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Balanço da gestão Leda Alves nas artes cênicas

Leda Alves, 82 anos, secretária de Cultura do Recife. Foto: Ivana Moura

Leda Alves, 82 anos, secretária de Cultura do Recife. Foto: Ivana Moura

Há alguns meses tentamos marcar uma entrevista com a secretária de Cultura Leda Alves. Mas o nosso encontro, por motivos vários, ainda não tinha dado certo. Depois de uma reunião do Fórum de Artes Cênicas, no último dia 14, no entanto, enxergamos o óbvio com muita clareza: essa conversa era fundamental. Afinal, passados oito meses de gestão, a equipe de artes cênicas não havia sido montada e a classe artística estava ali reunida, ouvindo um gestor técnico (Gustavo Catalano, gerente geral de ações culturais e infraestrutura da Fundação de Cultura da Prefeitura do Recife) perguntar se seria possível realizar o 18º Festival Internacional de Dança do Recife e o 16º Festival Recife do Teatro Nacional juntos. Não havia sequer uma resposta segura com relação aos orçamentos destinados aos dois eventos, completamente consolidados na cidade.

Em quase duas horas de conversa com a secretária, na última terça-feira (27), fizemos vários questionamos sobre diversos problemas da área de artes cênicas – o SIC (Sistema de Incentivo a Cultura), a manutenção dos espaços, a formação. Novamente, o óbvio ululante se instaura: há muito por ser feito e posicionamentos ainda bastante vagos. Leda Alves, pelo que demonstra na entrevista, deposita muita confiança e também responsabilidade no diretor, dramaturgo, ator e gestor Carlos Carvalho, que assumiu o Centro Apolo-Hermilo.

Aos 82 anos, a atriz e gestora, que já passou pela Fundarpe, Fundação de Cultura Cidade do Recife, Teatro de Santa Isabel e pela Companhia Editora de Pernambuco, e viu Geraldo Júlio e Eduardo Campos engatinhando, tem muitos desafios pela frente. Começou tentando exterminar os ratos e baratas que, explica ela, tomavam conta da sua sala no 15º andar da Prefeitura do Recife; e dividindo a sua sala noutras três, tão grande seria o espaço. Teria resolvido também os problemas da Orquestra Sinfônica do Recife; e agora, finalmente, durante a entrevista, anuncia o novo Chefe da divisão de Artes Cênicas (conhecido com gerente de artes cênicas): o diretor, dramaturgo e ator Romildo Moreira. Estão subordinados a ele o chefe do setor de serviços de Circo – Cleiton Osman Ferreira de Oliveira, nome também revelado na entrevista, o gestor responsável pela Dança, Fred Salim (que já assumiu o cargo) e o chefe do setor de serviços de Teatro. Esse último ainda não foi escolhido. Pelo menos até terça-feira passada. E ah, como o céu seria de brigadeiro se a pendência fosse só essa!

Entrevista // Leda Alves

Porque você aceitou ser secretária de Cultura do Recife?
Eu acho que a palavra nem é “aceitou”. A palavra é comparecer, dizer sim. O sim não quer dizer aceito. Quer dizer que acredita. Tenho uma perspectiva na minha vida muito ligada a uma fé, a um sentido da minha vida, a uma consciência de missão, a uma consciência de que sou parte de um plano de Deus. Não tenho dúvidas que Ele pensa em cada um de nós e, consequentemente, em mim também. E em toda a minha vida eu peço para eu não colocar obstáculos no plano de Deus sobre mim. Era tão fora da minha perspectiva essa secretaria! Porque eu tinha atravessado o momento mais difícil na Cepe (Companhia Editora de Pernambuco), que foi logo quando eu cheguei. Mas aí a gente abriu veredas do ponto de vista da democracia, da cidadania, da justiça social, da inserção e da abertura para outros códigos da cultura, muito sérias, profundas e bonitas. Nenhuma coisa que estou falando aqui se refere a mim. Eu só fui instrumento ali. Só chamei para junto de mim um bando de gente que acredita nas coisas e tem talento e deu no que deu. E aí eu estava vivendo o momento que o governador um dia me disse: “Leda, quando você colocar esse cargo nos trilhos, você viajar em céu de brigadeiro”. E eu brincava dizendo que parecia que o céu de brigadeiro estava chegando. Não deu duas! Eu estava em Exu, nas festas de Gonzaga, quando recebi o telefonema de Geraldo (Júlio), que eu conheço desde menino porque eu era amiga dos pais dele. Então foi uma pancada tão grande na minha cabeça, no meu coração, que eu estava almoçando, bebendo, saí da mesa e, quando voltei, não sabia nem em que chão eu estava pisando, voltei meio aérea. E à noite fui pro show e disse, “Geraldinho”! Eu não entendia o que ele estava me pedindo: “eu?”. Engasguei e disse: “Deixe eu conversar com Dudu (Eduardo Campos)”. “Mas é com o governador sabendo de tudo que eu estou telefonando”, ele respondeu. Aí eu fui ainda alimentando uma esperança que Eduardo dissesse: “não, eu não estou liberando você não. Quero que você termine meu governo”. Como ele dizia: “enquanto eu for governador, daqui você não sai”. Aí encontrei com ele à noite, ele beijou a minha testa e eu disse: “Dudu, olha a situação!”. Aí ele: “Vamos trabalhar? Eu quero você lá. Vamos trabalhar?”.

Espiritualizada, Leda Alves acredita em missão

Espiritualizada, Leda Alves acredita em missão

A sua escolha tem uma força política grande. E você, de certa forma, é uma pessoa, assim como Ariano, blindada com relação a críticas da categoria artística. O que você pensa sobre isso?
Guardando as devidas proporções com Ariano! Mas eu pensei sobre muitas coisas, sobre uma saudade do que não fui na minha juventude em relação a isso. Cheguei a reclamar dentro de mim: “pô, isso chegar agora, na minha velhice?”. Eu nunca pretendi, nunca insinuei, nunca desejei. Mas mais ligada ao doutor Arraes (Miguel Arraes de Alencar) do que eu era e depois a Eduardo? Que vi andando, engatinhando? Mas eu nunca insinuei nada disso porque sempre pensei que no balanço do mar..não sou eu quem me navego, quem me navega é o mar! (cantando). Então o mar para mim é uma força muito poderosa e eu sempre tento boiar na vida. Não de apatia, mas eu me largo completamente. E, se você não se largar, você não boia. É condição de boiar, você largar. Se você fizer uma forcinha, o corpo afunda. Então eu navego assim. Agora que estou terminando a missão? Chega um tamanho de missão desse? Mas, ao mesmo tempo, reflito: essa é a minha praia e eu trabalhei nela de várias maneiras, em várias frentes, desde quando tive minhas decisões de vida, de existência e de fé. Eu nunca tive desvio. Sempre fui desse lado e nesse código. O capitão Antônio Pereira dizia a Hermilo (Borba Filho) um negócio lindo: “ô Hermilo, só tem um caminho. O resto são veredas.” Eu nunca tomei outra vereda. Fui nesse caminho. Então agora você vai assumir a secretaria de Cultura. Sofri tanto ao longo desses caminhos vendo as besteiras que eram feitas, os desvios que faziam, a competição das vaidades, as traições e deslealdades com os outros, a inveja. Mas eu estava muito mais ligada aos artistas, apesar de sempre conviver com o poder. Mas o poder nunca me fez mal não. Eu ia como emissário. Agora quando eu aportei aqui, eu já vim bem, dessa expressão, que você usa, que eu senti que a categoria me quis. Eu vindo de Exu para cá, o telefone não parou um minuto. Das pessoas das mais diferentes linguagens, que me telefonavam, uns dizendo, “conte comigo, agora a coisa vai, a gente tem esperança, toque para frente, a gente ajuda no que puder”. Então isso é oxigênio. E eu tenho é que ouvir essas vozes. E se estão querendo, esperando e acreditando, é porque eu posso fazer, com eles eu posso. Aí eu vim para a posse. Também achei a receptividade da posse, quando meu nome foi anunciado, muito grande. E aí são as antenas de atriz, uma porção de coisas. Eu sou meio bicho para esse negócio de: comunico ou não comunico? Misturo pele, misturo uma porção de coisas…sinto logo quando a pessoa…não dá! Há pouco tempo eu tive uma reunião aqui, o sujeito estava sentado nessa cadeira, e eu disse: esse vai trair, esse não vai ser desse grupo. Não deu outra. Dez dias depois as coisas estavam virando e ele era o mentor da virada. Então isso eu sinto. Mas isso não é de agora não. Isso é de muito tempo! Então cheguei e tive uma reunião ainda no dia da posse. Eu acho que foi, porque eu cheguei até aos lugares sem pisar no chão, eu acho que é capaz de ter sido nessa sala. Quando eu disse a eles, aos funcionários, eu renovei o meu compromisso com eles que eu vivi há 28 anos. Se eu tenho hoje 82, eu tinha 54 anos. No auge da energia, já com uma maturidade, de experiência. Eu disse a eles que estou do lado deles, do ponto de vista do funcionalismo, do profissionalismo, da capacitação, das condições físicas de trabalho, que são péssimas, das condições salariais, que ainda são bastante degradantes. E aqui eu cheguei e encontrei uma equipe pequena, mas completamente apática. A barata “comia no centro”, quando você saia à noite, elas tomavam conta. Puxasse o telefone, saia uma barata de dentro. ‘Se botava’ spray para durante à noite não invadirem. Tinha rato, tinha barata, tinha tudo aqui dentro. Os roedores se misturavam com a gente. Cada vez que eu fui lá dentro e voltei…eu não sabia por onde começar! Mas fomos devagarzinho. Me pegaram logo, fizeram uma decoração de carnaval, logo no começo, do jeito que eu gosto. Pobre do ponto de vista do custo, mas sóbria, discreta e de bom gosto. Só com o essencial. Aí colocamos um som aí, só músicas de carnaval. Porque eu elogiei? Elogiei porque gostei e o pessoal nunca tinha tido um elogio. Aí eu os reuni aqui nessa sala para conversar sobre a situação de cada um, o que cada um fazia. As coisas mínimas! Muitos foram do meu tempo e outras não. Os mais novos não me conheciam. Olhe, houve gente que chorou, porque nunca tinha entrado nessa sala, nunca tinha sido ouvido, nunca tinha sido chamado pelo nome. Eu fui vendo como é fácil você administrar pessoas que têm a sensibilidade de sentir falta. Então vi que todos estavam vivos, todos estavam com possibilidade de querer alguma coisa. Hoje a gente está com uma equipe entusiasmada, cumprindo as etapas e as tarefas, querendo acertar. A equipe administrativa, que é a mais difícil, porque é meio cru, aquele negócio do papel, do papel, do papel. E eu tenho dado mais atenção a eles. Tirei umas coisas absurdamente erradas. Aí, para não sentirem muita falta, vai se colocando outras coisas. Estou apertando na disciplina de horário, coisas que incomodam. Tiramos uns negócios que eram assim já de vício.

