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Somos todos Galileus

Um espetáculo altamente brechitiano com elenco liderado por Denise Fraga. Foto: Joao_Caldas

Um espetáculo altamente brechtiano com elenco liderado por Denise Fraga. Foto: João Caldas

Denise Fraga e o elenco de Galileu Galilei recebem o público na entrada do Teatro de Santa Isabel. É o início de um ritual que vai durar duas horas e meia sem intervalo. Com esse gesto a trupe, sob direção de Cibele Forjaz, ressalta o caráter da presença ao vivo dessa arte e as opções brechtianas da encenação: de ser e se mostrar teatro (em que os atores entram e saem dos personagens), de ser político, de costurar reflexões na carnadura da encenação, de tomar partido. Tudo isso vai sendo aprofundado ao longo da encenação.

Galileu Galilei é a segunda montagem de Denise Fraga de uma peça do dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956). A outra foi A alma boa de Setsuan, que também esteve no Recife.

Esse derradeiro texto de Brecht A Vida de Galileu, rebatizado aqui como Galileu Galilei, pode chegar a quatro horas de duração. A encenação de duas horas e 20 para ser mais exata é puxada. Mas os atores são tão bons, o jogo é tão interessante, as músicas animam, as conexões com a realidade brasileira incendeiam os pensamentos, as reflexões sobre verdade, simulacro, manipulação, coragem e covardia fervilham na nossa cabeça.

Brecht criou três versões da biografia do cientista que confirmou  que a Terra orbita em torno do Sol. Dirigia a quarta com o  Berliner Ensemble, mas morreu em agosto de 1956, antes da estreia em Berlim.

Montagem traça conexões com a realidade brasileira. Foto: João Caldas

Montagem traça conexões com a realidade brasileira. Foto: João Caldas

Na Itália do século 17, Galileu (1564-1642) prova por A + B a doutrina de Copérnico – o Sol como centro do Universo . A Igreja não aceitou essa constatação de Galileu, que foi perseguido pela Inquisição e obrigado a negar publicamente seus estudos.

Por defender a infinitude do Universo, o frade dominicano, filósofo e teólogo italiano Giordano Bruno (1548-1600) foi acusado de prática de heresia e queimado na fogueira pela Inquisição, na cidade de Roma (Itália) em 17 de fevereiro de 1600. Galileu não quis seguir esses passos.

Atuação de Denise Fraga é exuberante e conta com ótimo elenco

Atuação de Denise Fraga é exuberante e conta com ótimo elenco

O que é a verdade? Questiona o espetáculo do começo ao fim. No palco eles falam sobre a Terra que orbitava em redor do Sol e se bulia ao redor do próprio eixo; da Lua, que se mexia em torno da Terra e de que esses movimentos ocorriam em outros planetas. A peça de Brecht também fala sobre verdades, manipulações.

Galileu esbarrou na interpretação da Bíblia. Hoje a intolerância religiosa pelo mundo afora produz atentados com vítimas. E levando a questão para o campo mais cotidiano calamos, nos abraçamos com meias-verdades para sobreviver, fazemos concessões, estamos atolados em contradições, evitamos o conflito para não perder o emprego, a amizade, o poder, a aventura amorosa.  Para pular as fogueiras diárias. Ou mesmo ao assumir as posturas de que eu não tenho nada a ver com isso.

O elenco brada todas as imperfeições desse Homem, que teima em ser o centro do universo, com todas as alegorias que a encenação utiliza.

A peça cutuca o retrocesso político do Brasil. Projeta a realidade do desmonte, da manipulação midiática, da defesa de teses insustentáveis mas insistidas à exaustão de propaganda. Expõe interpretações equivocadas e ridículas do comportamento dos políticos e da covardia de quem não aceita o embate da discussão de ideias.

A aviltante votação da abertura do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff na Câmara Federal (em 17/04) ganha cena na peça.  O trecho evidencia o absurdo da situação e o vexame que os deputados impuseram aos brasileiros frente ao mundo, com suas “argumentações” pífias, sórdidas, desprezíveis. A diretora Cibele Forjaz também inseriu um flash com os “coxinhas batedores de panela” na encenação.

utilização de jornais remete para a montagem de Macunaima de Antunes Filho

Utilização de jornais nos figurinos remete para a montagem de Macunaima, de Antunes Filho

Em  1968, no dia 13 de dezembro, dia da promulgação do Ato Institucional número 5 – o AI-5 (que deu início ao recrudescimento da ditadura militar no país) José Celso Martinez Corrêa e seu Teatro Oficina estrearam a peça São Paulo. Nessa montagem emblemática de Galileu Galilei, a cena do Carnaval era a crítica do grupo a quem apoiava o novo governo. Cibele Forjaz  faz referência a essa ação na sua montagem.

