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De palcos e resistências:
o tempo esculpido
por Augusta Ferraz,
Homenageada do 24º FRTN
Entrevista por Ivana Moura

Atriz Augusta Ferraz é homenageada do 24º Festival Recife do Teatro Nacional. Foto: Rogério Alves/ Divulgação

Augusta Ferraz esculpe o tempo que habita. Sagaz, irônica, combativa e corajosa, ela carrega em si um humor peculiar e inteligente que tempera cinco décadas de resistência cultural. Aos 68 anos e com 52 anos de carreira ininterrupta, a artista participou ativamente das transformações do teatro pernambucano, foi protagonista de muitas delas, ajudou a edificar instituições e nunca permitiu que as adversidades a retirassem de cena. Como escreveu a poeta polonesa Wisława Szymborska em Filhos da época: “Somos filhos da época e a época é política”. Augusta compreendeu que cada espetáculo, cada palavra no palco, cada silêncio ressoa politicamente no mundo. Sua relação com as artes cênicas se definiu logo na estreia. Durante Jesus Cristo Superstar, em 1973, no Teatro Santa Isabel, um prego atravessou seu dedo do pé. A dor era intensa, mas ela continuou interpretando a crucificação de Cristo, entendendo ali que “o espetáculo não podia parar” – lição que carrega até hoje.

Em quase sete décadas de vida, Augusta acumulou experiências que caberiam em várias biografias. Sobreviveu à ditadura militar, foi presa numa blitz policial em 1986, enfrentou violências silenciadas, faliu financeiramente, se reergueu e recomeçou. Militou pela criação da Federação de Teatro de Pernambuco, lutou por políticas culturais, denunciou o fechamento de teatros da cidade e nunca baixou a guarda diante da precariedade que assola as artes cênicas. 

Reinventar-se sempre foi sua marca. Atriz, dramaturga, diretora e produtora, Augusta transita entre linguagens com a desenvoltura de quem domina seu ofício. Do teatro partiu para o cinema com Amores de Chumbo (2016), de Tuca Siqueira, depois para a televisão como Dona Berenice em Guerreiros do Sol, novela da Globo de 2025. Entre seus quase 80 espetáculos, construiu uma técnica própria que ela mesma não consegue definir: “Alguém escreverá sobre isso depois que eu morrer”, diz com o humor ácido que matiza sua intensidade. 

Agora, homenageada pelo 24° Festival Recife do Teatro Nacional ao lado de Auricélia Fraga, Augusta traz Sobre os Ombros de Bárbara, com direção de José Manoel. O espetáculo, escrito em parceria com Brisa Rodrigues e vencedor do Prêmio Ariano Suassuna de dramaturgia, estreia nos dias 29 e 30 de novembro no Teatro Santa Isabel. A obra entrelaça sua própria história com a de Bárbara de Alencar, primeira presa política do Brasil – e tataravó de Augusta. O título aponta para uma filosofia: todos estamos sobre os ombros de quem veio antes, e serviremos de ombros para quem virá depois. Augusta está sobre os ombros de Bárbara, como esteve sobre os de sua mãe, e outras artistas estarão sobre os seus.

Na entrevista a seguir, Augusta Ferraz fala sobre esse novo trabalho, reflete sobre cinco décadas de teatro e analisa com sua habitual sagacidade a situação cultural do Recife. Entre memórias dolorosas e conquistas celebradas, ela oferece um panorama único do teatro brasileiro visto por quem nunca abandonou o palco – mesmo quando tudo conspirava para que isso acontecesse. É a voz de quem esculpe o próprio tempo e agora o compartilha com ironia, coragem e a clareza de quem sabe que cada gesto no palco ecoa no mundo.

“Quem tem a felicidade de experimentar,
não deixa de ir ao teatro nunca”

ENTREVISTA: Augusta Ferraz

Augusta Ferraz, homenageada do 24º Festival Recife do Teatro Nacional. Foto Rogério Alves / Divulgação

SATISFEITA, YOLANDA? – O que a inspirou a criar o espetáculo Sobre os Ombros de Bárbara e a trazer a história de Bárbara de Alencar para os palcos?

AUGUSTA FERRAZ: Coragem. Muita coragem, né? Porque tentar montar espetáculos hoje de maneira mais profissional é muito complicado, muito difícil. Por mais que a gente lute, continuamos sendo o cu do mundo.

SATISFEITA, YOLANDA? – Mas por que Bárbara? O que a motivou a falar sobre essa figura histórica?

AUGUSTA FERRAZ: Porque eu sou tataraneta do irmão de Bárbara, que lutou junto com ela em todas essas guerrilhas. Era o irmão mais novo da família. Miguel Arraes é descendente da irmã mais velha de Bárbara, Inácia. Só para citar, para vocês entenderem do que estou falando.
Então, Leonel Pereira de Alencar lutou nas mesmas questões que Bárbara, era companheiro dela nessa luta junto com os filhos. Desde criança eu escuto esse nome, de vez em quando se falava dela na família – fui criada na família da minha mãe. Fui crescendo com essa criatura, essa figura dentro de mim. Uns 20 anos atrás, comecei a pensar em montar um espetáculo sobre Bárbara de Alencar. Em 2022, eu decidi. Conversei com José Manoel – era uma oportunidade de trabalhar com ele, porque ele havia saído do SESC e tinha a agenda mais aberta. Quando ele topou e começamos, ele entrou na Fundação de Cultura. Mas continuamos, estamos trabalhando desde 2022 nesse processo.

“Bárbara é a primeira presa política do Brasil
– oficialmente, a primeira mulher presa por causa
de política. Comeu o pão que o diabo amassou”

SATISFEITA, YOLANDA? – Nesse processo de criação da peça, quais aspectos da vida e da luta de Bárbara você decidiu levar para a cena? O que mais a impactou na trajetória dessa mulher?

AUGUSTA FERRAZ: As pessoas não conhecem, não sabem a história de Bárbara. Muita gente não sabe do que se trata. Espero que o espetáculo, essa homenagem do festival, faça com que se fale um pouco sobre isso e que as pessoas se atentem mais para nossa história. Porque, afinal, a Revolução Pernambucana de 1817, a Confederação do Equador, a Convenção de Beberibe – tudo isso foi o ponto de partida para virarmos República, mesmo que tenha demorado 60 anos para chegarmos lá. No Brasil se fala muito sobre a Inconfidência Mineira, que aconteceu 100, 150 anos antes e cujo embrião não era realmente uma república, mas a questão dos impostos e a ligação com Portugal, que mandava e levava toda a riqueza material.
Essa Revolução Pernambucana traz outra discussão: tem a questão dos impostos, mas principalmente a de transformar o Brasil em República. Naquele momento, toda a América Latina já era República, e o Brasil continuava preso a uma coroa europeia.

Voltando à pergunta… basicamente é pegar uma mulher de 57 anos, fazendeira – comerciante, ela comerciava com plantação e agricultura. Tinha escravos, tinha terras, era rica e trabalhava. Era uma empreendedora, cuidava daquele negócio todo, daquela família toda. Era a cabeça da família Alencar quando essa família ainda estava estruturada ali por Exu, pelo Crato, não tinha se espalhado ainda. Acho Bárbara impressionante na força dela, uma força sertaneja, daquele ideário de mulher forte que luta no dia a dia. Naquela época, mesmo sendo rica, as pessoas trabalhavam duro para viver. Não tinha eletricidade, água, carro – era cavalo, carro de boi, carregar água. Era outro tipo de vida.

O sertão é uma coisa que me impressiona muito. Minha família é sertaneja por um lado – do meu avô, pai da minha mãe, para trás, é tudo sertanejo. Minha mãe nasceu em Limoeiro e veio para a capital pequena ainda. Essas questões do Nordeste, do sertão, das mulheres que lutam e são fortes, me impressionam.

Bárbara é a primeira presa política do Brasil – oficialmente, a primeira mulher presa por causa de política. Comeu o pão que o diabo amassou. Saiu de cavalo do Crato para Fortaleza, de Fortaleza para o Forte das Cinco Pontas, depois para a Casa da Torre em Salvador. Foram quatro anos de prisão, depois voltou, fez o mesmo percurso. Uma mulher de 57 anos.
Isso afetou muito a saúde dela – a minha também ficaria acabada. E no meio dessa confraria de homens, uma mulher à cabeça de um movimento. Não aqui no Recife, mas lá no Crato. É impressionante ela ter assumido essa postura naquela época.

SATISFEITA, YOLANDA? – Fale sobre o processo de construção do espetáculo. A dramaturgia é sua, em parceria com Brisa Rodrigues, correto? Como foram essas escolhas dramatúrgicas e qual é a proposta de encenação?

