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Mais Minas! Desta vez, o Galpão

Eduardo Moreira, um dos fundadores do grupo Galpão. Foto: Adalberto Lima

Tem mais Minas em Pernambuco! Eduardo Moreira, um dos fundadores do Galpão, está no Recife para discutir teatro de grupo – mais especificamente o tema: A trajetória do Grupo Galpão e as alternativas do teatro de grupo no Brasil. Eduardo aproveita também para lançar o livro Grupo Galpão – Uma história de encontros (R$ 50). Será hoje, às 19h30, na Caixa Cultural, no bairro do Recife.

Já tem um bom tempo que o Galpão não vem ao Recife com espetáculo. Se não me engano, a última vez foi com Till, a saga de um heroi torto. Não vimos por aqui, por exemplo, as peças do projeto Viagem a Tchékhov. Teve Tio Vânia (aos que vierem depois de nós), sob direção de Yara de Novaes, que estreou ano passado (com crítica aqui no Yolanda) e Eclipse – esta última com direção, dramaturgia, cenografia, figurino e treinamento do diretor russo e professor russo Jurij Alschitz. É uma lacuna que os produtores da cidade bem que poderiam ajudar a resolver!

E em junho do ano que vem provavelmente tem espetáculo novo. O Galpão, que completou 30 anos, entra daqui a pouco em novo processo de montagem. O gigante da montanha, de Pirandello, terá direção de Gabriel Villela.

Eduardo está vindo ao Recife através de um programa de ação cultural da FIAT Automóveis em parceria com o Sempre um Papo no Recife, com apoio da Lei Federal de Incentivo à Cultura. A ideia da empresa é realizar um intercâmbio entre os dois estados brasileiros que sediam fábricas da montadora.

Serviço:

Minas – Pernambuco – Sempre um Papo com Eduardo Moreira do Grupo Galpão
Quando: hoje, às 19h30
Onde: Caixa Cultural Recife (Avenida Alfredo Lisboa, 505, Praça do Marco Zero)
Informações: (31) 3261.1501
Entrada: gratuito. O livro custa R$ 50

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Vingança como coroa dos perdedores

Hécuba terá três sessões no Teatro de Santa Isabel. Fotos: João Caldas/Divulgação

Uma personagem que ultrapassa os limites da dor humana. “Estamos falando de uma rainha que é destronada, que perde o lugar em que estava. E não é só a concretude, o reino de Tróia, mas o seu lugar, com o seu corpo e o seu psiquismo”, explica Walderez de Barros, protagonista de Hécuba, texto de Eurípedes, com adaptação e direção de Gabriel Villela, que será encenado a partir de hoje no Teatro de Santa Isabel. “Ela passa a ser uma pessoa sem identidade social. Perde qualquer referência. E ainda vê os filhos serem assassinados. Ela não tem mais nada. Quando chega a esse ponto, vai se vingar”, complementa.

As racionalizações com relação ao texto continuam: a peça traz uma discussão importante sobre os limites entre a justiça e a vingança pessoal, em tantas situações tênues. “Quantas vezes a gente não quer esganar alguém? Mas como seres sociais, não podemos. Hécuba vai por outro caminho e se transforma em animal. Se você não tem relações sociais, a comunicação interpessoal, se o outro não é importante, você passa a ser um animal, não precisa matar alguém”.

Além de Walderez, que estava distante dos palcos desde a peça Fausto zero (na televisão o seu último papel foi na novela Morde e assopra, como mãe de Marcos Pasquim e fazendo par romântico com Paulo José), o elenco tem ainda Eduardo Sotelli, Fernando Neves, Leonardo Diniz, Luísa Renaux, Luiz Araújo, Marcello Boffar, Nábia Vilela e Rogério Romera.

Depois de dirigir Ricardo III, com o grupo Clowns de Shakespeare, a Hécuba de Gabriel Villela não é, de modo algum, em preto e branco. Os figurinos são dele mesmo. Outro detalhe da montagem é que o coro canta ao vivo. Os arranjos vocais foram compostos pelo mineiro Ernani Maletta, baseados em trilha do sérvio Goran Bregovic.