Os figurinos feitos com jornais para a histórica montagem de Macunaíma (1978) , de Antunes Filho (adaptada do livro de Mário de Andrade) também entra no espetáculo numa passagem breve como celebração ao potente teatro contemporâneo brasileiro.

A trilha sonora de Lincoln Antônio e Théo Werneck reelabora músicas originais de Hanns Eisler para a obra original de Brecht e inclui sons inéditos, com direito a marchinha cuja letra é distribuída para que a plateia cante junto. Um clima de festa.

O espaço cênico lembra um picadeiro. O cenário, assinado por Márcio Medina, sustenta uma área circular dianteira, que deixa o palco mais próximo da plateia. Os atores também percorrem corredores. Na cena, um volumoso retângulo de madeira reporta a uma gigantesca escrivaninha: as gavetas, quando puxadas, transformam-se em escadaria. Os figurinos e adereços de Marina Reis trabalham com o conceito de montagem e desmontagem. A luz de Wagner Antônio segue em harmonia com esses movimentos.

Clima festivo e carnavalesco em algumas cenas. Foto: João Caldas / Divulgação

Clima festivo e carnavalesco em algumas cenas. Foto: João Caldas / Divulgação

Denise Fraga tem um talento cômico, que é bem conhecido da televisão. No teatro ela brinca com as sutilizas de Brecht entre o popular e o engraçado. Ao longo da peça, a atriz retira a peruca e mostra os enchimentos na barriga, narrando e comentando o personagem. Seu Galileu é humano, obsessivo, que se debate entre questões éticas, mas não é um herói impecável, e sim um cientista que sabia do valor da sua própria vida para o avanço da ciência. Um composição que merece aplausos.

O elenco afiado e dentro do espírito brechtiano – Lúcia Romano (a filha de Galileu), Théo Werneck, Maristel Chelala, Vanderlei Bernardino, Jackie Obrigon, Luís Mármora, Silvio Restiffe e Daniel WarrenJackie Obrigon, Ary França (inspirado no papel de um cão ou como o cardeal inquisidor) – defende com distinção e elegância seus personagens .

É louvável o modo articulado da encenação para falar de temas como astronomia, física, matemática, teologia de forma fluida e com linguajar compreensível. Tem vitalidade, crítica humor, ironia, uma narrativa de um personagem histórico, efeitos de estranhamento, como o uso de cartazes que anunciam o título e os acontecimentos de cada cena, e as songs, executadas com música ao vivo pelo elenco.

Com muito humor e ironia fica o recado do cientista: “Desgraçada é a terra que precisa de heróis”. Galileu é  um espetáculo festivo. Intensamente brechtiano, surpreendente, de comunicação expressiva com a plateia numa encenação potente e rica em detalhes de Cibele Forjaz.

Ficha técnica
Texto: Bertolt Brecht
Elenco: Denise Fraga, Ary França, Lúcia Romano, Théo Werneck, Maristel Chelala, Vanderlei Bernardino, Jackie Obrigon, Luís Mármora, Silvio Restiffe e Daniel Warren
Direção: Cibele Forjaz
Trilha Sonora: Lincoln Antônio e Théo Werneck
Cenografia: Márcio Medina
Figurinista: Marina Reis
Iluminação: Wagner Antônio
Produção Executiva: Lili Almeida
Direção de Produção: José Maria
Assessoria de Imprensa: Barata Comunicação
Transportadora Oficial: AVIANCA | Patrocínio Exclusivo: BRADESCO
Realização: NIA Teatro, Ministério da Cultura e Governo Federal

Serviço
GALILEU GALILEI
QUANDO: de 18 a 21 de Agosto; Quinta, Sexta e Sábado às 20h; Domingo às 19h
ONDE: Teatro de Santa Isabel – Praça da República, s/n
Quanto: R$70 (inteira) | R$35 (meia-entrada) *** R$52,50 (clientes Bradesco para compra de até 02 ingressos para o titular do Cartão Bradesco, AMEX. Desconto válido para compras na bilheteria, não acumulativo com outros descontos). *** R$ 35,00 (Para clientes e funcionários Avianca na compra de até́ 2 ingressos, mediante apresentação do bilhete aéreo ou do crachá Avianca e documento de identificação. Desconto válido para compras na bilheteria, não acumulativo com outros descontos).
Duração: 130 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Informações: (81) 3355-3322

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O homem que negou sua verdade

Denise Fraga protagoniza espetáculo Galileu Galilei. Fotos: João Caldas/ Divulgação

A Terra não é o centro do Universo, proclamou Galileu Galilei (1564-1642). Por isso quase foi queimado na fogueira pela Inquisição. Para sobreviver, abjurou. Em A Vida de Galileu, Bertolt Brecht (1898-1956) conta as façanhas desse cientista italiano. Ao negar seus próprios estudos, o físico decepcionou seus discípulos. Um deles reclama que uma terra sem heróis é desgraçada. Galileu responde: “Não. Desgraçada é a terra que precisa de heróis”.

