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Grace Passô é invadida por Uma Voz

Grace Passô no colo Grão da Imagem: Vaga Carne. Foto: Kelly Knevels

Grace Passô no solo Grão da Imagem: Vaga Carne. Foto: Kelly Knevels

As peças da dramaturga, atriz e diretora mineira Grace Passô têm um toque surreal, porque a realidade – sob determinada perspectiva – é mesmo um absurdo. Na ciranda de medos e afetos, abacates desabam sem pudor na montagem Por Elise, do grupo Espanca!. “Cuidado com o que planta no mundo!”, avisa a mulher que cultivou a árvore e tem medo das frutas que caem. O homem dorme, mesmo quando acordado em Amores Surdos, também do Espanca!, porque os personagens não se ouvem, não se enxergam, não se percebem. Um estranho acordo de amor. Na peça Grão da Imagem: Vaga Carne, com texto, direção e atuação de Grace Passô, os elementos kafkianos se aproximam da realidade ilógica (ou perversa) subvertendo seu status a partir de temas identitários.

Grãos da Imagem: Vaga Carne é a atração desta sexta-feira (6), no Teatro Hermilo Borba Filho, às 20h, da programação do Trema Festival.

A personagem é Uma Voz errante, que invade matérias sólidas, líquidas ou gasosas, e decide, pela primeira vez, apossar-se de um corpo humano. “A peça parte da noção de construção da identidade, do contraste do ser social e subjetivo, dos conflitos e comunhão entre público e privado, do que há entre o julgamento social e as existências”, conta Grace no relato íntimo sobre o espetáculo, publicado na revista Trema!.

É uma jornada de auto reconhecimento, onde Uma Voz ocupa o cenário, “um corpo de mulher”, narrando o que sente ou finge sentir; o que é insondável em si, como sua imagem chega aos outros que veem. A proposta é de uma experiência complexa. São investigações e urgências estéticas de Passô contaminadas pelas inquietações do real.

Em Grãos da Imagem: Vaga Carne a atriz verticaliza sua identidade de mulher e negra. Uma instigação contra prescrições de nossa sociedade falocêntrica e racista. E nessa plataforma de gênero e étnica que o discurso é desenvolvido, os fragmentos de vida dessa Uma Voz vão aquém e além do corpo.

Jeito de moleca da atriz camaleônica. Foto: Lucas Ávila

Jeito de moleca da atriz camaleônica. Foto: Lucas Ávila

O espetáculo estreou no Festival de Curitiba em março, mesmo evento que a projetou junto com seu ex-grupo Espanca! em 2005. A atriz de 35 anos tinha 24 quando apresentou Por Elise no Fringe. Seu domínio técnico e carisma ficam mais apurados no decorrer dos anos.

Grace Passô é uma intérprete admirável. Que cria e encara provocações, que surpreende, que modula com expressões corporais e vocais, que sabe carregar bem as emoções, que faz seus gestos transbordarem de sentidos. E que usa tão bem a ironia com poderosa arma crítica. É incrível como ela pode se transformar nos seus personagens. Com uma propriedade que desperta a cumplicidade do público. É uma alegria acompanhar desde Por Elise da trajetória dessa artista brasileira.

Ficha Técnica
Direção, texto e atuação: Grace Passô.
Fotografia: Lucas Ávila.
Identidade Visual: 45 Jujubas.
Interlocutores: Ricardo Alves Jr. e Kenia Dias.
Luz: Nadja Naira.
Produção: Nina Bittencourt.
Gênero: Drama
Classificação indicativa: Livre
Duração: 60 minutos

Serviço
Grãos da Imagem: Vaga Carne
Quando: Sexta-feira, 6 de maio, às 20h
Local: Teatro Hermilo Borba Filho (rua do Apolo, 121, Bairro do Recife)
Ingressos: R$ 20 e R$ 10
Informações: (81) 3355-3320

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Por Elise bate docemente e encanta Garanhuns

Primeiro espetáculo do grupo Espanca! Fotos: Ivana Moura

Primeiro espetáculo do grupo Espanca! Fotos: Ivana Moura

Yolandas no FIG. Arte: Bosco

Por Elise, do Grupo Espanca!, de Belo Horizonte, provocou um susto, uma alegria, no Festival de Teatro de Curitiba de 2005. Apresentado no Fringe, a mostra paralela da programação, a montagem foi a grande revelação daquele ano. Ainda em 2005, a encenação participou da programação do Festival Recife do Teatro Nacional.