O diretor Gabriel Villela e a atriz Walderez de Barros

Aos 71 anos, Walderez já tinha feito outras duas tragédias: era Clitemnestra, em Electra, na montagem dirigida por Jorge Takla em 1987; dez anos depois, foi Medeia, numa peça do mesmo diretor. Com Villela, Walderez já fez outras duas montagens: A ponte e a água da piscina e Fausto zero. “Queria muito fazer Hécuba e o Gabriel nunca tinha feito uma tragédia grega”.

A montagem fez temporadas em São Paulo, já passou por Belo Horizonte e vai ainda para São José dos Campos, Santos, Curitiba (dentro do festival de Curitiba), Santo André, São José do Rio Preto, Ribeirão Preto e Porto Alegre.

Hécuba
Quando: Hoje e amanhã, às 21h; e domingo, às 20h
Quanto: Plateia e frisas – R$ 60 e R$ 30 (meia) / Camarotes – R$ 50 e R$ 25 (meia). Informações: (81) 3355-3323

ENTREVISTA // Walderez de Barros

Walderez de Barros trabalha pela terceira vez com Gabriel Villela

Quando você foi tema de livro na Coleção Aplauso, disse que pensava em fazer Hécuba. O que essa montagem tem de especial?

O Gabriel (Villela) foi muito feliz. Ele tem uma marca peculiar que mostra mais uma vez em Hécuba: as referências à cultura popular. As máscaras foram feitas pela mesma pessoa que fez os adereços de Ricardo III: Shicó do Mamulengo. Acho que as pessoas se esquecem que o teatro, os festivais, eram festas populares. Não tem no Youtube para a gente saber como era. Não tinha celular. Então virou moda fazer tragédia em preto e branco. Tragédia tem que ser cinza. Mas porquê? Se é uma festa popular, em qualquer lugar do mundo, as festas são coloridas. O coro é muito colorido. Eu visto preto, mas as troianas estão muito coloridas e com máscaras. Queria, aliás, falar bem do coro. Eles fazem um trabalho inacreditável. Em algum momento, todos fazem personagens que contracenam com Hécuba. Mas eles cantam músicas belíssimas, à capela, com máscara e se movimentando em cena! Aplaudo sempre.

Você diz que gosta mais da tragédia e da comédia. Porque
Tanto a comédia quanto a tragédia são mais difíceis. O drama é mais próximo – todos nós somos de uma classe média burguesa. Mas a primeira coisa de qualquer peça é o texto. A direção é indicada pelo texto. Se você pega um texto clássico, com uma boa tradução, tem a indicação de tudo. Isso no bom texto, claro. O tom está ali. Outro ponto é a direção – aquilo que o diretor pretende fazer; e ainda os outros atores com quem você contracena. Teatro é uma arte coletiva. É impossível querer fazer sozinho. E teatro só se realiza com a plateia.

Depois de passar alguns anos encenando A loba de Ray-Ban, Raul Cortez disse que não aguentava mais sofrer. Como você fica com Hécuba?
Sofro realmente com Hécuba. E, você vai entender, às vezes me dá uma preguiça: vou ter que passar por tudo aquilo de novo! Mas quando termina, fico renovada. Aquele percurso todo de emoção. Mas tudo isso fica no teatro mesmo. É muito sofrimento, emoção, forte, violenta. E quando acaba, estou revigorada. Nos ensaios, é outro processo. Não divido muito bem. Gosto de dizer que ensaio 24 horas por dia, porque você está sempre pensando e buscando. E aí a personagem se aproxima mais da gente. Mas não fico tomada.

