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Resistência cultural e inovação em diversos espaços

Agrinez Melo em Histórias Bordadas em Mim

Uma programação diversificada abrange desde comédias autorais até espetáculos que resgatam a ancestralidade afro-brasileira. Entre os destaques, duas produções pernambucanas chamam especial atenção: Histórias Bordadas em Mim, pela sua trajetória de resistência e celebração da cultura negra, e Ayiti, a montanha que assombra o mundo, que marca os 30 anos de carreira de Marconi Bispo com um mergulho inédito na Revolução Haitiana.

Após nove anos de trajetória independente, o espetáculo solo Histórias Bordadas em Mim, da atriz pernambucana Agrinez Melo, reestreia no Espaço O Poste nos dias 10 e 11 de outubro, às 19h, marcando um importante momento de reconhecimento para a produção artística local.

A peça, que já percorreu mais de 50 apresentações entre Pernambuco, Ceará e São Paulo, chegando a um público de mais de 6 mil pessoas, agora conquista pela primeira vez o incentivo público através do edital Funcultura. 

Histórias Bordadas em Mim” é mais que um espetáculo teatral – é um ritual de acolhimento que se inicia com um banho de ervas oferecido ao público. A protagonista, coberta por retalhos e saias, marca os pontos riscados das encruzilhadas entre histórias reais e imaginárias, proporcionando um resgate orgânico da fé e da possibilidade de ressignificar experiências vividas.

A encenação baseia-se na Poética Matricial dos Orixás e Encantados, explorando narrativas teatrais que posicionam uma mulher negra, mãe, candomblecista e nordestina no centro da cena. As referências incluem a oralidade africana ancestral, os ensinamentos de sua mãe costureira e avós benzedeiras, além das trocas com terreiros de matriz afro-indígena.

Em Ayiti, Marconi Bispo celebra 30 anos de arte com peça sobre revolução haitiana. Foto: Arthur Canavarro 

Em um marco histórico para o teatro pernambucano, Marconi Bispo apresenta no dia 14 de outubro, às 20h, no Teatro Hermilo Borba Filho, o espetáculo Ayiti, a montanha que assombra o mundo – a primeira produção em Pernambuco dedicada exclusivamente à Revolução Haitiana.

O espetáculo, que marca os 30 anos de carreira do artista, representa um mergulho profundo nas conexões históricas entre o Haiti e as insurgências pernambucanas, questionando por que sabemos tão pouco sobre a revolução que fundou a primeira nação negra de ex-escravizados a derrotar o invasor europeu e abolir a escravidão.

Ayiti une história, performance, percussão, poesia e dança em uma experiência cênica única, com dramaturgia assinada por Marconi Bispo e Kamai Freire. A apresentação conta com a participação de artistas locais como Thulio Xambá e Beto Xambá (musicistas do Grupo Bongar), Brunna Martins e Kadydja Erlen (atrizes), criando uma ponte entre a resistência haitiana e a cultura afro-pernambucana.

FETEAG: 34ª Edição Propõe Diálogos entre Arte e Urgências Sociais

Germaine Acogny encerra programação do Feteag com Un endroit du début

O Festival de Teatro do Agreste (FETEAG), dirigido por Fabio Pascoal, estabelece em sua 34ª edição diálogos diretos entre criação artística contemporânea e as urgências sociais do nosso tempo. Entre 9 e 26 de outubro, o evento reúne 21 espetáculos nacionais e internacionais, todos com entrada gratuita, em teatros de Caruaru e Recife.

À mon seul désir, de Gaëlle Bourges (França), abre o festival nos dias 9 e 10 de outubro no Teatro Luiz Mendonça. A coreógrafa francesa parte da tapeçaria medieval A Dama e o Unicórnio para reavaliar construções históricas sobre feminilidade, examinando como a cultura europeia associou mulheres ao mundo vegetal e animal, perpetuando ideais de virgindade através de imagens aparentemente poéticas.

A investigação coreográfica expõe violências simbólicas embutidas nessas representações românticas, utilizando movimento e voz para evidenciar como tapeçarias medievais funcionavam como dispositivos de controle sobre corpos femininos, conectando-se com debates contemporâneos sobre representação e autonomia.

Les Sans (Os Sem), do coletivo Les Récréâtrales-ELAN de Burkina Faso, investiga a questão dos sem-teto e excluídos sociais através de linguagem que combina tradições orais africanas com teatro político contemporâneo. A obra adapta o pensamento de Frantz Fanon para o teatro através do reencontro de dois ex-companheiros de luta, interrogando se a libertação formal constitui verdadeira descolonização.

L’Opéra du villageois, da Compagnie Zora Snake de Camarões, manifesta resistência através de performance-ritual que ressuscita a potência das máscaras africanas roubadas pelos museus europeus, questionando a pilhagem cultural colonial através de rituais com ouro e sal.

Germaine Acogny, lenda da dança contemporânea nascida no Senegal em 1944, encerra o festival no Teatro Santa Isabel com Un endroit du début. Aos 81 anos, ela segue ativa como pesquisadora corporal, tendo fundado a primeira escola de dança contemporânea da África Ocidental em 1977 e desenvolvido técnica própria que combina danças tradicionais africanas com metodologias ocidentais.

A apresentação de La Cocina Pública, do grupo chileno Teatro Container, no Assentamento Normandia em Caruaru estabelece uma das escolhas mais incisivas da curadoria. O espetáculo transforma o preparo coletivo de uma refeição em ritual de reflexão sobre direitos básicos, ganhando ressonâncias particulares sobre soberania alimentar em território conquistado pelo MST.

Édipo REC, do Grupo Magiluth (PE), com direção de Luiz Fernando Marques e dramaturgia de Giordano Castro, constrói releitura não-linear da tragédia sofocliana onde Tebas se transforma no Recife fantasmagórico. O Corifeu é representado pela câmera, espelhando a produção excessiva de imagens das redes sociais e câmeras de segurança.

Neva, montagem de Marianne Consentino (PE), ambienta-se no Domingo Sangrento de 1905 em São Petersburgo, friccionando arte e política através de três atores refugiados em teatro durante massacre nas ruas. A peça de Guillermo Calderón questiona a serventia do teatro através de Olga Knipper, viúva de Tchekhov.

Fábulas de nossas fúrias (Coletivo Atores à Deriva, RN) articula contação de histórias com afirmação política da raiva como elemento transformador, inspirando-se em Paulo Freire para questionar hierarquias conservadoras através de narrativas que invertem lógicas de poder.

Dancemos… que o mundo se acaba!, da BiNeural-MonoKultur (Argentina), propõe áudio-obra interativa que transforma público em dançarinos, questionando coreomanias e epidemias de dança através de jogo que reflete sobre sedução, pandemia e medo de dançar sozinho.

Sonho de uma noite de verão, da Trupe Ave Lola (PR), revisita Shakespeare através de encenação popular com tradução de Bárbara Heliodora, reunindo nove artistas em cena com música original executada ao vivo, criando atmosfera festiva que convida o público a testemunhar momentos de paixão, magia e loucura.

As criações francófonas constroem considerações convergentes sobre precariedade através de perspectivas diversificadas. Le Quai de Ouistreham, da Compagnie la Résolue (França), adapta investigação jornalística sobre mulheres que trabalham em empregos precários e invisíveis, especialmente na limpeza, vivendo à sombra da crise econômica.

La Vérité vaincra / A Verdade Vencerá, da Cie KastôrAgile (França), desenvolve palestra-performance baseada no livro homônimo de Luiz Inácio Lula da Silva, adaptando entrevistas concedidas à editora Ivana Jinkings em janeiro de 2018, transformando documento político em teatro de resistência.

Barbixas e a arte da improvisação

Barbixas: trio formado por Anderson Bizzochi, Daniel Nascimento e Elidio Sanna,

No fim de semana dos dias 11 e 12 de outubro, o Teatro RioMar recebe Improvável, espetáculo de improvisação teatral da Cia Barbixas. O trio formado por Anderson Bizzochi, Daniel Nascimento e Elidio Sanna, com mais de duas décadas de parceria artística, cria cenas inteiramente a partir de sugestões da plateia.

A companhia, que sacudiu o teatro de improviso no Brasil, trabalha com diferentes formatos cênicos incluindo musicais, westerns, novelas e até óperas, sempre mantendo o humor inteligente e a interação constante com o público. Cada apresentação é única, pois depende inteiramente da criatividade coletiva entre artistas e espectadores. No sábado (11), há duas sessões às 18h30 e 21h, enquanto domingo (12) apresenta sessão única às 20h.

Ópera com sotaque regional: La Serva Padrona

 La Serva Padrona: ópera italiana com humor

O Teatro Hermilo Borba Filho recebe, de 8 a 11 de outubro, às 19h30, uma montagem especial da ópera cômica La Serva Padrona, de G. B. Pergolesi. Esta versão recifense é resultado de um trabalho criativo audacioso que ressignifica a obra setecentista italiana através de elementos nordestinos, como expressões vocais.