Mais amadurecido e com substituições no elenco, o espetáculo Por Elise foi exibido no 23º Festival de Inverno de Garanhuns, com o Teatro Luiz Souto Dourado lotado.

A montagem ganhou experiência, mas não perdeu o frescor. As imagens poéticas surgem de situações cotidianas prosaicas. Com sua estrutura extremamente fragmentada, a partir do texto de Grace Passô, Por Elise prossegue a nos intrigar, entre cachorro que aposta que os humanos têm sentimentos e abacates que podem atingir qualquer passante. E que insiste em lembrar que viver é arriscar-se e os envolvimentos são inevitáveis.

Cachorro lembra que humanos têm sentimentos

Cachorro lembra que humanos têm sentimentos

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Abaixo dois textos sobre o espetáculo, escritos em 2005 e publicados originalmente no Diario de Pernambuco

Edição de Segunda-Feira, 28 de Março de 2005

Fringe oxigena Festival de Curitiba

Mostra paralela continua com a função de revelar os talentos
Ivana Moura

Participar da mostra paralela do Festival de Teatro de Curitiba, o Fringe, é uma aventura. O prêmio para quem consegue ultrapassar as barreiras pode ser o reconhecimento, digamos nacional. Em meio a 187 espetáculos, alguns se destacam pela qualidade. Desta vez, o grupo Espanca!, de Belo Horizonte, conseguiu emocionar plateias e crítica com uma história delicada, tocante e simples. Por Elise, com texto e direção de Grace Passô, vai desfiando e entrecruzado os conflitos e anseios de cinco personagens. A diretora é a contadora de história, uma negra de olhos grandes e muito carisma, que plantou um pé de abacates no quintal e vive sob ameaça de que um desses frutos caia na cabeça. Ela lembra ao espectador que “é preciso ter cuidado com o que se planta”. Do humor inicial, o tom vai ganhando verticalidade, nos pequenos dramas das personagens. Uma moça está triste, pois terá que sacrificar seu cachorro que está doente. Ela se apaixona pelo lixeiro, que chega à vizinhança à procura do pai, que um dia saiu para comprar cigarros e nunca mais voltou. O homem, que tem por função levar o cão, sonha com o Japão.

As histórias das dores repentinas que invadem o cotidiano daqueles vizinhos emocionam. As personagens se encontram, mas não se salvam. A vida tem que seguir seu rumo, nem sempre com sonhos realizados. O percurso de cada um deixa marcas profundas. Como na cena em que o domador/caçador de cachorros participa de uma dança de sedução com o cão que sabe que vai morrer.

Personagens correm atrás de sonhos

Personagens correm atrás de sonhos

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Edição de Segunda-Feira, 21 de Novembro de 2005

Espetáculo mineiro explora fragilidade humana

FESTIVAL – Na montagem Por Elise, companhia Espanca! ensina a transpor muros da relação com o mundo para sobreviver

Ivana Moura
Da equipe do DIARIO

Uma cena nonsense e um recado existencial. Uma mulher com medo que abacates caiam sobre sua cabeça e o aviso imediato “Cuidado com o que você planta”, num misto de advertência e constatação que pode ser entendido como “cuidado com os desejos, porque eles podem vingar”. O espetáculo Por Elise, da companhia mineira Espanca! – cartaz de sábado e domingo da 8ª versão do Festival Recife do Teatro Nacional-, traz esse misto de ingenuidade e profundidade no seu discurso. O palco nu dialoga com os lugares (tanto objetivos quanto subjetivos) que temos possibilidade de ocupar na vida contemporânea. No diário virtual da montagem, o grupo cita Tarkovski: “O teatro joga com os possíveis deslocamentos das posições dos desejos”, atestando que a beleza delicada da encenação é resultado de uma trabalho árduo de equipe.

