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Angu de sangue, de graça, no Arraial

Fábio Caio em Angu de sangue. Foto: Divulgação

Já faz tempo que estreou Angu de sangue, o espetáculo que marcou o lançamento do Coletivo Angu de Teatro. Sete anos, acho. De lá pra cá, foram montadas mais duas peças (Ópera, com texto de Newton Moreno e Rassif- mar que arrebenta, texto do mesmo Marcelino Freire de Angu). As três com direção do encenador, figurinista e cenógrafo Marcondes Lima. Atualmente, o grupo ensaia a quarta encenação, Essa febre que não passa, com texto da jornalista Luce Pereira e direção do ator e produtor André Brasileiro, que faz sua estreia na função de encenador.

Marcelino avisou… “nem arroz, nem feijão, nem bife. em meu jantar de ontem foi servido angu. puro e seco. quer dizer, com um pouco de sangue. é, sangue. esse que corre nas veias, sabe?”

E dessas coisas que correm nas veias a trupe denunciou, explorou, projetou que a miséria está em qualquer parte. A solidão, a violência, a exclusão, a dor estão soltas por aí. As pessoas não conversam ou não se entendem.

Angu de sangue é baseada em contos do livro homônimo e de Balé ralé, ambos de Marcelino Freire.

É dividido em quadros. Da história de um menino de rua assassinado em faz de conta que não foi. nada. De Socorrinho, que narra o estupro de uma garota, cantado por Hermila Guedes e com uma boneca manipulada por Fábio Caio. Ou de novo Fábio Caio no papel da catadora de lixo, que defende o lixão que vai ser desativado, no quadro Muribeca. Mas há outros quadros mais engraçados, críticos, mas com humor.

Angu de sangue faz uma apresentação neste sábado, às 20h, no Teatro Arraial. É o encerramento do projeto de circulação da peça por Pernambuco. O espetáculo passou por Fernando de Noronha, Garanhuns, Caruaru e Triunfo, além do Recife. O projeto teve incentivo do Funcultura.


SERVIÇO

Angu de sangue
Quando: Sábado,(09/04), às 20h – única apresentação
Onde: Teatro Arraial
Quanto: Entrada gratuita

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A visita da escritora

O Coletivo Angu de Teatro, do Recife, prepara sua quarta montagem. Essa febre que não passa, tem texto baseado no livro de contos da jornalista Luce Pereira, colunista do Diario de Pernambuco. No elenco do espetáculo, estão as atrizes Ceronha Pontes, Hermila Guedes, Hilda Torres, Maeve Jinkings, Márcia Cruz e Mayra Waquim.

André Brasileiro, ator e produtor das peças anteriores, estreia na direção. Marcondes Lima, que dirigiu as outras três encenações do Angu de Teatro: Angu de Sangue e Rasif – Mar que arrebenta, com textos de Marcelino Freire, e Ópera, com texto de Newton Moreno, está na supervisão do espetáculo e também assina a direção de arte.

Foto: Ivana Moura

Ontem, a escritora visitou o grupo no ensaio no Teatro Hermilo Borba Filho, no bairro do Recife. Foi uma conversa que trilhou os caminhos da memória para tentar descobrir origens, afetividades, referências. As atrizes ficaram surpresas quando perceberam que muitos dos personagens têm sim um ponto de partida real. Seja uma tia da escritora, uma situação, ou o seu estado ‘outonal’, como ela mesma disse.

Luce compartilhou suas memórias

Ainda não está decidido quantos contos farão parte da montagem e quem fará quais personagens – as atrizes, claro, já tem as suas preferências, e algumas ainda estão em processo de disputa! O diretor avisa que nada está definido! Mas há uma ideia de que, ao contrário de Angu de sangue e Rasif, os contos possam estar, de alguma forma, atrelados, seja por elementos de cena ou personagens.

“Fico muito curiosa. Conheço as minhas personagens, mas não o que está em vocês”, disse Luce ao elenco. “É muito fácil se apaixonar, se emocionar com as suas mulheres”, retrucou Hilda Torres. Essa febre que não passa está prevista para estrear no fim do mês de abril.

A autora e as atrizes

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A pedra no sapato (e na alma)

“A minha alma tá armada
E apontada para cara do sossego
Pois paz sem voz, paz sem voz
Não é paz, é medo”

A arte tem mesmo muitos poderes. Desde sempre. De fazer pensar, rir, chorar, ruborizar…Mas aquela que mais dói, quase corta, é a que nos tira da zona habitual de conforto – seja em relação aos procedimentos estéticos, mas principalmente no que diz respeito à mensagem da obra de arte. Rasif – Mar que arrebenta me deixou pequenininha. Com um desconfortável prazer que parecia ecoar e reverberar nas paredes de tijolinhos do Teatro Hermilo Borba Filho.