A direção cênica de Luiz Kleber Queiroz e a direção musical da maestrina Maria Aida Barroso criaram uma proposta que mantém a estrutura musical original – com as árias preservadas em italiano – enquanto transpõe os recitativos para o português carregado de regionalismo pernambucano. Esta escolha artística permite que o público local se conecte diretamente com a narrativa sem perder a essência operística da obra.

A produção de Matheus Soares (25 Produções) inova na cenografia e figurinos, incorporando elementos como algodão cru, cestos de palha, tapioca e o icônico chapéu de vaqueiro. O elenco se alterna entre diferentes solistas, acompanhado por um sexteto de câmara que executa a partitura original de Pergolesi, criando um diálogo entre a tradição operística europeia e a cultura popular nordestina.

A trama cômica, baseada na Commedia dell’arte, acompanha as estratégias da esperta criada Serpina para conquistar seu patrão Uberto, numa comédia de costumes que ganha novos contornos quando ambientada no universo cultural pernambucano.

Duas Conversas com Ítalo Sena 

No dia 14 de outubro, às 20h, o Teatro Luiz Mendonça recebe Duas Conversas, o mais recente trabalho de Ítalo Sena, conhecido nacionalmente como o “rei das pegadinhas”. Após o sucesso de Mostrando Meu Trabalho, que percorreu o Brasil, o humorista retorna com uma proposta renovada, resultado de nove meses de intensa preparação artística e física.

Duas Conversas mostra um mergulho nos dois lados da vida artística de Ítalo Sena, explorando aspectos nunca antes revelados ao público. O espetáculo conta com texto desenvolvido pelo próprio humorista, em colaboração criativa com Maurício Meireles.

O destaque fica por conta do cenário digital interativo, que busca surpreender a plateia com elementos tecnológicos integrados à narrativa. A preparação artística de Diógenes De Lima, a produção de Laura Ithamar, a iluminação de Jathyles Miranda e as artes para o cenário virtual assinadas pelo VJ Koala Brito buscam elevar produção a um patamar técnico diferenciado.

Traidor: Marco Nanini e Gerald Thomas revisitam parceria histórica

Nanini em Traidor. Foto: Annelize Tozetto

Traidor, com Marco Nanini sob direção de Gerald Thomas, ocupa o Teatro Luiz Mendonça entre 17 e 19 de outubro. O espetáculo reflete as transformações profundas que o mundo sofreu desde o começo do século: o trauma pós-pandêmico, a revolução digital que substitui o real pelo virtual, e as rupturas democráticas que marcam o cenário político global. Gerald Thomas criou o texto sob influência deste “caldeirão contemporâneo”.

Em Traidor, Marco Nanini está isolado em uma ilha, acusado de algo que não cometeu, dialogando com a própria consciência, seus fantasmas e reflexões sobre passado, presente e futuro. Estes elementos são materializados no elenco formado por Hugo Lobo, Ricardo Oliveira e Wallace Lau. A ação transcorre como se toda a narrativa se passasse dentro da mente do protagonista.

Gerald Thomas define a obra como “um cruzamento entre Kafka e Shakespeare, uma espécie de híbrido entre o Joseph K, de O Processo, e Próspero, de A Tempestade, cuja mente renascentista olha para o futuro da civilização, perdoa seus detratores e os absolve”.

A equipe técnica reúne iluminação de Wagner Pinto, cenografia de Fernando Passetti, figurinos de Antonio Guedes, direção musical e trilha sonora de Alê Martins, direção de movimento de Dani Lima e assistência de direção de Samuel Kavalerskid.

Drama e intensidade: As Bruxas de Salem e Imorais

As Bruxas de Salem na montagem da Cobogó das Artes, com produção executiva de Adriano Portela

Imorais do Bando de Nada – Grupo de Teatro, com texto de Cristiano Primo e direção de Emmanuel Matheus

A terceira semana de outubro (15 e 16) traz duas montagens teatrais de forte apelo dramático. No Teatro Apolo, As Bruxas de Salem apresenta adaptação livre da obra clássica de Arthur Miller, dirigida por Anthony Delarte. A montagem da Cobogó das Artes, com produção executiva de Adriano Portela, ambienta a trama numa pequena vila puritana onde fé e medo se confundem, questionando verdade, manipulação e a coragem necessária para questionar autoridades.

Simultaneamente, o Teatro Hermilo Borba Filho recebe Imorais do Bando de Nada – Grupo de Teatro. O texto de Cristiano Primo, com adaptação e direção de Emmanuel Matheus e produção da Lynda Produções, propõe uma experiência cênica intensa sobre uma família e suas relações complexas. O elenco formado por Aline Santos, Cristiano Primo, Lynda Morais, Felipe Nunes e Tarcila Nunes conduz a narrativa que questiona se sempre temos direito à escolha, em espetáculo classificado para maiores de 18 anos.

Grupo Corpo: Cinco Décadas de Dança Brasileira

Grupo Corpo celebra 50 anos com turnê pelo Brasil

Nos dias 17 e 18 de outubro, o Teatro Santa Isabel recebe o Grupo Corpo de Belo Horizonte em apresentações gratuitas que celebram os 50 anos da companhia. A programação inclui dois espetáculos distintos que demonstram a evolução artística ao longo de cinco décadas desde a fundação em 1975.

Parabelo, coreografia clássica de 1997 de Rodrigo Pederneiras, com música de Tom Zé e Zé Miguel Wisnik, celebra aspectos da vida sertaneja. Já Piracema representa a constante renovação do repertório através de novas parcerias criativas. A criação tem parceria coreográfica entre Rodrigo Pederneiras e Cassi Abranches, com trilha inédita de Clarice Assad que transita do tribal ao eletrônico. A cenografia de Paulo Pederneiras utiliza 82 mil tampas de latas de sardinha para evocar escamas de cardumes, inspirando-se na jornada dos peixes que enfrentam a correnteza para desovar.

Teatro de Rua: Ilha: Dois leva urgência climática para o centro da Cidade

Grupo Bote de Teatro faz apresentações na Praça do Sebo

O Bote de Teatro, em parceria com a Cia. Toda Deseo de Minas Gerais, leva às ruas do centro do Recife uma provocação urgente sobre a crise climática. Nos dias 18 e 19 de outubro, às 19h, a Praça do Sebo se transforma em palco para Ilha: Dois, espetáculo gratuito que confronta a cidade com uma realidade alarmante.

A escolha do espaço urbano não é casual: tratando-se de uma cidade considerada geograficamente uma ilha e que, segundo relatórios da ONU, figura entre as mais vulneráveis ao aumento do nível do mar – ocupando a 16ª posição entre as cidades que podem desaparecer -, a montagem busca provocar reflexões diretas com a população sobre as mudanças climáticas.

Sob direção de Rafael Bacelar, reconhecido nacionalmente e indicado a diversos prêmios, e dramaturgia de David Maurity, o espetáculo mescla poesia, crítica social e resistência. A cantora e atriz Nega do Babado enriquece a trama com intervenções musicais, criando uma linguagem híbrida que dialoga diretamente com o público.

A montagem integra o projeto colaborativo Cidade Líquida e garante acessibilidade completa, oferecendo tradução em Libras e transporte acessível através do programa PE Conduz.

Instituto Ploeg: Encontro Radical entre Clássicos do Teatro

O Instituto Ploeg propõe no dia 11 de outubro um encontro singular entre dois retratos radicais do desejo e da ferida humana através de leituras dramáticas. O ATO apresenta Navalha na Carne, de Plínio Marcos, e Closer, de Patrick Marber, duas obras de tempos e contextos distintos, mas unidas pela mesma intensidade na busca por contato humano, mesmo quando ele causa dor.

Navalha na Carne, clássico do teatro brasileiro escrito em 1967 e censurado à época, encena a tensão brutal entre três personagens à margem da sociedade, num embate visceral de poder, corpo e sobrevivência. A obra continua ecoando como um grito urgente e contemporâneo.

Closer, conhecida pela adaptação cinematográfica de 2004, foi originalmente uma peça de enorme sucesso no teatro britânico. Com diálogos afiados, a obra revela o jogo de sedução e crueldade que sustenta as relações amorosas contemporâneas.

Sonho Encantado de Cordel: Fusão entre Nordeste e Contos de Fadas

Sonho Encantado de Cordel – O Musical

No último fim de semana do mês (25 e 26 de outubro), o Teatro Luiz Mendonça encerra a programação de outubro com Sonho Encantado de Cordel – O Musical. A produção de Thereza Falcão cria uma mistura entre a cultura nordestina e os contos de fadas de Hans Christian Andersen, resultando numa celebração da arte, poesia e poder dos sonhos.