AUGUSTA FERRAZ: São três anos em cima dessa história. Sobre a dramaturgia, quando chamei José para trabalhar, ele me apresentou a Brisa. Ela estava em Petrolina, vinda do Rio de Janeiro, terminando o mestrado sobre vozes femininas na política brasileira e na formação do Brasil. Estava estudando Dilma Rousseff e Bárbara de Alencar – juntamos a fome com a vontade de comer. Comecei a adquirir livros raríssimos, consegui textos que nem sei como. Ficava passando para Brisa, trabalhávamos online, líamos e conversávamos muito. Brisa tem o dom da escrita, eu tenho o dom da palavra, e juntas temos o dom da inteligência e de articular pensamentos. Passamos cerca de um ano escrevendo, aí dei uma parada porque comecei a ficar doente. Chegamos num ponto em que não dava mais para trabalhar só por amor e desejo – tem que ter dinheiro também. Começamos a fazer projetos, editais de incentivo, conseguimos a Lei Paulo Gustavo, o Multicultural da prefeitura. Com a verba, juntei todo mundo e começamos a trabalhar firme em junho. Cada dia é uma coisa enlouquecedora.

SATISFEITA, YOLANDA? – Vocês ganharam um prêmio de dramaturgia com esse texto, o Prêmio Ariano Suassuna, não é?

AUGUSTA FERRAZ: Ganhamos o Prêmio Ariano Suassuna com essa dramaturgia. É claro que o texto vem sofrendo mudanças por conta da encenação. É muito bom trabalhar com um diretor aberto para esse convívio com a dramaturgia, que está disposto a retrabalhar o texto no espaço de ensaios. Como sou uma das autoras, posso mexer no texto. Quando mexia, mandava para Brisa e conversávamos. É um processo muito bom, muito bonito, muito novo. Acho que trabalhei apenas duas vezes dessa maneira na minha vida, mas é um processo excelente.

“O espetáculo tem a palavra de Bárbara e a palavra de Augusta.
Augusta fala sobre Bárbara e sobre Augusta, sobre o movimento
teatral no Recife e sobre a falta de casas de espetáculo…”

SATISFEITA, YOLANDA? – De que forma você acredita que essa história de Bárbara, uma revolucionária que viveu entre 1760 e 1832, dialoga com o Brasil de hoje?

AUGUSTA FERRAZ: Tudo. Veja: uma luta para se tornar República. Hoje somos uma República plena? Não, ainda estamos em processo, como se estivéssemos engatinhando. Com todos os processos e estudos que a população brasileira já passou e passa, ainda estamos discutindo isso seriamente. República pressupõe um espaço para todos, de convivência e vida relativamente agradável, sem tanta escravidão. Mas o processo brasileiro fica cada dia mais difícil. O país foi rachado ao meio, o que acho positivo em parte, porque a direita hoje se pronuncia plenamente, aos gritos. Nada se esconde mais, o jogo está muito aberto. Claro que ainda há coisas feitas na calada da noite, mas está muito explícito. 

SATISFEITA, YOLANDA? – Você explora também as contradições da própria Bárbara, como o fato dela ter sido uma escravagista?

AUGUSTA FERRAZ: O tempo inteiro. No início do espetáculo, ela é anunciada como dona de terras, de escravizados, comerciante, viúva, mulher que nasceu sob os auspícios de Santa Bárbara. Fica claro. Não há defesa de que Bárbara não era isso. Durante o espetáculo falamos sobre essas contradições. Bárbara é uma figura do seu tempo – século XVIII, início do XIX – quando a escravidão era a base econômica do país. Mas ela tinha lutas revolucionárias para aquela época: a luta por uma República. A fundação do Partido Liberal, em 1830, da qual Bárbara era membro, foi criado para libertar o Brasil de Portugal e criar a República. O partido foi criado para igualar a luta de todas as pessoas. Em princípio, das elites econômicas… É raro ver uma revolução que sai do seio do povo.

“Já que há uma prioridade em reformular a estrutura da cidade do Recife,
se há essa vontade, então por que não se estende às casas de espetáculo? Gerar pequenos espaços de 100, 150 lugares…”

SATISFEITA, YOLANDA? – O espetáculo estreia dia 29 de novembro, dentro do festival. Depois disso, quais são os planos de circulação? Vocês já têm estratégias para levar a peça a outros espaços?

AUGUSTA FERRAZ: Tínhamos planos, temos que fazer apresentações por conta das exigências do edital. Mas é impressionante. Não existe pauta nos teatros do Recife para mais de três apresentações. Três! Não existe pauta. Essa é uma discussão que também levamos para o espetáculo, porque ele tem a palavra de Bárbara e a palavra de Augusta. Augusta fala sobre Bárbara e sobre Augusta, sobre o movimento teatral no Recife, sobre a falta de casas de espetáculo. Pouquíssimas casas de espetáculo. Casas sendo fechadas, incendiadas, derrubadas pelas próprias prefeituras da Grande Recife. Barreto Júnior no Cabo, Paulo Freire em Paulista – foram derrubados pela prefeitura sem justificativa. Se não fosse a população de artistas de Paulista nessa luta, Vinícius Coutinho muito envolvido nisso, não estaria agora na tentativa de reerguer aquela casa de espetáculo. Os teatros daqui: o Teatro da Fundação Joaquim Nabuco vira cinema, deixa de ser teatro. O Valdemar de Oliveira é incendiado – incêndio criminoso e depredação que se arrasta há anos. O Teatro do Derby foi fechado pelo quartel, que na verdade é o Estado, que na verdade é a população. A polícia decidiu fechar porque não quer mais gente de teatro ali. Hoje é depósito e local de reuniões religiosas. Aqui estamos no Barreto Júnior. O cuidado da gestão é muito bom – teatro limpo, palco cuidado, ar-condicionado, material de cena. Mas se você for na plateia, algumas cadeiras estão quebradas. Cadê a prefeitura para consertar? Vai esperar que o teatro gere dinheiro e se autoconserte?

Eu fui a primeira pessoa a ir para a praça pública questionar o que aconteceria com o Teatro do Parque, que estava há dez anos fechado. Hoje está aberto, mas não consigo pauta nem para leitura de texto dentro de um camarim. Não tem pauta. Porque também ainda tem as bandas e as orquestras dentro dos teatros, que também ocupam os espaços do teatro. Aí eu não estou fazendo uma análise se isso é bom ou ruim – o que eu estou analisando é a falta de espaço.

Seria interessante também que as bandas e a orquestra sinfônica tivessem o seu próprio espaço para poder trabalhar e construir, e utilizar esses locais de manhã, de tarde e de noite, se quisessem, para que se possa estudar também. Mas pega-se tudo, enfia-se dentro de uma casa de espetáculo e essa casa de espetáculo tem que dar conta de tudo, inclusive pagar o conserto das fechaduras do banheiro, dos ganchos das portas, das cadeiras quebradas.

Quer dizer, cadê a prefeitura? Cadê a prefeitura da cidade do Recife para trabalhar isso? Já que há uma prioridade tão interessante em reformular a estrutura da cidade e reformular o próprio centro histórico da cidade do Recife – onde eu resido, eu moro no centro histórico do Recife -, se há essa vontade, então por que essa vontade também não se estende às casas de espetáculo? Gerar pequenos espaços de 100, 150 lugares nessa vasta cidade chamada Recife, cadê? É isso.

SATISFEITA, YOLANDA? – Mas existem também os espaços alternativos da cidade, não é?

AUGUSTA FERRAZ: Os espaços alternativos como Fiandeiros, Poste, Cênicas? Cadê o incentivo? Recife não entrou no edital federal para incentivar espaços alternativos da cidade (adesão ao Programa Nacional Aldir Blanc de Ações Continuadas). Por que não entrou? Os espaços existentes são escolas de teatro. Sendo escolas, têm movimento próprio – aulas práticas, teóricas, utilizam quase o dia todo, apresentam conclusões de cursos, oferecem oficinas. É difícil encontrar espaço para quem está fora do processo. Esses espaços não têm disponibilidade para a grande comunidade que trabalha em artes cênicas no Recife.

SATISFEITA, YOLANDA? – Agora vamos pegar outro caminho… Vamos falar sobre seus 150 anos de carreira, quer dizer 50…

AUGUSTA FERRAZ: 150 anos de carreira mesmo! Você está certíssima. Diria uns 240, porque me sinto por aí. Me sinto uma Matusalém nessa história toda. Cada dia fico mais velha – quando me olho no espelho, quando vou para cena testar minhas potencialidades: voz, corpo, gordura, cansaço, dor nas costas, rouquidão. Tenho uns 240 anos, sou jurássica assumidamente.

SATISFEITA, YOLANDA? – O que foi aquela fagulha inicial que a empurrou para o teatro há mais de cinco décadas? E o que mantém essa paixão acesa até hoje?

