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Performance da hipocrisia: reflexões
sobre autoimagem e dissimulação em
Pontos de Vista de um Palhaço

Com atuação de Daniel Warren e dramaturgia e direção de Maristela Chelala. Foto: Divulgação

Em Cenas de um Casamento (1974), Ingmar Bergman constrói uma das mais impiedosas dissecações da hipocrisia conjugal já filmadas. Na sequência do jantar entre casais, a câmera enquadra inicialmente o lustre de cristais envolto de castiçais, estabelecendo a atmosfera do sucesso familiar. Johan (Erland Josephson) e Marianne (Liv Ullman) recebem seus amigos Katarina Katarina (Bibi Andersson) e Peter (Jan Malmsjö) numa mesa farta, onde a conversa flui animada durante a sobremesa. Johan lê para os convidados a entrevista que ele e Marianne concederam a uma revista, celebrando sua felicidade conjugal.

Bergman constrói a tensão gradualmente: o que começam como indiretas aparentemente brincalhonas entre os convidados revelam feridas profundas. A tentativa de Johan de mudar o ambiente – “Vamos tomar um café na sala de estar” – apenas transfere o campo de batalha. O que parecia ser um agradável jantar entre amigos íntimos se transforma em pesadelo quando Katarina joga bebida no rosto de Peter após uma escalada de agressões verbais. O divórcio do casal convidado se torna inevitável diante dos anfitriões constrangidos.

A câmera de Bergman opera como um microscópio social: ela revela que a hipocrisia atua menos como mentira consciente do que como autoengano sistemático. Cada personagem acredita sinceramente em sua própria performance de felicidade matrimonial, o que torna a situação ainda mais perturbadora. A genialidade do cineasta reside em mostrar que a hipocrisia conjugal funciona como um sistema de proteção mútua: cada cônjuge mantém as ilusões do outro para preservar as próprias. Marianne e Johan observam a explosão de seus convidados com uma mistura de horror e superioridade, sem perceber que estão projetando seus próprios conflitos não resolvidos.

Esta anatomia da dissimulação encontra eco nas análises sociológicas contemporâneas sobre como construímos nossa identidade através da performance social. O sociólogo canadense Erving Goffman (1922-1982), em A Representação do Eu na Vida Cotidiana (1959), transformou profundamente a compreensão sociológica ao propor que toda interação social move-se através de uma dramaturgia complexa. Para Goffman, cada indivíduo atua como ator social que escolhe seu palco, sua peça e seu figurino conforme o público que pretende atingir. O objetivo principal é manter coerência entre diferentes performances e se ajustar conforme a situação.

O conceito goffmaniano de “fachada” – equipamento expressivo padronizado que inclui cenário, aparência e maneira – oferece uma chave de leitura para compreender como as relações sociais se estruturam através de códigos teatrais. Goffman observa que quando a definição aceita da situação é desacreditada, os atores podem fingir que nada mudou para manter a paz ou obter vantagens. A cena bergmaniana do jantar exemplifica perfeitamente esse mecanismo: todos os presentes colaboram inicialmente para manter a fachada de harmonia, mesmo quando os sinais de conflito se tornam evidentes.

Essa compreensão da teatralidade social encontra uma expressão particularmente potente na adaptação teatral de Pontos de Vista de um Palhaço, onde o ator Daniel Warren leva ao palco um monólogo tragicômico baseado no romance homônimo do escritor alemão Heinrich Böll (1917-1985), Prêmio Nobel de Literatura em 1972. Böll, que vivenciou tanto a Segunda Guerra Mundial quanto a reconstrução alemã, desenvolveu uma obra literária marcada pela crítica social às hipocrisias do pós-guerra, especialmente às contradições entre discurso moral e prática social.

Sob a direção de Maristela Chelala, o espetáculo propõe uma situação dramatúrgica engenhosa: um palhaço em crise profissional e amorosa se instala no divã para uma sessão terapêutica – que na realidade é todo o palco -, revelando ao público, que atua simultaneamente como plateia teatral e testemunha clínica, os motivos que o conduziram ao colapso.