O espetáculo conta com cenários e figurinos assinados por Rosa Magalhães e Mauro Leite, que dialogam com projeções de Batman Zavareze e coreografias de Renato Vieira, visando um universo visual que junte tradição popular e fantasia universal.

A trilha sonora é um dos grandes destaques da produção, contando com 10 músicas inéditas compostas especialmente para o espetáculo por três grandes nomes da MPB: Paulinho Moska, Chico César e Zeca Baleiro, sob direção musical de Marcelo Alonso Neves. Esta colaboração musical promete criar uma linguagem sonora que honra tanto as raízes nordestinas quanto a universalidade dos contos de fadas.

As apresentações acontecem no sábado (25) às 17h e no domingo (26) com duas sessões, às 15h e 17h, permitindo que diferentes públicos tenham acesso a esta produção especial.

CAIXA Cultural: Frankenstein em Dose Dupla

Frankenstein do Grupo Gompa, do Rio Grande do Sul

A CAIXA Cultural Recife apresenta entre 25 de outubro e 1º de novembro uma temporada especial do premiado Coletivo Gompa, do Rio Grande do Sul. O grupo apresenta duas montagens inspiradas no clássico de Mary Shelley: Frankenstein (para público adulto) e “Frankinh@ – Uma história em pedacinhos” (infantil).

Frankinh@, vencedor do Prêmio SESC de Artes Cênicas, já circulou por 18 cidades brasileiras e foi apresentado na Rússia e em Cuba. A peça infantil mescla narração, teatro, dança e artes visuais para despertar o imaginário das crianças através da história de Victor Frankenstein, jovem que cria alguém para lhe fazer companhia.

A versão adulta Frankenstein cria paralelos entre o corpo feminino e a Amazônia, explorando questões como pertencimento, violência e identidade com uma narrativa decolonial.

Espaço O Poste: Território de Resistência 

Fabíola Nansurê em Barro Mulher

Stephany Metódio com Luanda Ruanda: Histórias Africanas. Foto tatá costa

Urubatan Miranda com Negaça 

O Espaço O Poste se consolida como um dos principais centros de produções autorais e experimentais do Recife, funcionando como laboratório de criação e plataforma de visibilidade para artistas que desenvolvem pesquisas continuadas sobre identidade, memória e resistência. A programação de outubro reflete essa vocação curatorial, reunindo quatro trabalhos que abordam questões centrais da contemporaneidade através de linguagens cênicas diversificadas.

Além de Histórias Bordadas em Mim, recebe Fabíola Nansurê com Barro Mulher (24 de outubro), Stephany Metódio com Luanda Ruanda: Histórias Africanas (25 de outubro, gratuito) e Urubatan Miranda com Negaça (31 de outubro).

Fabíola Nansurê, reconhecida por suas pesquisas sobre corpo e território, constrói uma dramaturgia sensorial que utiliza barro como elemento cênico central, explorando texturas, plasticidade e simbolismo do material para questionar padrões estéticos e sociais impostos aos corpos femininos. A montagem propõe uma reflexão sobre resistência, autoconhecimento e reconexão com elementos primordiais da natureza.

A encenação dialoga com tradições ceramistas nordestinas e práticas rituais ancestrais, criando pontes entre saberes populares e linguagem cênica contemporânea através de uma experiência imersiva que convida o público a repensar relações entre humanidade e ambiente.

Stephany Metódio apresenta no dia 25 de outubro, às 16h, uma sessão gratuita de Luanda Ruanda: Histórias Africanas, espetáculo que resgata narrativas africanas através de contação de histórias que conecta tradições orais do continente com experiências da diáspora no Brasil.

A artista, especializada em culturas africanas e afro-brasileiras, desenvolve uma dramaturgia que articula contos tradicionais de diferentes regiões da África com reflexões sobre identidade, pertencimento e resistência cultural. Luanda Ruanda utiliza música, dança e elementos visuais para criar atmosfera envolvente que transporta o público para universos narrativos ricos em simbolismo e ensinamentos ancestrais.

A montagem tem particular relevância educativa e cultural, funcionando como instrumento de valorização da herança africana e combate ao racismo através da arte. Stephany Metódio incorpora instrumentos musicais tradicionais, adereços e gestualidade específica para honrar a autenticidade das tradições apresentadas, criando ponte entre continentes e gerações.

O formato de entrada gratuita reforça o compromisso do Espaço O Poste com a democratização cultural e o acesso da comunidade a produções que abordam questões de identidade e representatividade, especialmente relevantes no contexto da educação antirracista.

Urubatan Miranda encerra a programação mensal do espaço no dia 31 de outubro, às 19h, com Negaça, solo que explora construções de masculinidade no contexto nordestino através de autobiografia cênica que articula memória pessoal com questões coletivas sobre identidade de gênero e afetividade.

O artista, reconhecido por trabalhos que abordam questões LGBTQIA+ e regionalismo, desenvolve uma dramaturgia que questiona estereótipos sobre homens nordestinos, explorando sensibilidades, vulnerabilidades e formas de amar que escapam aos padrões heteronormativos dominantes. Negaça utiliza humor, poesia e crítica social para desconstruir imagens cristalizadas sobre masculinidade sertaneja.

A montagem incorpora elementos da cultura popular nordestina – como cordel, música regional e gestualidade característica – para criar linguagem cênica que celebra diversidade sexual e afetiva. Urubatan Miranda propõe um diálogo franco sobre preconceito, aceitação familiar e construção de identidade em contextos conservadores.

Festival de Circo: Novembro Promete

Le Bruit des Pierres do Collectif Maison Courbe da França

O mês de novembro será marcado pelo Festival de Circo do Brasil, que já tem pelo menos três espetáculos confirmados, prometendo dar continuidade à efervescência cultural iniciada em outubro.

Vermelho, Branco e Preto traz Cibele Mateus de São Paulo em solo que mescla riso, poesia e encantamento popular nos dias 5 e 6 de novembro às 19h30 no Teatro Apolo. A artista apresenta a figura cômica “Mateu”, inspirada no tradicional Cavalo-marinho pernambucano, em espetáculo-brincadeira que celebra identidade e ancestralidade.

No dia 6 de novembro, o Teatro Santa Isabel recebe O Vazio é Cheio de Coisa da Cia Nós No Bambu de Brasília. O espetáculo apresenta dança acrobática minimalista que explora a relação entre corpo humano e bambu, criando uma profusão de imagens e significados em dramaturgia poética onde simplicidade e complexidade se encontram.

A programação inclui ainda Le Bruit des Pierres do Collectif Maison Courbe da França, nos dias 8 e 9 de novembro no Teatro Santa Isabel. A criação híbrida combina circo coreográfico e teatro físico, com duas mulheres que encarnam a ganância ocidental pelo ouro através de coreografias realizadas com pedras, questionando a relação entre homem e ambiente.

SERVIÇO COMPLETO

FETEAG À mon seul désir
📅 Datas: 9 e 10 de outubro
📍 Local: Teatro Luiz Mendonça (Av. Boa Viagem, s/n, Boa Viagem)
🎫 Entrada: Gratuita
🎭 Criação: Gaëlle Bourges (França)

La Serva Padrona
📅 Datas: 8, 9, 10 e 11 de outubro
🕘 Horário: 19h30
📍 Local: Teatro Hermilo Borba Filho
🎫 Entrada: Gratuita (ingressos na bilheteria do teatro)
🎭 Direção: Luiz Kleber Queiroz | Direção Musical: Maria Aida Barroso

Histórias Bordadas em Mim
Datas: 10 e 11 de outubro (sexta e sábado)
🕘 Horário: 19h
📍 Local: Espaço O Poste (Rua do Riachuelo, 641, Boa Vista)
🎫 Ingressos: R15(meia)∣R 30 (inteira) | R$ 10 (estudantes UFPE/Escola O Poste)
♿ Acessibilidade: Sessão de 11/10 com Libras e audiodescrição

Leituras Dramáticas – Navalha na Carne e Closer
📅 Data: 11 de outubro (sábado)
🕘 Horários: Abertura às 15h | Navalha na Carne às 16h | Closer às 18h
📍 Local: Instituto Ploeg (Rua de Santa Cruz, 190, Boa Vista)
🎫 Informações: Consultar @institutoploeg

Improvável – Cia Barbixas
📅 Datas: 11 e 12 de outubro (sábado e domingo)
🕘 Horários: Sábado: 18h30 e 21h | Domingo: 20h
📍 Local: Teatro RioMar
🎫 Informações: Consultar bilheteria do teatro

Duas Conversas com Ítalo Sena
📅 Data: 14 de outubro (terça-feira)
🕘 Horário: 20h
📍 Local: Teatro Luiz Mendonça (Av. Boa Viagem, s/n, Boa Viagem)
🎫 Ingressos: R50aR 100
🎭 Colaboração: Maurício Meireles | Cenário Digital: VJ Koala Brito