AUGUSTA FERRAZ: Tudo coincidência. Mesmo sabendo – sou bem junguiana – que coincidências não existem, só sincronicidades. O único caminho que segui foi esse. Estudei, fiz toda formação, entrei na universidade, consegui concluir Artes Cênicas depois de anos de luta – entrava e saía, fui jubilada, depois voltei. Tinha uma turma de amigos, um dia fui assistir um ensaio do Romildo Moreira e a atriz faltou. Ele disse: “Você não quer fazer?” Coisa bem amadora. Eu disse: “Vamos.” Ensaiei no lugar da pessoa que não chegou. Pronto, não parei mais.

SATISFEITA, YOLANDA? – Isso foi com que peça? Você se lembra?

AUGUSTA FERRAZ: A Dama de Copas e o Rei de Cuba, primeiro espetáculo que participei, com Romildo Moreira. Isso foi em 1976, se não me engano. Mas já tinha estreado no teatro como cantora em 1975, no show de Flaviola e o Bando do Sol, com Lula Cortez. Em homenagem a esse momento, canto a música que cantava no show: “Está tudo tão vazio e mudo, a solidão é meu maior tempero, meu coração é pleno desespero”. Canto isso em Bárbara. Antes, em 1973, fiz a grande estreia via colégio – José Francisco Filho era professor. Fizemos apresentação no Teatro de Santa Isabel. Estreei no Santa Isabel, onde vou apresentar Bárbara agora, depois de 52 anos.

SATISFEITA, YOLANDA? – Então já são cerca de 70 espetáculos nesse percurso?

AUGUSTA FERRAZ: Já são mais de 70, fiz mais uns sete. É intenso, muito intenso. Não para. De diversas formas, linguagens, me metendo em várias coisas: cantando, falando, apoiando, lendo, fazendo leituras, apresentando espetáculos, participando de trabalhos de outras pessoas. Somando tudo, estamos perto de 80. Nunca parei. Só parei em 2017, quando tive falência total da vida profissional.

SATISFEITA, YOLANDA? – Financeira?

AUGUSTA FERRAZ: Financeira. Pedi ajuda às pessoas e, graças a Deus, essa ajuda veio, me ergui. Estive muito doente também. Veio a pandemia. A pandemia, ao contrário do que aconteceu com muita gente, me deu um momento muito bom. Pude ficar só – sou uma pessoa só, cultuo a solidão. É maravilhosa, assumida. Não significa que vivo intocada, sem conversar ou trocar com as pessoas. Na pandemia, as pessoas foram obrigadas a viver como eu vivia. Algumas mais perto, outras mais longe, mas me deixaram em paz. Pararam de me cobrar porque estavam tendo vida parecida. Foi um momento de equilíbrio, foi bom. Depois, começaram a sair editais, fiz pequenos projetos, comecei a ter algum dinheiro para viver, pagar os boletos todos. De lá para cá a vida, tem sido interessante. Aliás, a vida é muito boa comigo. Até nos piores momentos, sempre muito boa, me mostra coisas incríveis.

“O maior desafio foi aceitar que fiquei no Recife porque quis. Me neguei a fazer o êxodo. Tive oportunidades de ir para São Paulo, Rio de Janeiro, mas não via lógica nisso. Achava possível construir coisas aqui. Ainda acho”

SATISFEITA, YOLANDA? – Como você destacaria, desse percurso tão longo, alguns dos principais desafios e aprendizados da sua carreira?

AUGUSTA FERRAZ: O maior desafio foi aceitar que fiquei no Recife porque quis. Me neguei a fazer o êxodo. Tive oportunidades de ir para São Paulo, Rio de Janeiro, mas não via lógica nisso. Achava possível construir coisas aqui. Ainda acho. A cidade, no sentido da profissionalização, tem coisas interessantes acontecendo. Em grupos, artistas específicos, produção. Algumas coisas estão melhorando inegavelmente. Pena não ter espaço para todo esse pessoal desenvolver suas artes – pouquíssimos espaços. Mas hoje aceito plenamente essa escolha.

SATISFEITA, YOLANDA? – Fale sobre sua experiência no cinema, o protagonismo em Amores de Chumbo.

AUGUSTA FERRAZ: A experiência é boa, interessante. Quando estava dentro é que vi como tudo é rápido – em uma semana se faz tudo. Levamos três, quatro meses para montar uma peça de teatro e ainda trabalhamos em casa, na rua, decorando textos, repetindo na cabeça. No cinema, em uma semana se faz tudo. O processo mais demorado é conseguir recursos para produção e depois o lançamento. A pós-produção também, mas na edição não se demora tanto, porque geralmente, quando se faz um roteiro, principalmente agora, tudo é pensado na própria filmagem. Enquanto se filma, você já está pensando na edição. Essa foi uma experiência que tive na TV também. Foi interessante trabalhar com o Papinha – Rogério Gomes, que é o papa da direção da televisão brasileira. Papinha é o nome de guerra dele, porque ele é um papa naquilo que faz, um expert. O brasileiro tem aquela mania de diminutivos: neninha, menininha… então é Papinha. (risos) Eram quatro diretores – ele e os subdiretores que trabalhavam junto. Trabalhei com os quatro. Muito interessante quando era a vez do Rogério, porque ele já ia direto para uma cena, sabia exatamente o que queria, tudo enquadrado, já sabia onde ia cortar. Muito bom isso. A vida na televisão é enlouquecedora porque você fica à mercê daquilo ali. Você não pode fazer nada, mas também pagam para você ficar à mercê, né?

SATISFEITA, YOLANDA? – O teatro hoje é frequentemente visto como algo elitizado, quase um “luxo” – não para quem faz, que muitas vezes vive na precariedade, mas para o público, um certo público. Num mundo com tantas urgências sociais, como você vê a importância e o lugar dessa arte artesanal? O teatro não tem mais a mesma reverência de outras épocas e parece não alcançar multidões? Como você enxerga isso?

AUGUSTA FERRAZ: Fica difícil saber sobre essa questão da reverência em outras épocas, porque a gente sabe que quem escreve a história é sempre um só lado. Então é muito difícil de analisar. O que eu compreendo é que essa arte artesanal, como você fala, tem muitos séculos de vida e não morreu – ela continua. E acredito que continuará. Quem consegue, como plateia, entrar numa sala de espetáculo, se essa pessoa tiver consciência ou estiver pronta para adquirir a consciência de que aquele é um espaço no tempo, uma bolha onde ela entra e vive uma experiência diferente – que não é a experiência da confusão do mundo, mesmo que o tema seja sobre os horrores do mundo -, quem tem a felicidade de experimentar isso não deixa de ir ao teatro nunca. E quem está descobrindo vai continuar querendo descobrir. Agora, aqueles que não conseguem desligar o celular no momento da apresentação… vamos ver o que vai acontecer com eles. Não tenho a menor ideia. É muito estranho. Quando estou no palco e vejo celulares ligados na plateia, é engraçado porque parecem discos voadores, navezinhas pequenas. Está tudo escuro, a luz reflete na pessoa – você não vê o celular, só o reflexo da luz, e ficam aquelas bolhas sentadas na plateia. Quando estou na plateia é diferente – vejo a luz do celular voltada para minha cara, desvia minha atenção. Me incomoda muito mais ver celulares ligados quando estou na plateia do que no palco. Mas é a época que vivemos. Acredito que o espaço do teatro é esse mesmo, um espaço reduzido. Olha que assisti à Fernanda Montenegro em Fedra (1986) com 1.800 pessoas no Teatro Guararapes – não é tão reduzido assim.

SATISFEITA, YOLANDA? – Fernanda Montenegro fez uma leitura memorável no Auditório Ibirapuera em agosto do ano passado, de Simone de Beauvoir, transmitida por telões para 15 mil pessoas no parque. Foi algo incrível.

AUGUSTA FERRAZ: Incrível mesmo.

“Me sinto muito feliz. É um reconhecimento da minha cidade, pelos meus 52 anos de trabalho ininterrupto. Mas gostaria que tivesse havido uma cerimônia de abertura oficial do festival, seguindo sua tradição”

SATISFEITA, YOLANDA? – Como você recebe essa homenagem do 24º Festival Recife do Teatro Nacional? É um reconhecimento importante da cidade, especialmente por um festival que retomou há três anos, mas tem uma história significativa. Você também foi homenageada em 2015 pelo Festival Janeiro de Grandes Espetáculos, quando apresentou quatro trabalhos. O que representa essa homenagem do FRTN para você?