Houve uma transição? Você chegou a conversar com Simone Figueiredo, a secretária da gestão anterior?
Não. Simone me entregou dizendo que tinham umas pastas e que, se eu precisasse de alguma coisa, se colocou à minha disposição, mas fui me virando com o pessoal que está aqui, que era com eles que eu tinha que viver.

Você sabe que viemos aqui principalmente para falar sobre as artes cênicas. Que é também a sua área. Então vamos começar: porque a gente não tem um gerente de artes cênicas? Porque a equipe de artes cênicas não está estruturada?
Passou a ter a partir de ontem (segunda).

Então anuncie! Que nós não estamos sabendo!
Danado é que eu não sei os nomes…

Saiu no Diário Oficial?
Não, não saiu ainda. Foram Carlos Carvalho (diretor do Centro Apolo-Hermilo) e Williams Sant’Anna (do Teatro Luiz Mendonça). Já sei. O gerente de artes cênicas é Romildo (Moreira). Agora a gente está pensando em Romildo. É porque mudaram as nomenclaturas. Agora ainda não foi publicado. Eu estou dizendo a vocês e vocês aguentem…Porque aí o prefeito vai dizer: eu nem assinei ainda a portaria e Leda já está dizendo?”.

Mas você sabe que toda a classe quer essa informação!
Uma coisa que eu acho formidável é que não há nenhuma pressão do prefeito em empurrar nomes. A gente está fazendo uma mudança agora radical no desenho do carnaval. A conversa da gente toda é com as agremiações. Ontem passamos a tarde com algumas categorias. Amanhã de tarde outra, depois de amanhã outra. Apresentando uma proposta e discutindo com eles. Para depois eu comunicar ao prefeito.

Mas sobre a sua equipe: eu conversei com Gustavo Catalano (gerente geral de ações culturais e infraestrutura da Fundação de Cultura da Prefeitura do Recife) na última reunião do Fórum de Artes Cênicas, no dia 14 de agosto, e ele me disse que ainda não tinha equipe porque não tinha encontrado as pessoas capacitadas.
Mas já está encontrando. Porque a gente está no fazer das nossas ideias e do que a gente sonha, do que a gente pensa em caminho novo – e nem sempre caminho novo obrigatoriamente é caminhado por jovens, mas por experiências renovadas, não é? A gente está ouvindo muito as pessoas que estão na área, trabalhando, caminhando, fazendo ou refazendo. Então isso tem sido uma hora de muita escuta.

Orquestra Sinfônica do Recife foi uma das primeiras bombas que estourou na mão da secretária

Orquestra Sinfônica do Recife foi uma das primeiras bombas que estourou na mão da secretária

Esse tempo foi essa escuta? Porque, afinal, são oito meses de gestão.
Também. Mas aí quando a gente está escutando, a gente também está operacionalizando muita coisa. Por exemplo, a Orquestra Sinfônica do Recife. Fui eu chegar e, um mês ou dois depois, estourou o negócio. E estourou não foi um fato isolado. E estourou, uma orquestra gritou: “estamos morrendo”. E morrendo por dentro. Até que vomitaram, de maneira errada ou certa, não quero avaliar a dor de ninguém. O fato é que Gioia (Osman) entregou o cargo, e a gente ficou: “e agora?”. Uma torre de Babel lá dentro. Cada um falava de um jeito, chorava de um jeito e agredia de outro.

Mas a sensação que se tinha na área de artes cênicas, logo que você chegou, uma pessoa da área. E nesse intervalo…
Artes cênicas não é só teatro não. Eu estou falando de ópera, eu estou falando de música clássica. E isso está sendo um feito muito bom, que essa Prefeitura está ganhando, rapaz! A gente trouxe Marlos Nobre, cidadão acima de qualquer suspeita. Ele não participa de nenhuma corrente artística aqui no Recife. Então ele entrou com muita competência, com um nome internacional. Foi ele quem me procurou para dizer: “estou acompanhando a agonia da Sinfônica. Eu sendo daí, estou sofrendo pelo Recife”. Eu estava almoçando quando ouvi uma frase: “Leda, pode contar comigo”. Isso não foi em vão, que eu ouvi essa frase! Ele falou, falou, e eu disse que voltava a ligar. Aí fui para o prefeito. Quando eu falei, contei tudo, ele disse: “vamos chamar esse maestro aqui?”. Levei, sentamos os três e ele ouviu de mim, do prefeito; e ele, naquela hora, Marlos saiu comprometido em cuidar da Sinfônica. E ele é muito mais do que um maestro. Está sendo um amigo, um irmão, um confidente, um psicólogo. Então ele restaurou por dentro os músicos. Os músicos hoje estão alegres. E ele pensava que não poderia preparar um concerto antes de três meses de trabalho. De tal maneira, porque ele viu como ela estava desfalcada, instrumentos, plano de cargos e carreira…Claro que isso é o somatório de muitas coisas que vivemos no passado, de muitos não, não, não, esquecimento, e tudo. Não é de valor do pessoal não. E ele investiu, ele apostou. Aí o prefeito disse: “Eu estou com você e o que você precisar eu quero fazer”. Pronto. Ele mergulhou dentro do teatro e amanhã (quarta / na realidade, o concerto foi adiado por conta do apagão no Nordeste) ele entrega a Sinfônica, que ele acha “eu estou entregando ao Recife uma Orquestra Sinfônica, que faz jus ao título de ser a mais antiga do Brasil”. É exercício. A gente não comprou os instrumentos ainda, porque o processo de comprar fora do país é coisa para seis meses de burocracia. Mas já está tudo levantado, aprovado por ele, aprovado pelo prefeito, é só o tempo de os instrumentos chegarem. Ele então resolveu, um negócio que eu achei formidável, pegar músicos jovens, do Conservatório Pernambucano de Música, do antigo Centro de Criatividade Musical, e também dos meninos do Coque, também era o sonho dele. Mas o juiz Targino (João Targino) não concordou e não cedeu um músico para se incorporar à orquestra! O que eu achei lamentável! Então ele (Marlos Nobre) pegou: são quinze ou dezesseis, que também estreiam agora, já ganhando, pouquinho, mas ganham, e de janeiro em diante a gente vai ver. Isso daí, nessa área, missão cumprida, no sentido de ter limpado o chão, tirado as cascas de ferida, ninguém comenta mais o passado, tem gente que já estava se entregando à bebida, entendeu? E ele levantou tudo. Ele é forte e ao mesmo tempo muito suave.

Mas esse descontentamento é o que a senhora vai encontrar, pelo menos se Gustavo conversou com a senhora depois da reunião do Fórum de Artes Cênicas, nas três áreas, circo, teatro e dança. Porque as pessoas estavam muito cansadas. Porque estavam com aquela esperança e aí chegou o mês de agosto e não tinha gerência! Na reunião ouvimos um gestor perguntar: “e aí, quais são os problemas do festival de teatro e do festival de dança?”. Nós estamos em agosto, um dos festivais era teoricamente em outubro, o outro em novembro, “quais são os problemas do festival para a gente tentar resolver?”. Como assim? Você não tem nem gerente! Se você tivesse um gerente, ele saberia dos problemas. A gente tem uma avaliação do festival de teatro todo ano.
Não… Foi horrível.

Então os festivais, isso não é nenhuma novidade para quem é da área. Isso é uma construção. Então eu queria saber sobre os principais problemas das artes cênicas. Por exemplo, nessa reunião, foi levantada a questão do SIC. Como será resolvida a questão do SIC?
Vai se resolver. Todas as questões vão ser resolvidas primeiro numa mesa, conversando. E aos pouquinhos isso está acontecendo. Você veja a conferência da gente, se bem que eu acho que têm coisas muito deficitárias nas conferências: por exemplo, a ausência de artistas. Na minha opinião, ela é muito mais um encontro de política partidária. E a ausência de jovens. Acho que discutir partido é outra coisa. Participei de tudo. Foram horas difíceis, por conta das brigas das correntes e das tendências. Mas eu achei: classe média lá não pisou. Tudo foi comunidade. Mas fizemos e abrimos a porta para ingresso de outras faixas da sociedade civil. O SIC é uma coisa que a gente vai, já começamos a pensar, a tratar, e ver como é que a gente vai fazer. É claro que a gente vai ver como é que conduz. Discutindo. Há quem pense que a gente deveria deixar o que não foi feito, não foi feito, e começar a pensar e organizar de agora pra diante. Esse é um pensamento, com o qual eu me afino mais. Eu não posso dizer a vocês ainda. O universo é muito grande. A Sinfônica me pegou muito tempo, porque a gente não tinha um tostão no orçamento. O orçamento não foi pensado.

