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Totem ressignifica rituais indígenas

Retomada, como Grupo Totem. Foto: Fernando Figueiroa/ Divulgação

Retomada fala da luta pela terra, da alma coletiva, da ancestralidade. Foto: Fernando Figueiroa/ Divulgação

O Grupo Totem já está na estrada da performance há quase 30 anos. 28 para ser mais exato.  Muito antes da prática ser consagrada nas várias linguagens a trupe já estava no campo de luta, emanando energia vital pelo direito de minorias, da educação, dos povos originários, num enfrentamento político contínuo, visível ou invisível. A trupe dirigida por Fred Nascimento não trabalha com textos dramáticos, mas com processo de criação extraídos do corpo.  O espetáculo de teatro performático Retomada ganha uma apresentação nesta quarta-feira, às 20h, no Teatro Hermilo Borba Filho, como parte da programação do Trema! Festival de Teatro.

O procedimento para essa montagem começou em agosto de 2015. O coletivo enveredou pela  espiritualidade indígena. A primeira residência foi junto ao Povo Pankararu, no município de Tacaratu. Lá, a turma vivenciou com os indígenas a tradição do Menino do Rancho. Em Pesqueira praticou o ritual do Dia de Reis do povo Xucuru e conheceu melhor a história de luta e resistência dessa tribo e o episódio que abateu o cacique Xicão. Com os Kapinawás, próximo do município de Buíque, a turma interiorizou um jeito diferente de dançar o toré e sambada de coco. Também teve acesso a furna sagrada e colheu o sentimento de ligação dos indígenas junto aos encantados.

Foram experiências preciosas de intercâmbios culturais, alimentados por trocas rituais, performáticas e espirituais. A montagem é fruto final do projeto Rito Ancestral Corpo Contemporâneo, financiado pelo edital do Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura (Funcultura).

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O espetáculo capta a energia metafísica que emana dos rituais

O sagrado integra o cotidiano dos povos nas coisas mais simples. A relação é de respeito e as divindades são sempre consultadas. Mas como destaca o diretor do grupo, Fred Nascimento, a turma não reproduz os rituais das aldeias. O processo criativo captar a força, a energia metafísica que emana desses rituais e penetra os corpos contemporâneos.

As vozes ancestrais ecoam no presente. Além da questão mais transcendente, o teor político impregna a montagem. A luta pelo solo sagrado, o sentimento de pertencimento aquela terra inspirou a trupe a corporificar a sacralidade das terras indígenas e o sentimento de resistência.

A interlocução entre a ancestralidade e a tecnologia faz parte do método Totem de ser. Fred explica que a performance multimídia traça uma espécie de simbiose entre o físico, o sonoro, o espaço circundante e a metafísica, a fim de criar uma atmosfera ritual. “Através dos corpos expandidos das atrizes-performers, tomadas por suas personas, mostraremos simultaneamente o corpo contemporâneo e a alma coletiva dos povos, que os séculos de colonização não conseguiram anular”, adianta.

Atrizes do Grupo Totem

Atrizes do Grupo Totem

A pesquisa e a criação são coletivas, a encenação é assinada por Fred Nascimento, que também assina a trilha sonora da peça, em parceria com Cauê Nascimento. A iluminação de Natalie Revorêdo. No elenco estão Lau Veríssimo, Taína Veríssimo, Gabi Cabral, Gabi Holanda, Inaê Veríssimo, Juliana Nardin e Tatiana Pedrosa.

