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O gosto amargo do açúcar

Simião e a assustadora cumadre Fulozinha. Fotos: Ivana Moura

Em 25 anos de companhia, é a primeira vez que o Mão Molenga Teatro de Bonecos decide investir na dança como um dos elementos fundamentais da sua montagem. Em Algodão doce, que estreou neste último fim de semana no Teatro Hermilo Borba Filho, os passos inspirados no cavalo marinho e nas danças populares nordestinas tomam a cena, mas muitas vezes não conseguem se harmonizar com o restante do espetáculo. É como se os movimentos enérgicos tivessem mais espaço do que deveriam e, em alguns momentos, até “brigassem” mesmo com a cena que está sendo mostrada contada através dos bonecos.

As bailarinas Íris Campos e Elis Costa se uniram ao trio de atores do Mão Molenga

A peça, concretizada graças ao Prêmio Myriam Muniz, traz três histórias de assombração arraigadas no imaginário nordestino: O encontro de Simião com a Cumadre Fulozinha, As desventuras de Ioiozinho e O negrinho do pastoreio. Bem antes disso, são os atores que convidam o público a entrar no teatro e até fazem algodão doce para as crianças. De tanto açúcar, os dentes ficaram podres e o trabalho na lida os deixou cansados. A montagem começa quase com uma contação de histórias, com Fábio Caio explicando a origem do açúcar.

Marcondes Lima e Fátima Caio

Na primeira história de assombração, bonecos até maiores do que os próprios atores são levados ao palco. A cumadre Fulozinha, por exemplo, causou medo na criança que pulou para o colo da irmã (o espetáculo é indicado para maiores de oito anos). Marcondes Lima, ator, diretor e autor do argumento da montagem, se supera na manipulação do boneco Simião.

No sábado, um dos problemas da apresentação principalmente nesta primeira história, é que foi muito difícil ouvir e entender o áudio pré-gravado pelo atores. Não sabemos se era um problema da gravação mesmo ou do som do teatro.

Nos outros dois quadros, os bonecos são pequenos e bem mais graciosos (embora alguns deles não tenham olhos!), todos eles feitos com uma textura que lembra algodão doce. Aí as cenas adquirem outra potência. Se em As desventuras de Ioiozinho ela é mais tradicional, com aquela caixa que faz referência aos espetáculos de mamulengo apresentados no interior, em O negrinho do pastoreio os diálogos acontecem em módulos móveis que remetem aos grandes carros que levam canas nas usinas de açúcar. Uma história que ganha contornos muito mais delicados, embora seja cruel e amarga como todas as outras.

O negrinho do pastoreio

Outra questão que pode ser discutida é o fato de a montagem representar os negros com bonecos cor de rosa, como o algodão doce. Até que ponto o preconceito é realmente debatido na peça? Ou ela apenas joga questões, como o abuso do senhorzinho com os escravos, sem se demorar em trazer reflexão ao que está sendo exibido? Basta só Ioiozinho ser levado pelo “ser do mal”? Com a montagem, o grupo constrói imagens que, apesar de aparentemente delicadas, revelam intolerância, preconceito, resquícios de uma história que de doce não tem nada e que merece ser conversada com as crianças tanto no teatro quanto fora dele.

Ficha técnica Algodão doce
Direção cênica/ Direção de arte: Marcondes Lima
Argumento e Roteiro: Marcondes Lima
Diálogos e letras de músicas: Carla Denise
Elenco: Elis Costa, Íris Campos, Fábio Caio, Fátima Caio e Marcondes Lima.
Produção: Mão Molenga Teatro de Bonecos e Renata Phaelante
Criação dos bonecos: Marcondes Lima e Fábio Caio
Execução dos bonecos: Atelier do Mão Molenga
Design de luz: Sávio Uchôa
Adereços: Mão Molenga
Direção musical: Henrique Macedo

Serviço:
Algodão doce, do Mão Molenga Teatro de Bonecos
Quando: sábados e domingos, às 16h30, até 21 de agosto
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho, Bairro do Recife
Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia)
Informações: (81) 3355-3320

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