Essa foi uma situação geral? Todas as secretarias chegaram sem dinheiro?
Praticamente.

Por que isso aconteceu?
Porque não foi planejado antes. A gente agora já tem que encaminhar todas as verbas para o próximo ano. E se ela não foi pensada, a LOA (Lei Orçamentária Anual), e tudo, a gente não tem. Tudo é o prefeito que está encaminhando, suplementação, suplementação.

Vamos para os festivais. E os festivais? Como você vai resolver essa pendenga?
Vão acontecer. Não é pendência não. A cada dia basta o seu fardo. Então cada vez que vem, a gente se senta, pensa, reflete, discute e tenta fazer. Graças a Deus o pessoal do secretariado, a parte de finanças, está olhando com muita boa vontade, com muito respeito e credibilidade os pedidos de Cultura, que não são pequenos. A gente saiu com o carnaval. Quanto é que a gente gastou no Carnaval? Eu sou péssima para números! Este carnaval vai ter um desenho completamente diferente dos outros.

Qual a diferença?
Construído! Vai ser diversificado, vai ser realmente discutido, como a gente fez o São João. Eu vou dizer uma coisa que digo sempre. Eu não pensei em viver a experiência que vivi no São João. Pode para vocês ser até…até artesanal. Mas nós, este ano, eu queria que vocês ressaltassem isso, a gente passou a usar, nas nossas programações artísticas e culturais, um instrumento chamado edital. Esse edital é uma coisa formidável. Fizemos no São João. Esse edital democratiza e evita injustiças, abre espaço e vez para todos. Se bem, um parêntese, a gente vai ver como reformular as leis que regem um item que se chama prestação de contas, documentação, para os artistas populares. Isso bate no Tribunal de Contas, mas isso a gente ainda pensa em mudar. Mas, fechando o parêntese, com o edital, todo mundo tem acesso. Não tem boquinha também: eu não recebo pedido seu, pedido seu, pedido seu. Parente, aderente, neto, avó, compadre, nada! Aí vem: “Leda..”. Eu secretária, então! “Meu grupo, não sei o que, não sei o que”. Eu digo: “vocês se inscreveram no edital?”

Mas isso especificamente para o São João?
Não! Vou fazer para carnaval, vou fazer para Natal. É caminho definido de politização, política cultural. Não há apelação, quem não estiver inscrito no edital, perdeu! E aí eu recebo os nomes, a relação toda, e a gente vai sentar aqui, uma equipe, e vai decidir.

Então existe uma mudança de conceito. Com relação ao São João, é o forró pé-de-serra? Em detrimento aos outros?
Não! Coco, ciranda, aboiador, todas as expressões concernentes ao nosso São João, a gente descobriu, catucou, vem pra cá! Vamos nos apresentar!

Mas o que não era do nosso São João, por exemplo, que estava tendo vez?
Tinha, tinha muita coisa de fora que vinha para cá porque tinha prestígio. O que todos nós vivemos, não precisa eu denunciar. Todos nós vivemos e sabemos qual era a receita: era a da amizade, do sujeito que tem nome, da sujeita que tem fama. Se você fosse ao Sítio da Trindade, não precisava eu falar nadinha! Você ia ver a mudança que foi esse São João no Sítio da Trindade, em estética, beleza, organização e a qualidade do que se apresentou no palco. E tem mais, viu? Não houve uma briga, assalto, furto!

O Carnaval vai seguir essa linha? Não precisa ter artista de fora?
Não, não precisa. Este ano teve, mas para o próximo não. Agora a gente ainda não pode dizer como vai ser a abertura do carnaval, porque o grande homenageado deste carnaval será o frevo.

Mas vamos voltar ao assunto festival. Os festivais de dança e teatro, que são para agora, como você está pensando em produzir esses eventos?
Você usou uma palavrinha que eu não uso. Nós jamais produzimos. Nós não somos produtores. Muito menos de eventos. A proposta, o compromisso da secretaria de Cultura é fomentar, apoiar, incentivar, dar oportunidade e espaço a todas as expressões de nossa cultura, respeitando a tradição, respeitando o novo, respeitando o jeito que o Nordeste tem de brincar e de se alegrar, em todas as linguagens. Para as artes cênicas, eu pensei muito no Centro Apolo-Hermilo. Não foi nem um minuto pelo nome de Hermilo apenas. Mas é porque o projeto daquilo é que seria um centro de formação. Ele foi durante um tempo no começo, mas depois os tumultos da vida foram afastando, afastando. E hoje eram dois espaços sem nenhuma linha cultural, de compromisso, de nada. Aquele “espontaneísmo” da mediocridade. Então chamei para lá Carlos Carvalho, que estava no Governo do Estado. Conversei com Fernando (Duarte) e pedi Carlos para a gente. Ele é um homem de artes cênicas, escritor, encenador, foi ator. Mas ele é um idealizador, um líder e também com muita ligação com a cultura popular. Por coincidência, ele é hoje o homem de teatro que mais trabalhou sobre a obra de Hermilo, adaptando até para a dança. Ele seguiu essa estética. Passou seis anos no Governo do Estado, exatamente trabalhando muito com os artistas populares. Aí chamei Carlos. Ele veio para cá e está dando tempo integral. E aí ele está pensando. O projeto dele tem coisas muito boas de formação. E os festivais estão acontecendo, irão acontecer, já estão pensados, todos eles.

Secretária afirma que festivais de dança e de teatro já estão pensados

Secretária afirma que festivais de dança e de teatro já estão pensados

Como assim já estão pensados? Se a gente, há menos de um mês, teve uma reunião com a classe em que não sabíamos nem o orçamento dos festivais?
Vocês sabem que Carlos Carvalho é o coordenador do Centro Apolo-Hermilo? E esses projetos de festival estão na mão de Carlos.

Como é que ele vai dar conta de dois festivais e do Centro de Formação Apolo-Hermilo?
Você vai perguntar a ele. Ele está com esses dois festivais, distribuiu nos outros teatros.

Mas você está falando do Festival Recife do Teatro Nacional? Porque geralmente há uma curadoria, além do coordenador, o que demanda um tempo.
Mas isso está havendo. Procure Carlos, converse com Carlos.

Está bem. Vamos adiante. Outra questão é sobre o fomento de artes cênicas, que sempre foi alvo de muitos questionamentos, principalmente por conta do valor, que é apenas de R$ 100 mil. E há alguns anos ele não sai.
Deixa eu dizer uma coisa a vocês. Não está decidido, não foi maturado, mas eu acho que tem que se rever muito esse negócio de dinheiro público, de fomento, de fundo de cultura. Um produtor veio um dia me pedir um apoio para uma viagem para o exterior. E aí ele disse, agora você me dá, vamos dizer, R$ 20 mil, para os atores poderem sair, passear, comprar presentes, beber, uma farrinha. Você não tem o despudor de me pedir isso não? Desde quando dinheiro público é para isso? Para isso ele bota a mão no bolso, do dinheiro dele, que ele leva. E quem não leva porque não pode levar, não faz farra, nem traz presentes. O que é isso? Eu vou custear isso? Já sabe que não vai. Não dou um tostão. Então você não sabe o que é se sentar nessa mesa e ouvir pedido. Vem as coisas mais absurdas do mundo pedindo dinheiro para você! Porque há uma deformação. O sujeito vem com uma série de apoios e vem, pede R$ 90, pede R$ 80, pede R$ 120 mil. Pede 13 passagens de ida e volta para a Europa, 20 passagens. Então não há nenhuma consciência disso. Você foi para o Funcultura (Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura), você recebeu? Como também a gente sabe que um projeto encaminhado ao Funcultura, um fulano pode ser beneficiado em seis projetos. Quando ele vai somar os dinheiros, botou um bom dinheiro no bolso. Entendeu? Muda só a posição dele, o nome do projeto, mas é tudo uma mesma cadeia. Essas coisas têm que ser moralizadas.

Você pensa em criar um fundo municipal, como o Funcultura?
Eu estou dizendo a você que como está não presta. Agora qual é o caminho que a gente vai seguir, vocês também têm que propor. Está na hora de propor. Vocês sabem quando a coisa não presta. Vocês sabem quando não está correto o negócio. Só não presta quando não vem benefício? Quando vem benefício para mim eu me calo? Não pode! Olhe, facilitar isenção de pauta no Teatro de Santa Isabel. Eu entrei radical. Eu só dou isenção quando o ingresso é de graça. Chega um sujeito cheio de apoios e cobra R$ 80, R$ 100, R$ 120 por ingresso. E eu vou dar o da gente de graça? Não. Agora, se é de graça, se vem com preços populares, às vezes simbólicos só, se a troca é, como por exemplo, com Deborah Colker. Esse espetáculo de hoje (terça) à noite, que a gente ajudou, ela deu para a Prefeitura do Recife, para a secretaria de Educação. As escolas da gente vão todas hoje. O que ela está chamando de ensaio aberto. É o espetáculo. Então negocio com isso, com uma troca de benefícios. Se você faz de graça, você tem todo o meu apoio, se você está entregando ao povo um produto de primeira, de graça, eu também vou dar ao povo o Teatro de Santa Isabel de graça.

Você saberia dizer quanto Deborah Colker recebeu?
Foi R$ 20 mil. Só para a secretaria de Educação a gente entregou 1.200 ingressos. E teve uma oficina de dança. Aí ela deixa um benefício aqui.