As atrizes-performers acionam o conceito de alma coletiva identificada nas aldeias. O termo foi desenvolvido nos estudos da performance e antropologia de Richard Schechner. Além de Schechner o coletivo buscou sustentação teórica nos estudos do professor, pesquisador brasileiro Cassiano Sydow Quilici e nas ideias do poeta Antonin Artaud, que defendia que o teatro deve ser “antes de tudo ritual e mágico”

SERVIÇO

Retomada
Quando: quarta-feira, 4 de maio, às 20h
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho (rua do Apolo, 121, Bairro do Recife)
Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia),
Informações: (81) 3355-3320

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Por uma pedagogia da libertação

Junior Aguiar e Daniel Barros. Fotos: Amanda Pietra

Daniel Barros e Junior Aguiar. Fotos: Amanda Pietra

O pernambucano Paulo Freire (1921-1997), autor da Pedagogia do Oprimido, defende em sua obra que o estudo é uma ponte para habilitar o aluno a “ler o mundo”. A educação é uma avenida para os mais pobres trespassarem a “cultura do silêncio” e mudarem a realidade, “como sujeitos da própria história”. Seu pensamento pedagógico é assumidamente político. E é a partir dessa posição que o Coletivo Grão Comum ergue o espetáculo pa(IDEIA) – pedagogia da libertação, que faz sua estreia nesta terça-feira, no Teatro Hermilo Borba Filho, às 20h, dentro da programação do Trema! Festival de Teatro.

Os atores Daniel Barros e Júnior Aguiar investigam e incorporam o papel o patrono da educação brasileira, que se contrapunha à escola conservadora como modelo de acomodação e defendia a pedagogia libertária, com ética, política e consciência.

A montagem faz parte da Trilogia Vermelha, que distingue a vida e obra de três nordestinos; o cineasta baiano Glauber Rocha, com o montagem h(EU)stória – O tempo em transe; Paulo Freire e o bispo cearense Dom Helder Câmera, com pro(FÉ)ta – O bispo do povo. h(EU)stória estreou em 2014, no Teatro do Arraial.

“São espetáculos que valorizam formas híbridas de narração (mesclando o lírico, o épico e o dramático). Encenações que reacendem e contribuem para dimensionar a importância do teatro político na sociedade brasileira e na América Latina”, explica Júnior Aguiar. O ator e diretor aponta que as obras reabrem novos “diálogos dialéticos-críticos-criativos” sobre as dimensões da nossa identidade contemporânea.

A peça explora os quatro dias de interrogatório a que Paulo foi submetido no Recife. “Identifiquei que no momento do Golpe de 1964, Freire estava em Brasília, a convite de Jango, para aplicar a Pedagogia do Oprimido no Brasil. E é deste ponto dramatúrgico que o espetáculo começa sua narrativa”, comenta Aguiar. O espetáculo está dividido em três partes e 16 cenas. (1ª parte – Prisão por 70 Dias; 2ª Parte – Exílio por 16 Anos e a 3ª Parte – Redemocratização).

Como afirma o educador Paulo Freire, não existem territórios neutros.

Como afirma o educador Paulo Freire, não existem territórios neutros.

Quando exilado, Freire viaja o mundo e chega à África. O território no Brasil e na América Latina é de confronto. Um clima hierático é instalado na segunda parte da peça, com a evocação do poder dos ancestrais. A plateia se transforma numa grande sala de aula. E é revelada a história de Dona Maria, que tinha o sonho de aprender a ler. É retratada como exemplo do papel da velha educação castradora, que reprova e exige a reprodução de que está estabelecido.

Nas relações com o real e o político, o Coletivo mira a ignorância paralisante, a alienação submissa e a opressão inaceitável.

A pesquisa, a encenação, o roteiro e a iluminação também são assinados por Aguiar, que idealizou o projeto e tem a figura do cineasta Jomard Muniz de Britto como inspiração.

Com poucos recursos visuais em cena – acessórios que remetem a outros símbolos, como tecido vermelho, bandeira do Brasil, malas, livros e artefatos religiosos – a dramaturgia textual ganha destaque. A costura do argumento se dá por trilha sonora com depoimentos de arquivos, como os de Paulo Freire e do ex-governador de Pernambuco, Miguel Arraes – que também foi preso e exilado na época da repressão.

“As palavras de Paulo Freire são vivas de ideias transformadoras, elas movem nossa consciência e esclarecem dimensões que nos tornam mais lúcidos, mais éticos e mais humanos”, condensa o diretor.