Mesmo sendo uma atriz que tem raízes no teatro, você diz que não se frustra na televisão. Como é isso?
Gosto muito de fazer televisão. Acho bom, gosto de representar papéis. Se a personagem é boa, estou feliz porque estou criando de alguma maneira. Teatro é minha terra natal. Tanto que, quando não estou fazendo teatro, não me sinto afastada. É porque não dá mais para fazer um monte de coisa ao mesmo tempo, fico cansada! Mas a terra natal carregamos sempre com a gente. Mas é sim mais horizontal. Eu já sei disso: que tem que fazer na hora, criar na hora. Não me frustro, porque conhece. Se fizesse no teatro como faço na televisão, aí sim seria frustrante. No teatro, a criação é mais intensa.

Uma pergunta que parece simples, mas não é. Qual o poder do teatro hoje?
É aquela velha história: se você tem alguém na plateia que se transformou, que se sentiu incomodado, já valeu. A percentagem é pequena, não estamos atingindo milhões. É produto artesanal, não é indústria.

É mais difícil fazer teatro hoje?
A realidade é hoje. Se eu ficar pensando naquilo que era, é frustrante. A realidade é hoje. As pessoas que fazem teatro têm outra visão. Como observadora do teatro, não sei o rumo que a moçada está seguindo. É uma geração que pensa muito menos no coletivo. Vejo muito o individual e me assusto. Mas, enfim, aperfeiçoar o ser humano é o melhor caminho. Sobre se é difícil? Com algumas exceções de grandes sucessos, de algumas pessoas, é sim. E não estou criticando, não há sentido em criticar. O ideal era que todos conseguissem ganhar dinheiro, sobreviver da sua arte. Mas sempre foi difícil e continua sendo. Quem não tem visão de mercado, acaba penando. É muito difícil você conseguir patrocínio e sem patrocínio, você não consegue montar. Temos que contar com os abnegados, que acreditam.

Mas você é pessimista com relação aos avanços na arte?
Há avanços sim. Não especificamente no teatro, mas avanços. Estamos vendo uma maior valorização das culturas locais. A cultura não pode ser padronizada e a televisão é um pouco culpada disso.

Com Fausto Zero você conseguiu vir para o Recife?
Não! Fomos para a Rússia, um festival em Moscou, para o Festival de Curitiba. Faz tempo que não vou a Pernambuco.

Quais as recordações que têm daqui?
Cada vez que penso, só lembro das frutas e do sorvete! E da praia!

A sua primeira peça profissional foi dirigida por Hermilo Borba Filho: Onde canta o sabiá. Quais lembranças têm dele?
Ele era uma pessoa encantadora. Durante essa temporada, me casei com o Plínio (Marcos). Para mim, tudo era novidade. No início eu tinha medo da direção, mas depois de um tempo ficamos amigos. Hermilo foi uma referência de como um diretor pode ser competente e amigável. Levei isso comigo. Ele era muito especial.

Como já falamos, no livro da série Aplauso, você dizia que queria fazer Hécuba. E agora? Quais são os personagens que ainda quer?
Gosto demais do Lorca e nunca fiz. Estava conversando com o Gabriel (Villela). Quem sabe a gente não faz? Seria uma coisa boa, mas não é plano.

Quantos anos você tem?
71 anos. A melhor idade. Não porque eles dizem. Porque eu acho mesmo. Deveria ter nascido aos 71 anos.

É? Como assim?
É tudo tão melhor depois dos 70. Vemos a vida de maneira diferente, mais relaxada.

Mas você disse que não consegue mais fazer muita coisa ao mesmo tempo…não é ruim?
Mas para quê essa loucura? Quando a gente é jovem é que acha que isso é preciso.