Com Denise Fraga no papel central da encenação assinada por Cibele Forjaz, Galileu Galilei dispara metáforas sobre a realidade brasileira, parecendo encomendada para 2016. A montagem bem-humorada, posicionada politicamente, debochada e crítica abre espaço para a aparição dos “coxinhas batedores de panela”, de cabeleiras louras e pela execução do hino da Internacional Comunista. A trilha, assinada por Théo Werneck e Lincoln Antônio, aguça o espírito carnavalesco da encenação.

A montagem produzida por José Maria traz no elenco Ary França, Lúcia Romano, Théo Werneck, Maristela Chelala, Vanderlei Bernardino, Jackie Obrigon, Luís Mármora, Silvio Restiffe e Daniel Warren. A peça chega ao Recife para um curta temporada no Teatro de Santa Isabel, de 18 a 21 de agosto, quinta, sexta e sábado às 20h; e domingo, às 19h.

Brecht põe em xeque a figura do herói e a sociedade que embaraça a liberdade com seus estranhos jogos de poder

Bertolt Brecht levou mais de uma década para compor o texto dramático Vida de Galileu (Das Leben des Galilei), de 1933, lançado em plena Alemanha nazista, e reelaborado depois. Exilado, o dramaturgo assinou um segundo tratamento, em 1938, na Dinamarca. E conferiu a estreia da a peça em 1943, na Suíça. Ele concebeu uma nova encenação nos Estados Unidos, onde morava, depois do fim da Segunda Guerra e ainda sob o efeito das bombas atômicas de Hiroshima e de Nagasaki. Nas versões apresentadas Galileu ganha as marcas do herói, vítima da Inquisição, mas que continuou a desenvolver suas teorias às escondidas. Ou o protagonista aparece como um homem comum, coberto pela ambição e afetado pelos próprios vícios.

Em 1956, já de volta à Alemanha, Brecht ensejava uma nova montagem para a quarta versão do texto, que seria encenado em seu próprio teatro, o Berliner Ensemble, mas morreu antes da  estreia.

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O cientista vira uma ameaça e cai nas garras da Santa Inquisição

Há muitas camadas de interesses nesse mapa geopolítico habitado por Galileu. No século 17, em plena Contrarreforma, a contenda pela hegemonia política e econômica do mundo movia os reinos conhecidos hoje como Espanha, Inglaterra, França, Alemanha e Holanda (entre outros). O alvo era posse de colônias na América, África e na Ásia. A Europa estava dividida entre União Evangélica de um lado e Liga Católica do outro. Lutero (Alemanha), Calvino (França) e Henrique VIII (Inglaterra) já haviam desafiado a força do Vaticano. A Inquisição precisava mostrar sua força.

Galileu construiu um telescópio com o qual conseguiu comprovar a teoria heliocêntrica do polonês Nicolau Copérnico (1473-1543), que sustentava que a Terra gravitava em torno do Sol, e não o oposto, como se aceitava desde o modelo geocêntrico de Ptolomeu, do século II. Mas sob a perspectiva da Igreja era inadmissível que Deus não tivesse colocado o homem no centro do universo.

Amigo do Papa Urbano VIII, apreciador de pequenos luxos e dos prazeres mundanos, o astrônomo, físico e matemático italiano tentava harmonizar suas pesquisas e as benesses do poder. Um controverso e rico personagem. Que desperta conflitos éticos. Herói e anti-herói.

A atuação de Denise Fraga no papel do cientista reforça o caráter brechitano da montagem. Alguns procedimentos evidenciam essa quebra da ilusão teatral, como a colocação e retirada da peruca e a exibição da barriga pela atriz, ao assumir as funções de narradora e comentarista.

Galileu, Galilei

Elenco é formado por 10 atores, sob direção de Cibele Forjaz

José Celso Martinez Corrêa dirigiu para o Teatro Oficina uma montagem histórica de Galileu Galilei, que estreou em São Paulo no dia 13 de dezembro de 1968, dia da promulgação do Ato Institucional número 5 – AI5. No elenco estavam os atores Cláudio Corrêa e Castro, Ítala Nandi, Esther Góes, Fernando Peixoto, Renato Borghi, Raul Cortez, Othon Bastos, Otávio Augusto, Pedro Paulo Rangel e muitos outros atores. O espetáculo, de quase 2h30 sem intervalo, estreou em maio de 2015, em São Paulo e ficou nove meses em cartaz.