E como já defendeu o  professor de estudos teatrais na University of Kent, Canterbury, Inglaterra, Patrice Pavis, (no artigo Uma redefinição do teatro político, publicado na revista Sala Preta, da Universidade de São Paulo): “Nesses tempos pós-modernos e pós-dramáticos, nesses momentos de desânimo sociopolítico, é preciso coragem para recusar as facilidades do teatro de entretenimento e de conforto, esse teatro que arrisca pouco e se conforma rapidamente à moda e ao mainstream. É preciso, em suma, a coragem de engajar a vida na recusa das injustiças, na confiança dos poderes da arte e na vontade irrepreensível de pensar sobre o real”.

Ficha Técnica
Atores: Daniel Barros E Júnior Aguiar
Encenação, Roteiro E Iluminação: Júnior Aguiar
Música Original: Leo Vila Nova, Juliano Muta, Tiago West, Glauco César Ii. Participação Especial dos Intérpretes: Geraldo Maia E Otiba.
Operador De Som E Luz: Roger Bravo
Elementos Cenográficos: Alexandra Jarocki, Isabelle Santos E Amanda Cristal
Tease: Gê Carvalho Galego
Programação Visual: Arthur Canavarro
Idealização E Produção: Grão Comum

SERVIÇO
Espetáculo pa(IDEIA) – pedagogia da libertação
Quando: Terça-feira, 03/05, às 20h
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho
Quanto: R$ 20 e R$ 10

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Trema! ataca com Quem tem medo de Travesti!

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Elenco conta histórias autobiográficas ou vividas por outras pessoas. Foto: Divulgação

A partir de pesquisa histórica, social, antropológica e artística sobre os papéis da travesti no teatro e na sociedade, o coletivo As Travestidas (CE) ergueu o espetáculo Quem tem medo de travesti!, atração desta sexta-feira (29), às 21h, no Teatro de Santa Isabel, do Trema! Festival de Teatro. A montagem investe na concepção da Arte Transformista desde a conquista do espaço na cena, passando pela glamourização do teatro de revista até procedimentos de marginalização da figura “trans”.

Seres da noite, vampiras, lobisomens, centauros urbanos, bichas e veados ganham outras angulações, com humor e provocação. Essas criaturas trazem narrativas repletas de dor e questionamentos inquietantes. A sociedade que assassina jovens com seus preconceitos e discriminação é descascada na encenação, que conta com sete atores em cena e músicas, dubladas ou cantadas ao vivo.

Quem tem medo de travesti!
devolve o julgamento de quem condena sem conhecer essa realidade. De quem sabe pouco das práticas e técnicas corporais, que vão desde injeções de silicone à mudança de hábitos e gestuais, na busca da sobrevivência e elevação da auto-estima dos que ousam ter o corpo modificado.

O desejo mascarado ou subterrâneo de setores da sociedade gera violência e preconceito. Como resposta, elas gritam por civilidade e respeito.

O estereótipo cede lugar ao desejo da travesti que perpassa o desejo do outro. O íntimo, a subjetividade e a dor sem caricatura ganham o primeiro plano. Mas com comicidade e deboche, que são as armas dessas figuras híbridas exibidas por trás dos aparatos da montagem.

Quem tem medo de travesti? Foto: Divulgação

Quem tem medo de travesti? Foto: Divulgação

Fragmentos de vidas reais coletados em conversas com travestis, transexuais e artistas transformistas, mesclados a relatos dos próprios atores, além de pesquisas acadêmicas, documentários em vídeos e referências que vão de Aristóteles a João Cabral de Melo Neto compõe o espetáculo. Quem tem medo de Travesti! tem texto e direção do ator e diretor cearense Silvero Pereira e Jezebel De Carli, professora e diretora gaúcha. A parceria surgiu com o espetáculo BR-TRANS, em Porto Alegre/RS em 2013.