AUGUSTA FERRAZ: Claro que me sinto muito feliz. É um reconhecimento oficial da minha cidade, que reconhece minha história, meus 52 anos de trabalho ininterrupto. Isso é maravilhoso, me alimenta. Gostaria que tivesse havido uma cerimônia de abertura oficial do festival, seguindo sua tradição, onde as pessoas sobem, falam, com cortina aberta ou fechada, com o espetáculo montado. Gostaria de ter sido reconhecida assim também, ter tido esse momento na abertura. Justamente quando chegou minha vez, isso não aconteceu. Sinto falta disso, acho que faltou diálogo comigo. Não sei a posição de Auricéia Fraga, que é a outra atriz homenageada – não conversei com ela sobre isso. Fizeram uma proposta de ter alguma coisa antes da minha apresentação, mas não podia ser porque preciso estar muito concentrada. É um espetáculo que exige muito, mexe com coisas complicadas, atuais, fortes. É impossível parar para fazer algo e depois começar o espetáculo. Tenho que estar imersa, quase amarrada em cena quando a cortina abre. Depois do espetáculo também é impossível – fico exausta, não dá tempo de mudar de roupa. Sinto falta dessa materialização da homenagem que aconteceu nos outros anos – não só a homenagem na mídia, mas também onde a cidade referencia isso. Não vejo como coisa de ego, é absolutamente normal. Faltou diálogo para decidir isso. Mas estou absolutamente feliz com esse momento. É muito especial, não é qualquer pessoa que consegue isso.

SATISFEITA, YOLANDA? – Há algo mais que gostaria de destacar sobre o espetáculo ou sua trajetória?

AUGUSTA FERRAZ: Quero falar sobre o título Sobre os Ombros de Bárbara. A imagem é como um totem, onde um está em cima do outro. Eu, Augusta, estou sobre os ombros de Bárbara, como estou sobre os ombros da minha mãe, dessas pessoas que me antecederam. E sei que algumas pessoas que trabalham com essa arte, com esse ofício, estarão sobre os meus ombros também. Me reconheço nesse espaço de troca, de ter uma história, de ser um ambiente para pesquisa, de ser seguida. Percebo esse lugar também na cidade – essa homenagem que me fazem todos os dias nas trocas com meus colegas, técnicos e artistas. É isso. Estar sobre os ombros da própria história. É lindo isso. Gosto muito de história – do mundo, do Brasil, das pessoas, dos bichos, das máquinas voadoras. É isso.

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Ela enfrentou a ditadura
Lady Tempestade abre
24º Festival Recife do Teatro Nacional

Andrea Beltrão estrela monólogo sobre defensora de presos políticos em Pernambuco, abrindo festival que celebra vozes femininas nas artes cênicas.  Foto: Nana Moraes / Divulgação

Embarque na história de uma mulher que dedicou sua vida a defender aqueles que o Estado considerava inimigos. Mércia Albuquerque foi uma advogada corajosa que, durante os anos mais sombrios da ditadura militar, enfrentou tribunais, burocracias e ameaças para garantir direitos básicos a centenas de presos políticos em Pernambuco. Sua trajetória está no palco através de Lady Tempestade, com Andrea Beltrão, espetáculo que inaugura o 24º Festival Recife do Teatro Nacional, com sessões entre 20 e 22 de novembro no Teatro de Santa Isabel.

Mércia Albuquerque era uma ponte entre famílias desesperadas e um sistema jurídico militarizado. Durante os 21 anos da ditadura civil-militar (1964-1985), ela esteve na linha de frente da defesa dos direitos humanos, documentando violações, organizando defesas e mantendo viva a esperança de inúmeras famílias pernambucanas.

Com texto de Silvia Gomez e direção de Yara de Novaes, a obra baseia-se nos diários pessoais e registros profissionais deixados pela própria Mércia. Trata-se de um trabalho de arqueologia da memória que revela os bastidores da resistência jurídica durante um dos períodos mais sombrios da história brasileira.

Lady Tempestade” oferece uma aula de história viva, demonstrando como funcionava na prática a máquina repressora e, principalmente, como pessoas comuns encontraram formas de resistir dentro da própria lei. Mércia enfrentava verdadeiras tempestades burocráticas e políticas para fazer valer os direitos de seus defendidos.

Andrea Beltrão, uma trajetória de escolhas inteligentes. Foto: Gil Tuchternhagen / Divulgação

Com mais de 40 anos de carreira, Andrea Beltrão conquistou reconhecimento tanto na televisão quanto no teatro, sempre priorizando projetos de relevância artística e social. Na TV, destacou-se em produções como Armação Ilimitada, A Grande Família e Um Lugar ao Sol, enquanto no cinema brilhou em Hebe, A Estrela do Brasil.

No teatro, a atriz emocionou plateias em montagens como “A Prova” e As Centenárias“, demonstrando versatilidade para transitar entre drama e comédia com igual maestria. Essa trajetória sólida reflete uma carreira pautada pela inteligência na escolha dos trabalhos.

Em Lady Tempestade, Beltrão enfrenta um de seus papéis mais desafiadores: interpretar uma mulher real, com responsabilidades históricas e familiares que ainda guardam a memória de Mércia Albuquerque. O monólogo demanda técnica refinada e resistência emocional, já que a intérprete permanece em cena por aproximadamente 90 minutos, conduzindo uma narrativa densa sobre um período traumático da história nacional.

No cenário atual, Lady Tempestade oferece algo raro, que são fatos documentados apresentados através de uma perspectiva humana e acessível. A montagem ganha relevância especial por mostrar o papel crucial da advocacia em momentos de crise democrática. 

Para plateias mais jovens, o espetáculo atua como janela para um período histórico frequentemente reduzido a dados estatísticos nos livros didáticos. Dessa forma, através do relato pessoal de Mércia, eventos históricos ganham rostos, nomes e consequências humanas concretas.

Expectativa de alta procura

A organização do festival prevê alta demanda para as três sessões de Lady Tempestade. A produção acumula histórico de salas lotadas em temporadas anteriores, enquanto a combinação do nome de Andrea Beltrão com a relevância do tema tem atraído atenção em várias temporadas.

Há relatos de caravanas organizadas em estados vizinhos interessadas em acompanhar a abertura do festival. Tal expectativa se justifica: além da importância histórica do material, a montagem oferece a rara oportunidade de ver uma das maiores atrizes brasileiras em ação no palco, em um espaço histórico como o Teatro de Santa Isabel.

Festival celebra protagonismo feminino

Tudo que Eu Queria te Dizer, solo de Ana Beatriz Nogueira. Foto: Divulgação

O 24º Festival Recife do Teatro Nacional consolida-se como um dos principais eventos teatrais do país, apresentando 24 espetáculos em onze dias de atividades, sendo 16 deles inéditos na capital pernambucana. Com o tema “Vozes Femininas – Histórias que ressoam”, a edição deste ano celebra as criadoras e criativas do teatro brasileiro, entre dramaturgas, atrizes, diretoras e pesquisadoras.

Entre as principais atrações nacionais, além de “ady Tempestade, está Tudo que Eu Queria te Dizer, solo de Ana Beatriz Nogueira inspirado no best-seller de Martha Medeiros, onde a atriz se desdobra na pele de cinco mulheres distintas para falar sobre amor, rejeição e desejo. A apresentação acontece nos dias 22 e 23, no Teatro do Parque.

Também inédita na capital pernambucana é Mary Stuart, protagonizada por Virginia Cavendish, trazendo um olhar contemporâneo sobre as últimas 24 horas de vida da rainha escocesa, numa trama sobre conspiração e jogos de poder. A montagem paulista estreia no Recife nos dias 28 e 29, também no Teatro do Parque.

116 Gramas: Peça para Emagrecer, solo da paulista Letícia Rodrigues, explora a jornada de uma mulher em busca do emagrecimento, questionando pressões sociais sobre a imagem corporal. A protagonista tenta, a cada apresentação, perder exatamente 116 gramas, utilizando o espetáculo como uma aula de academia performativa. As sessões acontecem nos dias 22 e 23, no Teatro Apolo.

A Cia do Tijolo, companhia paulista reconhecida nacionalmente, traz duas produções inéditas na cidade: Corteja Paulo Freire, celebração poética e musical no Parque Dona Lindu, e Restinga de Canudos, que reconstrói a vida em Canudos a partir da visão feminina de duas professoras do povoado, que eram professoras em tempos de paz e enfermeiras em tempos de guerra. A montagem apresenta uma perspectiva inédita sobre a comunidade, destacando o cotidiano, as resistências e as histórias que ficaram submersas na narrativa oficial sobre o conflito. A apresentação acontece no dia 23, no Teatro Luiz Mendonça.

Homenagens

Augusta Ferraz. Foto Rogério Alves / Divulgação

Auricéia Fraga. Foto: Divulgação

A edição presta tributo a duas grandes atrizes pernambucanas: Auricéia Fraga e Augusta Ferraz, com 50 anos de trajetória cada uma, cujas vidas em cena contam a história do teatro local.

Augusta Ferraz apresenta Sobre os Ombros de Bárbara, mergulho na vida de Bárbara Alencar, heroína da Revolução Pernambucana e considerada a primeira presa política do Brasil. A montagem acontece nos dias 29 e 30, no Teatro de Santa Isabel.

Auricéia Fraga convida o público para  abertura de processo de Não se Conta o Tempo da Paixão, onde narra sua longa relação com o teatro. A abertura de processo acontece no dia 21, no Teatro Hermilo Borba Filho.