Construída com delicadeza e pitadas generosas de humor, a montagem, com texto e direção de Grace Passô submete os nossos individualismos cotidianos, quando cruza a vida de várias pessoas, vizinho e prestadores de serviço, de uma cidade de médio porte, a uma necessidade de relacionamento, de amizades, de sentimentos. Na economia de recursos cênicos, de aparatos visuais ou tecnológicos, Por Elise investe na palavra poética para dizer muitas coisas ao público.

A dona-de-casa que plantou os abacates conhece os dramas dos outros vizinhos da rua, marcados pela solidão, pela perda, pelo abandono e pela esperança. Ela é a contadora de histórias baixinha e de olhos grandes, interpretada pela própria Grace. A moça de vermelho (Samira Ávila) está triste e desorientada, porque seu cão está condenado e, em breve, chegará o rapaz da carrocinha para sacrificar o animal. Ela é pura emoção, cuja síntese é mimetizada pelo ato de cair. A garota se apaixona pelo lixeiro (Gustavo Bonés), que está à procura do pai, que saiu de casa para comprar cigarros e nunca mais voltou. Os dois correm pelo palco, encontram-se, perdem-se, deixam frases soltas pelo meio do caminho.

O funcionário (Paulo Azevedo) que chega para sacrificar o cão da moça desorientada é um inadequado para a profissão. Ele sonha deixar aquela vida e ir para o Japão. É um personagem difícil, contraditório (e por isso mesmo, cheio de humanidade), defendido com muita elegância pelo ator, que equilibra seu porte com o medo e a insociabilidade do tal funcionário. A figura do cão é interpretada por Marcelo Castro, que aos poucos vai conquistando a plateia com sua composição poética e contagiante, ao fugir de uma possível caricatura dos que preferem o caminho fácil quando fazem papel de animal.

Por Elise é uma fábula de efeito moral, numa narrativa elipsada, marcada por vazios, saltos e silêncios profundos. O título da peça remete à peça de Beethoven, Pour Elise, que em algumas cidades é utilizada em anúncio de caminhão de gás. Por Elise foi eleito informalmente por críticos, jornalistas e público como um dos melhores espetáculos do Fringe (programação paralela do Festival de Teatro de Curitiba) deste ano, em meio a mais de 150 montagens.

“Cuidado com o que toca; com a capacidade que gente tem de se envolver com as coisas”, adverte a verborrágica dona-de-casa da peça, incentivando a plateia a se arriscar nos envolvimentos, mesmo que isso gere “uma pancada doce”, aquela dor repentina, mas que faz com que cada um acredite que vale a pena transpor os muros para o encontro, a conversa de amigos, que no fundo é sempre muito bom.

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Grace Passô no papel da dona de casa de Por Elise

Grace Passô no papel da dona de casa de Por Elise

Confira entrevista com Grace Passô, concedida após a apresentação do espetáculo Por Elise, no Teatro Luiz Souto Dourado, de Garanhuns, durante o 23º Festival de Inverno. Ela fala sobre o Grupo Espanca!, o seu amadurecimento profissional e os novos projetos, agora que deixou o grupo (mas continua envolvida com as montagens do repertório).

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Os bem intencionados do grupo Lume

Os bem intencionados se passa num  salão de baile. Fotos:  Annelize Tozetto

Espetáculo Os bem intencionados se passa num salão de baile. Fotos: Annelize Tozetto

A ambientação do espetáculo Os bem intencionados, montagem da trupe paulista Lume é realista e convincente. No galpão do Centro de Eventos Sistema Fiep, com engradados de um lado, um lugarzinho para o bar com uma luz néon e uma pequena banda que toca boleros e outros sons, e mesas espalhadas por todo o espaço, entramos num ambiente com ar decadente e apelo brega. A atmosfera kitsch da montagem é completada pelo figurino dos atores, com roupas brilhantes, coloridas, curtíssima e até um terno branco com camisa colorida por dentro.

Ao entrar, o público já faz parte da cena. Os espectadores são distribuídos em mesas com amendoins e salgadinhos (a cerveja chegará depois) e acompanha a movimentação dos personagens do grupo Lume a indicar lugares, dançar e se exibirem pelo grande salão. As duas apresentações no Festival de Teatro de Curitiba foram lotadas.

A primeira senha: “será que você vai ver o que você quer ver?”. Parece jogo de palavras, como gosta tanto a dramaturga e diretora Grace Passô, do grupo mineiro Espanca!, convidada a dirigir esse trabalho. O que se segue é algo bem diferente das encenações do Lume.