Ayiti, a montanha que assombra o mundo
📅 Data: 14 de outubro (terça-feira)
🕘 Horário: 20h
📍 Local: Teatro Hermilo Borba Filho
🎫 Ingressos: R$ 25 e R$ 50 (Sympla)

Dancemos… que o mundo se acaba!
Data: 15 de outubro
🕘 Horário: 19h
📍 Local: Estação Ferroviária (Caruaru)
🎫 Entrada: Gratuita
📊 Classificação: Livre
🎭 Cia: BiNeural-MonoKultur (Argentina)

Édipo REC
Data: 15 de outubro
🕘 Horário: 20h
📍 Local: Teatro Lycio Neves (Caruaru)
🎫 Entrada: Gratuita
📊 Classificação: 18 anos
🎭 Grupo: Magiluth (PE)

As Bruxas de Salem
📅 Datas: 15 e 16 de outubro (quarta e quinta-feiras)
📍 Local: Teatro Apolo
🎫 Informações: Consultar bilheteria do teatro
🎭 Direção: Anthony Delarte | Produção: Cobogó das Artes

Imorais
Datas: 15 e 16 de outubro (quarta e quinta-feiras)
📍 Local: Teatro Hermilo Borba Filho
🎫 Informações: Consultar bilheteria do teatro
📊 Classificação: +18 anos | Direção: Emmanuel Matheus

Fábulas de nossas fúrias
📅 Data: 16 de outubro
🕘 Horário: 20h
📍 Local: Teatro Lycio Neves (Caruaru)
🎫 Entrada: Gratuita
📊 Classificação: 16 anos
🎭 Cia: Atores à Deriva (RN)

Neva
📅 Data: 17 de outubro
🕘 Horário: 20h
📍 Local: Teatro Lycio Neves (Caruaru)
🎫 Entrada: Gratuita
📊 Classificação: 16 anos
🎭 Direção: Marianne Consentino (PE)

Grupo Corpo – Parabelo e Piracema
📅 Datas: 17 e 18 de outubro (sexta-feira e sábado)
📍 Local: Teatro Santa Isabel
🎫 Entrada: Gratuita
🎭 Celebração: 50 anos da companhia

Traidor com Marco Nanini
📅 Datas: 17 a 19 de outubro (sexta, sábado e domingo)
🕘 Horários: Sexta e sábado às 20h | Domingo às 19h
📍 Local: Teatro Luiz Mendonça (Av. Boa Viagem, s/n, Boa Viagem)
Ingressos: R100aR 200
🎭 Direção: Gerald Thomas | Elenco: Hugo Lobo, Ricardo Oliveira, Wallace Lau

Sonho de uma noite de verão
📅 Datas: 18 e 19 de outubro
🕘 Horário: 17h
📍 Local: Teatro Rui Limeira Rosal (Caruaru)
🎫 Entrada: Gratuita
📊 Classificação: 12 anos
🎭 Cia: Trupe Ave Lola (PR)

La Cocina Pública
Datas: 18 e 19 de outubro
🕘 Horário: Encontro 16h na Estação Ferroviária
📍 Local: Centro de Formação Paulo Freire (Assentamento Normandia, Caruaru)
🎫 Entrada: Gratuita
📊 Classificação: Livre
🎭 Cia: Teatro Container (Chile)

Ilha: Dois
Datas: 18 e 19 de outubro (sábado e domingo)
🕘 Horário: 19h
📍 Local: Praça do Sebo (Centro do Recife)
🎫 Entrada: Gratuita
♿ Acessibilidade: Tradução em Libras e transporte via PE Conduz

Barro Mulher
📅 Data: 24 de outubro (sexta-feira)
🕘 Horário: 19h
📍 Local: Espaço O Poste (Rua do Riachuelo, 641, Boa Vista)
🎫 Ingressos: R15(meia)∣R 30 (inteira)

Luanda Ruanda: Histórias Africanas
📅 Data: 25 de outubro (sábado)
🕘 Horário: 16h
📍 Local: Espaço O Poste (Rua do Riachuelo, 641, Boa Vista)
🎫 Entrada: Gratuita

Sonho Encantado de Cordel – O Musical
📅 Datas: 25 e 26 de outubro (sábado e domingo)
🕘 Horários: Sábado: 17h | Domingo: 15h e 17h
📍 Local: Teatro Luiz Mendonça (Av. Boa Viagem, s/n, Boa Viagem)
🎫 Informações: Consultar bilheteria do teatro
🎭 Produção: Thereza Falcão | Músicas: Paulinho Moska, Chico César, Zeca Baleiro

Frankinh@ – Uma história em pedacinhos
📅 Datas: 25 e 26 de outubro e 1º de novembro
🕘 Horários: 17h (sábado) | 11h (domingo)
📍 Local: CAIXA Cultural Recife (Av. Alfredo Lisboa, 505, Bairro do Recife)
🎫 Ingressos: R15(meia)∣R 30 (inteira)
♿ Acessibilidade: Sessão de 26/10 com Libras
⏱️ Duração: 50 minutos

Frankenstein
📅 Datas: 30 de outubro a 1º de novembro
📍 Local: CAIXA Cultural Recife (Av. Alfredo Lisboa, 505, Bairro do Recife)
🎫 Ingressos: R15(meia)∣R 30 (inteira)

Negaça
📅 Data: 31 de outubro (sexta-feira)
🕘 Horário: 19h
📍 Local: Espaço O Poste (Rua do Riachuelo, 641, Boa Vista)
🎫 Ingressos: R15(meia)∣R 30 (inteira)

FESTIVAL DE CIRCO (Novembro)
Vermelho, Branco e Preto
📅 Datas: 5 e 6 de novembro
🕘 Horário: 19h30
📍 Local: Teatro Apolo
🎭 Artista: Cibele Mateus (SP)

O Vazio é Cheio de Coisa
Data: 6 de novembro
📍 Local: Teatro Santa Isabel
🎭 Cia: Nós No Bambu (Brasília)

Le Bruit des Pierres
📅 Datas: 8 e 9 de novembro
📍 Local: Teatro Santa Isabel
🎭 Cia: Collectif Maison Courbe (França)

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Escuta pública para discutir
o Festival Recife do Teatro Nacional

 

Sinapse Darwin, da Casa de Zoé, esteve na programação do 23º FRTN. Foto: Marcos Pastich/PCR

Evento acontece terça-feira (29), às 18h30, no Teatro do Parque

A Secretaria de Cultura do Recife convocou uma escuta pública para construir coletivamente a 24ª edição do Festival Recife do Teatro Nacional (FRTN), que acontecerá em novembro. Na próxima terça-feira (29/07), às 18h30, artistas, produtores e demais profissionais da cena teatral recifense são chamados para se reunir na sala da Banda Sinfônica do Teatro do Parque para contribuir com a programação do festival.

“O Festival Recife do Teatro Nacional sobe aos palcos da cidade em novembro. Mas, nos bastidores, a programação já começou. E todos os cênicos da cidade estão convidados a se engajar na produção da próxima edição do festival”, destaca a convocatória oficial.

A iniciativa busca que o festival consiga “apresentar e representar esperanças e necessidades da eloquente cena recifense”, mas enfrenta um desafio que tem se repetido: a baixa participação da classe artística nestes momentos de construção coletiva.

Embora seja comum ouvir reclamações e sugestões da classe teatral recifense nas redes sociais e nas mesas de bares da cidade, a presença física nas escutas públicas tem sido decepcionante. Em 2023, apenas 20 pessoas compareceram. Em 2024, o número caiu para 15 participantes – um quórum que preocupa os organizadores, especialmente considerando que o Recife possui uma cena teatral vibrante e numerosa.

“A hora da grita é essa, mas elas preferem as redes sociais e as mesas dos bares”, observa um integrante da organização, refletindo sobre a contradição entre as críticas virtuais e a ausência nos espaços formais de discussão.

Principais pontos críticos apontados na última avaliação pública 

O encontro de terça-feira ganha ainda mais relevância diante das questões levantadas na avaliação pública da 23ª edição, realizada em dezembro de 2024. Durante três horas de discussão na mesma sala da Banda Sinfônica, artistas, produtores e a avaliadora contratada Giovana Soar debateram os acertos e problemas enfrentados pelo festival.

Infraestrutura e equipe técnica: A avaliação revelou o esgotamento das equipes técnicas dos teatros, especialmente no Centro Apolo-Hermilo. Nathalie Revoredo, iluminadora com 11 anos de experiência no local, alertou: “Temos espaços exaustos e um corpo exausto não consegue realizar muito.” O atraso de uma hora e meia na apresentação de Mulheres de Nínive exemplificou os limites da infraestrutura atual.

Comunicação e divulgação: A avaliadora Giovana Soar identificou a comunicação como “um dos pontos mais delicados”, destacando a necessidade de melhorar a divulgação para alcançar públicos mais amplos. O programa do festival só foi distribuído na segunda semana do evento, comprometendo a estratégia de comunicação.