Diversidade de propostas e territórios

Das que Ousaram Desobedecer, do Ceará. Foto de Pattie Silva / Divulgação

O festival distribui sua programação estrategicamente por teatros municipais, parques e espaços públicos da cidade. Além dos tradicionais palcos do Santa Isabel, Teatro do Parque, Apolo e Hermilo Borba Filho, a programação alcança o Marco Camarotti, Luiz Mendonça, Espaço Cênicas e Casa de Alzira, chegando também aos parques da Macaxeira e da Tamarineira.

Shá da Meia Noite, com Sharlene Esse. Foto: Divulgação 

Entre as produções locais inéditas, sobressai Helô em Busca do Baobá Sagrado, espetáculo infantil que narra a história de uma menina em missão para encontrar o fruto sagrado e curar seu povo da “doença da tristeza”. As apresentações acontecem nos dias 22 e 23, no Teatro Hermilo.

Outras montagens nacionais inéditas incluem Das que Ousaram Desobedecer (CE), que relembra a luta de mulheres cearenses contra a ditadura; Zona Lésbica (RJ), que enfrenta estereótipos de gênero para reivindicar o direito ao amor; A Mulher Bala (SP), com a palhaça Funúncia tentando se tornar uma bala humana; e Ella (AM), solo de palhaçaria que aborda violência de gênero.

A Mostra OFFRec amplia o alcance do festival com produções locais e nacionais  contemporâneas, incluindo Mi Madre, solo autobiográfico de dança de Jhanaina Gomes; HBLynda em Trânsito, sobre as vivências de uma pessoa gorda, preta e não binária; e Shá da Meia Noite, celebrando os 40 anos da artista que participou do irreverente Grupo Vivencial.

O festival mantém sua vocação pedagógica através de quatro oficinas gratuitas sobre temas como teatro e sagrado feminino, dramaturgia feminista e criação de solos teatrais. As atividades acontecem entre os dias 20 e 27, em diversos equipamentos.

Toda a programação é gratuita, com distribuição de ingressos nas bilheterias dos teatros uma hora antes de cada espetáculo, mediante entrega de um quilo de alimento não perecível. Serão 37 sessões ao longo dos onze dias, convidando a cidade inteira a celebrar o teatro brasileiro.

📅 SERVIÇO 

LADY TEMPESTADE
🎭 Com: Andrea Beltrão
✍️ Texto: Silvia Gomez
🎬 Direção: Yara de Novaes
📅 Datas: 20, 21 e 22 de novembro
⏰ Horários: 20h (todas as sessões)
📍 Local: Teatro de Santa Isabel – Praça da República, Santo Antônio, Recife/PE
🪑 Capacidade: 570 lugares
🎟️ Ingressos: Gratuitos com 1kg de alimento não perecível
♿ Acessibilidade: Libras (todas as sessões) + Audiodescrição (dia 22)

24º FESTIVAL RECIFE DO TEATRO NACIONAL
🎨 Tema: “Vozes Femininas – Histórias que ressoam”
📅 Período: 20 a 30 de novembro de 2024
🎭 Programação: 24 espetáculos (16 inéditos na cidade) + 37 sessões
🎟️ Acesso: Gratuito com 1kg de alimento não perecível
🏛️ Equipamentos: 9 teatros e 2 parques da cidade
📱 Informações: @culturadorecife (Instagram) | Canais oficiais da Prefeitura do Recife

OUTROS DESTAQUES DA PROGRAMAÇÃO:

 Abertura de processo de Não se Conta o Tempo da Paixão (Auricéia Fraga) – dia 21, no Teatro Hermilo Borba Filho.
Tudo que Eu Queria te Dizer (Ana Beatriz Nogueira) – 22 e 23/11, Teatro do Parque
Mary Stuart (Virginia Cavendish e elenco) – 28 e 29/11, Teatro do Parque
116 Gramas: Peça para Emagrecer (Letícia Rodrigues) – 22 e 23/11, Teatro Apolo
Restinga de Canudos (Cia do Tijolo) – 23/11, Teatro Luiz Mendonça
Sobre os Ombros de Bárbara (Augusta Ferraz) – 29 e 30/11, Teatro de Santa Isabel

OFICINAS GRATUITAS:
Teatro, Dança e Sagrado Feminino (20-21/11)
Dramaturgia para Infâncias (21-23/11)
Criação de Solos Teatrais (24-27/11)
Dramaturgias Feministas (26/11)

⚠️ INFORMAÇÕES IMPORTANTES:

Chegada com 1h de antecedência recomendada
Programação sujeita a alterações – acompanhar canais oficiais
Espetáculos com classificação indicativa variada
Sessões com recursos de acessibilidade sinalizadas na programação

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Lady Tempestade, com Andrea Beltrão
abre Festival Recife do Teatro Nacional
celebrando vozes femininas

Andrea Beltrão em Lady Tempestade. Foto: Nana Moraes / Divulgação

Atriz interpreta a advogada pernambucana Mércia de Albuquerque. Foto: Nana Moraes / Divulgação

2 de abril de 1964. Uma cena de horror se desenrolava pelas ruas do Recife e mudaria para sempre a vida de uma jovem advogada. Gregório Bezerra, comunista histórico e líder das Ligas Camponesas, ferrenho opositor do recém-instalado regime militar, estava sendo arrastado seminu pelo asfalto, amarrado ao para-choque de um jipe. O coronel Darcy Villocq comandava aquela demonstração de brutalidade que seria transmitida pelo Repórter Esso para todo o país – o primeiro caso documentado de tortura política pós-golpe.

Entre os que testemunharam aquela barbárie estava Mércia de Albuquerque, advogada de 30 anos. Aquela imagem ficou cravada em sua retina. Ao chegar em casa, ela comunicou ao marido Octávio uma decisão que mudaria sua vida: defenderia Gregório Bezerra e qualquer pessoa que necessitasse de proteção contra as arbitrariedades do novo regime.

Mais de sessenta anos depois, essa história de coragem chega ao 24º Festival Recife do Teatro Nacional através do espetáculo Lady Tempestade, que abre a programação no dia 20 de novembro no Teatro de Santa Isabel. Andrea Beltrão protagoniza o monólogo sobre a advogada que defendeu mais de 500 presos políticos.

Com texto de Sílvia Gomez e direção de Yara de Novaes, o espetáculo parte dos diários que Mércia escreveu durante os anos mais duros da ditadura. Passado, presente e futuro se embaralham na narrativa, que utiliza uma estrutura “diário dentro do diário”.

Andrea Beltrão interpreta A., mulher que recebe misteriosamente os escritos de Mércia e gradualmente se envolve com aquelas histórias de resistência. A protagonista encara o dilema de se aprofundar ou não naquela realidade, mas acaba mergulhando nas memórias que revelam a busca por justiça e o paradeiro de desaparecidos, ecoando as súplicas de mães desesperadas.

A dramaturgia explora a ideia de que alguém do presente recebe uma convocação do passado, criando um tempo verbal instável que oscila entre passado, presente e futuro. Essa estrutura temporal reflete como o Brasil permanece reincidente no esquecimento de sua própria história. Uma frase se torna leitmotiv da montagem, repetida após trechos dramáticos do diário: “Essas coisas acontecem, aconteceram, acontecerão”. Para materializar esse conceito em cena, a direção de Yara de Novaes constrói uma jornada visual que espelha a própria transformação de Mércia.

O espetáculo inicia em um ambiente doméstico deteriorado – mobiliário gasto, cores apagadas, iluminação que sugere clausura e melancolia. Conforme a narrativa avança e o passado invade o presente, essa cenografia se reinventa: sons de violência cedem lugar a celebração, a decadência visual dá espaço à luminosidade, e o palco se torna território de resistência e esperança.

Complementando essa atmosfera de encontro entre tempos, a presença de Chico Beltrão, filho de Andrea, adiciona uma camada geracional ao espetáculo. Responsável pela trilha sonora e por momentos pontuais de diálogo, sua participação surgiu de uma proposta da diretora. Embora Andrea inicialmente tenha hesitado em envolver o filho – produtor musical, não ator – no projeto teatral, Yara identificou que essa configuração familiar ampliaria o impacto emocional da montagem. 

Lady Tempestade consolidou-se como um dos maiores sucessos teatrais contemporâneos e já circulou por várias cidades brasileiras. Desde sua estreia em 2024, a montagem realizou cerca de 150 apresentações e ultrapassou a marca dos 70 mil espectadores, registrando sessões esgotadas e repercussão positiva na imprensa.

O alcance da obra expandiu-se além dos palcos. A dramaturgia foi publicada pela Editora Cobogó em 2024, enquanto uma versão cinematográfica, dirigida por Maurício Farias, já teve suas filmagens concluídas em janeiro e fevereiro de 2025. O filme conta com direção de fotografia de Chico Rufino, direção de arte de Luciane Nicolino, desenho de som de Arthur Ferreira, participação de Chico Beltrão e produção da Taba Filmes, Boa Vida e Quintal Produções.