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Clown sanguinário

Sua Incelença, Ricardo III estava na grade da Virada Multicultural. Fotos: Daniela Nader

No Nordeste de nem tão antigamente, os mortos não eram enterrados sem que antes fossem cantadas ou rezadas as incelências. E todo “doutor” podia ser chamado por alguém mais cheio de dedos ou embromações de “Sua Incelença”. Foi a partir dessa brincadeira semântica que o Clowns de Shakespeare rebatizaram a obra do dramaturgo inglês. Sua Incelença, Ricardo III finalmente foi apresentada no Recife (dentro da programação da Virada Multicultural), depois de já ter sido vista em vários festivais, como Curitiba (onde a peça estreou nacionalmente, antes só tinham sido feitas apresentações, antes mesmo da montagem finalizada, em Acari, no Rio Grande do Norte), Brasília, Rio e Porto Alegre. A direção da montagem é assinada por Gabriel Villela.

No Parque Dona Lindu, em Boa Viagem, a semiarquibancada da trupe (eles não conseguiram autorização para montar uma arquibancada maior, como em outros lugares) foi erguida bem na esplanada. Como o espaço era mesmo muito reduzido, o público sentou no chão, ficou nas laterais, mas deu um jeitinho de conferir a performance desse importante grupo que já tem dezoito anos de estrada.

Montagem fez apenas uma sessão no Parque Dona Lindu, em Boa Viagem

Desta vez, a história de truculência e a trajetória de assassinatos de Ricardo para chegar ao poder ganharam embalagem circense. As referências ao mambembe, ao improviso, à estética e criatividade dos clowns se sucedem ao longo da montagem. E é com um humor mais ácido que eles atravessam a violência com força, mas leveza. As crianças mortas viraram coco vendido na praia; o nobre que estava prestes a ser assassinado era uma cabeça de boneca.

O público entra na ilusão proposta pela montagem já a partir da música, que tem de referências nordestinas ao rock inglês. E a partir daí não tem problema ser um matador sanguinário no momento e noutro se travestir de duquesa com peruca loira e longo vestido vermelho.

A música é fundamental para a encenação construída pelo grupo

Ah….já soube que os Clowns vão pagar a “dívida” que tem com Pernambuco em grande estilo! Já existe a ideia de que eles comecem a comemorar os 20 anos da companhia aqui, em 2013, no Janeiro de Grandes Espetáculos. O grupo vai remontar Muito barulho por quase nada, peça de 2003 que teve direção conjunta de Fernando Yamamoto e Eduardo Moreira, do Grupo Galpão; além disso, já deve ter estreado o novo projeto: Hamlet, com direção de Márcio Aurélio. A ideia é apresentar essas peças e talvez outras do repertório, fazer oficinas, debates. Esperamos que tudo se concretize mesmo! Vamos cobrar!

Ficha técnica:
Direção geral: Gabriel Villela
Elenco: Camille Carvalho, Dudu Galvão, César Ferrario, Joel Monteiro, Marco França, Paula Queiroz, Renata Kaiser e Titina Medeiros
Assistência de direção: Ivan Andrade e Fernando Yamamoto
Texto original: William Shakespeare
Adaptação dramatúrgica: Fernando Yamamoto
Consultoria dramatúrgica: Marcos Barbosa
Figurino: Gabriel Villela
Cenário: Ronaldo Costa
Assistente de figurino: Giovana Villela
Aderecista: Shicó do Mamulengo
Costureira: Maria Sales
Direção musical: Marco França, Ernani Maletta e Babaya
Arranjos vocais: Ernani Maletta e Marco França
Arranjos instrumentais: Marco França
Preparação vocal: Babaya
Direção vocal para texto e canto: Babaya
Música instrumental original: Marco França
Pesquisa musical: Gabriel Villela e o grupo
Preparação corporal: Kika Freire
Iluminação: Ronaldo Costa

Próximo projeto do grupo é montar Hamlet, com direção de Márcio Aurélio

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Sua Incelença Ricardo III em três momentos

Sua Incelença Ricardo III, apresentação no Museu Oscar Niemeyer. Foto: Daniel Sorrentino/Divulgação

PRIMEIRA APRESENTAÇÃO

O cenário foi erguido no Museu Oscar Niemayer (conhecido como o museu do olho). Os últimos ventos de março sopravam amenos. Abertura da vigésima edição do Festival de Curitiba para autoridades e convidados. Isto é, patrocinadores, políticos, empresários, artistas, jornalistas e os organizadores do evento, dirigido por Leandro Knolpfolz. A arquibancada lotada. Expectativa lá no alto para conferir a versão de Ricardo III, sobre o vilão mais sanguinolento de Shakespeare pela trupe potiguar Clowns de Shakespeare e o encenador Gabriel Vilella.