Vamos adiante. Queria saber sobre a manutenção dos nossos teatros e aí, claro, vamos entrar inevitavelmente na questão do Teatro do Parque.
Que não é da secretaria de Cultura, é da Fundação de Cultura, mas já foi criado um grupo, os projetos já estão sendo desenhados. Isso aí vai para frente. Eu tenho certeza que agora o Teatro do Parque vai. É coisa para mais um ano, um ano e tanto, talvez até dois anos.

Daqui a dois anos, quando o Teatro do Parque completar cem anos, ele vai estar aberto? Vamos lá, o seu compromisso para a câmera!
Vai, vai estar aberto. É Roberto Lessa quem está encarregado disso, mas eu participo de algumas reuniões. Porque o Teatro do Parque pertence à Fundação de Cultura. Ele e o Barreto Júnior. Daqui são Teatro de Santa Isabel, Dona Lindu, Apolo-Hermilo, o de Peixinhos. Esses, fizemos um grande projeto pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), encaminhamos ao Minc (Ministério da Cultura), o Iphan liderando isso, e chegou o sinal verde de que tinham sido aprovados os projetos para restauração de luz e de som. Dinheiro do Ministério da Cultura.

Para compra de equipamentos de luz e som?
Exatamente. Eu acredito! Se eu não acreditar, o que é que eu faço?

Pensando no Teatro do Parque como um problema que vem desde a outra gestão, você não vai gostar da palavra mas, existem outras heranças malditas?
Palavrinha muito cansada. Mas não. Eu prefiro não falar sobre isso. Porque é tão contundente, que eu prefiro não falar. Vamos trabalhar, vamos colocar para frente, o pessoal de Carnaval, que diziam tanta coisa, a gente vai pagar os atrasados. Tenham paciência, porque tudo agora é emergencial!

A sua principal vertente em formação é o Centro Apolo-Hermilo? E o que você vai fazer com relação à Escola João Pernambuco?
Mas ela não pertence à secretaria de Cultura não. Pertence à secretaria de Educação. Agora, no afã da Sinfônica, falamos muito sobre ela. Acho que o maestro até ia visitá-la. Mas eu ouvi do secretário de Educação, numa conversa, que está tirando a João Pernambuco do lixo, do chão. Está levantando.

E sobre o Apolo-Hermilo?
Eu quero dar uma ênfase muito grande ao Apolo-Hermilo. A Semana de Hermilo, que há três anos não acontecia, ela nasceu muito bem, ela foi muito bem, uns quatro, cinco anos, depois ela caiu. Ela caiu e caiu para a mesmice, para a coisa medíocre e morreu. Agora Carlos (Carvalho) deu uma linha dos espetáculos populares nordestinos, ele trouxe o filé de tudo e, a partir dali, debates com teóricos, com estudiosos, com doutores, com especialistas e com os mestres populares. A gente repetiu um modelo que aconteceu com o Teatro do Estudante de Pernambuco no fim dos anos 1940. A gente voltou a reunir os mestres populares para discutir as coisas. Agora, não sei porque, público lá não foi. Quinze, vinte pessoas é muito pouco.

Falando do Apolo-Hermilo, uma das vocações do Apolo-Hermilo, por ser um centro de formação, é o de fomentar o novo…
O que você entende por novo?

É o teatro contemporâneo, instigar o novo, a produção, discutir dramaturgia.
Você não acha que o contemporâneo também se alimenta do acúmulo de experiências do que você viveu? Você transforma, você renova. Então a gente não pode excluir nada. A pauta do Hermilo está aberta para ocupação do teatro, diferente do Santa Isabel. O espaço do Santa Isabel não pode ser para um teatro experimental. Não pode ser um teatro de comunidade que vem testar. Não se estreia espetáculo no Santa Isabel. Ele é um teatro municipal, que tem características, que tem peso, um custo altíssimo, cada vez que aquela cortininha se abre. Ali só pode vir espetáculo testado já. Quando Carlos Carvalho estreou O inimigo do povo, eu disse: “de jeito nenhum. Você vá embora para os outros teatros, enxuga esse espetáculo, amadureça. Quando ele tiver vida já testada e tiver pauta no Santa Isabel você traz. Mas aqui não se pode experimentar”. Agora, o Apolo-Hermilo, não quer dizer com isso que venha qualquer porcaria, porque toda peça, há que haver uma avaliação. Não pode chegar assim. Vamos fazer das coisas um passo para a melhoria. O que você faz numa sala no seu bairro, numa garagem, você dali está caminhando, pensando em um dia levar para a cena mesmo. Para isso você tem que testar o começo, acrescentar as coisas, dominar as técnicas e capacitar o elenco. Ninguém nasce pronto, não é? Para um dia chegar lá. Agora nessa semana (Hermilo) o que eu achei formidável é que tinha espetáculos de dança contemporânea e tinha espetáculos de dança popular. Entendeu? E o debate não foi grande porque o público não dizia nada.

Uma das preocupações de Leda é com sua equipe de funcionários

Uma das preocupações de Leda é com sua equipe de funcionários

Que tipo de política cultural você está construindo? Você teria um conceito?
Eu não formulo pensamentos. Até porque vocês falam em sete meses, isso não é nada. Isso não é nada. Eu só consegui diminuir o meu gabinete, que era muito grande – do que a gente tirou, eu fiz três salas. A gente não arrumou a casa, o programa de cargos e salários dos funcionários. Arrumei umas melhorias pequenas, estou moralizando um negócio que se chama diária de evento. Diária de evento surgiu no meu tempo. Não fui eu quem inventou não, mas é do meu tempo. Para os funcionários que trabalhavam, vamos dizer, nos ciclos culturais. E trabalha, viu? O pessoal administrativo vê o dia clarear preparando pagamento. É incrível. Então há o valor de uma diária, duas, três, dependendo do quanto você trabalhou. Isso seria um nome para gratificação. Isso de tal maneira se alastrou, que entra saúde, entra tudo com diária de evento. E ela se transformou em complementação salarial. Eu chamo você para um trabalho e lhe digo: “o seu salário é R$ 1,2 mil, mas você tem de diária de evento outro pacotão. Isso não incorpora na sua aposentadoria, não incorpora em nada. Então a gente está acabando com isso. Ela voltar a ser, até haver outra possibilidade, das pessoas que trabalham mais, ganhar mais.. Mas isso é uma máquina tão ronceira, que por mais que a gente esteja tentando impregnar de prazo para poder viver… A mínima coisa! Prazo para se cumprir, ninguém cumpre! Então colocar esse negócio para a frente. Você não pode ir para casa tendo um ofício pra despachar. Volta para a tua mesa, despacha tudo, vá para casa, bote a cabeça no travesseiro dizendo: “fiz”. E transformar em servidor público um funcionário público é um processo de mutilação, às vezes, porque é muito difícil. Então não é uma frase que vai dizer o que a gente pensa. É uma constatação depois que a gente estiver fazendo. Se daqui a um tempo vocês disserem: “Leda, em que você acha que vocês mudaram?”. Que não sou eu! Ou esse bonde vai junto ou não caminha. Aí a gente hoje é uma secretaria assim, quero informatizar ela todinha, mas isso não se faz em dois meses, nem com pouco dinheiro. Agora é que eu estou colocando uma pessoa para captação de recursos. A engrenagem é muito difícil! Mesmo que todos os secretários não tenham mais do que 45 anos, é tudo gente bem jovem, mas é fogo! Eu esperneio, perco paciência, difícil, muito difícil.

Qual o seu sonho? Quando você deixar essa secretaria, o que você quer? Deitar no travesseiro e dizer: “fiz”?
Se ela puder ser democrática, se ela puder refletir a vontade do povo, sem demagogia, se ela puder criar espaço para todos os artistas terem condições de desenvolver o seu talento, o seu ofício, viver do seu ofício e ser feliz! Se a secretaria de Cultura puder contribuir para isso, eu me dou por satisfeita.

O prefeito é sensível à cultura?
Sensibilíssimo. Não é artista, mas ele é…você falou, ele diz: “não posso, agora não dá” ou diz: “vamos fazer”. Não enrola. Esse defeito ele não tem.

Muito obrigada!
Obrigada por eu ter a chance de falar nas coisas nas quais eu acredito.

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O menino da gaiola estreia neste sábado

O menino da gaiola, texto de Cleyton Cabral e direção de Samuel Santos. Foto: Ângulo cinematografia

O menino da gaiola estreia neste sábado. Foto: Ângulo cinematografia

O espetáculo O menino da gaiola, texto do ator, publicitário e dramaturgo Cleyton Cabral, estreia neste sábado, com a assinatura do diretor Samuel Santos. É uma dramaturgia que trata de temas difíceis, como o abuso sexual. No elenco, Evilásio de Andrade como o protagonista; Auricéia Fraga, Márcio Fecher, Eduardo Japiassu e Ana Souza.

Conversamos como Samuel, que esteve à frente de produções como A terra dos meninos pelados, O amor do galo pela galinha d’água, Historinhas de dentro e O circo Rataplan, sobre a peça e o seu trabalho como diretor.

Entrevista // Samuel Santos

O que você destacaria na encenação?
O texto é de uma essencialidade e coragem fundamentais para a abordagem desse quadro atual e urgente que é o universo para crianças. O menino da gaiola aqui em Pernambuco é um precursor de uma dramaturgia voltada para as questões sociais da infância, sem esconder a realidade, nem tratar essa realidade como uma fantasia paradisíaca. Vemos no sonho do protagonista – Vito – uma dimensão utópica própria do universo infantil: o de voar e ir para lugares imaginários. Só que Vito não viaja por terras distantes do faz-de-conta ou paraísos perfeitos, com animais falantes, heróis com capa e espadas. Ele faz uma viagem por dentro da realidade. Ou seja, ele sonha, mas o seu sonho o leva a passear pela realidade. Diferente do que estamos acostumados a ver, a ler a criança sonhando com castelos, príncipes e afins. Há uma inversão de paradigmas. Vito quer libertar, fazer voar os sonhos presos e oprimidos de cada um que ele encontra na sua jornada. Tudo isso de forma lúdica e poética. E, claro, destaco toda a equipe que está se doando para colocar essa montagem na cena pernambucana. Os atores entregues à proposta, as músicas compostas especialmente pela cantora Isaar, o desenho de luz criado pelo O Poste Soluções Luminosas, figurinos, cenários e produção da jovem produtora Clarisse Fraga, que inicia sua primeira produção apostando nesse espetáculo infantil nada tradicional.