Festival conecta vozes femininas através dos séculos

Augusta Ferraz no ensaio Sobre os Ombros de Bárbara. Foto: Reprodução do Instagram

O tema “Vozes Femininas – Histórias que Ressoam” conecta diferentes épocas e contextos. Ao longo da programação – ainda sendo ultimada pela organização, com contratos em finalização e sem divulgação oficial da prefeitura – o público encontra desde Mércia Albuquerque, que enfrentou a ditadura no século XX (Lady Tempestade, na abertura dia 20), até Bárbara de Alencar, que desafiou o império no século XIX (apresentações agendadas para os dias 29 e 30), passando por outras montagens que abordam as lutas das mulheres contemporâneas. Essas histórias revelam como a resistência feminina se reinventa em cada período, mantendo sua força através dos tempos.

Primeira presa política brasileira e protagonista da Revolução Pernambucana de 1817 e da Confederação do Equador de 1824, Bárbara de Alencar (1760-1832) ganha vida através da interpretação de Augusta Ferraz. Sobre os Ombros de Bárbara, com dramaturgia de Brisa Rodrigues da própria Augusta, sob direção de José Manoel Sobrinho, explora as contradições de uma mulher republicana durante a monarquia.

Nascida em Exu, Bárbara quase custou a vida da mãe no parto. Aos 22 anos, casou-se e mudou-se para o Crato, onde teve cinco filhos – dois estudaram no Seminário de Olinda, epicentro do liberalismo europeu entre as elites. Organizou células revolucionárias em sua residência, articulando movimentos que desafiaram o poder imperial.

Posteriormente presa, foi transportada a pé por 600 quilômetros até Fortaleza, permaneceu três anos em calabouços, liderou um segundo levante, perdeu dois filhos nas revoltas e morreu aos 72 anos sem testemunhar a proclamação da República. Augusta Ferraz, da série Guerreiros do Sol, dá vida a essa escravocrata em crise, apresentando um corpo violentado e uma resistência ao arbítrio.

Laboratório Franco-Brasileiro

Trabalho desenvolvido pela companhia francesa ktha em Seul. Foto: Reprodução

A companhia francesa ktha chega ao Recife para desenvolver  a peça A Gente Quer com artistas locais, dentro da programação do Ano Cultural Brasil-França 2025. O grupo não carrega espetáculos prontos; ele criou uma metodologia de criação teatral que se concretiza diferentemente em cada cidade, ocupando espaços urbanos alternativos como contêineres, carrocerias de caminhões, telhados, túneis, estacionamentos, etc.

Em agosto, na Casa do Povo, no bairro do Bom Retiro em São Paulo, durante o festival ERUV, seis artistas brasileiros participaram de residência de duas semanas para criar as versões brasileiras de A Gente Quer e Tu Es Là / Você está Aqui. As apresentações lotaram o espaço, validando a potência dessa metodologia aplicada ao contexto brasileiro.

Para Recife, após analisar mais de 100 cartas de intenção, a companhia selecionou 10 artistas locais: Lucas Vinícius, Catarina Almanova, Ludmila Lopes, Anna Batista, Ana Luiza DAccioli, Rodrigo Hermínio, Maria Pepe, Guara Rios, Bruna Luiza Barros e Caru dos Santos. Durante 10 ensaios, eles vão construir uma versão que dialogue com as particularidades pernambucanas.

Desde 2021, essa metodologia se realizou em mais de 15 cidades do mundo, gerando espetáculos únicos. A dramaturgia funciona como uma matriz: uma extensa lista de desejos e reivindicações que ganha forma específica através do trabalho com performers locais, criando rituais coletivos de partilha de anseios urbanos.

Festival Recife do Teatro Nacional 2025
📅 20 a 30 de Novembro de 2025
🎭 Abertura: 20 de novembro – Lady Tempestade
📍 Teatro de Santa Isabel e outros espaços
🎫 Programação gratuita
Homenageadas: Auricéia Fraga e Augusta Ferraz

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Escuta pública para discutir
o Festival Recife do Teatro Nacional

 

Sinapse Darwin, da Casa de Zoé, esteve na programação do 23º FRTN. Foto: Marcos Pastich/PCR

Evento acontece terça-feira (29), às 18h30, no Teatro do Parque

A Secretaria de Cultura do Recife convocou uma escuta pública para construir coletivamente a 24ª edição do Festival Recife do Teatro Nacional (FRTN), que acontecerá em novembro. Na próxima terça-feira (29/07), às 18h30, artistas, produtores e demais profissionais da cena teatral recifense são chamados para se reunir na sala da Banda Sinfônica do Teatro do Parque para contribuir com a programação do festival.

“O Festival Recife do Teatro Nacional sobe aos palcos da cidade em novembro. Mas, nos bastidores, a programação já começou. E todos os cênicos da cidade estão convidados a se engajar na produção da próxima edição do festival”, destaca a convocatória oficial.

A iniciativa busca que o festival consiga “apresentar e representar esperanças e necessidades da eloquente cena recifense”, mas enfrenta um desafio que tem se repetido: a baixa participação da classe artística nestes momentos de construção coletiva.

Embora seja comum ouvir reclamações e sugestões da classe teatral recifense nas redes sociais e nas mesas de bares da cidade, a presença física nas escutas públicas tem sido decepcionante. Em 2023, apenas 20 pessoas compareceram. Em 2024, o número caiu para 15 participantes – um quórum que preocupa os organizadores, especialmente considerando que o Recife possui uma cena teatral vibrante e numerosa.

“A hora da grita é essa, mas elas preferem as redes sociais e as mesas dos bares”, observa um integrante da organização, refletindo sobre a contradição entre as críticas virtuais e a ausência nos espaços formais de discussão.

Principais pontos críticos apontados na última avaliação pública 

O encontro de terça-feira ganha ainda mais relevância diante das questões levantadas na avaliação pública da 23ª edição, realizada em dezembro de 2024. Durante três horas de discussão na mesma sala da Banda Sinfônica, artistas, produtores e a avaliadora contratada Giovana Soar debateram os acertos e problemas enfrentados pelo festival.

Infraestrutura e equipe técnica: A avaliação revelou o esgotamento das equipes técnicas dos teatros, especialmente no Centro Apolo-Hermilo. Nathalie Revoredo, iluminadora com 11 anos de experiência no local, alertou: “Temos espaços exaustos e um corpo exausto não consegue realizar muito.” O atraso de uma hora e meia na apresentação de Mulheres de Nínive exemplificou os limites da infraestrutura atual.

Comunicação e divulgação: A avaliadora Giovana Soar identificou a comunicação como “um dos pontos mais delicados”, destacando a necessidade de melhorar a divulgação para alcançar públicos mais amplos. O programa do festival só foi distribuído na segunda semana do evento, comprometendo a estratégia de comunicação.

Ocupação dos teatros: Houve esvaziamento em algumas sessões, especialmente no OFF REC e espetáculos locais da mostra principal, contrastando com a lotação em apresentações com nomes consagrados como Marco Nanini e Othon Bastos.

Democratização do acesso: Foram levantadas questões sobre como atrair o público que compareceu à festa dos 20 anos do Grupo Magiluth (cerca de 2 mil pessoas) para dentro dos teatros durante o festival.

A questão dos pagamentos

Paralelamente aos debates artísticos, a cena teatral recifense tem enfrentado uma crise de confiança relacionada aos atrasos sistemáticos nos pagamentos de cachês por parte da Prefeitura do Recife.

Marconi Bispo, diretor do espetáculo Ọnà Dúdú — Caminhos Negros do Bairro do Recife (destaque do OFF REC 2024), recorreu às redes sociais para cobrar publicamente o pagamento pela participação da peça que envolvia 20 artistas, seis meses após a apresentação.

Não é um caso isolado. Outros artistas também recorreram às redes sociais para fazer cobranças públicas de cachês em atraso, evidenciando um problema que afeta diversos profissionais da cena cultural recifense.

Desafios estruturais e propostas 

A precarização dos espaços teatrais foi outro tema central dos debates. Augusta Ferraz, com 51 anos de dedicação ao teatro recifense, lamenta a situação de equipamentos como o Teatro Barreto Júnior, considerado um “subteatro” na vida cotidiana dos profissionais, e espaços fechados como o Teatro Valdemar de Oliveira (fechado desde 2020 e atingido por incêndio em fevereiro de 2024).

Inês Franco Maia questionou se a cadeia produtiva do teatro em Recife realmente valoriza a cultura local, criticando a tendência de valorizar mais os trabalhos externos: “O Magiluth só conseguiu reconhecimento local após ser legitimado fora de Recife.”

