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O Beijo no Asfalto faz temporada no Apolo

Peça volta neste fim de semana e fica em cartaz no Teatro Apolo até 5 de junho. Foto: Américo Nunes

Peça volta neste fim de semana e fica em cartaz  até 5 de junho. Foto: Américo Nunes

Jornalista de batente, o dramaturgo Nelson Rodrigues conhecia bem os mecanismos da produção de notícias nas redações. E é demolidor ao compor personagens do métier. Em Viúva porém honesta julga tanto o publisher quanto o crítico teatral fisgado do reformatório. Em O Beijo no Asfalto, a imprensa inescrupulosa, na figura do repórter Amado Ribeiro, aliada à justiça submissa – representada pelo delegado Cunha, compõem um quadro de poder em que o cidadão comum pode ser caluniado, vilipendiado, coagido, destruído diante de uma sociedade hipócrita.

Parece até teatro do real.

Mas a peça O Beijo no Asfalto foi escrita 1961 especialmente para o Teatro dos Sete e estreou naquele ano, no Rio de Janeiro, sob direção de Gianni Ratto, com Fernanda Montenegro, Fernando Torres, Sérgio Britto e Ítalo Rossi no elenco, entre outros.

Na trama, um anônimo atropelado pede um beijo a um desconhecido, que foi em seu socorro após o acidente no trânsito num grande centro. O flagrante faz com que a curiosidade mórbida ganhe o lugar da indiferença que domina o caos da metrópole.

A vida do jovem Arandir, que atende ao último pedido do atropelado à beira da morte, se transforma num inferno. O repórter inescrupuloso e oportunista converte o ato de misericórdia em um caso de polícia com grande espaço na imprensa. Sem pudor em explorar com extrema crueldade, jornalistas e policiais sem ética invadem a privacidade da família, destroem a reputação de Arandir e fazem até com que nem mesmo a mulher do cidadão, Selminha, acredite na sua inocência.

A montagem acrescenta a obsessão pela internet. A cena é registrada por dezenas de pessoas munidas de aparelhos celulares e o caso ganha repercussão imediata nas redes sociais. O espetáculo reflete sobre a fabricação das celebridades instantâneas, ética e os meios de comunicação.

O espetáculo O Beijo no Asfalto utiliza do procedimento clássico do coro para expor facetas da sociedade que rumina opiniões, muitas vezes clandestinamente, nas redes sociais. São as manifestações sub-reptícias  de figuras sem identidade revelada, mas com os dentes afiados para condenar fatos e pessoas.

Assinada pelo diretor Claudio Lira, a encenação pernambucana estreou no Rio de Janeiro em agosto de 2012, como parte do projeto Nelson Brasil Rodrigues: 100 Anos do Anjo Pornográfico, organizado pela Funarte. Depois fez temporada no Recife e circulou por algumas cidades.

O Beijo no Asfalto volta neste fim de semana e fica em cartaz no Teatro Apolo, até 5 de junho, com sessões às sextas e sábados, às 20h, e aos domingos, às 19h. A temporada faz parte do projeto Nelson Rodrigues e o Óbvio Ululante (Temporada Jornalística de O Beijo no Asfalto), incentivada pelo Funcultura.

No elenco estão Arthur Canavarro, Andrêzza Alves, Eduardo Japiassu, Ivo Barreto, Pascoal Filizola, Sandra Rino, Daniela Travassos e Lano de Lins.

Ingressos antecipados pelo site www.eventick.com.br/temporada-de-o-beijo-no-asfalt.

FICHA TÉCNICA
Direção: Claudio Lira
Elenco: Andrêzza Alves, Arthur Canavarro, Daniela Travassos, Eduardo Japiassú, Ivo Barreto, Lano de Lins, Pascoal Filizola e Sandra Rino | Participações em Vídeo: Cardinot, Clenira de Melo, Cira Ramos, Márcia Cruz, Renata Phaelante, Sônia Bierbard e Vanda Phaelante
Voz da Locução: Gino Cesar
Música Final / Voz: Lêda Oliveira e Pianista: Artur Fabiano
Direção de vídeo cenário: Tuca Siqueira
Iluminação: Luciana Raposo
Cenário: Claudio Lira
Figurinos: Andrêzza Alves e Claudio Lira
Direção Musical e Preparação Vocal: Adriana Milet
Preparação Física e Coreografias: Sandra Rino
Fotografias: Caio Franco e Américo Nunes
Programação Visual: Claudio Lira
Produção Executiva: Renata Phaelante e Andrêzza Alves

SERVIÇO:
O Beijo no Asfalto
Onde: Teatro Apolo (Rua do Apolo, 121, Bairro do Recife. Fone: 3355 3321)
Quando: A partir desta sexta-feira (20/05) até 5 de junho. Sextas e sábados às 20h; e domingos, às 19h
Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada)
Duração: 1h30m
Indicação: 16 anos

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O beijo de Nelson

O beijo no asfalto tem direção de Claudio Lira. Foto: Pollyanna Diniz

O beijo no asfalto tem direção de Claudio Lira. Foto: Pollyanna Diniz

Ah, Nelson Rodrigues. O nosso clássico tão controverso. Que nos desestrutura com suas posições ideológicas, suas frases de efeito, seus textos de palavras ditas na hora certa, no momento exato, sem excessos. Que usa os instintos mais primitivos para falar de quem somos nós, das nossas capacidades, dos limiares da moral. Em O beijo no asfalto, o enredo tem muitas nuances. Da sujeira da imprensa em busca da venda de exemplares até a polícia corrupta, a relação entre duas irmãs, a confiança no outro, a homossexualidade.