No elenco estão Denis Lacerda (Deydianne Piaf), Verónica Valenttino (Jomar Carramanhos), Alicia Pietá, Patrícia Dawson, Italo Lopes (Karolaynne Carton) Diego Salvador (Yasmin Shirran) e Rodrigo Ferreira (Mulher Barbada).

Leia abaixo entrevista com ator, dramaturgo, diretor, professor de teatro, dançarino,   pesquisador, produtor, figurinista, maquiador,  iluminador,  sonoplasta,  aderecista e militante Silvero Pereira.

Silvero Pereira em uma cena de BRTrans. Foto: Lina Sumizono/Clix/FTC

Silvero Pereira em uma cena de BR-TRANS. Foto: Lina Sumizono/Clix/FTC

ENTREVISTA // SILVERO PEREIRA

Que você acha de ser considerado a vedete do teatro cearense?
Eu, sinceramente, não me preocupo com rótulos. Tenho mais preocupação com a construção de um teatro que possa comunicar-se com o público. Se vão dizer que sou pop, vanguardista, imitação ou transformador, para mim, depende muito de como se relacionam com a obra. Entretanto, esse título de vedete me deixa feliz, pois coloca meu trabalho entre o antigo, glamouroso e um teatro que aproxima o público.

O que dá sustentação a sua pesquisa, experimentação artística e envolvimento político com as  questões do LGBTTT?
Talvez essa sustentação venha por conta de nossa verticalização entre arte e pesquisa. Fazemos um trabalho que antes da aula, questões levantadas sobre gênero e diversidade, ele possui uma identidade artística com base na dramaturgia, encenação e atuação. Não é uma construção apenas político-militante. Antes de tudo somos artistas que acreditam no seu ofício em várias vertentes, seja ele de entretenimento ou de questão social. Entretanto, nos identificamos com esse teatro capaz de provocar novas percepções sobre determinado assunto a partir da estética que realizamos

Por que a escolha do universo trans?
Não foi exatamente uma escolha. De certa forma eu fui sendo absorvido por essa temática. Trabalhei numa comunidade no Ceará com muitas travestis e diante da realidade delas é do meu ofício, achei que seria o modo como eu poderia colaborar para mudar um pouco essa realidade, mas fui entrando no universo e me dando conta de uma série de questões que não ficaram resumidas a apenas uma obra, havendo a necessidade de novos projetos para novas discussões

Estamos vivendo um momento muito delicado no Brasil, as máscaras do preconceito contra o diferente são depostas quando se fala em conquistas e direitos. Como você enxerga a situação política e quais os receios sobre a repercussão disso tudo para o trabalho de defesa dos trans, que você está empenhado?
O Brasil é um país travestido de democracia e liberdade. Ele finge ser libertário, finge ser uma sociedade igualitária, mas é o país que mais mata LGBTTT’s no mundo. É um país racista, machista. Mas também não podemos deixar de ver que é um país que tem abertura para as lutas do movimento social e são essas brechas que nos fazem respirar e seguir lutando por mudança. Avançamos em muita coisa desde a Colônia, mas não somos, ainda, um lugar seguro e igual para todos

Fale um pouco do espetáculo Quem tem medo de travesti!. Sei que faz muito sucesso. As pessoas ficam tocadas. Vocês buscaram o lado mais humano e menos glamouroso. 
Quem tem Medo de Travesti! é um espetáculo que desnuda a caricatura marginal da travesti. Ele traz situações sobre infância, descobertas, família, a falta de afeto e a morte por assassinato e por suicídio. Não é a arte que humaniza a travesti. É a sociedade que a coloca como bicho. No nosso caso, queremos abrir esse olhar estigmatizado e fazer enxergar esse universo como um lugar de pessoas que acordam, amam, sofrem e são julgadas a cada segundo por conta de uma construção histórico-social de que elas não são humanas, mas sim animais.

O que é ser travesti na abrangência do espetáculo?
A travesti é a verdadeira filha dessa sociedade excludente. Se ela virou marginal foi porque foi parida por uma sociedade que não a aceitou na família, na religião e na educação. Logo, aceite seus filhos como você educou.