A atriz Auriceia Fraga é o destaque no elenco

A atriz Auriceia Fraga é o destaque no elenco

Como o texto é levado à cena?
No texto, os personagens estão à margem da sociedade, como um mendigo que teve o rosto queimado e uma menina de sete anos que é assediada pelo padrasto. Unir esses temas delicados e melindrosos, colocando o texto numa determinada perspectiva como o autor propõe e determinar os laços que se interligam: as personagens, os cenários, os climas, as cores, os objetos e todos os elementos que o compõem, leva a encenação a buscar um conceito que não prendesse e nem tão pouco deixasse os elementos em fragmentada desordem. A escolha recorre sobre: voo/liberdade. Sobre o onírico o lúdico. Cada elemento visualizado e sonorizado na encenação terá um despojamento cênico peculiar ao conceito. Ou seja, os elementos serão soltos na sua execução e na sua transição de cena. Redes, gaiolas, sofá, tecidos, adereços entrarão e sairão de cena de forma lépida. Os cenários não serão fixos, eles vão entrando conforme o tempo, espaço e a geografia da cena. Antes de qualquer forma concretizada nos elementos cênicos da peça o conceito está implícito, ele vem a partir do interno dos atores. A encenação não optou em suavizar os temas propostos, há uma seriedade e serenidade na proposta, porém essa seriedade é envolta em muita poesia e dentro do jogo lúdico, pois nossa intenção primordial não era fazer do espetáculo um programa de auditório ou “Tatibitati”.

Qual a marca do seu trabalho como diretor e, especificamente, neste espetáculo?
O ator e a poesia. O ator no sentido de nunca esquecê-lo e a poesia por entender que ela é essencial ao teatro. Num dos ensaios de O menino da gaiola, um dos meus atores disse que eu era muito exigente. Mas ele disse sem nem travo ou ranço de que estava sendo oprimido, pois a minha exigência, meu rigor era sem o grito, sem a violência. Era estar atento ao ator em cada detalhe: emoção, gesto e voz, no seu comportamento na cena. E no Menino acredito que o público verá essa minha marca. Meu olhar é de atenção, preocupação com a linguagem tanto para crianças como para adultos. Meu olhar é de insatisfação, esmero, inquietude, reflexão. Meu olhar para essa montagem está mais maduro, ao mesmo tempo infante, pois o que tento reproduzir no teatro não é o olhar do adulto Samuel Santos, mas do Samuca, a criança Samuca, que tenta fazer do teatro uma forma de aventurar-se e refletir.

O menino da gaiola
Quando: sábados e domingos, às 16h, até 4 de agosto
Onde: Teatro Apolo (Rua do Apolo, 121, Bairro do Recife)
Quanto: R$ 10 e R$ 5 (meia-entrada)
Informações: (81) 3355-3320 / 3321
Indicação: 7 anos

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“No meu palco vazio existem muitos mortos”

Ikiru - Um réquiem para Pina Bausch. Fotos: Renata Pires/divulgação

Ikiru – Um réquiem para Pina Bausch. Fotos: Renata Pires/divulgação

O bailarino japonês Tadashi Endo nos faz experimentar muitas sensações através da sua dança, do duelo entre a delicadeza e a força das imagens que constrói com o corpo no palco. Tadashi é um dos discípulos de Kazuo Ohno, criador do butoh ao lado de Tatsumi Hijikata. Desde 2002 vem regularmente ao Brasil, principalmente a convite do LUME Teatro, de Campinas. Já fez algumas temporadas pelo país, mas só chegou ao Recife semana passada, para apresentar o espetáculo Ikiru – Um réquiem para Pina Bausch. No solo, Tadashi trata de vida e morte; lembra Pina, Michael Jackson (de quem era fã: “ninguém consegue dançar como ele) e Kazuo Ohno. Dança com os mortos e, mais do que isso, consegue trazê-los de volta – ao menos sentimentalmente. Esta é a primeira parte de uma conversa que Tadashi teve com jornalistas na véspera da sua estreia no Recife, na Caixa Cultural.

Entrevista // TADASHI ENDO – Parte I

Bailarino japonês fez quatro sessões com ingressos esgotados na Caixa Cultural

Bailarino japonês fez quatro sessões com ingressos esgotados na Caixa Cultural

Butoh
Nos anos 1950, o butoh era mais um protesto contra a americanização do teatro e da dança japonesas. E nós fazíamos muito mais happenings. Isso significa que este tipo de manifestação contra alguma coisa não era como dança. Depois, Tatsumi Hijikata, o fundador do butoh, descobriu especialmente o corpo do japonês e a vida do japonês. Se nós dançamos, geralmente toda a educação de dança vem do balé clássico. O exemplo típico é um tipo de beleza, um tipo de luz, suave, mais branca e alta, todas essas direções positivas. O butoh é exatamente o oposto, porque a nossa vida existe muito mais com problemas, é muito mais suja, feia. E é preciso descobrir isso com o nosso corpo; não apenas do lado iluminado, mas também do outro lado, entre os dedos, atrás da orelha, debaixo do queixo, no pescoço. Isso é muito importante para o butoh, especialmente o nosso corpo. A nossa criação de dança começa no nosso corpo e dentro do nosso corpo. Se falamos em espaço, a dança contemporânea usa o espaço através das linhas diagonais, retas, verticais, circulares. Esse espaço para o butoh existe dentro do corpo, entre as costelas, entre os dedos. Esse espaço chamamos de cosmos. Estamos dentro de um grande cosmos, mas isso aqui (aponta para o corpo) é cosmos, é universo. Então a paisagem do corpo pode dançar – e algumas vezes acontecem terremotos e algumas vezes tsunamis, cachoeiras. Tudo isso acontece dentro do corpo. Esse espaço é muito importante e é o ponto principal do butoh.

Teatro ocidental x teatro oriental
Essa distinção é importante, mas temos que pensar em dois pontos diferentes. Um é, por exemplo, se você fala em teatro noh, kabuki, bunraku, que são manifestações tradicionais de teatro e dança do Japão, eles ainda são exóticos para os estrangeiros. Mas o butoh veio do Japão e, especialmente, a dança do butoh é para o corpo japonês. Isso foi no começo. Mas agora mais pessoas fora do Japão dançam butoh – no Brasil, no México, na Argentina, na Europa, na África. As pessoas dançam butoh. Mas no Japão, isso acontece mais ou menos. O butoh não é popular. Se você perguntar aos japoneses sobre o butoh, eles não sabem. O butoh veio do Japão, mas agora as sementes do butoh foram espalhadas em tantos lugares e estão surgindo flores dessas sementes. É claro que não é algo que podemos dizer que é uma dança japonesa apenas. Mas para mim é importante. Eu moro na Alemanha e trabalhei com muitos não-japoneses: europeus, americanos, brasileiros, mas trago o espírito do butoh para eles, não o estilo do butoh. Então desejo o butoh brasileiro. Há dois anos trabalhei em Salvador com um grupo afro-brasileiro. Então era butoh afro-brasileiro. Porque não? Os corpos são diferentes, eles são negros, a energia é diferente. Mas a Bahia não é somente alegria…há outro espírito. Isso é interessante. Mas se as pessoas imitam o butoh japonês, há algo errado. Esse não é o meu desejo.

Tadashi Endo é um dos discípulos de Kazuo Ohno

Tadashi Endo é um dos discípulos de Kazuo Ohno

Trabalho
Eu tive muita sorte de vir para o Brasil e, da primeira vez que fiz o meu solo e dei um workshop, de começar a trabalhar com o LUME Teatro. E eu fiquei muito surpreso porque eu pensei antes de vir ao Brasil, claro que era muito clichê, eu imaginava o Brasil: sol, Copacabana, capoeira, samba, caipirinha, uma terra da felicidade. Mas quando comecei a trabalhar: “oh, eles também tem um lado negro, muito sensível da vida”. Não é só energia. E então descobri que em cada país existe esse tipo de sensibilidade, um pouco, não uma coisa sentimental, mas um lado negro solitário, único. Mas eu não quis fazer butoh japonês com as companhias brasileiras. Quis pegar mais delas, de cada vida diferente, de cada estilo diferente e, depois, vamos todos dançar sobre a base do butoh. Essa é a ideia. Venho para o Brasil desde 2002 quase todos os anos. O Brasil agora é quase a minha segunda casa, mas ainda não consigo falar português. Para mim, o Brasil é um país muito importante. Dependendo do país, se você trabalha no Brasil, México, Europa, você precisa conhecer primeiro o estilo de vida, não o estilo de dança, ou como eles dançam. A dança contemporânea brasileira, ou européia, ou japonesa, é quase a mesma, mas a vida é diferente e, se você entender esse ponto, então você pode colocar o espírito do butoh em diferentes estilos de vida. Por exemplo, o sentimento de tempo. O sentimento de tempo aqui no Brasil é muito diferente. No Japão, por exemplo, o tempo é muito preciso. No Brasil você espera 30 minutos, é algo normal. E o trem chega pontualmente no Japão, na Europa também e aqui no Brasil, se estiver um pouquinho atrasado, você não vê problema. Mas os brasileiros aproveitam a vida muito mais do que um alemão ou japonês, isso é o que eu acho. Porque nós temos que organizar tudo da nossa vida e morrer? Por que não curtir mais? Esse sentimento eu tenho especialmente no Brasil.