A técnica de pesquisa com acabamento limpo, uma marca do grupo de quase 30 anos de existência, é deixada um pouco de lado nesse espetáculo que segue por outras palpitações. A companhia de Barão Geraldo, distrito de Campinas (SP), arrisca em outro terreno e sai de sua zona de conforto.

Suas figuras usam perucas e outras marcas de travestimento para destacar elementos histriônicos. Isso fala das inquietações dos artistas. Deles, também. É um mergulho em outras águas.

Os sete aspirantes a artistas expõem suas dificuldades. Eles não vivem de sua arte. Assumem outras profissões tão diferentes, mas à noite se encontram “cheios de boas intenções” para traçar planos para o sucesso.

Bebem, conversam, incentivam uns aos outros, brigam. Uma sempre quis ser Nina Simone. Outro canta Fábio Jr. Entrecortada, como focos que se alternam no salão, a peça intercala os tempos. Eles falam da vida cotidiana e deliram em suas fantasias de grandeza.

Atriz Naomi Silman interpreta uma viciada

Atriz Naomi Silman interpreta uma viciada

Uma conta que ficou feliz quando o pai morreu, porque ela era violentada todo o dia. Outra tenta mostrar uma técnica infalível de sedução, que ela prova na pele que não funciona. Outra ainda, interpretada pela atriz Naomi Silman, tem crises de dependência química e chega a lembrar a cantora Amy Winehouse.

Num momento de destemperança, o Márcio de Ricardo Puccetti grita que “eles”, o resto da companhia, pode enganar os outros (os espectadores), mas a ele não. O alvo de sua fúria é Gonçalvez, de Jesser de Souza (aquele baixinho, de 1,50m de altura). É um momento forte em que eles arrancam suas máscaras. E a reflexão que chega com o desmascaramento é de que o artista é vulnerável em seu trabalho, solitário e sempre a mercê do aplauso e da legitimação de outros que, muitas vezes, nem entendem o que eles fazem.

Carlos Simioni  no papel de Dagoberto

Carlos Simioni no papel de Dagoberto

Em uma auto ironia, eles sempre reforçam que o grupo possui CNPJ e que o cachê é dividido por igual para os sete integrantes. Lógico que é um dinheiro insuficiente. Dagoberto, de Carlos Simioni, ouve o diagnóstico ferino de uma tia, quando ele sofre um AVC: “Se você não tivesse perdido tanto tempo tentando ser artista, as coisas seriam melhores. Podia até ter plano de saúde”. Enquanto pode Dagoberto canta My way ao estilo Frank Sinatra para acalentar as ilusões.

Na trilha dessa trupe cômico marginal, com todos os excessos, seus integrantes buscam incentivar uns aos outros repetindo como mantra: “Ele acordou com esperança porque nada melhor que um fim de semana para decorar um peito solitário. Essa mansão”.

* A jornalista viajou a convite da produção do Festival de Teatro de Curitiba

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De janeiro a janeiro, tem festival!

Essa febre que não passa (foto) e Aquilo que meu olhar guardou para você estarão no Festival de Curitiba. Foto: Ivana Moura

Duas montagens pernambucanas – Essa febre que não passa, do Coletivo Angu de Teatro, e Aquilo que meu olhar guardou para você, do grupo Magiluth – estão na programação da mostra oficial do Festival de Teatro de Curitiba. Depois do Janeiro de Grandes Espetáculos e do hiato no mundo das artes – para tudo que não é música e folia carnavalesca, claro – é Curitiba quem abre o calendário de festivais de teatro no país.

De janeiro a janeiro, tem festival em vários lugares do Brasil, com enfoques e objetivos diferentes, mas sempre proporcionando a circulação dos espetáculos e, geralmente, o acesso do público a montagens que dificilmente conseguiriam ser vistas sem o suporte de um festival – já que não há patrocínio para todas as peças e bilheteria definitivamente não garante a possibilidade dos grupos viajarem.