Vilella transportou a história para o universo lúdico do circo, dos palhaços mambembes e das carroças ciganas. E com isso criou um diálogo entre as tramas da Inglaterra Elisabetana e a realidade do Sertão Nordestino.

Cheguei ao local nas palmas entusiasmadas da plateia. Foram quase oito horas de voo. Conexão. E com espera infindável no Rio de Janeiro.

E só vi o show de pirotecnia. Durante alguns minutos iluminando o céu de Curitiba.

Depois, os comentários de algumas pessoas sobre o espetáculo oscilavam entre maravilhoso a genial.

Encontrei o Fernando Yamamoto na festa nas dependências do museu. Parecia impactado com a experiência. E eram muitas congratulações.

Soube que o diretor Gabriel assistiu ao espetáculo pendurado numa árvore. Dias depois, em conversas com os atores, eles falaram que o entorno dessa apresentação criou um clima especial.

Humor para falar das falcatruas dos poderosos. Foto: Daniel Isolani

Titina Medeiros no papel da rainha. Foto: daniel sorrentino

Diretor Gabriel Vilella assiste ao espetáculo. Foto: Daniel Isolani/Divulgação

SEGUNDA APRESENTAÇÃO – Um espetáculo arretado

Mal estreou, a montagem do Grupo Clowns de Shakespeare foi convidada para participar de dois festivais internacionais. A edição de 2013 do Festival Tchekhov, na Rússia, um dos principais do mundo e o Festival de Santiago do Chile, no próximo janeiro. Méritos não faltam à encenação Sua Incelença Ricardo III, do grupo potiguar, que abriu o para o público o Festival de Curitiba, na terça-feira (29/03), dia do aniversário da cidade, no Largo da Ordem lotado.

O drama histórico Ricardo III, escrito pelo dramaturgo inglês William Shakespeare, já ganhou muitas versões nos palcos do mundo e no cinema. A do Clowns de Shakespeare, dirigida pelo mineiro Gabriel Villela é permeada por uma ironia fina e cruel e denuncia o cinismo dos poderosos. Eles usam qualquer artimanha para se agarrar ao poder e desqualificar os desejos alheios.

Largo da Ordem lotado. Fotos: Ivana Moura

A tragicidade do original é diluída. Sabemos que não há do que rir nesse texto de Shakespeare. Mas a encenação, com suas técnicas de teatro de rua, está mais próxima das brincadeiras de mamulengo do que das companhias inglesas tradicionais. E se afasta do puro naturalismo. E o público ri em alguns momentos.

A realidade se tornou muito mais sangrenta, cruel e violenta do que qualquer ficção que narre as atrocidades cometidas por um tirano. Para isso, basta ligar a televisão ou abrir qualquer jornal, não mais aqueles sensacionalistas. Todos trazem, suas doses de carnificina.

Pois bem, o último rei da Inglaterra da casa de York utilizou os mais variados ardis para chegar ao poder. Para subir ao trono ele precisava varrer do mapa outros herdeiros e ele mandou matar sobrinhos, parentes, amigos e inimigos. O troncho Ricardo fez tudo para conseguir a coroa.

Lindo espetáculo nordestino

Esse episódio inglês é transferido para o Sertão nordestino, inserido num reino de fantasia, onde a sangrenta trajetória de Ricardo, Duque de Gloucester, e sua trajetória de assassinatos e traições rumo à coroa da Inglaterra, ganha pequenas sutilezas, colorido do material cênico. De figurinos e cenários, que mesclam cipó, couro e outros materiais típicos da região Nordeste a sedas e tecidos nobres. O figurino assinado por Gabriel Villela, recebeu a colaboração do artesão Shicó do Mamulengo, do município de Acari.