Durante a avaliação, emergiram diversas propostas para fortalecer o festival e a cena teatral local: planejamento antecipado das contratações técnicas e logísticas, melhor distribuição de horários para evitar sobreposições entre espetáculos, parcerias estratégicas com secretarias de Saúde, Educação e Cidadania para formar novos públicos, expansão do “Palco da Aurora” (onde Sinapse Darwin, da Casa de Zoé foi apresentado) para outras áreas da cidade, criação de espaços de encontro e diálogo após os espetáculos e revitalização do Teatro do Sítio da Trindade.

Diante deste cenário complexo, que mistura conquistas artísticas com desafios estruturais e de gestão, a escuta pública de terça-feira representa uma oportunidade crucial para que a classe teatral recifense contribua efetivamente com a construção coletiva da próxima edição do festival.

Milu Megale, secretária de Cultura do Recife, André Brasileiro, coordenador do FRTN, e Alexandre Sampaio, coordenador de produção, estarão presentes para ouvir as demandas e propostas da categoria. A 24ª edição está marcada para 19 a 30 de novembro de 2025.

Serviço

Escuta pública do Festival Recife do Teatro Nacional
Quando: Terça-feira (29/07), às 18h30
Onde: Sala da Banda Sinfônica – Teatro do Parque
Entrada: Gratuita

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Festival Reside Amaro
Uma experiência artística inovadora no Recife

Vizinhos no bairro de Santo Amaro participam de ações artísticas. Foto: Rogério Alves

O Festival Reside Amaro, que ocorre nestes dias 7, 8 e 9 de fevereiro de 2025, é mais que um evento no calendário cultural do Recife; é um manifesto vivo, uma declaração ousada sobre o potencial transformador da arte quando esta pulsa organicamente com o tecido social de uma comunidade.

Paula de Renor, uma produtora cultural com uma visão ousada, sempre sonhou em realizar um festival teatral inovador, diferente dos modelos tradicionais. A inspiração que faltava surgiu quando ela conheceu o trabalho do Teatro Bombón e o conceito de “teatro vecinal” (teatro de vizinhança) da artista argentina Monina Bonelli. Com essa nova perspectiva, Paula uniu forças com Bonelli e o curador Celso Curi para dar vida ao Reside Amaro, um projeto que leva o teatro para o coração do bairro de Santo Amaro, no Recife. Essa proposta única transforma a comunidade no centro pulsante da experiência teatral, promovendo uma colaboração íntima entre artistas e moradores locais para criar performances autênticas e envolventes.

A escolha de Santo Amaro como palco para esta experiência não foi aleatória. O bairro, com sua rica vivência histórica e cultural, serve como um microcosmo perfeito do Recife e, por extensão, do Brasil urbano contemporâneo.

“Santo Amaro é um paradoxo vivo,” aponta Roger de Renor, produtor e ativista cultural e vizinho inspirador. Neste território, casarões coloniais expõem a luta pelo espaço urbano com prédios altíssimos. Comunidades de pescadores, cujas tradições remontam a séculos, convivem lado a lado com startups de tecnologia de ponta.

Esta complexidade sociocultural de Santo Amaro serve como um terreno fértil para o tipo de narrativas plurais que o Reside Amaro busca explorar.

Monina Bonelli_Paula de Renor_Celso Curi._Foto Rogério Alves

O Reside Amaro destaca-se por sua natureza site-specific, onde cada apresentação é cuidadosamente elaborada para se integrar e dialogar com o ambiente específico em que ocorre. Esta técnica transforma espaços cotidianos – desde casas particulares até bares locais – em cenários teatrais singulares, criando uma experiência imersiva tanto para os artistas quanto para o público.

O aspecto comunitário do festival é igualmente central. Ao envolver ativamente os moradores de Santo Amaro no processo criativo, o Reside Amaro opera essa via de mão dupla: traz o teatro para a comunidade, mas também traz a comunidade para o teatro. Esta abordagem resulta em performances que são autênticas reflexões das histórias, culturas e experiências locais.

A maioria das performances é criação original, desenvolvida especificamente para o festival. Outra característica marcante do Reside Amaro é seu caráter processual. Muitas das ações e performances começaram a ser desenvolvidas apenas nas últimas semanas antes do festival. Este curto período de gestação confere às apresentações um frescor e uma espontaneidade raramente vistos em produções teatrais tradicionais. 

“É fascinante ver como as técnicas de teatro comunitário desenvolvidas em Buenos Aires se adaptam e ganham novos significados no contexto de Recife”, observa Monina Bonelli. “Há um diálogo intercultural acontecendo aqui que é verdadeiramente enriquecedor”.

Espetáculos internacionais Rainha, com Maiamar Abrodos e Da Melhor Maneira com Federico Liss e David Rubinstein. Foto: Divulgação

O festival apresenta duas peças argentinas em espanhol com legendas em português. Rainha (Reina en el Gondo), dirigida e escrita por Natalia Villamil e estrelada por Maiamar Abrodos, retrata a vida de uma mulher transgênero idosa no Gondolín, um hotel-refúgio em Buenos Aires, explorando suas memórias e reflexões sobre identidade. Já Da Melhor Maneira (De la mejor manera) é uma obra de Jorge Eiro, Federico Liss e David Rubinstein, dirigida por Eiro e atuada por Liss e Rubinstein. Esta peça acompanha dois irmãos que retornam ao bar da família durante o velório do pai, enfrentando o vazio deixado por sua perda e o desafio de seguir em frente diante de um “abismo silencioso”.

Além das performances, o Reside Amaro tem um forte componente educacional. Alunos do Curso de Interpretação para Teatro do Sesc Santo Amaro estão ativamente envolvidos em todas as etapas do festival, desde a concepção até a execução. Esta iniciativa aprimora o aprendizado dos estudantes, contribuindo para a formação de uma nova geração de artistas.

Com mais de 70 apresentações distribuídas ao longo de três dias, o festival oferece uma programação diversificada e acessível. Todas as apresentações são gratuitas, com ingressos distribuídos uma hora antes de cada sessão. O evento também prioriza a acessibilidade, oferecendo tradução em Libras para várias performances e garantindo que os espaços sejam acessíveis para pessoas com deficiência.

PROGRAMAÇÃO

CASA 1 (Rua Capitão Lima) CENTRAL DE INFORMAÇÕES

Casa 2 Rua (Rua Capitão Lima) LENE CONVIDA
Performance participativa onde Lene estreia um programa de entrevistas intimista. Recebe personalidades para conversas sinceras e inspiradoras sobre Pernambuco.
Dramaturgia/Direção: Giordano Castro, Mateus Condé.
Atuação: Lene Maria.
07/02: 19h30-22h, 08-09/02: 18h30-21h30. Fluxo contínuo.

Casa 3 (Rua Capitão Lima) COMUNHÃO MUSICAL
Espetáculo musical que une diferentes gerações e histórias de vida. Performances de um padre, uma cozinheira e um cantor profissional.
Direção musical: Douglas Duan.
Vozes: Padre Caetano, Alê Maria, Carlinhos Monteverde.
07/02: 19h, 08-09/02: 18h.

Casa 4 (Rua da Piedade) ÁLBUM DOS VIZINHOS
Projeção de retratos que capturam a essência dos moradores da vila. Transformação de memórias em arte, reforçando laços comunitários.
Fotos: Rogério Alves. Coordenação: Ingredy Barbosa.
07/02: 19h30-22h, 08-09/02: 18h30-21h. Fluxo contínuo.

Casa 5 (Rua Capitão Lima) SOM NA RURAL
Festa itinerante que transforma as ruas em palco de celebração. Picadeiro sonoro que constrói novas histórias e memórias.
comunicação: Roger de Renor. DJ: Dj Vibra.
07/02: 22h-23h.

Casa 6 (Travessa do Ferreira) HEY, HEY, HEY! ROBERTO É O NOSSO REI!
Karaokê em homenagem a Roberto Carlos, realizando o sonho de João Paulo. Inclui mural no Beco do Roberto, multiplicando a presença do Rei.
Artista vizinho: João Paulo Silva. Artista ativador: Douglas Duan.
07/02: 20h-22h, 08-09/02: 19h-21h30. Fluxo contínuo.

Casa 7 (Rua da Piedade) ALTA VIGILÂNCIA
Instalação dramatúrgica que explora a cultura da fofoca em Pernambuco. Narradoras compartilham histórias bisbilhotadas na rua Piedade.
Dramaturgia: Newton Moreno. Narradoras: Amanda Menelau, Márcia Luz.
07/02: 20h-22h, 08-09/02: 19h-21h30.

Casa 8 (Rua da Piedade) CASINHA DE ROGÊ
Instalação/performance que convida à intimidade da casa de Roger de Renor. Reflexões sobre cidades horizontais, utopias e memória. Performance: Roger de Renor.
Duração: 30min.
Capacidade: 20 pessoas/sessão.
07/02: 20h e 21h, 08-09/02: 19h e 20h.