Conversamos com diretores e curadores dos principais festivais do país – Festival de Curitiba, Porto Alegre em Cena, Londrina, Festival de São José do Rio Preto, Festival Internacional de Artes Cênicas da Bahia (Fiac), Cena Contemporânea e Tempo_Festival. Procuramos saber quais as propostas para este ano e, mais ainda, tentamos revelar os méritos de cada um deles para, de alguma forma, contribuir para que os nossos próprios festivais (ao menos os três maiores) – Janeiro de Grandes Espetáculos, Palco Giratório e Festival Recife do Teatro Nacional (esses também foram ouvidos, obviamente) – consigam avançar (ou também servir de espelho) em diversos aspectos.

Curitiba, por exemplo, recebe muitas críticas de que prioriza e incentiva na cidade a proliferação do teatro comercial. Apesar disso, o festival que já vai para a 21ª edição é, indiscutivelmente, um dos mais bem-sucedidos do Brasil. Consegue reunir produções de qualidade na cena nacional, inclusive muitas estreias acontecem lá, e ainda fomentar o experimentalismo, graças à mostra paralela intitulada Fringe, que foi inspirada no Festival Internacional de Edimburgo, na Escócia. Este ano, o Fringe deve ter 368 espetáculos. O grupo Magiluth, que nunca participou do festival, além de estar na mostra oficial, apresenta outros dois espetáculos: 1 Torto e O canto de Gregório, numa mostra dentro do Fringe organizada pela Companhia Brasileira de Teatro, que será realizada no Teatro HSBC.

Los pájaros muertos abre festival no Paraná

A mostra oficial do festival, que acontece entre 27 de março e 8 de abril, terá 29 espetáculos de seis estados brasileiros – São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Pernambuco -, além de dois internacionais – da Espanha e da Inglaterra. “Apesar dessas atrações, não queremos ser um festival internacional. O nosso grande mote é a produção nacional e mantemos esse foco”, explica Leandro Knopfholz, um dos criadores e diretor geral do evento.

A abertura da mostra será com a peça espanhola Los pájaros muertos; mas o festival tem ainda duas remontagens da companhia carioca Os Fodidos Privilegiados – O casamento e Escravas do amor -, as duas textos de Nelson Rodrigues; a estreia de Eclipse, do grupo Galpão; e de Licht & Licht, da Cia de Ópera Seca; e ainda montagens como Gargólios, de Gerald Thomas; O idiota, de Cibele Forjaz; e O libertino, de Jô Soares.

Recorte holandês no Rio de Janeiro

Qual o teatro feito na Holanda? Você já se fez essa pergunta? Os diretores e curadores Márcia Dias, Bia Junqueira e César Augusto, do Tempo_Festival das Artes – Festival Internacional de Artes Cênicas do Rio de Janeiro, já. Tanto que um recorte dessa cena teatral poderá ser visto entre 5 e 12 de outubro no chamado 2° Tempo do festival. “O festival é realizado em três tempos: o primeiro é dedicado ao pensamento – trazemos artistas internacionais para fazer residência, debates, encontros com filosófos, pessoas de outros segmentos. Já o segundo é aquele dedicado à programação artística propriamente dita. E há ainda o Tempo_Contínuo, que é o site, um suporte permanente”, conta Márcia.

Para quem duvida sobre o quanto o teatro na Holanda é profícuo, Márcia Dias responde: “Estou com material de mais de 60 espetáculos, entre teatro e dança, para que possamos fazer a curadoria”. Ano passado, o Tempo fez um recorte da cena argentina – inclusive co-produziu (com o Festival Internacional Santiago a Mil, o Festival d’Automne de Paris e a Maison des Arts et de la Culture de Créteil, na França), O vento num violino, do Teatro Timbre 4, que esteve pela primeira vez no Recife no último Janeiro de Grandes Espetáculos.

Espetáculo do grupo argentino Timbre 4 foi co-produzido por festival carioca

Londrina tem o festival de teatro mais antigo do Brasil

O festival de teatro mais antigo do Brasil é o Festival Internacional de Londrina – Filo. São 44 anos (a mostra só não foi realizada uma única vez e, por isso, o festival vai para a sua 43ª edição) e a programação inclui não só teatro, mas dança, circo, música. “Tentamos montar uma programação diversificada. E conseguimos uma média de 80, 90 e até 100 mil pessoas por edição”, conta o diretor da mostra, Luiz Bertipaglia.