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FICHA TÉCNICA 
Direção e dramaturgia: Jezebel De Carli e Silvero Pereira
Elenco: Denis Lacerda (Deydianne Piaf), Verónica Valenttino (Jomar Carramanhos), Alicia Pietá, Patrícia Dawson, Italo Lopes (Karolaynne Carton) Diego Salvador (Yasmin Shirran) e Rodrigo Ferreira (Mulher Barbada)
Produção: Silvero Pereira
Técnico de som: Fabio Vieira
Iluminação: Fabio Oliveira
Realização: Coletivo Artístico As Travestidas
Classificação indicativa: 18 anos
Duração: 80 minutos

SERVIÇO
Quem tem medo de travesti!
Quando: Hoje (29), às 21h
Onde: Teatro de Santa Isabel (Praça da República s/n, Bairro de Santo Antonio)
Quanto: R$ 30 e R$ 15
Telefone: 3355 3322

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Trema! Festival de Teatro divulga programação

Jacy, do Grupo Carmin, abre o festival no Teatro Apolo. Foto: Nityama Macrini

Jacy, do Grupo Carmin, abre o festival no Teatro Apolo. Foto: Nityama Macrini

A importância de um festival de teatro não pode ser medida por sua duração ou pela quantidade de atrações. A proposta da curadoria, quando refletida na programação, é o que de fato mais importa. É nesse lugar que o Trema! Festival de Teatro se estabelece na capital pernambucana. Até então, o festival, que levava a assinatura do Magiluth, se voltava para o teatro de grupo. Agora, sob o comando da Trema! Plataforma de Teatro, tendo na coordenação Pedro Vilela, Mariana Rusu e Thiago Liberdade, a proposta foi ampliada, podendo incluir solos. Na realidade, a principal marca do festival continua: agregar montagens que tenham a pesquisa e a experimentação cênica como pressuposto.

Para fazer um breve retrospecto, pelo Trema!, já vimos no Recife o Teatro Kunyn, de São Paulo, a Cia Hiato, também de São Paulo, o Teatro Inominável, do Rio de Janeiro, o Grupo Espanca, de Belo Horizonte, o coletivo As Travestidas, de Fortaleza. São espetáculos de grupos que, com os seus trabalhos, têm muito a dizer sobre a realidade que vivemos e sobre os próprios procedimentos teatrais contemporâneos.

Nesta quarta edição, o Grupo Carmin, de Natal, abre a programação com a delicada Jacy, montagem de teatro-documentário que já foi vista em Garanhuns, no Festival de Inverno, mas ainda não havia chegado ao Recife. Jacy vem de uma recente temporada de sucesso no Rio de Janeiro, de uma passagem pelo Itaú Cultural (com lotação esgotada), em São Paulo, e começa agora a percorrer o Brasil pelo Palco Giratório.

De Belo Horizonte, o festival traz o grupo Primeira Campainha, com dois espetáculos do seu repertório: Isso é para Dor e Sobre Dinossauros, Galinhas e Dragões. Depois dos espetáculos, o grupo vai conversar sobre o processo criativo que norteou as montagens. A vinda da Primeira Campainha está sendo financiada pelo Prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz 2014 em parceria com o festival.

O coletivo As Travestidas volta ao Recife com o mais recente espetáculo, Quem tem medo de travesti. A montagem faz parte da pesquisa continuada sobre o universo trans no Brasil. Recentemente, foi vista no Festival de Teatro de Curitiba. O coletivo também comanda a festa Cabaré das Travestidas, que vai acontecer no Roda Cultural, no Bairro do Recife. A festa promete improviso, dublagem, talk show e a participação de DJ´s.