Manifestações no Brasil
Mais um ponto que eu quero falar: sobre as manifestações no Brasil. Quando eu estava em Fortaleza, todos os dias eu tinha que me apresentar, mas todos os dias, milhares de pessoas estavam nas ruas e também houve violência. Eu gosto de ver futebol e o Brasil é o principal país do futebol, o futebol brasileiro é tão popular. Mas nesse país vi tantos problemas. Prefiro parar a Copa do Mundo ou a Copa das Confederações e então começar a pensar: o que é realmente importante para nós? Esse ponto inicial podemos achar agora se fizermos mais. Eu tive sentimentos parecidos dois anos atrás quando houve o tsunami e aquela tragédia nuclear em Fukushima, um completo desastre. E o Japão foi o único país que recebeu uma bomba atômica. Porque o governo japonês não parou esse momento todos os reatores nucleares do país? A Alemanha parou. Mas outros países estão criando reatores nucleares novamente. Porque não podemos mudar desde a nossa base? Foi uma grande chance, mas isso não aconteceu. Eu estou muito desapontado, com raiva…Isso não está diretamente conectado com a minha dança do butoh, mas num ponto sim: em todo tempo, você precisa ser radical. Isso para um bailarino de butoh também. Eu crio algo e depois destruo. Nunca estou feliz com a minha peça. Não quero ficar feliz. Quero mais, mais, nunca parar. Do contrário, me torno muito preguiçoso e paro.

Espetáculo homenageia Pina, Michael Jackson e Kazuo Ohno

Espetáculo homenageia Pina, Michael Jackson e Kazuo Ohno

Pina Bausch
Pina Bausch e Kazuo Ohno eram bons amigos. Minha relação com Pina era realmente mais privada. Nunca aprendi com ela a dança-teatro e também nunca segui exatamente o trabalho dela. Mas eu a encontrei algumas vezes em festas e eram festas bem privadas porque as festas eram organizadas por Pina para Kazuo Ohno e quando Kazuo Ohno foi para a Europa, eu estava o tempo inteiro com ele como um assistente. E então nós bebemos juntos, fumamos, ela era uma fumante inveterada, o tempo todo fumando. E o carisma dela era tão maravilhoso; ela era famosa no mundo inteiro, mas nunca se mostrou: “eu sou uma grande bailarina” ou falou sobre outros bailarinos. Não, sempre muito tímida. Mas quando ela viajava, para Turquia, Japão, Israel, para qualquer lugar, em cada país diferente, ela criava diferentes peças. Porque ela me disse, como eu disse agora sobre Brasil, você tem que saber quem mora naquele país e não começar a trabalhar como bailarino. Coloque a vida deles na dança. E por essa razão normalmente quando ela começava, os trabalhos não tinham título, porque como você pode chamar a sua vida no Brasil? Ou no Japão? Eu não sei. A morte de Pina foi um grande choque para mim. E, quatro dias depois, Michael Jackson morreu. Também foi um grande choque. Eu amo Michael Jackson. Eu vi o show dele em Hanôver, num grande estádio de futebol. Fui com minha mulher e meu filho e nós estávamos no campo, em pé, em frente ao palco. Antes do show começar, houve um blecaute. E então uma grande luz. Michael Jackson estava no topo de uma estrutura e estava ventando. Por duas horas fiquei tão fascinado, os movimentos, a voz, a luz, tudo era perfeito. Então nós perdemos nosso filho. Meu filho tinha nove anos e olhei: “oh, droga! Milhares de pessoas. Nós perdemos nosso filho!” Mas, de novo, Michael Jackson, esqueci completamente meu filho. Quando o show terminou, achei um guarda e perguntei se ele tinha visto meu filho. Meu filho naquela época era muito fã de Michael Jackson, dançava um pouco de break, tinha um boné vermelho e luvas brancas. Nós achamos nosso filho. Onde estava meu filho? Ele estava no palco, ao lado do palco e ele estava tão feliz, sorrindo. “Papai, eu vi Michael Jackson a cinco metros de distância”. “Como você veio para o palco? É impossível”. “Dois seguranças, quando teve o blecaute, as pessoas começaram a vir para frente, era perigoso. Então os seguranças me colocaram no palco”. Os seguranças foram embora e meu filho não sabia o que fazer. Ficou o tempo todo no palco! Eu fiquei com tanta inveja! Gosto do Michael Jackson por causa da sua perfeição e uso algumas vezes suas músicas, seu ritmo, mas não posso dançar como Michael Jackson, ninguém pode. Mas eu quero capturar esse sentimento. E em Ikiru, eu queria dizer muito obrigado a Pina Bauch porque você me deu muita energia, e ambição, e coragem. Ela nunca me ensinou, nunca tive uma aula com ela. Mas se você conhece Pina, você entende mais do que técnicas de dança e por essa razão eu queria dizer, obrigado Pina. Mas depois que criei essa peça, também quero agradecer a Kazuo Ohno e a muitos mortos: obrigado Michael Jackson. Muitas pessoas que já morreram me ajudaram. Quando danço, é sempre uma homenagem a muitas pessoas que já morreram, não só Pina Bausch, mas Kazuo Ohno, e também meu irmão mais novo. E se eu sinto que continuo vivo, tenho que me tornar mais forte. Essas pessoas mortas me ajudaram nesse caminho. Claro que o público é importante, mas normalmente quando danço, no palco, tudo é vazio. Mas porque danço? Por causa do sentimento, da alma. Do contrário, meu movimento de dança é só técnica, movimentos técnicos. No meu palco vazio existem muitos mortos. E isso é o que eu sinto especialmente em Ikiru.

Demonstração de trabalho – No sábado, para uma plateia de bailarinos, atores, diretores, professores e jornalistas, Tadashi Endo fez uma demonstração de trabalho. Gravamos um trechinho:

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Um encontro com Boal

Augusto Boal.

Augusto Boal

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Teatro do Oprimido pode ser realizado em qualquer parte do planeta, visto que em toda parte há seres humanos e também há opressão

 

É um método de descoberta do desejo e de ensaio de realização deste desejo.

Ele surgiu em São Paulo, no início dos anos 1970. No princípio chamava-se Teatro Jornal.

Na Argentina tive uma experiência  com o Teatro Invisível, que é uma forma de utilizar o teatro dentro da realidade sem revelar que é teatro
A censura se dá de duas formas. Uma delas é a policial, usada no regime autoritário no Brasil.  A outra – tão ruim quanto – é aquela que se dá na forma da sedução.
Isso é o padrão de censura dominante no Brasil. É a coerção pelo poder econômico.
São as empresas que determinam o que pode ser feito e o artista não está livre para fazer suas experiências.
O que ocorre no Brasil é a privatização da cultura. O patrocinador vê a produção artística como parte de seu projeto de marketing.
Isso vai torna a arte asséptica. O que os patrocinadores geralmente querem é reproduzir um mundo velho, já conhecido e aprovado.
O pressuposto de que cultura tem de dar lucro é dos neoliberais.
A cultura tem que ser subsidiada.
O lucro da arte se dá de outro jeito. Enriquecendo a forma de pensar do espectador. É um lucro do crescimento humano, de um valor muito difícil de ser medido já que não se trata de uma mercadoria vulgar.
A arte faz o homem mais rico

 

Augusto Boal e o Teatro do Oprimido em Paris, 1975. Cedoc-Funarte

Augusto Boal e o Teatro do Oprimido em Paris, 1975. Foto: Cedoc-Funarte

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Augusto Boal era puro amor ao teatro. Um  mito. Uma bússula.  Um libertário que apostava  que essa arte aparentemente tão frágil poderia mudar o mundo, fazer a revolução.

Lembro do teatrólogo com um sorriso sempre aberto e entusiasmo pela vida que contagiava seu interlocutor. Ele veio ao Recife para um encontro e eu tive o prazer e a honra de passar algumas horas ao seu lado, ouvindo suas ideias. Sua sede por justiça. Sua fome de oportunidades para todos.

Boal faz falta.

A entrevista abaixo foi publicada em 20 de setembro de 2000, no Diario de Pernambuco.

 

Augusto Boal

Augusto Boal esteve no Recife em 2000, durante a Conferência Internacional Mudança de Cena II

O teatrólogo Augusto Boal foi tratado como sujeito de extrema periculosidade pelo regime militar. Foi preso, torturado e exilado em 1971. Nessa temporada forçada no exterior, criou técnicas de teatro. O Teatro do Oprimido foi lançado em 1974, traduzido para dezenas de idiomas e até hoje é uma publicação bem vendida. O livro reúne experiências do autor/diretor com o teatro invisível, quando o espectador participa do espetáculo e de técnicas para colocar no centro da cena quem está à margem. O seu método é praticado em mais de 70 países em todo mundo. Boal sempre lutou por um mundo mais justo para todos. Figura central do Teatro de Arena nos anos 1950 e 1960, em São Paulo, ele fez espetáculos como Arena conta Zumbi. O dramaturgo, que lançou recentemente sua autobiografia, Hamlet e o Filho do Padeiro, da editora Record, chega hoje ao Recife para participar da conferência internacional Mudança de Cena II.

ENTREVISTA // Augusto Boal

Como o senhor vê o atual momento do teatro brasileiro, dominado pelo besteirol e pelas constantes reclamações dos artistas e público de que o teatro brasileiro vai mal?