O diretor pernambucano Claudio Lira, que estreou a sua versão de O beijo no asfalto no dia em que Nelson Rodrigues comemoraria seu centenário, ano passado, no Rio de Janeiro, tem sensibilidade e perspicácia para lidar com o texto de Nelson. Criou uma pequena vila de casas todas juntinhas. As fachadas são passagens que abrem possibilidades para a história, que permitem o olhar invasivo ou discreto dos espectadores da vida dos outros – embora a execução dessa ideia se deixe levar pelo caminho mais fácil: homens e mulheres de óculos escuros, jornal empunhado, figurinos cinzas, uma relação cinematográfica desnecessária.

Dona Matilde, a vizinha fofoqueira, é desdobrada em várias outras que participam da discussão através da projeção de vídeos. Há também a participação de Gino César e de Cardinot, o primeiro um popular apresentador de um programa de rádio e o segundo de televisão, comentando o caso. O bordão “durma com uma bronca dessas” levou a plateia ao delírio na primeira apresentação que o elenco fez no Recife, no Teatro de Santa Isabel. Afinal, os julgamentos continuam sendo feitos a priori e como é difícil destrinchar o real.

O elenco cresceu bastante (já vi a peça em três oportunidades – no Teatro de Santa Isabel, no Teatro Luiz Mendonça e no Barreto Júnior), mas as nuances e gradações ainda precisam ser perseguidas. Selminha, interpretada por Andrêzza Alves, vai da felicidade idealizada à desestruturação. Mas, principalmente no início da montagem, nas primeiras conversas com o pai e a irmã, o texto nem sempre consegue ter ressonância na atriz: “papai, papai” soa falso e descolado aos ouvidos dos espectadores.

Pascoal Filizola, Andrêzza Alves e Ivo Barreto

Pascoal Filizola, Andrêzza Alves e Ivo Barreto

Os principais destaques estão no elenco masculino. Pascoal Filizola, como o delegado Cunha, e Ivo Barreto, interpretando Amado Ribeiro (embora estereotipado principalmente pelos figurinos, um problema de toda a montagem) têm um jogo muito interessante em cena. Há ainda Arthur Canavarro (Arandir), numa atuação bastante convincente, Eduardo Japiassu (Aprígio), Sandra Rino (Viúva, D. Judith e Aruba), Daniela Travassos (Dália) e Lano de Lins (Barros, Werneck e travesti).

O mais interessante é realmente ouvir esse texto sendo dito na íntegra e o quanto ele consegue nos atingir, causando as reações mais diversas. Os diálogos são as pérolas desse espetáculo e o diretor sabe muito bem disso. Não precisa de enfeites. Precisa de sutilezas e nuances para que o texto possa nos inquietar ainda mais. Todo o resto é quase dispensável – inclusive a última cena da montagem. O texto termina no seu ápice. Não tem sentido colocar adendos que não agregam à dramaturgia, à encenação, que parecem sem objetivo.

*Este texto é fruto de uma parceria entre o Sesc Piedade e o Satisfeita, Yolanda? para a apreciação crítica de alguns espetáculos que participaram da mostra Aldeia Yapoatan.

O Beijo no asfalto será encenado hoje (27) e amanhã (28) no Teatro Marco Camarotti (com a proximidade é possível que o espetáculo ganhe bastante), no Sesc Santo Amaro, às 20h, dentro da programação do Festival Recife do Teatro Nacional. Os ingressos custam R$ 10 e R$ 5 (meia-entrada)

Arthur Canavarro e Daniela Travassos

Arthur Canavarro e Daniela Travassos

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Depois de quase um ano e meio, Prefeitura paga fomento

Recebi uma ligação do ator Tatto Medinni dando uma boa notícia: finalmente, um ano e cinco meses depois de ter o seu resultado divulgado, o Prêmio de Fomento às Artes Cênicas da Prefeitura do Recife foi pago. A premiação contempla cinco propostas com R$ 20 mil cada. Mesmo que o valor seja pequeno, é um apoio que não pode ser perdido pela classe.

Neste caso específico, algumas montagens até já foram realizadas, como é o caso de Minha cidade, de Ana Elizabeth Japiá. A diretora inclusive fez um empréstimo para fazer a produção, contando com o fomento. Ana tinha me contado um tempo atrás que já tinha nova temporada prevista no Marco Camarotti, mas não sabia se iria conseguir cumprir por conta da grana.

Outra produção contemplada foi Um rito de mães, rosas e sangue, com direção de Claudio Lira, que estreou em maio do ano passado e coincidentemente está voltando em temporada este fim de semana, no Teatro Hermilo Borba Filho. A montagem é formada por três quadros com adaptações de Bodas de sangue, Yerma e A casa de Bernarda Alba, todos de Federico Garcia Lorca. A peça que tem um elenco numeroso – Ana Maria Ramos, Auricéia Fraga, Andrêzza Alves, Daniela Travassos, Luciana Canti, Sandra Rino, Lêda Oliveira, Lano de Lins e Zé Barbosa – fica em cartaz sábados e domingos, às 20h, até 28 de agosto. Ingressos: R$ 15 e R$ 7,50.

Auricéia Fraga em Um rito de mães, rosas e sangue. Foto: Tuca Siqueira

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