Grace Passô apresenta trabalho solo. Foto: Kelly Knevels

Grace Passô apresenta trabalho solo. Foto: Kelly Knevels

Por fim, uma das artistas mais interessantes da sua geração, Grace Passô, apresenta o solo Vaga carne. Depois de dez anos no Espanca, grupo que ajudou a fundar, Grace tem dirigido muitos espetáculos e participado de outros como atriz, como Krum, da Companhia Brasileira de Teatro. O solo Vaga carne, que tem direção, texto e atuação de Grace, integra o projeto Grãos da imagem, que reúne peças em torno de temas identitários.

Do Recife, a programação contará com as estreias de Retomada, do Grupo Totem, importante grupo de performance no cenário nacional, e pa(IDEIA), do Coletivo Grão Comum, um trabalho sobre Paulo Freire. Ainda estão na grade Soledad – A terra é fogo sob nossos pés (Confira a crítica), com Hilda Torres, e Vento Forte para Água e Sabão, musical para infância e juventude do Grupo Fiandeiros de Teatro, com texto de Giordano Castro e Amanda Torres.

Durante o festival, os produtores aproveitam para lançar a sexta edição da Trema! Revista, projeto que conta com o apoio do Funcultura.

Grupo Totem estreia Retomada. Foto: Fernando Figueiroa

Grupo Totem estreia Retomada. Foto: Fernando Figueiroa

Os ingressos já estão à venda pela internet, através do site www.eventick.com.br/tremafestivaldeteatro.

Tivemos uma importante conversa com Pedro Vilela, um dos produtores e idealizadores do festival. São questões sobre política cultural, resistência e permanência. Afinal, “a crise não é de agora. Para nós, trabalhadores da arte, ela sempre esteve presente”.

Pedro Vilela é um dos produtores do Trema! Festival. Foto: Bob Souza/divulgação

Pedro Vilela é um dos produtores do Trema! Festival. Foto: Bob Souza/divulgação

ENTREVISTA // PEDRO VILELA

De que maneira foi pensada a curadoria desta edição? Vocês falam, por exemplo, em (re)construção de paradigmas da nossa sociedade. Como isso se refletiu nos espetáculos escolhidos?

O teatro sempre será um espaço para enfrentamentos de ideias. Todo aquele que não se propõe a isto está fadado a ser apenas mais um mecanismo de reprodução da indústria cultural e da massificação de nosso povo. Ao pensar a curadoria do Trema! neste ano, procurei comungar trabalhos que em si carregam questões pertinentes para nosso tempo e que venham encontrando visibilidade no cenário artístico brasileiro. Poderíamos encher nossos palcos com obras de maior retorno financeiro para nós, organizadores, mas nosso compromisso ético com a ação faz com que estejamos muito atentos às reflexões que queremos propor. Ao assumir o tema (re)construção, estamos dispostos a percorrer um caminho duplo.

O primeiro está ligado à trajetória dos próprios organizadores, ao abandonarem antigos projetos artísticos na cidade e re-iniciarem novos percursos a partir da Trema! Plataforma de Teatro. (Re)construímos pois não achamos justo destruirmos algo que foi importante para nossa trajetória artística, ao passo que alimentamos o desejo por novos trajetos. O próprio nome do festival traz isto, este ano abandonamos o recorte exclusivo de “festival de teatro de grupo” e passarmos a ser apenas “Festival de Teatro”. Continuamos investindo na pesquisa de linguagem, mas ampliamos o olhar para artistas solos.

Em relação aos espetáculos, ao escolhermos espetáculos como os que compõem a programação, estamos nos propondo a reflexão em torno de temas como identidade, gênero, educação, tradição, ditadura, política, ou seja, pautas muito urgentes para nosso país. Acreditamos portanto que através do teatro podemos (re)construir nossa sociedade.

“Fechar um teatro é tão absurdo quanto fechar uma escola”

“Recife é a cidade dos festivais”. Essa frase é bastante dita quando discutimos a política cultural pernambucana, sem que a gente pare para avaliar de fato a importância de cada um dos festivais de artes cênicas da nossa cidade. No atual cenário, qual a importância do Trema!, tanto pra cidade quanto para os artistas? Porque insistir em fazer um festival, mesmo com a crise que assola os festivais no país todo?