Ocupação dos teatros: Houve esvaziamento em algumas sessões, especialmente no OFF REC e espetáculos locais da mostra principal, contrastando com a lotação em apresentações com nomes consagrados como Marco Nanini e Othon Bastos.

Democratização do acesso: Foram levantadas questões sobre como atrair o público que compareceu à festa dos 20 anos do Grupo Magiluth (cerca de 2 mil pessoas) para dentro dos teatros durante o festival.

A questão dos pagamentos

Paralelamente aos debates artísticos, a cena teatral recifense tem enfrentado uma crise de confiança relacionada aos atrasos sistemáticos nos pagamentos de cachês por parte da Prefeitura do Recife.

Marconi Bispo, diretor do espetáculo Ọnà Dúdú — Caminhos Negros do Bairro do Recife (destaque do OFF REC 2024), recorreu às redes sociais para cobrar publicamente o pagamento pela participação da peça que envolvia 20 artistas, seis meses após a apresentação.

Não é um caso isolado. Outros artistas também recorreram às redes sociais para fazer cobranças públicas de cachês em atraso, evidenciando um problema que afeta diversos profissionais da cena cultural recifense.

Desafios estruturais e propostas 

A precarização dos espaços teatrais foi outro tema central dos debates. Augusta Ferraz, com 51 anos de dedicação ao teatro recifense, lamenta a situação de equipamentos como o Teatro Barreto Júnior, considerado um “subteatro” na vida cotidiana dos profissionais, e espaços fechados como o Teatro Valdemar de Oliveira (fechado desde 2020 e atingido por incêndio em fevereiro de 2024).

Inês Franco Maia questionou se a cadeia produtiva do teatro em Recife realmente valoriza a cultura local, criticando a tendência de valorizar mais os trabalhos externos: “O Magiluth só conseguiu reconhecimento local após ser legitimado fora de Recife.”

Durante a avaliação, emergiram diversas propostas para fortalecer o festival e a cena teatral local: planejamento antecipado das contratações técnicas e logísticas, melhor distribuição de horários para evitar sobreposições entre espetáculos, parcerias estratégicas com secretarias de Saúde, Educação e Cidadania para formar novos públicos, expansão do “Palco da Aurora” (onde Sinapse Darwin, da Casa de Zoé foi apresentado) para outras áreas da cidade, criação de espaços de encontro e diálogo após os espetáculos e revitalização do Teatro do Sítio da Trindade.

Diante deste cenário complexo, que mistura conquistas artísticas com desafios estruturais e de gestão, a escuta pública de terça-feira representa uma oportunidade crucial para que a classe teatral recifense contribua efetivamente com a construção coletiva da próxima edição do festival.

Milu Megale, secretária de Cultura do Recife, André Brasileiro, coordenador do FRTN, e Alexandre Sampaio, coordenador de produção, estarão presentes para ouvir as demandas e propostas da categoria. A 24ª edição está marcada para 19 a 30 de novembro de 2025.

Serviço

Escuta pública do Festival Recife do Teatro Nacional
Quando: Terça-feira (29/07), às 18h30
Onde: Sala da Banda Sinfônica – Teatro do Parque
Entrada: Gratuita

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Nanini enaltece arte do ator
Crítica a partir da peça Traidor

Marco Nanini e o boneco Naninão no espetáculo Traidor. Foto: Divulgação

Marco Nanini subiu ao palco do Teatro do Parque, na Boa Vista, região central do Recife, para abrir a programação do 23º Festival Recife do Teatro Nacional com o espetáculo Traidor, de Gerald Thomas, na quinta-feira, (21/11), com mais duas sessões nos dias seguintes. Leia como foi a abertura. O primeiro impacto dessa montagem é o cenário, uma representação visual pesada do caos e da fragmentação presentes na dramaturgia e na encenação. Concebido por Fernando Passetti, o palco se apresenta como um mundo em ruínas, repleto de escombros e objetos desconexos que refletem o estado mental conturbado do protagonista. O elemento mais impactante é um boneco gigante amarrado. Uma metáfora visual do personagem aprisionado em seus próprios delírios? De todo modo, o ator não se relaciona com o Naninão e em algum momento comenta. “Não consigo (olhar). É muito fake”, 

Espalhados pelo palco, encontram-se restos de colunas de concreto, adereços variados, inclusive uma cafeteira largada, que o protagonista diz não ter nenhuma utilidade na cena e que até debocha que deve ser teatro “moderno”. A iluminação transforma constantemente a percepção do cenário, alternando entre focos específicos e iluminação geral, contribuindo para o efeito de instabilidade. Este panorama amplifica a sensação de um mundo em ruínas.

Tudo parece tão confuso. Tem obras assim. Não sei por onde entrar. Me chamam, mas não me pegam. É a terceira vez que assisto Traidor, título que intriga e não entrega. A primeira vez foi na estreia no Teatro Antunes Filho, do Sesc Vila Mariana, em São Paulo, com todas aquelas pedras cenográficas no caminho; uma segunda vez no mesmo teatro, com algumas alterações na montagem. E desta vez no Festival Recife do Teatro Nacional, onde o cenário fica mais concentrado. Esse festival bancado pela Prefeitura do Recife quase foi extinto; resgatado ano passado para o bem da cultura, pois é um evento muito importante.  

Com sua metralhadora falatória, o protagonista pula do mundo em guerra, com as bombas que explodem em Gaza, para as redes sociais que  estilhaçam imagens. A dramatugia/encenação de Thomas brinca com a ideia de que a narrativa tradicional está morta. Ele estica até esgarçar a convicção de que o teatro contemporâneo não comporta enredo e personagem convencionais. Em fragmentos desconexos, aciona o fluxo de consciência de um homem beirando à loucura, refletindo a cacofonia do mundo atual.

Na construção do protagonista, observa-se um vasto painel de referências culturais e literárias. Do vulto de Samuel Beckett ao niilismo do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, o personagem central incorpora elementos do enigmático Próspero, o mago desterrado da obra-prima shakespeariana A Tempestade, absorvendo sua solidão e o domínio sobre um reino que existe apenas na imaginação. Paralelamente, ele ressoa as angústias de Joseph K., o emblemático anti-herói de Kafka em O Processo, enredado em uma teia de absurdos burocráticos e dilemas existenciais. A característica marcante do cabelo desgrenhado do renomado maestro britânico Leopold Stokowski (1882-1977) é incorporada ao personagem como uma nota da genialidade caótica e da excentricidade artística.

 “Roubei de Shakespeare. Sim, do Próspero de A Tempestade. Mas essa voz é minha. Até certo ponto, claro. Somos quem somos, até certo ponto. Isso também não é meu. É… de Kafka. Como veem, nada em nós é totalmente original. Mas nada é inteiramente falso também. Estamos no meio. Do quê? É assim! O Século 21. Bem-vindos a essa zona!”, solta o personagem.

Em meio à narrativa ficcional, Nanini, que atua em uma cadeira de rodas, explica ao público que ainda se recupera de uma cirurgia para a reparação do menisco – estrutura interna do joelho, – e que faz o seu melhor para que o público goste do espetáculo.

Do espetáculo, há quem goste, há quem não. Mas da atuação do Nanini, da dignidade do seu trabalho, é praticamente uma unanimidade. O que fica ao final é uma comovente ode à arte do artista da cena. 

Marco Nanini atua em uma cadeira de rodas. Foto: Divulgação

Em sua construção dramatúrgica, Thomas tece fios de memórias, observações mordazes e desabafos, entrelaçados com referências à cultura pop e à publicidade. Essa estrutura aparentemente caótica revela-se como um meticuloso exercício de autorreferência. As vivências do autor – desde sua estadia em Nova York e a angústia burocrática da imigração até suas passagens por Punta Cana e elucubrações sobre a realidade brasileira – são destiladas em um mosaico autobiográfico.

Na última parte de Um Circo de Rins e Fígados, de 2005, escrito e dirigido por  Thomas, Nanini encerrava a peça com uma reverência à sua profissão: “Quando dizem que o ator não se emociona, estão errados. A gente se emociona sim”. Esta frase retorna em Traidor: “A gente se emociona, a gente se emociona sim.” A repetição desta afirmativa permeia diversos momentos da apresentação, até que o protagonista admite: “Gente, vamos ser honestos. Sério. Eu vou parar com essa coisa de dizer ‘A gente se emociona sim’. É truque. É bobagem. É efeito. Sim, sim, a gente se emociona sim, mas não precisa ficar afirmando isso na frente das crianças não”.

É provocação em muitas escalas, essa dramaturgia erguida a partir de fragmentos, como se o personagem fosse um roteiro do Instagram, onde imagens passam rapidamente sem conexão aparente entre si. Nesta estrutura, o encenador espalha sua erudição pelo palco, transitando de um assunto a outro, citando artistas e conceitos na velocidade de um feed de rede social. É como se Thomas tivesse mergulhado na piscina do conhecimento, desafiando o público a acompanhá-lo neste fluxo vertiginoso de informações.