A relação do Filo com a cidade, explica Bertipaglia, é bastante especial. “O festival tem 44 anos e a cidade 77. O festival foi crescendo com Londrina. As pessoas entendem que o festival faz parte da história da cidade”. Outra facilidade com relação à público é que Londrina não é tão grande – tem cerca de 600 mil habitantes e aí as ações conseguem ser mais efetivas junto ao espectador.

Segundo o diretor, a cena teatral londrinense foi impulsionada pelo Filo. “Muitas companhias foram criadas em função do festival. E acho que foi fundamental também para a criação, em 1998, do curso de Artes Cênicas da Universidade Estadual”.

Grupo belga vai encenar texto de Alejandro Jodorowsky no Filo

As inscrições para os grupos nacionais no Filo terminaram no dia 9 de fevereiro. A curadoria dos internacionais é feita pelo próprio Luiz Bertipaglia. Em primeira mão, o diretor nos confirmou a apresentação de The ventriloquist’s school, do grupo belga Poit Zero (um texto de Alejandro Jodorowsky), e Translunar paradise, montagem do grupo da Inglaterra Theatre Ad Infinitum (uma história sobre vida, morte e amor eterno que começa depois que a esposa de William morre e ele vai para uma ilha da fantasia, das suas memórias passadas). O festival será realizado entre 8 e 30 de junho.

Teatro africano no Distrito Federal

Geralmente o festival Cena Contemporânea, de Brasília, é realizado em agosto ou setembro. Esse ano, no entanto, será um pouco mais cedo: de 17 a 29 de julho. Guilherme Reis, coordenador do festival, diz que a mudança é por conta de um convite da Universidade de Brasília (UnB), que está completando 50 anos. “Vamos fazer uma edição especial, voltada para América Latina e África. Em 1987 e 1989, a UnB realizou o Festival Latino Americano. Por isso essa ação”, explica Reis que garante que terá liberdade para realizar suas escolhas, de forma independente da universidade.

El rumor del incendio, do México, estará no Cena Contemporânea

“Tenho uma oferta grande de espetáculos africanos e algumas co-produções que passam também por Portugal, Canadá e Espanha”. A grade de programação ainda não está fechada, mas o coordenador adianta que devem ser 12 ou 13 espetáculos internacionais, sendo seis ou sete latino-americanos e o restante de espetáculos africanos, além da produção nacional com a presença de montagens de diretores como Henrique Dias e Cibele Forjaz. Dos internacionais, estão confirmados The butcher brothers, da África do Sul, e El rumor del incendio, do México.

O Cena é um festival privado que nasceu em 1995, mas está indo para a 13ª edição. “Em alguns anos, não conseguimos realizar. Mas desde 2003 não paramos mais. Brasília tem uma situação atípica com relação a apoio. Pela primeira vez, ano passado, recebemos incentivo do Distrito Federal”, conta Reis. Um dos méritos do Cena é envolver a cidade – mesmo quem não vai ao teatro, não fica ileso ao Ponto de Encontro, um espaço montado na Praça do Museu Nacional da República, que abriga apresentações musicais.

Teatro de dois em dois anos

O Festival Internacional de Teatro Palco & Rua de Belo Horizonte (FitBH), em Minas Gerais, acontece de dois em dois anos. “Essa já era a proposta desde que ele foi criado, em 1994. Era para ter fôlego mesmo, para fazer sempre um grande festival”, explica Marcelo Bones, diretor do evento que, ao lado da diretora Yara de Novaes e da atriz Grace Passô, fará a curadoria da mostra. O evento está marcado para acontecer entre 12 e 24 de junho. A grade de programação ainda não está fechada, mas já há algumas definições. Bones adianta que devem ser 12 espetáculos internacionais, 15 nacionais e ainda 10 montagens de Belo Horizonte – que ocupam não só os palcos dos teatros, mas também as ruas.

“Vamos trabalhar a partir de três conceitos: o teatro e a cidade; o teatro e outras linguagens artísticas; e a cooperação e o intercâmbio entre criadores”, explica Marcelo Bones. O festival, que vai para a 11ª edição, é realizado pela Prefeitura de Belo Horizonte – responsável por 60% dos custos do evento. “Apesar de depender da agenda política, é um evento consolidado, importante para a cidade. Todas as pessoas sabem que o evento está acontecendo, gera movimentação”, diz o diretor.