Augusto Boal – Vai de mal a pior. O teatro segue o País que vai de pior em pior, como dizia a canção do João do Vale. Hoje nós vivemos escravos em um País escravo. Não nos damos conta disso porque se trata de uma nova forma de escravidão, na qual os senhores são invisíveis – FMI, bolsa de NY, Hong-Kong, bancos internacionais. Onde estão? Não os vemos, mas somos escravos porque o que caracteriza a escravidão é a total ausência de livre arbítrio – nós não temos mais livre arbítrio, os brasileiros não podem decidir o que fazer com um salário mínimo de 151 reais, com o pagamento mensal de um bilhão e 500 milhões de dólares de juros e serviços da dívida externa. Sobram as migalhas. Dana-se a educação, a saúde, a cultura. Enquanto o Brasil não se libertar desse jugo odioso, o teatro irá sempre mal, de mal a pior… A privatização da cultura faz com que muitos artistas estejam deixando de ser donos de suas vozes para se transformarem em vozes dos seus donos. É triste.

Hoje, o senhor faria revisões à metodologia do Teatro do Oprimido?

Boal – Não são necessárias. O que é necessário á incluir novas técnicas que dêem conta de novos problemas. O método é o mesmo, mas nestes quase 30 anos tem sido constantemente enriquecido: teatro imagem, teatro fórum, teatro invisível, arco-íris do desejo, teatro legislativo. Nada disto é inútil, precisamos apenas saber em que momento usar uma técnica ou uma outra. T.O. não é moda nem modismo: é método mesmo, método de pensar, forma de inventar.

Como o senhor identifica os trânsitos possíveis entre a arte e a realidade brasileira?

Boal – A arte é uma representação do real, não é o real. Como tal, de algum ponto no mundo essa representação é feita – isso mostra que o artista está localizado em algum lugar e vê o mundo – por isso, toda arte é sempre política. Além do mais, ao contrário da pintura, por exemplo, que representa um instante do real, o teatro representa o movimento desse real. Maior ainda a nossa responsabilidade: O que mostrar? Para onde vai o mundo e para onde poderá ir?

“O teatro é uma forma de se entender a dor, dominá-la. Fazemos teatro para sermos maiores que a dor”. Este é um poético conceito do senhor sobre o fazer artístico e até das motivações da opção pela arte. Quando isso pode se materializar?

Boal – Qualquer ato artístico criador concretiza esse sonho. Ser artista é ser humano. Ser humano é ser capaz de transformar o mundo. É verdade que uma boa parte da humanidade está desumanizada, mas ainda existem muita gente que respira, vive, trabalha para que o mundo – principalmente o Brasil e outros países igualmente miseráveis no que se refere à sua população – se transforme!

O mundo de hoje está numa maré de despolitização. O individualismo é a principal tendência em todos os segmentos. Como é possível fazer conexões com as utopias de uma sociedade mais justa para todos diante da globalização, que continua impondo a exclusão?

Boal – Existem dois sonhos: O que substitui a realidade e o que é posto à nossa frente para que alcancemos a mudança. Nada se pode mudar se não for antes sonhado. Chame-se a isto utopia, pouco importa – é o sonho bom. O mau é quando vemos o povo olhando TV e vendo na tela a mesa farta enquanto que em sua casa nem sequer tem mesa, menos ainda comida; na tela, felicidade e piscinas de água quente; na casa do telespectador, nem água corrente nem felicidade.

Nas décadas de 1960 e 1970 a discussão das relações entre política e teatro animavam o fazer teatral no Brasil. Como este debate pode ser feito atualmente?

Boal – Através da ação. Fazendo Teatro do Oprimido, por exemplo.

As técnicas do Oprimido foram adotadas em várias cidades do mundo. A que o senhor atribui o sucesso internacional do seu método?

Boal – Ao fato de que é verdadeiramente um método democrático e não uma cartilha, não um catecismo. É socrático e sinceramente pergunta, interroga, quer saber e não ordena, não força ninguém a fazer o que talvez não possa. É criativo, é saudável, é terapêutico, é divertido. Como não fazer sucesso no mundo inteiro se assim é? Hoje, o T.O. se pratica em mais de 70 países do mundo.

O senhor tem uma agitada agenda internacional. O que o público de outros países questiona nas suas conferências?

Boal – Dialogamos. Os temas que os participantes em qualquer país sempre querem tratar são principalmente: a opressão da mulher, o racismo, e a falta de dinheiro, emprego, etc.

Como o senhor vê a política no Brasil nesse final de século?

Boal – Precisamos lutar por uma nova abolição. Basta de escravidão! Eu me sinto como Bolívar: sou (somos!!!) lavradores do mar – tudo o que fizemos ficou por fazer. O Brasil se libertou do colonialismo português e caiu sob o domínio feroz e humilhante da globalização atual.

Qual sua expectativa sobre o futuro? O senhor é otimista?

Boal – Acredito no trabalho, na luta, na criatividade, na solidariedade, no trabalho conjunto, acredito em tudo que é bom. Sou otimista sim, mas não sou bobo!

Qual o seu sentimento sobre a “globalização cultural”?

Boal – Querem nos transformar em robôs, em clones, em ovelhas Dolly, em números. Querem nos arrancar nosso nome. E eu quero que cada um de nós seja capaz de dizer “eu” para que possa logo depois dizer “nós”! Quero a unificação de todos os que lutam e os globalizantes querem a uniformização, isto é, a destruição da identidade!

 

Boal protagonizou debates contra a opressão

Boal protagonizou debates contra a opressão

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Só depois de concluir o curso de química na Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1950 é que Boal foi atrás de sua formação teatral. Ele estudou teatro na Universidade de Columbia , em Nova Iorque, foi aluno de John Gassner e assistiu aulas do Actor’s Studio.

Após esse aprendizado tornou-se diretor e dramaturgo e depois teórico teatral.

No Teatro de Arena, Augusto Boal, Gianfrancesco Guarnieri e José Renato protagonizam uma revolução cênica a partir do pensamento. Boal dirigiu clássicos da dramaturgia mundial de Molière, Lope de Vega, Gogol, Maquiavel. Colocou em cena o homem comum, em montagens como Arena Conta Zumbi e Arena Conta Tiradentes.

Na Argentina ele criou a estrutura teórica dos procedimentos do Teatro do Oprimido.

 

Ele retornou de vez ao Brasil em meados da década de 1980.

Montou:

O Corsário do Rei (1985), texto de sua autoria com música de Edu Lobo e letras de Chico Buarque;

Fedra (1986), de Racine, com Fernanda Montenegro no papel-título.

 

Em 2009, ano de sua morte, foi nomeado embaixador mundial do teatro pela UNESCO.

 

Espetáculos de Augusto Boal no Teatro de Arena

1956. Ratos e Homens. De John Steinbeck. Direção: Augusto Boal.
1957. Juno e o Pavão. De Sean O’Casey. Direção: Augusto Boal.
1957. Marido Magro, Mulher Chata. Texto e direção: Augusto Boal.
1958. A Mulher do Outro. De Sidney Howard. Direção: Augusto Boal.
1959. Chapetuba Futebol Clube. De Oduvaldo Vianna Filho. Direção: Augusto Boal.
1959. A Farsa da Esposa Perfeita. De Edy Lima. Direção: Augusto Boal.
1959. Gente como a Gente. De Roberto Freire. Direção: Augusto Boal.
1960. Revolução na América do Sul. De Augusto Boal. Direção: José Renato.
1960. Fogo Frio. De Benedito Ruy Barbosa. Direção: Augusto Boal.
1961. Pintado de Alegre. De Flavio Migliaccio. Direção: Augusto Boal.
1961. O Testamento do Cangaceiro. De Chico de Assis. Direção: Augusto Boal.
1962. A Mandrágora. De Maquiavel. Direção: Augusto Boal.
1963. O Melhor Juiz, o Rei. De Lope de Vega. Direção: Augusto Boal.
1963. O Noviço. De Martins Pena. Direção: Augusto Boal.
1964. Show Opinião. De Armando Costa, Oduvaldo Vianna Filho, Paulo Pontes e Augusto Boal. Direção: Augusto Boal.
1964. Tartufo. De Molière. Direção: Augusto Boal.
1965. Arena Conta Zumbi. De Augusto Boal e Gianfrancesco Guarnieri. Direção: Augusto Boal.
1965. Tempo de Guerra. De Gianfrancesco Guarnieri e Augusto Boal. Direção: Augusto Boal.
1966. O Inspetor Geral. De Nikolai Gogol. Direção: Augusto Boal.
1966. A Criação do Mundo Segundo Ary Toledo. De Augusto Boal e Guarnieri. Direção: Augusto Boal.
1967. Arena Conta Tiradentes. De Augusto Boal e Guarnieri. Direção: Augusto  Boal.
1967. O Círculo de Giz Caucasiano. De Brecht. Direção: Augusto Boal.
1967. La Moschetta. De Angelo Beolco. Direção: Augusto Boal.
1968. Mac Bird. De Bárbara Garson. Direção: Augusto Boal.
1968. Primeira Feira Paulista de Opinião. Vários autores. Direção: Augusto Boal.
1968. Sérgio Ricardo na Praça do Povo. Texto e direção: Augusto Boal.
1969. Chiclete e Banana. Texto e direção: Augusto Boal.
1969. O Comportamento Sexual Segundo Ary Toledo. Direção: Augusto Boal.
1970. Arena Conta Bolívar. Texto e direção: Augusto Boal.
1970. A Resistível Ascensão de Arturo Ui. De Brecht. Direção: Augusto Boal.
1970. Teatro Jornal Primeira Edição. Vários autores. Direção: Augusto Boal.

 

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Quando teatro era resistência

Paulo José. Foto: Pollyanna Diniz

Paulo José. Foto: Pollyanna Diniz

Foram duas horas de conversa. Não lembro exatamente qual era o teatro em Curitiba, mas ficava afastado do Centro. Fui ver Murro em ponta de faca e pedi uma entrevista. Gentil, ele disse que me atenderia na tarde do dia seguinte, antes da nova sessão do espetáculo.