A cena do comercial da salsicha. Foto: Divulgação

A crítica ao mercado e ao capitalismo neoliberal é elaborada através de cenas em que o protagonista faz publicidade de salsichas vestido de mulher. Enquanto alguns podem considerar esses quadros hilários, eles também podem ser percebidos como irritantes, devido às falsas inocentes exaltações fálicas embutidas na publicidade. Em um momento, o ator na propaganda da peça declara: “É com chucrute no bumbum é que se vai… É isso aí…”. Em outra intervenção comercial, ele se rebela: “Não vou, não vou e não vou fazer mais um desses comerciais ridículos! Eu descobri tudo! Você acha que vai me tapear com chucrute no bum bum? Ora? Essa linguiça não tem nada a ver com Chico Mendes e nem com Punta Cana. Tem a ver com… Tira isso tudo de mim, tira essa cozinha daqui…”

Estas cenas satirizam a indústria publicitária e questionam o papel do ator neste sistema, criando um contraponto irônico à afirmação recorrente sobre a emoção do ator.

O humor, a ironia e o nonsense são oferecidos e alguns identificam e compram. A gravidade dos assuntos apontados se diluem na velocidade do processo de desumanização causado pela tecnologia e pela constante exposição a tragédias mundiais. Com isso, a peça escancara nossa relação com a informação na era digital, onde o Google substitui a leitura aprofundada e as redes sociais moldam nossas percepções. O protagonista, em um momento, exclama: “O Instagram é pior do que as fogueiras da Inquisição! O Facebook é pior do que o Terceiro Reich!” – uma hipérbole talvez, mas carregada desse sentimento de alienação na era digital.

Afirmações seguidas de negações dão o tom da montagem. E que ninguém busque uma salvação. “Nada nessa história faz sentido. Nada. O corpo da minha mãe não foi jogado ao mar. (…) Não havia barco onde morávamos. Não morávamos no litoral. Não tinha praia”, aponta o personagem. 

Foto: Divulgação

Quatro atores coadjuvantes trabalham como elementos cênicos vivos, amplificando a atmosfera surreal da peça. Apollo Faria, Hugo Lobo, Marllon Fortunato e Wallace Lau formam o coro que executa uma variedade de ações performáticas em apoio ao monólogo de Nanini.

Suas intervenções são diversas: iluminam o protagonista com lanternas, manipulam guarda-chuvas, simulam cenas de guerra, realizam coreografias em nudez e executam pantomimas. Essas ações têm intenção de preencher espaços físicos e metafóricos da peça.

Complementando o elenco presencial, a voz em off de Fabiana Gugli interpreta uma diretora imaginária, funcionando como uma espécie de consciência externa ou alter ego do protagonista ou do diretor.

Embora os elementos adicionais em Traidor representem uma escolha estética e conceitual deliberada, é plausível argumentar que a peça poderia funcionar bem como um monólogo, prescindindo do cenário grandioso e do coro de atores. A dramaturgia autorreferencial de Thomas, aliada à presença magnética de Marco Nanini, potencializada pelo uso eficiente do ponto eletrônico, e realçada pela iluminação exuberante característica do diretor, seriam mais que suficiente para sustentar a obra.

A estética experimental de Gerald Thomas, que causou furor nas décadas de 1980, 1990 e 2000, revela-se paradoxal em Traidor. Sua estrutura e estética podem parecer nostálgicas, um teatro particular que não dialoga plenamente com as sensibilidades atuais. Talvez seja justamente nessa aparente singularidade que resida seu fascínio peculiar. O texto enigmático de Thomas, permeado de referências particulares e divagações existenciais, serve como um veículo para algo mais profundo: a revelação da humanidade de Marco Nanini.

É nos interstícios entre o personagem e o ator que Traidor encontra sua força. Nanini, figura icônica do teatro, cinema e televisão brasileiros, traz para o palco não apenas sua técnica apurada, mas também fragmentos de sua própria essência. A ambiguidade entre o real e o fictício, característica intrínseca do teatro, é aqui elevada a um novo patamar, convidando o público a um exercício de percepção sobre onde termina o personagem e onde começa o homem.

Um episódio emblemático na estreia no Teatro Antunes Filho, do Sesc Vila Mariana, em São Paulo, ilustra perfeitamente essa dualidade. A queda acidental de Nanini no palco, um momento potencialmente catastrófico, transformou-se em uma demonstração pungente de sua grandeza profissional. Sua determinação em retornar e concluir o espetáculo demonstrou um poderoso compromisso com a arte e seu público. Leia sobre o incidente.

Enfim, Nanini é um grande ator que potencializa qualquer material com o qual trabalha. Nesta 23ª edição do Festival Recife do Teatro Nacional, ele é acarinhado por seus conterrâneos, sendo ele mesmo recifense que ainda na infância se mudou para o Rio de Janeiro. Sua presença no festival enriquece o evento e reafirma sua conexão com suas raízes pernambucanas.

Ficha técnica:
Texto, direção e concepção visual: Gerald Thomas
Iluminação: Wagner Pinto
Cenografia: Fernando Passetti
Figurinos: Antonio Guedes
Direção musical e trilha sonora: Alê Martins
Direção de movimento: Dani Lima
Assistente de direção: Samuel Kavalerski
Direção de produção: Fernando Libonati
Coordenação de produção: Carolina Tavares

 

O Satisfeita, Yolanda? faz parte do projeto arquipélago de fomento à crítica,  apoiado pela produtora Corpo Rastreado, junto às seguintes casas : CENA ABERTA, Guia OFF, Farofa Crítica, Horizonte da Cena, Ruína Acesa e Tudo menos uma crítica

 

 

 

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Abertura do Festival Recife do Teatro Nacional

Marco Nanini e elenco da peça Traidor. Foto: Divulgação

A presença do ator Marco Nanini na programação foi o chamariz perfeito para esse segundo ano de retomada do Festival Recife do Teatro Nacional. Homenageado desta 23ª edição (ao lado da atriz pernambucana Ivonete Melo, in memoriam), Nanini apresentou o espetáculo Traidor. A cerimônia oficial de abertura ocorreu na quinta-feira (21/11), no Teatro do Parque lotado. O evento segue até o dia 1º de dezembro e reúne 31 espetáculos na mostra principal – 13 nacionais e 18 locais – além de trabalhos artísticos em processo, rodas de conversas, debates, performances e outras intervenções na mostra OffREC.  A multiartista, performer, preparadora de elenco, arte-educadora e produtora cultural recifense Sophia William conduziu com elegância a abertura deste FRTN, que tem como temática Atuação e a Representatividade. 

Os discursos de abertura foram breves, mas carregados do ethos pernambucano. O prefeito João Campos destacou que um festival de Teatro que celebra a produção pernambucana, mas que dialoga e abraça a produção cênica do Brasil é uma marca da nossa cidade. E arrematou afirmando que “a gente é tão amostrado que ele (Nanini) é filho do Recife”.

A secretária de Cultura do Recife, Milu Megale, distribuiu agradecimentos ao prefeito por “nos deixar sonhar e executar”, aos fazedores de cultura, aos parceiros e ao Conselho de Cultura. Ressaltou a importância do festival para a cidade, principalmente para os artistas do teatro, que têm a oportunidade de se reciclar. Também destacou a realização, pela primeira vez, do OffREC.

O presidente da Fundação de Cultura da Cidade do Recife, Marcelo Canuto, enfatizou a importância do festival para o cenário cultural recifense e brasileiro. Na sua avaliação, houve um avanço de 2023 para este ano, com a ampliação da programação.

Que este espírito entusiástico pelo teatro perdure e se materialize em outras ações concretas ao longo de todo o ano, pois o Recife possui talentos inegáveis na área das artes cênicas.

Público lota teatro do Parque. Foto: Divulgação

Seguindo a tradição estabelecida na edição anterior, o Festival mantém a prática solidária na distribuição de ingressos. Os espectadores podem adquirir suas entradas através da doação de 1kg de alimento não perecível nas bilheterias dos teatros, antes do início das sessões. Cada pessoa tem direito a retirar até dois ingressos. Esta iniciativa é fruto de uma parceria com a Secretaria de Desenvolvimento Social, Direitos Humanos, Juventude e Políticas Sobre Drogas do Recife, reforçando o compromisso social do evento.

A programação completa do Festival Recife do Teatro Nacional está disponível em nossa publicação anterior. 11 dias de festival 

Prefeito João Campos cumprimenta Nanini. Foto: Divulgação

O festival destaca a importância de duas figuras pernambucanas do teatro. Marco Nanini, filho ilustre do Recife, é reconhecido mundialmente por sua carreira versátil como ator, autor, produtor teatral e dramaturgo. Com uma trajetória que se estende por seis décadas, Nanini personifica a dedicação e a excelência no palco, no audiovisual e na televisão.