Expandindo fronteiras

Where were you on January 8th? integrou programação do festival em São José do Rio Preto ano passado

O teatro contemporâneo é sempre o mote do Festival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto (Fit). Cerca de 40 companhias participam da programação que, este ano, vai de 4 a 14 de julho. Para se ter uma ideia, o festival recebeu 570 inscrições de grupos interessados em participar – desses, seis são pernambucanos. A curadoria é formada por Kil Abreu (que, durante quatro anos, foi curador do Festival Recife do Teatro Nacional), Sérgio Luis Venitt de Oliveira, Beth Lopes e Natália Noli Sasso. “Como festival internacional, estamos indo para a 12ª edição, mas o festival já tem 43 anos. Só na época da ditadura militar é que a programação não aconteceu uns dois ou três anos”, conta Marcelo Zamora, diretor do Fit.

“A gente achava que o festival precisava do recorte internacional”, complementa Zamora. O festival é realizado pela prefeitura, embora, o órgão seja responsável por apenas 10% do orçamento. “Somos um festival que vai atrás de propostas mais radicais, conceituais, com riscos maiores. E isso é sempre uma provocação para o nosso público”, diz o diretor. 60% da programação do festival em São José do Rio Preto, em São Paulo, é gratuita.

Relacionamento internacional

Em 18 anos, o festival Porto Alegre em Cena conseguiu estabelecer uma relação invejável com grupos internacionais. Muitas companhias vêm ao Brasil apenas para se apresentar lá. Ano passado, por exemplo, o diretor Bob Wilson só passou por Porto Alegre com A última gravação de Krapp, em que ele mesmo está em cena. “O trabalho sério e de respeito aos grupos ampliou muito os contatos do festival. É um meio onde as informações circulam. Então hoje conversamos com o mundo inteiro e, quando há um cenário propício, convidamos esses grupos”, diz Luciano Alabarse, que além de diretor é muito da alma do festival de Porto Alegre.

Bob Wilson era o diretor e o ator de A última gravação de Krapp, espetáculo apresentado no último POA em Cena. Foto: Mariano Czarnobai/Divulgação

Apesar de toda dedicação de Alabarse, a mostra não é privada, mas realizada pela Secretaria de Cultura da cidade. “A equação da qualidade é um grande desafio. Harmonizar a burocracia pública com a agilidade requerida por um festival internacional de grande porte é difícil. Há momentos em que penso em pegar em armas”, brinca Alabarse. “Importante é que não haja concessões artísticas. O festival não flerta com sucessos televisivos, celebridades duvidosas, peças de apelo comercial. O que está em jogo é a discussão cênica que faz diferença. Essa postura estabelece limites”, complementa.

Como um festival que já tem uma carreira consolidada, as negociações para que os grupos participem do POA em Cena podem durar anos. “Em 2012, o Berliner Ensemble vai visitar Porto Alegre pela primeira vez. O compositor inglês Michael Nyman, da mesma forma. E o Fuerza Bruta, sucesso mundial, vai aterrisar nos pampas. Essas são atrações já confirmadas”, adianta Luciano Alabarse.

O mais jovenzinho entre os festivais

O Festival Internacional de Artes Cênicas da Bahia (Fiac) só teve quatro edições e, ao que parece, um longo percurso pela frente. A data da próxima edição já está marcada: será de 28 de setembro a 6 de outubro. “Como nos anos anteriores, não direcionaremos a seleção em torno de um conceito pré-definido. Adotamos um caráter mais panorâmico, buscando alcançar uma mostra caracterizada pela diversidade e levando espetáculos que, de alguma forma consideramos, significativos, seja pela proposta de inovação na linguagem, aposta em um processo artístico ou experimentação, ou pelo ineditismo de grupos ou artistas importantes”, explica Ricardo Libório, coordenador do Fiac.