Peça é baseada no romance homônimo do escritor alemão Heinrich Böll, Prêmio Nobel de Literatura em 1972

A montagem explora uma fragmentação radical do protagonista Hans Schnier, que o ator Warren divide em duas personagens e personalidades distintas: o próprio Hans e seu alter ego, um palhaço chamado Schnier. Na adaptação de Chelala, esse alter ego se transforma no narrador da história, criando possibilidades cômicas que emergem precisamente dessa divisão interna. “Estou com problemas com o meu sócio”, desabafa o palhaço nos primeiros momentos: “Ele é um irmão que não é um irmão, mas é como se fosse. Que você ama e odeia ao mesmo tempo.” É assim, referindo-se a si próprio na terceira pessoa, que Schnier começa a contar seus percalços de artista mambembe na Alemanha do pós-Segunda Guerra.

O mote para o desenrolar da trama é a decadência profissional do palhaço narrador, seguida de sua ruína pessoal, após uma grave briga que expõe divergências de valores e crenças religiosas nas relações pessoais, revelando também a intolerância no convívio social. Para interpretar essa crise de identidade, Warren passeia por estados de espírito opostos: da graça e do sarcasmo à revolta, manipulando com sutileza a máscara do palhaço para alternar-se entre Hans e Schnier.

Essa escolha dramatúrgica revela uma compreensão sofisticada dos mecanismos psicológicos em jogo na obra original de Böll, internalizando o conflito que no romance se estabelecia entre personagens distintos. O conceito de Doppelgänger (“duplo caminhante”) surge na literatura romântica alemã como expressão da fragmentação do sujeito moderno. Suas origens literárias remontam ao final do século XVIII, quando Jean Paul, em Siebenkäs (1796-97), definiu o Doppelgänger como “pessoas que veem a si mesmas”. Edgar Allan Poe, em William Wilson (1839), utilizou essa figura para explorar os aspectos sombrios da personalidade humana.

No teatro contemporâneo, Robert Wilson desenvolveu uma estética específica para trabalhar com duplicações. Em obras como Einstein on the Beach (1976) e The Life and Times of Joseph Stalin (1973), Wilson criou cenas onde performers se movimentavam como duplos fantasmáticos uns dos outros, questionando a unidade do sujeito através da repetição gestual e vocal. Cada uma dessas obras parecia como se Wilson tivesse convidado o público para uma paisagem de sonho – um mundo governado por sua própria lógica interna de tempo, movimento e imagem. Em Einstein on the Beach, os performers executavam movimentos extremamente lentos e precisos, criando ecos gestuais entre si, enquanto em Joseph Stalin, a duplicação se manifestava através de repetições rituais de ações cotidianas que se multiplicavam no palco como reflexos distorcidos.

Em Pontos de Vista de um Palhaço, Warren utiliza estratégia diferente: em vez da lentidão hipnótica de Wilson, ele trabalha com alternância rápida entre registros, corporificando a divisão interna do sujeito contemporâneo através da manipulação física e vocal da máscara. Quando Goffman demonstra que o equipamento expressivo inclui tanto a aparência quanto a maneira – comportamentos que informam sobre papéis sociais -, Warren expõe dramaturgicamente esse fenômeno através da mudança de personagem. Cada alternância revela que somos múltiplos e contraditórios, habitamos permanentemente a linguagem que nos constitui e nos aliena simultaneamente.

Essa dinâmica ecoa a figura do flâneur moderno, aquele observador urbano que se recusa a acelerar o passo da produtividade social, que insiste em observar o mundo com a lentidão necessária para captar suas contradições. O palhaço de Warren atualiza essa figura, mas sua resistência pode ser também uma forma sofisticada de narcisismo – a recusa em participar dos jogos sociais estabelecidos como forma de manter a pureza moral, mesmo quando essa pureza implica inação política. Warren consegue equilibrar essa ambiguidade através do humor inteligente que permeia toda a apresentação.

O espetáculo estreou em 2017 e desde lá faz circulações pelo país. 