Ivonete Melo, lembrada com carinho e respeito, iniciou sua trajetória como bailarina e se consolidou como uma atriz de destaque no grupo Vivencial de Olinda e em outras produções do Recife. Além de sua atuação artística, Ivonete foi uma defensora fervorosa dos direitos da classe artística, presidindo o Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversão no Estado de Pernambuco (Sated-PE) por mais de duas décadas, deixando um legado de luta e paixão pela arte. Em um momento tocante, a filha de Ivonete, Andrezza, recebeu as honras em nome de sua mãe. Visivelmente emocionada, Andrezza optou pelo silêncio eloquente, permitindo que a grandeza das realizações de Ivonete falasse por si, em um tributo que ressoa profundamente na comunidade artística pernambucana.

Logo após a apresentação do espetáculo Traidor, Nanini foi agraciado com distinções, recebendo uma placa e flores das mãos do prefeito João Campos. Este espetáculo ainda conta com mais duas sessões durante o festival, que ocorrem nesta sexta-feira e sábado.

O coordenador do FRTN, André Brasileiro, embora não tenha subido ao palco ou falado publicamente, foi citado pela secretária de cultura como o cérebro do festival e o trabalhador incansável para a realização do evento.

O clima no teatro durante a abertura era festivo e de confraternização. Alguns fãs de Nanini foram cumprimentá-lo no camarim, onde ele os recebeu com atenção e carinho. Para um grupo de estudantes que pediu conselhos para seguir na profissão de artista, Nanini sugeriu que tivessem o amor como guia: “Amem o ofício de ator, mas também as pessoas e os animais. O amor é que faz a diferença”.

 

O Satisfeita, Yolanda? faz parte do projeto arquipélago de fomento à crítica,  apoiado pela produtora Corpo Rastreado, junto às seguintes casas : CENA ABERTA, Guia OFF, Farofa Crítica, Horizonte da Cena, Ruína Acesa e Tudo menos uma crítica

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Recife do teatro nacional
11 dias de festival

Peça Traidor, com Marco Nanini, abre Festival Recife do Teatro Nacional. Foto: Annelize Tozetto / Divulgação

A 23ª edição do Festival Recife do Teatro Nacional começa nesta quinta-feira, 21 de novembro, prometendo uma intensa maratona cultural até o dia 1º de dezembro. Este evento, que se firmou como um dos mais significativos no panorama teatral brasileiro, reúne 31 espetáculos de companhias pernambucanas e de outros estados, em diversos teatros e espaços públicos do Recife. A programação inclui apresentações gratuitas, oficinas e rodas de diálogo, com ingressos distribuídos mediante a doação de um quilo de alimento não perecível, promovendo uma ação solidária que beneficia a comunidade local.

Este ano, o festival presta homenagem a Marco Nanini e Ivonete Melo (in memoriam).

Marco Nanini é uma figura icônica no cenário artístico brasileiro, com uma carreira que se estende por mais de seis décadas. Nascido no Recife, Nanini se mudou ainda criança para o Rio de Janeiro, onde iniciou sua trajetória no teatro, televisão e cinema. Ele é amplamente reconhecido por sua versatilidade como ator, capaz de transitar entre o drama e a comédia com maestria. Nanini ganhou destaque nacional por seu papel na série de televisão A Grande Família, onde interpretou o personagem Lineu Silva, conquistando o carinho do público brasileiro.

No teatro, Nanini é conhecido por sua dedicação e paixão pela arte cênica. Ele já participou de inúmeras produções teatrais, muitas delas ao lado de outros grandes nomes do teatro brasileiro. Sua contribuição para as artes cênicas é inestimável, e sua presença no Festival Recife do Teatro Nacional é uma celebração de suas raízes pernambucanas e de sua trajetória.

Ivonete Melo. Foto: Reprodução

Ivonete Melo é lembrada como uma das grandes referências do teatro pernambucano. Com uma carreira marcada pela militância e dedicação, Ivonete presidiu o Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Pernambuco (SATED-PE) por mais de 20 anos. Ela foi uma figura central no grupo Vivencial, conhecido por sua atuação inovadora e provocativa no teatro entre as décadas de 1970 e 1980, frequentemente desafiando normas sociais e artísticas da época.

A influência de Ivonete Melo no teatro pernambucano é inegável, refletindo seu compromisso inabalável com a defesa dos direitos dos artistas e a promoção da cultura local. Admirada por sua habilidade em inspirar e liderar, ela desempenhou um papel crucial no fortalecimento da comunidade artística. A homenagem a Ivonete no festival celebra sua dedicação e militância, ao mesmo tempo em que reconhece o impacto duradouro de seu legado na cena teatral pernambucana.

Foto: Matheus José Maria / Divulgação

Traidor é uma peça que marca a abertura do Festival Recife do Teatro Nacional, estrelada por Marco Nanini e dirigida por Gerald Thomas.

Marco Nanini, em uma performance tour de force, encarna um náufrago da própria mente, isolado em uma ilha que é tanto física quanto metafórica. Seu personagem, batizado com seu próprio sobrenome, “Nanini”, navega por um mar de memórias fragmentadas e delírios vívidos, confrontando sua identidade como ator e a própria essência do que significa ser humano em um mundo cada vez mais desconexo.

A frase que norteia Traidor, citada várias vezes ao longo da peça, é justamente aquela que encerrava Um Circo de Rins e Fígados, outra parceria Nanini Thomas: “A gente se emociona, a gente se emociona sim.” Esta declaração ressoa como um manifesto da arte da interpretação, ecoando através do tempo e das obras de Gerald Thomas. Em Traidor, que estreou em novembro de 2023 em São Paulo, essa afirmação ganha novas camadas de significado, transformando-se em um farol que ilumina a jornada labiríntica de um ator perdido entre realidade e ficção.

A dramaturgia fragmentada de Thomas encontra em Nanini um intérprete capaz de dar corpo e voz às angústias e contradições de um artista acusado de um crime que não cometeu, mas que talvez tenha cometido em alguma de suas múltiplas personas teatrais. A peça trata de muitos assuntos, refletindo o caos contemporâneo, a ansiedade gerada pelo excesso de informações e o uso viciante das redes sociais, enquanto simultaneamente se apresenta como uma declaração de amor ao ofício da representação. 

Programação Diversificada

Édipo Rec. Foto: Camila Macedo / Divulgação

Márcia Luz em Antígona – A Retomada. Foto: Divulgação

Othon Bastos em Não me entrego não. Foto: Beti Niemeyer/ Divulgação

Rei Lear. Foto: Mariana Chama / Divulgação

A programação diversificada do festival inclui 13 espetáculos nacionais e 18 locais na programação principal (ver programação completa abaixo), abrangendo desde peças infantis e sátiras até musicais e dramas. Entre as produções estão Édipo REC; Eu Não Me Entrego, Não; Antígona , Rei Lear.

Édipo REC, produção do grupo recifense Magiluth, é uma releitura contemporânea da tragédia grega de Sófocles. Ambientada em um imaginário Recife de 2024, a peça explora temas como o excesso de produção de imagens e a manipulação da realidade nas redes sociais. A direção de Luiz Fernando Marques traz elementos do cinema, com referências a filmes como Édipo Rex de Pasolini. O espetáculo brinca com a cronologia e questiona a noção de tempo no teatro. 

Solo da atriz pernambucana Márcia Luz, Antígona – A Retomada reinterpreta a clássica tragédia grega de Sófocles sob uma perspectiva contemporânea e afro-brasileira. A montagem radicaliza o protagonismo feminino já presente na obra original, entrelaçando a voz da personagem Antígona com as vivências da própria atriz como mulher negra. Dirigida por Quiercles Santana, a peça busca fazer reflexões sobre raça, gênero e poder na sociedade atual.

Eu Não Me Entrego, Não marca a estreia solo do veterano ator Othon Bastos. Escrita e dirigida por Flávio Marinho, a peça percorre os principais momentos da carreira de Othon, incluindo seu papel icônico em Deus e o Diabo na Terra do Sol. E utiliza um formato  descrito como “monólogo híbrido”, onde a atriz Juliana Medella atua como uma “memória” em cena, interagindo com Othon. 

Adaptação ousada da Cia. Extemporânea, Rei Lear traz a tragédia de Shakespeare para o universo das drags queens. Com um elenco composto inteiramente por artistas drag, o trabalho funde a estética drag com a poesia trágica shakespeariana. Dirigida por Ines Bushatsky e adaptada por João Mostazo, o espetáculo utiliza elementos como lipsync (Sincronia Labial) e performances de boate para reinterpretar cenas clássicas. A produção celebra a arte drag, destaca sua capacidade de expressar emoções complexas e desafiar normas de gênero, oferecendo uma visão contemporânea de Rei Lear.