Foto: Tadeu Gondim

A montagem, assim como Angu de sangue, primeiro espetáculo do repertório do grupo Angu de teatro, é dividida em quadros. Ambas bebem na língua e escrita afiada do pernambucano de Sertânia, radicado em São Paulo, Marcelino Freire. São pequenos contos que não trazem relação direta de personagens entre si, mas passeiam pelos mesmos espectros de significados.

Desde a confusão de uma tribo de índios canibais que fala uma língua específica – só uma mulher entende e traduz – e ameaça uma atriz; à confusão do trânsito; à dor de uma mãe que não quer acordo com a paz, afinal já lhe tiraram o que ela tinha de mais precioso. O próprio nome do espetáculo – Rasif, extraído da origem árabe do nome Recife, já sugere um ambiente urbano, caótico, fragmentado.

Impossível não fazer uma menção especial ao ator Fábio Caio. A sua propriedade em cena, a capacidade de trazer para junto de si o espectador, de criar um mundo imaginário cruel, irônico, cheio de sarcasmo, riso nervoso ou escancarado. Com ele, entramos num ônibus com destino a algum dos Altos do Recife. Ele é uma velhinha que faz tricô para passar o tempo e é abordada por um sujeito. E o discurso se repete algumas vezes – algo do tipo, ‘não quero chiclete, não quero caneta, você está me pedindo dinheiro pra comprar remédio?’. O final, que eu não vou estragar, faz jus ao percurso circular do diálogo.

Foto: Tadeu Gondim

“Às vezes eu falo com a vida
Às vezes é ela quem diz
qual a paz que eu não quero conservar
prá tentar ser feliz?”

Fábio Caio é também o menino na manjedoura, no caixote de madeira, nas tábuas duras de um barraco em Santo Amaro ou na Favela da Xuxa. Que conta a história de um amiguinho que se desiludiu com o Papai Noel e queria matá-lo de todo jeito. Também…pedir uma motoca com todas as suas luzes e receber uma bola! Ou ver a irmãzinha ganhando uma boneca horrorosa! Não é pra menos!

Se o talento de Fábio me salta aos olhos, não deixo de notar também a qualidade desse coletivo de atores, o Angu de Teatro, como grupo mesmo, que existe há sete anos. Participaram ainda da encenação no último fim de semana Vavá Schön-Paulino, Ivo Barreto, Arilson Lopes, Tatto Medinni, Márcia Cruz e Ceronha Pontes. No comando disso tudo e ainda nos vocais tão afiados e provocativos quanto o texto, o diretor Marcondes Lima.

As cenas se desenrolam num retângulo branco, que também serve como espelho para as projeções de imagens ou palavras. Às margens, pedras pesam sob os textos que compõem a peça. E a imagem da pedra diz muito sobre tudo que se passa ali. É uma pedrinha no sapato – que parece ser inofensiva, mas deixa um calo feio depois de um dia subindo a Conde da Boa Vista a pé.

Foto: Tadeu Gondim

Similaridades encaixadas – Rasif – Mar que arrebenta é muito mais provocador aos olhos de quem não viu Angu de sangue e vice-versa. Porque a fórmula cênica é mais ou menos a mesma. Os textos impiedosos de Marcelino, assim como sugerem os próprios livros, em contos rápidos, traduzidos pelo Angu de Teatro em cenas rápidas. A mulher que não quer aprender a ler, interpretada por Vavá Schön-Paulino em Rasif, parece aquela mesma feita por Fábio Caio, que não quer sair do lixão da Muribeca em Angu de sangue. Até nos trejeitos, na fala. E aí entram algumas coisas em questão, como fechar mesmo o ciclo “Marceliniano”, inovar ou não em relação ao espetáculo anterior (o grupo tem ainda a montagem Ópera, mas que é baseada em texto de Newton Moreno); e até que ponto não é válido se renovar mesmo apostando num mesmo formato. Não tenho as respostas. Só restam dúvidas e o amargor na boca, mesmo que a risada não se faça de rogada.

“As grades do condomínio são pra trazer proteção
Mas também trazem a dúvida se não é você que está nessa prisão
Me abrace e me dê um beijo,
Faça um filho comigo!
Mas não me deixe sentar na poltrona
No dia de domingo, domingo!
Procurando novas drogas de aluguel
Neste vídeo coagido….
É pela paz que eu não quero seguir admitindo” (Minha Alma/ Marcelo Yuka)

Serviço:
Rasif estreou em 2008 e agora está fazendo uma série de 20 apresentações
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho (Bairro do Recife)
Quando: de quinta a domingo, às 20h
Ingressos: R$ 10 e R$ 5

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