Para mostrar a crueldade desse personagem em sua subida e queda, a peça junta elementos diferentes, que alguns podem achar díspares, do Nordeste e lembranças da Inglaterra. Faz a sua mestiçagem em grande estilo. Transforma personagens do bardo inglês em cangaceiros, em ciganas, em bonecos gigantes.

O grupo explora o universo lúdico do picadeiro do circo, dos palhaços mambembes e carroças ciganas, da estética do cangaço e da memória ibérica. Isso é feito quase como uma festa, que borbulha nos detalhes. Cocos secos ou verdes, por exemplo, mimetizam decapitações ou estrangulamentos. São soluções ricas e simples.

É louvável a atuação do elenco, preparo vocal e corporal. Marco França interpreta de Ricardo III, carregando no charme do vilão. Titina Medeiros canta de forma encantadora e interpreta a rainha Elizabeth como uma perua desbocada que tropeça na língua portuguesa. No elenco estão, além dos já citados, Camille Carvalho, Cesár Ferrario, Dudu Galvão, Joel Monteiro, Paula Queiroz e Renata Kaiser.

Elenco tem boa atuação

A música é executada ao vivo e consegue fazer uma ponte entre a Inglaterra e o Nordeste, com suas incelenças tão cantadas nos rituais fúnebres pelas carpideiras. O grupo mistura Bohemian Rhapsody, da banda inglesa Queen, no álbum A Night at the Opera com Assum Preto de Luiz Gonzaga, além de músicas de Supertramp e outros forrós e xotes.

O dramaturgista e produtor Fernando Yamamoto, lembra que esa ponte não é só da ordem da estética, mas também da política. “Ricardo III é tão cruel quanto fascinante e sedutor. E sua conduta fica muito próximo dos nossos ‘reis’ nordestinos. A forma como ele, ardilosamente, elimina seus concorrentes à coroa para chegar ao poder, abraçando em um dia e matando no outro, é muito familiar às nossas referências políticas”, argumentou ele em conversa após a apresentação.

Essa peça que usa de várias formas de hibridismo, carnavaliza a ascensão e queda desse poderoso, ganha o púbico com seu humor popular e sua crítica disfarçada de escracho

TERCEIRA APRESENTAÇÃO – A chuva foi a vilã

Público lotou Largo do Ordem, no centro de Curitiba. FOTO: Rubens Nemitz Jr/Cortesia

Sua Incelença, Ricardo III teve que enfrentar um inimigo a mais para levar até o fim a sua proposta, na sessão de quarta-feira (30/03). Única peça de rua da Mostra Oficial, o espetáculo da Cia. Clowns de Shakespeare encarou a forte chuva e saiu ovacionada do Bebedouro do Largo da Ordem, onde foi armado o palco.

As arquibancadas e o chão do espaço estavam lotados de pessoas. A chuva criou um problema no sistema elétrico. Os atores voltaram para o começo. O aguaceiro caindo, os técnicos tentando resolver a questão, as pessoas ansiosas. Aparece o diretor Gabriel Villela, que garante que se o sistema de iluminação for solucionado vai ter peça. Aí não tinha mais jeito. Quem estava na chuva era para se molhar.

Nem o cangaceiro escapou. Foto Rubens Nemitz Jr/ Cortesia

Com as roupas encharcadas os atores apresentaram o espetáculo. As luzes pifaram novamente e o elenco, por um tempo, levou sua versão de Ricardo III no escuro e no gogó (sem microfones). O sistema voltou.

Foi uma noite de superação. Com riscos que a combinação água x parafernália elétrica pode gerar. Graças aos deuses do teatro, nada de grave aconteceu. No final, dez minutos de aplausos entusiasmados da plateia e a emoção do elenco. Valeu Clows de Shakespeare.