Jéssica Teixeira em Monga. Foto: Ligia Jardim / Divulgação

O evento também marca a estreia do OffREC, uma agenda dedicada a experimentos e espetáculos em processo, que ocorrerá no Teatro Hermilo Borba Filho, de 25 a 30 de novembro. Na programação estão a provocante peça Monga, da cearense radicada em São Paulo Jéssica Teixeira, o  espetáculo itinerante ONÁ DÚDÚ: Caminhos Negros no Bairro do Recife, com Marconi Bispo e Coletivos e a Roda de Diálogo Vedetes e Vivecas: Mulheres do Vivencial, uma homenagem a Ivonete Melo, com as atrizes Suzana Costa, Auriceia Fraga e Zélia Sales, com mediação de Hilda Torres. A curadoria do OffREC é assinada por Rodrigo Dourado.

Projeto Arquipélago de Crítica

Nesta 23ª edição do Festival Recife do Teatro Nacional quatro profissionais ligados ao Projeto Arquipélago participam de uma ação de  prática da crítica. Kil Abreu, da Cena Aberta, Heloisa Sousa, da Farofa Crítica, Fredda Amorim (convidada) e Ivana Moura, do Satisfeita, Yolanda? tod_s com ampla experiência na produção de conteúdos críticos. 

O projeto arquipélago é uma iniciativa coletiva inovadora de fomento à crítica apoiado pela produtora Corpo Rastreado, de São Paulo, que surgiu em novembro de 2022 para fortalecer a crítica teatral independente no Brasil. Atualmente, seis casas virtuais participam do projeto: Guia Off, Farofa Crítica, ruína acesa, Satisfeita, Yolanda?, Tudo, Menos Uma Crítica, Cena Aberta e Horizonte da Cena.

Programação Principal

Quinta-feira (21 de novembro)

19h30 – Traidor, com Marco Nanini (direção: Gerald Thomas/RJ), no Teatro do Parque.

Sexta-feira (22 de novembro)

15h – Palhaçadas – História de um Circo sem Lona (Cia. 2 em Cena/PE), no Teatro Barreto Júnior.
18h – Cara do Pai (Coletivo Opte/PE), no Teatro Hermilo Borba Filho.
20h – Édipo REC (Magiluth/PE), no Teatro Luiz Mendonça.
20h – Traidor, com Marco Nanini (direção: Gerald Thomas/RJ), no Teatro do Parque.
20h – Eu no Controle (Cia da Baju/PE), no Teatro Apolo.

Sábado (23 de novembro)

17h – As Charlatonas (Trupe-Açu Cia. de Circo/TO), no Parque da Macaxeira.
18h – Sinapse Darwin (Cia. Casa de Zoé/RN), na Rua da Aurora.
18h – Antígona – A Retomada (Luz Criativa/PE), no Teatro Hermilo Borba Filho.
19h – 2 Mundos (Lumiato Formas Animadas/DF), no Teatro Apolo.
20h – Rei Lear (Cia. Extemporânea/SP), no Teatro de Santa Isabel.
20h – Traidor (RJ), no Teatro do Parque.
20h – Édipo REC (Magiluth/PE), no Teatro Luiz Mendonça.

Domingo (24 de novembro)

16h – Hélio, o Balão que não consegue voar (Coletivo de Artistas/PE), no Teatro do Parque.
17h – As Charlatonas (Trupe-Açu Cia. de Circo/TO), no Parque da Tamarineira.
17h – Frankinh@ (Coletivo Gompa/RS), no Teatro Apolo.
18h – Mulheres de Nínive (Nínive Caldas/PE), no Teatro Hermilo Borba Filho.
18h – Sinapse Darwin (Cia. Casa de Zoé/RN), na Rua da Aurora.
20h – Rei Lear (Cia. Extemporânea/SP), no Teatro de Santa Isabel.

Segunda-feira (25 de novembro)

20h – Instinto (Coletivo Gompa/RS), no Teatro Apolo.

Terça-feira (26 de novembro)

20h30 – Não me entrego não (Othon Bastos/RJ), no Teatro do Parque.

Quarta-feira (27 de novembro)

15h – Malassombros – Contos do Além Sertão (Grupo Teatro de Retalhos/PE), no Teatro Barreto Júnior.
20h30 – Não me entrego não (Othon Bastos/RJ), no Teatro do Parque.

Quinta-feira (28 de novembro)

20h – Kalash – Ensaio sobre a Extinção do Outro (Coletivo Opte/PE), no Teatro Apolo.

Sexta-feira (29 de novembro)

20h – Inacabado (Grupo Bagaceira/CE), no Teatro Luiz Mendonça.

Sábado (30 de novembro)

17h – Paraíso (Grupo Teatro Máquina/CE), no Teatro Apolo.
19h – Pequeno Monstro (Quintal Produções Artísticas, com Silvero Pereira/RJ), no Teatro do Parque.
20h – Inacabado (Grupo Bagaceira/CE), no Teatro Luiz Mendonça.
20h30 – Brás Cubas (Armazém Cia. de Teatro/RJ), no Teatro de Santa Isabel.

Domingo (1º de dezembro)

17h – Quatro Luas (O Bando Coletivo de Teatro/PE), no Teatro Apolo.
18h – Esquecidos por Deus (Cícero Belmar/PE), no Teatro Hermilo Borba Filho.
19h – Pequeno Monstro (Quintal Produções Artísticas, com Silvero Pereira/RJ), no Teatro do Parque.
20h30 – Brás Cubas (Armazém Cia. de Teatro/RJ), no Teatro de Santa Isabel.

Programação OffREC (25 a 30 de novembro, no Teatro Hermilo Borba Filho)

25 de novembro

16h às 18h – Roda de Diálogo Corporalidades e Estranhamentos, com Johnelma Lopes (UFPE), Ana Marques (UFPE) e Alexsandro Preto (Vale PCD). Mediação: Clara Camarotti.
20h – Espetáculo Monga, de Jéssica Teixeira (CE).

26 de novembro

9h às 12h – Vivência de Teatro Hip Hop, com o coletivo À Margem (PE) e Bento Francisco (PE).
15h às 17h – Espetáculo ONÁ DÚDÚ: Caminhos Negros no Bairro do Recife, com Marconi Bispo e Coletivos (PE). Espetáculo itinerante, com concentração no Teatro Apolo.
17h30 às 19h – Roda de Diálogo Teatro Negro em Perspectiva, com Marcos Alexandre (UFMG). Mediação: Jefferson Vitorino (Cia. Máscara Negra).
20h – Espetáculo Xirê, do Coletivo À Margem.

27 de novembro

9h às 12h – Vivência Criando Autoficções, com a Cia. Teatro da UFPE (PE).
16h às 17h30 – Roda de Diálogo Processos Criativos Autoficcionais, com Marcondes Lima (UFPE) e Rodrigo Dourado (UFPE). Mediação: Fátima Pontes (Escola Pernambucana de Circo).
18h – Espetáculo Não. Tá. Fácil, do Coletivo À Margem (PE).
20h – Espetáculo Palestra Babau, Pancadaria e Morte, com Marcondes Lima e Mão Molenga (PE).

28 de novembro

9h às 12h – Vivência Contornos do Tempo: Ensaio na Terceira Idade, com o grupo Memória em Chamas (PE).
16h às 18h – Roda de Diálogo Teatro, Memória e Envelhecimento, com Rodrigo Cunha (IFPB) e equipe do espetáculo Senhora. Mediação: Manu de Jesus, da Creative’se Cultural.
18h – Espetáculo Baba Yaga, da Cênicas Cia. de Repertório (PE).
20h – Espetáculo Senhora, de João Pedro Pinheiro (UFPE).

29 de novembro

9h às 12h – Vivência Dramaturgias Urgentes: Escritas e Cenas Negras, com Kléber Lourenço (PE).
18h – Espetáculo Poema – Desmontagem, da Cia do Ator Nu (PE).
20h – Espetáculo Negro de Estimação – Desmontagem, com Kléber Lourenço (PE).

30 de novembro

10h às 12h – Abertura de Processo Senhora dos Sonhos, com Ceronha Pontes e Gonzaga Leal (PE).
14h às 17h – Roda de Diálogo Teatro e Comunicação na Era Digital: por e para onde caminhamos, com Aline (Vendo Teatro), Fernanda (Teatralizei), Ricardo Maciel (Palco Pernambuco). Mediação: Márcio Bastos.
18h – Performance O Problema é a Cerca, com Renna Costa (PE).
20h – Roda de Diálogo Vedetes e Vivecas: Mulheres do Vivencial, uma homenagem a Ivonete Melo, com Suzana Costa, Auriceia Fraga e Zélia Sales. Mediação: Hilda Torres.

O Satisfeita, Yolanda? faz parte do projeto arquipélago de fomento à crítica,  apoiado pela produtora Corpo Rastreado, junto às seguintes casas : CENA ABERTA, Guia OFF, Farofa Crítica, Horizonte da Cena, Ruína Acesa e Tudo menos uma crítica

 

 

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