Paulo José faz parte da história do teatro brasileiro – e, definitivamente, essa não é só uma frase de efeito. Ele, Augusto Boal, Vianinha, José Renato Pécora, Gianfrancesco Guarnieri. Um tempo em que o teatro era, muito mais do que hoje, atividade de resistência. O que o Arena, o Centro Popular de Cultura (CPC) queriam era, além de levar ao palco a realidade dos trabalhadores, da exploração, do capitalismo, discutir sobre os processos históricos que determinavam essa realidade, sem que isso significasse um teatro chato – muito pelo contrário.

Como Murro em ponta de faca, peça que tem direção de Paulo José, faz curta temporada no Centro Cultural da Caixa desta quarta-feira (6) até o próximo sábado, resolvi resgatar essa entrevista com o ator, diretor e dramaturgo, realizada em 2011, no Festival de Curitiba.

Entrevista // Paulo José

Qual a diferença de dirigir Murro em ponta de faca em 1978 e em 2011?
Esta versão agora nos dá a possibilidade de mergulhar no personagem. Naquele momento, tudo tinha acontecido. Era muito mais ebulição do que razão. Hoje a peça intriga, provoca, dá vontade de conhecer mais da época. É saber o princípio, a origem desse mal. Na época, o sucesso dela, o encontro dela com o público, era natural por causa das circunstâncias, da luta pela anistia, da campanha Tortura nunca mais. Não precisava nenhuma teatralidade especial. Poderia ser quase uma leitura. Agora é mais profundo, estamos menos presos à superfície, ao aparente. E são muitas as referências a coisas que aconteceram naquela época, que não necessariamente as pessoas sabem hoje. Há uma referência clara, por exemplo, ao chileno Víctor Jara (professor, diretor de teatro, poeta, cantor, compositor, músico e ativista), que teve as mãos cortadas. É cheio de referências também ao Marighella (Carlos). Apesar de que, no Brasil, a ditadura foi menos dura do que na Argentina e no Chile. Os militares aqui tinham origem de classe média, classe média baixa. Em muitas situações, eles se encontravam tendo que reprimir a própria família. Diferente do exército argentino, que tinham inimigos de raízes. Aqui, os militares se viam às voltas com parentes presos, tendo que resolver “pepinos” familiares.

É a segunda vez que Paulo José dirige texto de Boal

É a segunda vez que Paulo José dirige texto de Boal

Como você enfrentou a ditadura. Mesmo não tendo sido exilado, teve essa sensação aqui mesmo?
Claro! Eu era do Teatro de Arena. E a peça que estava em cartaz na época do golpe era O filho cão. Era do Guarineiri (Gianfrancesco) e eu dirigia e atuava. A polícia foi lá para fechar o teatro. Mas nós escapamos todos. Guarnieiri e o Juca de Oliveira foram para Bolívia. Augusto Boal foi para uma fazenda. Fiquei na casa de Cacilda Becker, que morava numa cobertura, esquina com a Avenida Paulista. Fiquei lá um mês. Depois de 15 dias na Bolívia, o Guarnieri e o Juca decidiram voltar. Disseram que preferiam morrer. Depois disso, o Boal foi preso, torturado. Éramos privados da liberdade de ir e vir, de todos os bens, de qualquer conforto que o dinheiro pudesse dar, dos teus discos, filmes, instrumentos musicais. Esse sentimento não tem idade. E hoje as pessoas, noutra situação, também são desprovidas de tudo. Mas naquela época, essas pessoas iam para a Sérvia, para a Croácia. Ficavam sem dinheiro, precisavam da família no Brasil. Mas mandar dinheiro também não era fácil. Então, às vezes, era fome, necessidade mesmo. Era uma indignação, uma vergonha, a gente ser tutelado por imbecis. Apresentar uma peça para a censura, para que eles dessem o parecer. Pessoas desqualificadas, ignorantes. Às vezes a gente colocava, por exemplo, um palavrão na peça, só para poder negociar. Porque eles iam implicar com aquilo e deixavam outras coisas passar. Os policiais entravam na tua casa. Os livros perigosos ficam no fundo falso do guarda-roupa. Lembro de perguntarem que eram Aristófanes.

O Boal chegou a ver a peça sendo encenada? Qual a importância dele para o nosso teatro?
O Boal escreveu no exílio. E quando voltou em 1983, acho (na realidade, 1986), a peça já tinha sido encenada. O Boal era devotado ao teatro. Enquanto nós éramos “adúlteros”, namorávamos o cinema, a tv, ele era fiel. Quem sustentou o Arena foi o Boal, por mais de dez anos. Nós íamos para o TBC, para o Oficina. Mas o Boal estava no Arena.

Falando nisso, atuar na televisão, cinema ou teatro é a mesma coisa?
São formas diferentes de trabalhar, mas não há dificuldade. Tenho preferência por cinema e teatro. A televisão é redundante, não é muito inovador. A comunicação é horizontal. Se todo mundo tem que entender, o foco é menor. No teatro, se uma pessoa entender, tudo bem. A programação da televisão também tende a ter um discurso homogêneo, desde a manhã ate a hora que acaba. E o meio se transforma na própria mensagem.

A música é importante? Neste trabalho, o senhor está “brincando” no teclado…
Sempre trabalho com música. Gosto muito, por exemplo, do trabalho do Galpão, porque é muito musical, porque todos tocam. Gosto muito do teclado, mas eu não toco mesmo, por causa do Parkinson. Até para escrever no computador é difícil. Quero digitar uma tecla e vou para outra.

Como foi a descoberta de que tinha a doença e lidar com isso?
Foi em 1992. Uma doença degenerativa, progressiva e irreversível. Foi o que me disse o médico. Ele estava lá, receitando o remédio e eu perguntei “por quanto tempo vou tomar?”. “Durante toda a vida”, ele me disse. E aí, olhando para ele, um homem quase careca, perdendo o cabelo, descobri que ele também tinha o Parkinson dele: o envelhecimento. Que é progressivo, irreversível, degenerativo. A diferença é que eu tinha a certeza que ia morrer e ele não. Como se fosse eterno. Você passa a ter limitações, mas você descobre outras coisas, a introspecção, a concentração. Passei a escrever bem. A minha acuidade musical aumentou. Os meus sentidos foram aguçados. Cada um tem o seu Parkinson. E eu tenho 74 anos, já estou fora da garantia. É só manutenção, não troca mais peça nenhuma.

Mas quais são os cuidados?
Remédios. E hoje faço aula de voz, ginástica, hidroginástica.

Você já fazia ginástica?
Não! Ginástica faz mal! (Risos) Queima! Nunca fiz. Fazia exercício, mas tinha que ser prático, com bola, ou andar a cavalo.

Tem medo da morte?
Não tenho medo. Mas você tem que se preparar bem. As pessoas morrem mal porque não se preparam. São surpreendidas. Estou procurando deixar um testemunho pessoal das coisas que fiz. Estou passando a limpos coisas que escrevi para publicar. Cadernos de direção, de cinema. Dei aula de cinema em Cuba, por exemplo. Na Globo, dei aula para diretores e atores.

Nas duas últimas peças em que você esteve envolvido, você trabalhou com as suas filhas (Um navio no espaço ou Ana Cristina César e Histórias de amor líquido). É diferente? E o seu trabalho de direção também tem sido diferente com o tempo?
Acho que não…Cada peça tem suas exigências, necessidades. Mas a diferença que é estou ficando calmo, sossegado, não fico sofrendo. Até porque percebi que é só uma peça de teatro, tem limites previamente estabelecidos. Então fico mais calmo, tranqüilo. O que me interessa no teatro são as relações humanas, é ajudar a desenvolver potencialidades nos outros. E as pessoas me ouvem, me respeitam. Então me aproveito disso. Eu “chupo” o sangue destes atores jovens, a energia deles para mim.

Vamos falar de televisão. Como é o próximo papel?
É nessa novela nova..Morde e assopra. Entro e fico até o fim da novela. Representa o amor na terceira idade. É o Plínio. Ele volta para a cidadezinha onde tinha deixado a namorada. Gosto de trabalhar como ator. Tenho contrato com a Globo desde 1969. Então tenho que fazer algo de vez em quando. Faço a novela..aí passo mais algum tempo fazendo teatro e cinema.

Falando em cinema…o que o senhor acha da produção pernambucana?
Ah…o Cláudio Assis, o Lírio Ferreira, já estão consagrados, sabem fazer. Cláudio Assis é um louco! Aspirinas e urubus é um filme muito bom. Tem baianos também muito bons no cinema. Meu próximo papel é no filme Palhaço, de Selton Mello, que deve ser lançado em maio. É um filme autoral, que o Selton escreveu, produziu. Temos uma safra muito boa.

E deixa eu perguntar…o que o senhor acha da ministra Ana de Hollanda?
A linhagem é boa…é filha de Sérgio Buarque, de uma família que tem respeito pela cultura. Mas está apenas começando…Mesmo o governo da Dilma ainda é muito cedo. Já percebemos que ela tem diferenças de Lula, mas ainda é cedo…

Uma pergunta clássica: algum papel que gostaria de fazer e ainda não teve oportunidade?
Tem personagens da literatura, personagens reais, que a gente gosta. Mas eu não estou sofrendo com isso. Tenho tanta coisa para fazer sempre!

E vai fazer teatro até quando?
Até morrer!

Não existe aposentadoria para o teatro?
Não existe! Até porque, no teatro, tem papel para todo mundo, independentemente da idade. Aos 90, ainda terão papeis que são ideais pra mim.

Montagem faz curta temporada no Recife

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