Henri Bergson, em O Riso: Ensaio sobre a Significação da Comicidade (1900), propõe que rimos quando percebemos algo de mecânico incrustado no vivo – quando seres humanos se comportam como autômatos, revelando rigidez onde esperávamos flexibilidade. Warren utiliza essa mecânica bergsoniana quando alterna entre os dois personagens que interpreta, extraindo humor da artificialidade dos códigos sociais que governam cada um deles. O público ri ao reconhecer que nossos comportamentos mais “naturais” são programações sociais rígidas.

Bergson também observa que o riso possui uma dimensão corretiva e social. As interações de Warren com a plateia operam como revelações que expõem ao público seus próprios mecanismos de dissimulação. São risos de cumplicidade e constrangimento simultâneos – o que os torna mais perturbadores do que simples divertimento.

Hans Schnier ocupa território ambíguo, semelhante ao Príncipe Míchkin de O Idiota (1869), de Dostoiévski. Míchkin representa a tentativa impossível de viver segundo princípios cristãos numa sociedade corrupta. Já o ator Warren constrói um personagem que oscila entre a lucidez crítica e o autoengano, entre a resistência ética e a autopiedade narcísica. A divisão entre Hans e seu alter ego Schnier permite que o ator explore essa ambiguidade de forma teatralmente produtiva: cada faceta comenta ironicamente a outra, impedindo qualquer resolução fácil.

A construção cênica da montagem trabalha com alternância constante entre registros emocionais, impedindo que o público se acomode numa única resposta afetiva. Cada momento de riso é contaminado pela melancolia subjacente; cada instante de tristeza é atravessado por ironia que desarma qualquer sentimentalismo simples. O resultado é uma experiência emocional complexa que espelha a própria ambiguidade da existência contemporânea, onde a linha entre sinceridade e performance se torna cada vez mais tênue.

A religiosidade hipócrita, presente no romance de Böll como crítica específica ao catolicismo alemão do pós-guerra, ganha na montagem uma dimensão que extrapola esse contexto original. O ator Warren constrói sua crítica através da ironia sutil, evitando o panfleto direto. Quando aborda as contradições entre discurso religioso e prática social – especialmente através da história da briga que expõe divergências de crenças religiosas -, insinua paralelos evidentes com o cenário brasileiro contemporâneo: a ascensão de lideranças evangélicas envolvidas em escândalos financeiros, a instrumentalização política da fé, a transformação de templos em empresas de entretenimento religioso.

O capitalismo tardio, com suas demandas de performance constante, encontra no palhaço em crise uma metáfora da condição do trabalhador criativo contemporâneo. A incapacidade de Hans de continuar produzindo humor sob demanda ecoa as experiências de esgotamento que atravessam desde influenciadores digitais até professores universitários, todos pressionados a performar entusiasmo por suas atividades profissionais. Warren consegue extrair dessa matéria melancólica um humor espontâneo que chega às gargalhadas, construindo gags que emergem organicamente da situação dramática e de suas interações improvisadas com a plateia.

O espetáculo Pontos de Vista de um Palhaço revela sua maior potência quando resiste à tentação de oferecer resoluções fáceis. O palhaço permanece em crise, a sociedade continua hipócrita, e o público sai do teatro sem cartilhas morais prontas. Apesar da densidade temática, a montagem consegue terminar com uma sensação de leveza, como se o próprio ato de nomear e expor as contradições já fosse uma forma de libertação temporária. Numa época marcada por soluções rápidas e coaches de vida, um palhaço que permanece perdido mas consegue rir de sua própria perdição pode ser a figura mais lúcida em cena. Warren equilibra humor e reflexão crítica, construindo um trabalho maduro que faz rir sem perder a densidade necessária para abordar as hipocrisias do nosso tempo.