Casa 9 (Rua da Piedade) INDO PARA LÁ
Performance documental sobre uma travessia imaginária de barco. Explora conversas, histórias e imagens que permanecem na memória. Direção: Quiercles Santana. Atuação: Clau Barros, Dorgival Fraga. Duração: 30min. Capacidade: 20 pessoas/sessão. 07/02: 20h e 21h, 08-09/02: 19h e 20h.

Casa 10 (Rua da Piedade) PRONTA PRA GUERRA; PULANDO FOGUEIRAS E DECORANDO O TEXTO COM FUXICOS
Performance inspirada na vida de Joana d’Arc e Ivete Alves de Mesquita. Explora a luta pela existência através de costura, fuxicos e memórias.
Dramaturgia/Encenação: Anderson Leite.
Atuação: Augusta Ferraz.
Duração: 30min.
Capacidade: 20 pessoas/sessão. 07/02: 20h30 e 21h30, 08-09/02: 19h30 e 20h30.

Casa 11 (Rua da Piedade) NO FRIGIR DOS OVOS TUDO TEM SOM
Performance documental que explora os sons e aromas da cozinha. Inspirada na vida de Geraldo Maximiano de Lima, o Rei do Omelete.
Direção: Quiercles Santana. Atuação: Djalma Albuquerque, Anne Andrade, Lua Alves.
Duração: 30min.
Capacidade: 20 pessoas/sessão.
07/02: 20h30 e 21h30, 08-09/02: 19h30 e 20h30.

Casa 12 (Rua Capitão Lima) SABOR DO DESTINO
Audioguia e experiência sensorial baseada na vida de Detinha. Percurso sonoro guiado pelos sabores, com participantes de olhos vendados.
Dramaturgia/Direção: Júnior Sampaio.
Narração: Fabiana Pirro.
Duração: 30min.
Capacidade: 20 pessoas/sessão.
07/02: 20h e 21h, 08-09/02: 19h e 20h.

Casa 13 ((Rua Capitão Lima) RITO DE PASSAGEM
Performance em movimento conduzida por HBlynda até a casa de Reina. Compartilha desafios enfrentados na jornada de reafirmação de identidade.
Criação/Performance: HBlynda Morais.
Duração: 30min.
Capacidade: 30 pessoas/sessão.
08-09/02: 19h.

Casa 14 (Rua Capitão Lima) AMARO
Exibição do curta-metragem desenvolvido durante a residência do festival. Retrata um dia na vida de Amaro, homem emocionalmente contido.
Roteiro/Direção: Diogo Cabral.
09/02: 19h-21h. Fluxo contínuo.

Casa 15 (Rua Capitão Lima) RECEITA PARA CONTAR HISTÓRIAS
Performance documental sobre histórias familiares e receitas. Mistura memórias do Maranhão a Pernambuco através do doce de banana.
Dramaturgia/Direção: João Pedro Pinheiro, Larissa Pinheiro. Com: Lannje Falcão, Aurian Falcão.
Duração: 30min.
Capacidade: 20 pessoas/sessão.
07/02: 20h30 e 21h30, 08-09/02: 19h30 e 20h30.

Casa 16 (Rua Capitão Lima, 410) UMA DOR MENOR
Teatro documental sobre impasses de um enterro familiar. Explora o conflito entre luto pessoal e cerimônia pública de um político.
Dramaturgia/Atuação: Ivana Moura.
Direção: Luiz Felipe Botelho.
Duração: 30min.
Capacidade: 20 pessoas/sessão.
07/02: 20h30 e 21h30, 08-09/02: 19h e 20h30.

Casa 17 (Rua Capitão Lima, 408) RAINHA
Peça argentina sobre a vida de uma mulher transgênero idosa. Explora memórias e reflexões sobre identidade no hotel Gondolín.
Dramaturgia/Direção: Natalia Villamil. Atuação: Maiamar Abrodos.
Duração: 60min.
Capacidade: 30 pessoas/sessão.
08-09/02: 19h30.

Casa 18 (Rua Capitão Lima – auditório da TV Jornal) NOS BASTIDORES DOS PROGRAMAS DE AUDITÓRIO: CONHEÇA A HISTÓRIA DA TV JORNAL
Vídeo que relembra 65 anos da TV Jornal pernambucana. Destaca programas de auditório e participações importantes.
Criação/Produção: TV Jornal.
Duração: 5min. Capacidade: 20 pessoas/sessão.
07/02: 19h, 19h15, 19h30 e 19h45.

Casa 19 (Rua Capitão Lima) CASAR, PARA QUE?
Quadrilha que desafia superstições sobre casamento. Celebra o casamento de dona Neta e Luiz com pompa e circunstância.
Direção/Coreografia: Mônica Lira. Casal: Erivonete Barbosa, Luiz Elias.
08/02: 21h30-23h.

Casa 20 (Rua Capitão Lima – na rua) BOI MARINHO
Cortejo que mistura tradições populares, com destaque para o Cavalo Marinho. Ativação com alunos da Escola Sylvio Rabello e vizinhos.
Mestre/Direção: Helder Vasconcelos. Contra mestra: Laura Tamiana.
09/02: 18h-18h40.

Casa 21 (Rua Capitão Lima – Restaurante Casa Capitão) DA MELHOR MANEIRA
Peça argentina sobre dois irmãos lidando com a perda do pai. Explora o luto e o desafio de seguir em frente após uma perda.
Dramaturgia: Jorge Eiro, Federico Liss, David Rubinstein. Direção: Jorge Eiro.
Duração: 60min.
Capacidade: 30 pessoas/sessão.
08-09/02: 20h.

FICHA TÉCNICA

Idealização
Monina Bonelli

Criação
Monina Bonelli e Celso Curi

Artista criador convidado
Quiercles Santana

Curadores
Paula de Renor e Celso Curi

Vizinho inspirador
Roger de Renor

Vizinha embaixadora
Ingredy Barbosa

Assistente de criação
Márcio Allan

Artistas convidados
Álefe Passarin, Amanda Menelau, Anderson Leite, Augusta Ferraz, Bailarinos da Quadrilha Evolução (Damas – Giovanna Seabra Paiva Carneiro, ⁠Hellen Cavalcante, Perollah Hair, Rayssa Gomes de Vasconcelos, Thadgya Dos Santos Silva e Thais Maely Sidronio. Cavalheiros – Adones Vasconcelos, Aleson Willam Souza, Anthony Matheus de Aquino, Lourival Rodrigues, Rodrigo de Oliveira e ⁠Wladiel Queiroz), Boris Trindade Júnior (palhaço Tapioca), Carlinhos Lua, Carlinhos Monteverde, Carlos Santos, Clau Barros, David Rubinstein, Dj Vibra, Douglas Duan, Fabiana Pirro, Federico Liss, Giordano Castro, HBlynda Morais, Helder Vasconcelos e o Boi Marinho, Ivana Moura, Jeison Wallace, Jerlane Silva (palhaça Bilack), João Pedro Pinheiro, Jorge Eiro, Júlio Brito, Júnior Sampaio, Jurema Fox, Kleber Santana, Larissa Pinheiro, Luiz Felipe Botelho, Maiamar Abrodos, Mônica Lira, Natalia Villamil, Newton Moreno, Pinho Fidelis, Rafael Chamié e Roger de Renor.

Vizinhos artistas
Alê Maria, Alice Barbosa, Aurian Falcão, Dorgival Fraga (Paizinho), Erivonete Barbosa (dona Neta), Everton de Holanda Júnior, Geraldo Maximiano de Lima (Rei do Omelete), Ivete Alves de Mesquita, Joana d’Arc Dantas Mesquita, João Paulo Silva, Lannje Falcão, Lene Maria, Ligia Vieira, Luiz Elias, Maria José (dona Detinha), Maria Laura (Laurinha), Padre Caetano e Thiago Santos.

Artistas Residentes
Alunos do CIT / Sesc Santo Amaro – Anne Andrade, Bibi Santos, Caví Baso, Diogo Cabral, Djalma Albuquerque, Fanny França, Lua Alves, Márcio Allan e Mateus Condé.

Beco do Roberto
Produção: Arte da Imagem Produções
Apoio: Gabinete de Inovação Urbana

Fotos álbum dos vizinhos
Rogério Alves

Fotos registro
Gianny Melo

Fotos e vídeos making of
Ivo Barreto e Wesley Kawaai

Comunicação comunitária
Djalma Albuquerque

Designer
Clara Negreiros

Assessoria de imprensa
Márcio Bastos

Gestão de redes sociais
Cognos Comunicação – Luiza Maia e Tiago Barbosa

WebDesigner / Front-End
Sandro Araújo (SandroWeb)

Acessibilidade comunicacional
CENTRAE

Coordenador de produção
Ivo Barreto

Produção
Remo Produções Artísticas
Paula de Renor e Wesley Kawaai

Assistente de produção
Elias Vilar

Coordenador técnico
Eron Villar

Assistente técnico
Caví Baso

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