Um dos desafios do festival, aliás, não só dele, mas de praticamente todos no Brasil, é a formação de plateia. “Estamos amadurecendo algumas ações, que vão desde a ampliação do número de sessões por espetáculos, o fortalecimento de nossa coordenação de formação de platéias e a busca de parcerias estratégicas com a Secretaria de Educação, além de buscar modelos de promoção focada em grupos específicos que tenham potencial de ampliar o público ‘consumidor’ de teatro, para beneficiar não apenas o alcance do Festival em si, mas a atividade teatral em Salvador ao longo de todo o ano”, finaliza. A grade do festival ainda não foi definida.

OS PERNAMBUCANOS

Janeiro de Grandes Espetáculos faz escala em Portugal

O próximo Janeiro de Grandes Espetáculos pode ser aberto por uma montagem idealizada na ponte áerea Recife – Portugal. A ideia é que cinco atores daqui façam um intercâmbio com o Centro Póvoa de Lanhoso, que fica na vila de mesmo nome no distrito de Braga. O projeto é de Paulo de Castro, um dos produtores do festival, ao lado de Paula de Renor e Carla Valença. “Ainda estamos fechando os detalhes; porque devemos lançar uma seleção para essa escolha. Queremos proporcionar essa vivência com um centro internacional”, explica Paula de Renor.

Curadores do Janeiro pensam em estruturar intercâmbios e parcerias

Desde 2011, o Janeiro de Grandes Espetáculos é um dos integrantes do Núcleo de Festivais Internacionais do Brasil. “Aqui em Pernambuco, somos o único festival internacional. E o que queremos realizando parcerias é melhorar a programação e ainda trabalhar o público para essas montagens, porque as pessoas ainda têm receio da qualidade; talvez pela língua, embora as montagens tenham legenda sempre que preciso”, comenta Paula.

Realmente, não são todas as montagens internacionais que empolgam o público mesmo – ao contrário da programação das peças locais. É delas, independente de quantos meses ficaram em cartaz durante o ano anterior, o maior público do festival. “Esse é realmente o nosso foco. Dar visibilidade à produção local e possibilitar melhorias na cadeia do teatro para o resto do ano”, complementa Paula.

Além do intercâmbio com Portugal, provavelmente começam aqui as comemorações dos 20 anos da companhia Clowns de Shakespeare, do Rio Grande do Norte, no Janeiro do próximo ano. “Queríamos fazer uma residência com atores daqui e talvez com outros grupos. O Teatro Timbre 4, por exemplo, da Argentina, quer voltar com outros dois espetáculos. Achamos que talvez o formato de vivência seja mais interessante do que a oficina”, diz a produtora.

Espetáculo de Petrolina abre o Palco Giratório em maio

É do Sesc o festival que proporciona a maior circulação de espetáculos no país – o Palco Giratório. Em Pernambuco, além de promover a exibição de montagens em vários locais do estado, em maio, Recife recebe uma edição especial do Palco Giratório. Será praticamente um mês inteiro de programação – incluindo os espetáculos que estão circulando nacionalmente e ainda montagens convidadas, entre elas espetáculos internacionais. Este ano, o Palco Giratório no Recife será aberto no dia 4 de maio, com o espetáculo Eu vim da Ilha, da Companhia de Dança do Sesc Petrolina, no Teatro Barreto Júnior, que ganhou o Prêmio Apacepe 2012 de melhor espetáculo de dança pelo júri oficial – por conta da apresentação no Janeiro de Grandes Espetáculos.

Dois motes especiais: 15 anos e Nelson Rodrigues

Este ano, o Festival Recife do Teatro Nacional vai comemorar 15 primaveras. Como “adolescente” está no momento de repensar o seu papel para a cidade. “Sou positivo, otimista. Espero um festival muito bom. Nas conversas internas, a ideia é que a gente proponha que o mote para o festival seja essa data: os 15 anos”, explica Vavá Schön-Paulino, coordenador da mostra, promovida pela Prefeitura do Recife. Um dos desafios é agregar público; fazer parte do calendário não só para os artistas, mas para a cidade.

Segundo Vavá, Nelson Rodrigues não será o homenageado do festival – porque já foi uma vez, mas os eventos especiais devem lembrar a efeméride dos 100 anos de nascimento do dramaturgo pernambucano. “Tudo ainda vai ser conversado, mas existe sim a possibilidade de termos algum espetáculo de Nelson na grade”, complementa. A data do festival ainda não está fechada, mas deve ser provavelmente entre 15 e 30 de novembro.

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