Ficha Técnica

Pontos de Vista de um Palhaço
Concepção Artística
: Maristela Chelala e Daniel Warren
Inspirado no romance Ansichten eines Clowns, de Heirich Böll
Dramaturgia e Direção: Maristela Chelala
Elenco: Daniel Warren
Preparação e Técnicas de Palhaços: Esio Magalhães
Iluminação e Cenografia: Marisa Bentivegna
Figurino: Carol Badra
Trilha Sonora: Frederico Godoy
Fotos: Lígia Jardim e Willian Aguiar
Assistente de Produção: Marita Prado
Produção: Fenetre Produções Artísticas- Daniel Warren e Maristela Chelala

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Somos todos Galileus

Um espetáculo altamente brechitiano com elenco liderado por Denise Fraga. Foto: Joao_Caldas

Um espetáculo altamente brechtiano com elenco liderado por Denise Fraga. Foto: João Caldas

Denise Fraga e o elenco de Galileu Galilei recebem o público na entrada do Teatro de Santa Isabel. É o início de um ritual que vai durar duas horas e meia sem intervalo. Com esse gesto a trupe, sob direção de Cibele Forjaz, ressalta o caráter da presença ao vivo dessa arte e as opções brechtianas da encenação: de ser e se mostrar teatro (em que os atores entram e saem dos personagens), de ser político, de costurar reflexões na carnadura da encenação, de tomar partido. Tudo isso vai sendo aprofundado ao longo da encenação.

Galileu Galilei é a segunda montagem de Denise Fraga de uma peça do dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956). A outra foi A alma boa de Setsuan, que também esteve no Recife.

Esse derradeiro texto de Brecht A Vida de Galileu, rebatizado aqui como Galileu Galilei, pode chegar a quatro horas de duração. A encenação de duas horas e 20 para ser mais exata é puxada. Mas os atores são tão bons, o jogo é tão interessante, as músicas animam, as conexões com a realidade brasileira incendeiam os pensamentos, as reflexões sobre verdade, simulacro, manipulação, coragem e covardia fervilham na nossa cabeça.

Brecht criou três versões da biografia do cientista que confirmou  que a Terra orbita em torno do Sol. Dirigia a quarta com o  Berliner Ensemble, mas morreu em agosto de 1956, antes da estreia em Berlim.

Montagem traça conexões com a realidade brasileira. Foto: João Caldas

Montagem traça conexões com a realidade brasileira. Foto: João Caldas

Na Itália do século 17, Galileu (1564-1642) prova por A + B a doutrina de Copérnico – o Sol como centro do Universo . A Igreja não aceitou essa constatação de Galileu, que foi perseguido pela Inquisição e obrigado a negar publicamente seus estudos.

Por defender a infinitude do Universo, o frade dominicano, filósofo e teólogo italiano Giordano Bruno (1548-1600) foi acusado de prática de heresia e queimado na fogueira pela Inquisição, na cidade de Roma (Itália) em 17 de fevereiro de 1600. Galileu não quis seguir esses passos.

Atuação de Denise Fraga é exuberante e conta com ótimo elenco

Atuação de Denise Fraga é exuberante e conta com ótimo elenco

O que é a verdade? Questiona o espetáculo do começo ao fim. No palco eles falam sobre a Terra que orbitava em redor do Sol e se bulia ao redor do próprio eixo; da Lua, que se mexia em torno da Terra e de que esses movimentos ocorriam em outros planetas. A peça de Brecht também fala sobre verdades, manipulações.

Galileu esbarrou na interpretação da Bíblia. Hoje a intolerância religiosa pelo mundo afora produz atentados com vítimas. E levando a questão para o campo mais cotidiano calamos, nos abraçamos com meias-verdades para sobreviver, fazemos concessões, estamos atolados em contradições, evitamos o conflito para não perder o emprego, a amizade, o poder, a aventura amorosa.  Para pular as fogueiras diárias. Ou mesmo ao assumir as posturas de que eu não tenho nada a ver com isso.

O elenco brada todas as imperfeições desse Homem, que teima em ser o centro do universo, com todas as alegorias que a encenação utiliza.

A peça cutuca o retrocesso político do Brasil. Projeta a realidade do desmonte, da manipulação midiática, da defesa de teses insustentáveis mas insistidas à exaustão de propaganda. Expõe interpretações equivocadas e ridículas do comportamento dos políticos e da covardia de quem não aceita o embate da discussão de ideias.