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Vinte anos de festa cênica

Sua Incelença Ricardo III

Começa nesta terça-feira, com o espetáculo Sua Incelença, Ricardo III, do grupo Clowns de Shakespeare, de Natal (RN), o Festival de Teatro de Curitiba. A montagem dirigida por Gabriel Villela, reúne cantoria de funerais nordestinos com rock and roll para tratar de poder. É o encontro entre o sertão brasileiro e a Inglaterra elisabetana. São duas apresentações, hoje, dia do aniversário da cidade, e amanhã, ambas no Bebedouro do Largo da Ordem, um dos cartões postais da capital paranaense.

Este ano, o Festival de Curitiba completa 20 anos e busca “reconhecer no teatro brasileiro atual uma sintonia com o país vibrante e intenso” e que reflita a renovação da linguagem cênica.

Com uma perspectiva de reunir na capital do Paraná quase 3 mil artistas em 31 peças da mostra principal e quase 400 no Fringe, o festival vai até o dia 10 de abril.

Vinte anos depois da primeira edição, o teatro continua a ocupar o centro da cena, mas hoje tem coadjuvantes que enriquecem o encontro, com produções de dança, circo, stand up, música, cinema e gastronomia, além de inovações tecnológicas. Entre outros, o festival vai abrigar shows musicais, com Maria Gadú e Música de brinquedo, do Pato Fu.

Para a mostra principal foram selecionadas 11 companhias. Os mineiros do Galpão, atacam com uma versão de Tio Vânia, escrito entre 1896 e 1897 por Anton Tchekhov, com direção de Yara de Novaes. Cláudio Botelho e Charles Moeller levam o Carnaval para o Teatro Guairão com o musical É com esse que eu vou.

Marina une o conto A Sereiazinha, de Hans Christian Andersen, com as canções praieiras de Dorival Caymmi.

Marina

Nascida no Paraná e radicada no Rio de Janeiro, a Armazém Cia de Teatro apresenta o premiado Antes da coisa toda começar. É a 19ª montagem da companhia, desta vez uma dobradinha dramatúrgica de Maurício Arruda de Mendonça e Paulo de Moraes, esse último também assina a direção. A trupe do Armazém faz quatro apresentações no Festival.

A Cia. de Dança Deborah Colker fará a pré-estreia de Tathyana, peça baseada em Eugene Onegin, o romance em versos publicado em 1832 por Aleksander Puchkin.

Tathyana

Os Satyros estreiam O último stand up, com direção de Fábio Mazzoni; uma investigação sobre pessoas comuns do centro de São Paulo, onde fica a sede do grupo. A encenação é inspirada no poema Pátroclo ou o Destino, de Marguerite Yourcenar. Já a Sutil Companhia encena Trilhas Sonoras de Amores Perdidos.

Tercer Cuerpo é a montagem internacional da mostra, espetáculo do diretor argentino Cláudio Tolcachir.

Para montar a grade da programação principal, os curadores se guiaram por quatro linhas: movimento forte de teatro de grupo, influência de textos nacionais, onda de musicais e confusão de gêneros. “O público está mais participante, exigente e questionador”, atesta o diretor do festival, Leandro Knopfholz. Segundo ele, o festival cresceu mais do que os criadores (o próprio Knopfholz, Cássio Chamecki e Victor Aronis) imaginaram em 1992. De lá pra cá, foram contabilizados 2,8 mil espetáculos, com cerca de 1,6 milhão de espectadores.

De Caruaru – Dos quase 400 espetáculos do Fringe, a mostra paralela do Festival, um deles é pernambucano. Trata-se de A metamorfose, produzido pelo Teatro Experimental de Arte (TEA), de Caruaru. Dirigido por Fábio Pascoal, o espetáculo é baseado na obra de Franz Kafka. No elenco estão as atrizes: Julliana Soares e Geysiane Melo, que irão se apresentar dias 4, 5 e 6 de abril.

Metamorfose Foto Euclides Ferreira

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