Recife já foi a cidade dos festivais. Minha formação enquanto artista esteve muito ligada aos que aconteciam na nossa cidade. Esperava ansiosamente a cada ano e acompanhava absolutamente tudo. Os tempos são outros e o mais triste é perceber que retrocedemos. Já não temos o Palco Giratório, do SESC, e o Festival Recife virou um triste fantasma de anos anteriores, só para citar alguns. Os privados que teimam em resistir, a cada ano ou desistem pelo meio do caminho ou precisam fazer das tripas coração para serem executados. Isso é apenas uma breve demonstração do descaso do poder público para com as artes.

“Pensamos seriamente se realizaríamos o festival neste ano. Mas percebemos que não fazer significa que os propagadores da barbárie, da corrupção, da falta de educação, estariam saindo como vencedores desta batalha”.

É meio absurdo ter que nominar a importância desses eventos. Eles alimentam uma vasta cadeia produtiva, além de todas as questões simbólicas que suportam. O grande problema é que não conseguimos sermos vistos como utilidade pública, como elementos primordiais de construção da nossa sociedade. Fechar um teatro é tão absurdo quanto fechar uma escola. Mas se vivemos numa conjuntura que nem mesmo educação e saúde são ofertadas à população de maneira digna, o que podemos dizer das artes….

O Trema! resiste e insiste há quatro edições. Pensamos seriamente se realizaríamos o festival neste ano. Mas percebemos que não fazer significa que os propagadores da barbárie, da corrupção, da falta de educação, estariam saindo como vencedores desta batalha. A crise não é de agora. Para nós, trabalhadores da arte, ela sempre esteve presente.

Tentamos captação com diversas empresa do Estado e todas negaram recursos. Empresas inclusive que recentemente aportaram em nosso Estado com slogans ligados à cultura e ao desenvolvimento de nosso povo. O capital toma conta de nossos cidadãos, jogando-os num clico vicioso de consumo e onde apenas uma parte é beneficiada, o que vende.

Ninguém chega a Berlim, Paris ou qualquer lugar do mundo onde a produção artística é efervescente e fica deslegitimando a pluralidade que encontra. A única crítica que poderíamos fazer é quando invertemos o fomento às atividades continuadas e ficamos navegando exclusivamente em eventos passageiros. E isso sim é uma prática recorrente em nossa cidade. O que gastamos com decoração de Natal daria pra fomentar inúmeros festivais que possuem trajetória comprovada, por exemplo. Palco com banda tocando no Marco Zero aos domingos nunca será construir sociedade. Talvez seja por isto que ao acabar o show se inicie recorrentemente arrastões naquele lugar. O povo tá cansado de faz de conta. Educação é a única saída. Teatro, literatura, artes plásticas…. Isso sim muda um panorama.

“Palco com banda tocando no Marco Zero aos domingos nunca será construir sociedade. Talvez seja por isto que ao acabar o show se inicie recorrentemente arrastões naquele lugar”.

Qual o orçamento do Trema!? De onde vem o recurso? Qual o apoio, efetivamente, da Prefeitura do Recife e do Governo do Estado?