A aviltante votação da abertura do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff na Câmara Federal (em 17/04) ganha cena na peça.  O trecho evidencia o absurdo da situação e o vexame que os deputados impuseram aos brasileiros frente ao mundo, com suas “argumentações” pífias, sórdidas, desprezíveis. A diretora Cibele Forjaz também inseriu um flash com os “coxinhas batedores de panela” na encenação.

utilização de jornais remete para a montagem de Macunaima de Antunes Filho

Utilização de jornais nos figurinos remete para a montagem de Macunaima, de Antunes Filho

Em  1968, no dia 13 de dezembro, dia da promulgação do Ato Institucional número 5 – o AI-5 (que deu início ao recrudescimento da ditadura militar no país) José Celso Martinez Corrêa e seu Teatro Oficina estrearam a peça São Paulo. Nessa montagem emblemática de Galileu Galilei, a cena do Carnaval era a crítica do grupo a quem apoiava o novo governo. Cibele Forjaz  faz referência a essa ação na sua montagem.

Os figurinos feitos com jornais para a histórica montagem de Macunaíma (1978) , de Antunes Filho (adaptada do livro de Mário de Andrade) também entra no espetáculo numa passagem breve como celebração ao potente teatro contemporâneo brasileiro.

A trilha sonora de Lincoln Antônio e Théo Werneck reelabora músicas originais de Hanns Eisler para a obra original de Brecht e inclui sons inéditos, com direito a marchinha cuja letra é distribuída para que a plateia cante junto. Um clima de festa.

O espaço cênico lembra um picadeiro. O cenário, assinado por Márcio Medina, sustenta uma área circular dianteira, que deixa o palco mais próximo da plateia. Os atores também percorrem corredores. Na cena, um volumoso retângulo de madeira reporta a uma gigantesca escrivaninha: as gavetas, quando puxadas, transformam-se em escadaria. Os figurinos e adereços de Marina Reis trabalham com o conceito de montagem e desmontagem. A luz de Wagner Antônio segue em harmonia com esses movimentos.

Clima festivo e carnavalesco em algumas cenas. Foto: João Caldas / Divulgação

Clima festivo e carnavalesco em algumas cenas. Foto: João Caldas / Divulgação

Denise Fraga tem um talento cômico, que é bem conhecido da televisão. No teatro ela brinca com as sutilizas de Brecht entre o popular e o engraçado. Ao longo da peça, a atriz retira a peruca e mostra os enchimentos na barriga, narrando e comentando o personagem. Seu Galileu é humano, obsessivo, que se debate entre questões éticas, mas não é um herói impecável, e sim um cientista que sabia do valor da sua própria vida para o avanço da ciência. Um composição que merece aplausos.

O elenco afiado e dentro do espírito brechtiano – Lúcia Romano (a filha de Galileu), Théo Werneck, Maristel Chelala, Vanderlei Bernardino, Jackie Obrigon, Luís Mármora, Silvio Restiffe e Daniel WarrenJackie Obrigon, Ary França (inspirado no papel de um cão ou como o cardeal inquisidor) – defende com distinção e elegância seus personagens .

É louvável o modo articulado da encenação para falar de temas como astronomia, física, matemática, teologia de forma fluida e com linguajar compreensível. Tem vitalidade, crítica humor, ironia, uma narrativa de um personagem histórico, efeitos de estranhamento, como o uso de cartazes que anunciam o título e os acontecimentos de cada cena, e as songs, executadas com música ao vivo pelo elenco.

Com muito humor e ironia fica o recado do cientista: “Desgraçada é a terra que precisa de heróis”. Galileu é  um espetáculo festivo. Intensamente brechtiano, surpreendente, de comunicação expressiva com a plateia numa encenação potente e rica em detalhes de Cibele Forjaz.

Ficha técnica
Texto: Bertolt Brecht
Elenco: Denise Fraga, Ary França, Lúcia Romano, Théo Werneck, Maristel Chelala, Vanderlei Bernardino, Jackie Obrigon, Luís Mármora, Silvio Restiffe e Daniel Warren
Direção: Cibele Forjaz
Trilha Sonora: Lincoln Antônio e Théo Werneck
Cenografia: Márcio Medina
Figurinista: Marina Reis
Iluminação: Wagner Antônio
Produção Executiva: Lili Almeida
Direção de Produção: José Maria
Assessoria de Imprensa: Barata Comunicação
Transportadora Oficial: AVIANCA | Patrocínio Exclusivo: BRADESCO
Realização: NIA Teatro, Ministério da Cultura e Governo Federal

Serviço
GALILEU GALILEI
QUANDO: de 18 a 21 de Agosto; Quinta, Sexta e Sábado às 20h; Domingo às 19h
ONDE: Teatro de Santa Isabel – Praça da República, s/n
Quanto: R$70 (inteira) | R$35 (meia-entrada) *** R$52,50 (clientes Bradesco para compra de até 02 ingressos para o titular do Cartão Bradesco, AMEX. Desconto válido para compras na bilheteria, não acumulativo com outros descontos). *** R$ 35,00 (Para clientes e funcionários Avianca na compra de até́ 2 ingressos, mediante apresentação do bilhete aéreo ou do crachá Avianca e documento de identificação. Desconto válido para compras na bilheteria, não acumulativo com outros descontos).
Duração: 130 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Informações: (81) 3355-3322

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O homem que negou sua verdade

Denise Fraga protagoniza espetáculo Galileu Galilei. Fotos: João Caldas/ Divulgação

A Terra não é o centro do Universo, proclamou Galileu Galilei (1564-1642). Por isso quase foi queimado na fogueira pela Inquisição. Para sobreviver, abjurou. Em A Vida de Galileu, Bertolt Brecht (1898-1956) conta as façanhas desse cientista italiano. Ao negar seus próprios estudos, o físico decepcionou seus discípulos. Um deles reclama que uma terra sem heróis é desgraçada. Galileu responde: “Não. Desgraçada é a terra que precisa de heróis”.

Com Denise Fraga no papel central da encenação assinada por Cibele Forjaz, Galileu Galilei dispara metáforas sobre a realidade brasileira, parecendo encomendada para 2016. A montagem bem-humorada, posicionada politicamente, debochada e crítica abre espaço para a aparição dos “coxinhas batedores de panela”, de cabeleiras louras e pela execução do hino da Internacional Comunista. A trilha, assinada por Théo Werneck e Lincoln Antônio, aguça o espírito carnavalesco da encenação.

A montagem produzida por José Maria traz no elenco Ary França, Lúcia Romano, Théo Werneck, Maristela Chelala, Vanderlei Bernardino, Jackie Obrigon, Luís Mármora, Silvio Restiffe e Daniel Warren. A peça chega ao Recife para um curta temporada no Teatro de Santa Isabel, de 18 a 21 de agosto, quinta, sexta e sábado às 20h; e domingo, às 19h.

Brecht põe em xeque a figura do herói e a sociedade que embaraça a liberdade com seus estranhos jogos de poder

Bertolt Brecht levou mais de uma década para compor o texto dramático Vida de Galileu (Das Leben des Galilei), de 1933, lançado em plena Alemanha nazista, e reelaborado depois. Exilado, o dramaturgo assinou um segundo tratamento, em 1938, na Dinamarca. E conferiu a estreia da a peça em 1943, na Suíça. Ele concebeu uma nova encenação nos Estados Unidos, onde morava, depois do fim da Segunda Guerra e ainda sob o efeito das bombas atômicas de Hiroshima e de Nagasaki. Nas versões apresentadas Galileu ganha as marcas do herói, vítima da Inquisição, mas que continuou a desenvolver suas teorias às escondidas. Ou o protagonista aparece como um homem comum, coberto pela ambição e afetado pelos próprios vícios.

Em 1956, já de volta à Alemanha, Brecht ensejava uma nova montagem para a quarta versão do texto, que seria encenado em seu próprio teatro, o Berliner Ensemble, mas morreu antes da  estreia.