O Trema! neste ano tem orçamento de R$ 60 mil. Algo muito abaixo do que precisaríamos para executar o festival. Às vezes fico com a sensação de sermos malabaristas em conseguirmos realizar a ação. Mas seria injusto de nossa parte levarmos todos os méritos. O festival só será possível graças a todas as parcerias criadas e principalmente pelo desejo que a classe artística de todo o país tem por sua realização. Os grupos locais receberão apenas as bilheterias, por exemplo; nos sentimos até envergonhados ao termos que propor isso. Os grupos de fora estão vindo com cachês muito abaixo do comumente praticado. Isso mostra a seriedade com que lidamos com o Festival ao longo dos últimos anos e também a união dos artistas nesta guerrilha. Poderia não querer responder a vocês sobre questões orçamentárias, mas acho importante para que as coisas comecem a ter seu devido valor. A Fundação de Cultura entrará com algo em torno de R$ 15 mil (recursos e serviços) e o Governo do Estado com R$ 20 mil (recursos e serviços). Se dividirmos por exemplo o aporte da Prefeitura pela quantidade de habitantes na cidade daria algo em torno de R$ 0,01 por pessoa. Não chega nem a 1 centavo! Pouco, não?! O restante são parcerias criadas e principalmente recursos nossos. Em todas as edições não ganhamos absolutamente nada para realizar o Festival, mas ao mesmo tempo não queremos ver o Festival morrer! O por quê de fazermos esta loucura? Fico me perguntando a todo momento. E não sabemos por quanto tempo conseguiremos.

Talvez este também seja o momento de (re) construirmos o elo perdido com o poder público. Talvez. O que nos resta é fazemos um apelo ao público do Recife para que estejam juntos conosco nesta batalha. A melhor maneira de contribuir neste momento é compartilhar o quanto puder nossa divulgação. Os tempos são outros e sabemos o quanto juntos podemos mudar este paradigma. Ao ocuparmos os teatros, estaremos mostrando a importância da ação e, ainda que simbolicamente, requisitando o que nos é de direito. Como bem postamos ao anunciar que iríamos fazer o festival: não é por nós, é pela cidade!

“Se dividirmos por exemplo o aporte da Prefeitura pela quantidade de habitantes na cidade daria algo em torno de R$ 0,01 por pessoa. Não chega nem a 1 centavo!”

Programação Trema! Festival de Teatro:

28/4
Jacy / Grupo Carmin (RN)
Teatro Apolo – 20h

29/4
Sobre dinosauros, galinhas e dragões / Primeira Campainha (MG)
Teatro Arraial Ariano Suassuna – 19h30

Quem tem medo de travesti / Coletivo As Travestidas (CE)
Teatro Santa Isabel – 21h

30/4
Isso é para dor / Primeira Campainha (MG)
Teatro Arraial Ariano Suassuna – 19h30

Quem tem medo de travesti, do coletivo As Travestidas. Foto Allan Taissuke

Quem tem medo de travesti, do coletivo As Travestidas. Foto Allan Taissuke

FESTA: Cabaré das Travestidas / Coletivo As Travestidas (CE)
Roda cultural – a partir das 23h

01/5
Isso é para dor / Primeira Campainha (MG)
Teatro Arraial Ariano Suassuna – 19h30

03/5
Lançamento TREMA! Revista #6
Teatro Hermilo Borba Filho – a partir das 19h

pa(IDEIA) Pedagogia da autonomia / Coletivo Grão Comum (PE)
Teatro Hermilo Borba Filho – 20h

Coletivo Grão Comum estreia pa (IDEIA). Foto: Amanda Pietra

Coletivo Grão Comum estreia pa (IDEIA). Foto: Amanda Pietra04/5

 

04/5

Retomada / Grupo Totem (PE)
Teatro Hermilo Borba Filho – 20h

05/5
Soledad, A terra é fogo sob nossos pés / Cria do Palco (PE)
Teatro Hermilo Borba Filho – 20h

06/5
GRÃOS DA IMAGEM: Vaga Carne / Grace Passô (MG)
Teatro Hermilo Borba Filho – 20h

07/5
Vento Forte para água e sabão / Cia. Fiandeiros (PE)
Teatro Hermilo Borba Filho – 16h

08/5
Vento Forte para água e sabão / Cia. Fiandeiros (PE)
Teatro Hermilo Borba Filho – 16h

INGRESSOS:
R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada), com exceção do espetáculo Quem tem medo de travesti, com sessão no Teatro de Santa Isabel ao valor de R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada) e a festa Cabaré das Travestidas, com preço único de R$ 20.

Vendas antecipadas pelo site www.eventick.com.br/tremafestivaldeteatro.

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