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O cientista vira uma ameaça e cai nas garras da Santa Inquisição

Há muitas camadas de interesses nesse mapa geopolítico habitado por Galileu. No século 17, em plena Contrarreforma, a contenda pela hegemonia política e econômica do mundo movia os reinos conhecidos hoje como Espanha, Inglaterra, França, Alemanha e Holanda (entre outros). O alvo era posse de colônias na América, África e na Ásia. A Europa estava dividida entre União Evangélica de um lado e Liga Católica do outro. Lutero (Alemanha), Calvino (França) e Henrique VIII (Inglaterra) já haviam desafiado a força do Vaticano. A Inquisição precisava mostrar sua força.

Galileu construiu um telescópio com o qual conseguiu comprovar a teoria heliocêntrica do polonês Nicolau Copérnico (1473-1543), que sustentava que a Terra gravitava em torno do Sol, e não o oposto, como se aceitava desde o modelo geocêntrico de Ptolomeu, do século II. Mas sob a perspectiva da Igreja era inadmissível que Deus não tivesse colocado o homem no centro do universo.

Amigo do Papa Urbano VIII, apreciador de pequenos luxos e dos prazeres mundanos, o astrônomo, físico e matemático italiano tentava harmonizar suas pesquisas e as benesses do poder. Um controverso e rico personagem. Que desperta conflitos éticos. Herói e anti-herói.

A atuação de Denise Fraga no papel do cientista reforça o caráter brechitano da montagem. Alguns procedimentos evidenciam essa quebra da ilusão teatral, como a colocação e retirada da peruca e a exibição da barriga pela atriz, ao assumir as funções de narradora e comentarista.

Galileu, Galilei

Elenco é formado por 10 atores, sob direção de Cibele Forjaz

José Celso Martinez Corrêa dirigiu para o Teatro Oficina uma montagem histórica de Galileu Galilei, que estreou em São Paulo no dia 13 de dezembro de 1968, dia da promulgação do Ato Institucional número 5 – AI5. No elenco estavam os atores Cláudio Corrêa e Castro, Ítala Nandi, Esther Góes, Fernando Peixoto, Renato Borghi, Raul Cortez, Othon Bastos, Otávio Augusto, Pedro Paulo Rangel e muitos outros atores. O espetáculo, de quase 2h30 sem intervalo, estreou em maio de 2015, em São Paulo e ficou nove meses em cartaz.

5 DIII

Montagem traça paralelo com a realidade brasileira

Ficha técnica
Texto: Bertolt Brecht
Elenco: Denise Fraga, Ary França, Lúcia Romano, Théo Werneck, Maristel Chelala, Vanderlei Bernardino, Jackie Obrigon, Luís Mármora, Silvio Restiffe e Daniel Warren
Direção: Cibele Forjaz
Trilha Sonora: Lincoln Antônio e Théo Werneck
Cenografia: Márcio Medina
Figurinista: Marina Reis
Iluminação: Wagner Antônio
Produção Executiva: Lili Almeida
Direção de Produção: José Maria
Assessoria de Imprensa: Barata Comunicação
Transportadora Oficial: AVIANCA | Patrocínio Exclusivo: BRADESCO
Realização: NIA Teatro, Ministério da Cultura e Governo Federal

Serviço
GALILEU GALILEI
QUANDO: de 18 a 21 de Agosto; Quinta, Sexta e Sábado às 20h; Domingo às 19h
ONDE: Teatro de Santa Isabel – Praça da República, s/n
Quanto: R$70 (inteira) | R$35 (meia-entrada) *** R$52,50 (clientes Bradesco para compra de até 02 ingressos para o titular do Cartão Bradesco, AMEX. Desconto válido para compras na bilheteria, não acumulativo com outros descontos). *** R$ 35,00 (Para clientes e funcionários Avianca na compra de até́ 2 ingressos, mediante apresentação do bilhete aéreo ou do crachá Avianca e documento de identificação. Desconto válido para compras na bilheteria, não acumulativo com outros descontos).
Duração: 130 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Informações: (81) 3355-3322

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