5 DIII

Montagem traça paralelo com a realidade brasileira

Ficha técnica
Texto: Bertolt Brecht
Elenco: Denise Fraga, Ary França, Lúcia Romano, Théo Werneck, Maristel Chelala, Vanderlei Bernardino, Jackie Obrigon, Luís Mármora, Silvio Restiffe e Daniel Warren
Direção: Cibele Forjaz
Trilha Sonora: Lincoln Antônio e Théo Werneck
Cenografia: Márcio Medina
Figurinista: Marina Reis
Iluminação: Wagner Antônio
Produção Executiva: Lili Almeida
Direção de Produção: José Maria
Assessoria de Imprensa: Barata Comunicação
Transportadora Oficial: AVIANCA | Patrocínio Exclusivo: BRADESCO
Realização: NIA Teatro, Ministério da Cultura e Governo Federal

Serviço
GALILEU GALILEI
QUANDO: de 18 a 21 de Agosto; Quinta, Sexta e Sábado às 20h; Domingo às 19h
ONDE: Teatro de Santa Isabel – Praça da República, s/n
Quanto: R$70 (inteira) | R$35 (meia-entrada) *** R$52,50 (clientes Bradesco para compra de até 02 ingressos para o titular do Cartão Bradesco, AMEX. Desconto válido para compras na bilheteria, não acumulativo com outros descontos). *** R$ 35,00 (Para clientes e funcionários Avianca na compra de até́ 2 ingressos, mediante apresentação do bilhete aéreo ou do crachá Avianca e documento de identificação. Desconto válido para compras na bilheteria, não acumulativo com outros descontos).
Duração: 130 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Informações: (81) 3355-3322

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Amor, meu grande amor

Gardênia, do El Otro Núcleo de Teatro (SP). Foto: Pollyanna Diniz

Gardênia, do El Otro Núcleo de Teatro (SP). Foto: Pollyanna Diniz

A música do Barão Vermelho pede para que o amor só dure o tempo que merecer. Para que você, meu grande amor, possa me reconhecer. Para que quando você me quiser, que seja de qualquer maneira. Hoje ou daqui a cinquenta e um anos, nove meses e quatro dias. Não, a última parte já é não é mais Barão Vermelho (como Breno Fittipaldi lembrou nos comentários e as mensagens que recebi no face, a música é de Ana Terra e Ângela Ro Ro..perdoem-me…tinha acabado de ver Barão Vermelho no Big Brother – sim, eu torço por Alvinho…rsrsrs..e aí não consegui pensar em mais ninguém cantando a música!). Talvez o tempo do merecimento não seja maior do que o tempo do esquecimento para todo mundo. A paciência é de García Marquez, é de O amor nos tempos do cólera, é de Gardênia, montagem do El Outro Núcleo de Teatro inspirada no livro do escritor colombiano. A peça foi apresentada nesta quarta-feira e terá mais duas sessões nesta quinta, às 17h (com entrada gratuita) e às 21h (ingressos: R$ 20 e R$ 10), no Teatro Hermilo Borba Filho (Bairro do Recife), dentro da programação do Janeiro de Grandes Espetáculos.

Lugar comum dizer que o teatro serve para contar histórias, né? Pode até ser. Mas tantas vezes querem inventar a roda, colocar na cena as inquietações pseudofilosóficas (inclusive com relação ao fazer teatral), ser mais do que contemporâneos, que até nos tornamos chatos e esquecemos do fundamental. Do olho no olho, da palavra, do prazer que é ouvir uma história boa do início ao final com direito a riso, surpresa, choro, passar do tempo, esperança.

Montagem é inspirada em livro de García Márquez

Montagem é inspirada em livro de García Márquez

Gardênia nos traz esse bem querer de volta. O bem querer ao teatro da história boa – e logo daquelas de amor, que não acaba nunca. E olhe que não quero começar falando do “como” a história é contada. Porque isso me traz à memória os moderninhos e as suas parafernálias, seja no cenário, no figurino, no vídeo, em qualquer suposta solução genial.

Queria primeiro tratar da palavra mesmo, da atuação, da clareza da dicção (ah, como isso tem sido raro! Pode acreditar, caro leitor). São só dois atores – Cybele Jácome e Luís Mármora – para contar o amor de Florentino Ariza e Fermina Daza. Mas como é García Marquez (a adaptação da dramaturgia foi feita por Ana Roxo), há muitos outros personagens que perpassam a vida desses dois, mudança de tempo e cenários, idas e vindas.

Ninguém ousaria dizer que Luís Mármora não é Florentino e que ele não ama Fermina Daza com todo o seu ser. Podemos escrever o mesmo sobre Cybele, tirando o fato de que Fermina não parou no tempo. Os dois nos levam a universos tão particulares, a sonhar juntos, a imaginar e constatar o quão grande era aquele amor. É um passeio feito sem percalços, levado por atuações seguras, convincentes e, bem mais do que isso, comoventes.

Luís Mármora

Luís Mármora

E o “como” também é lindo, funcional, mão está ali só de enfeite. A disposição cênica nos deixa muito perto dos atores; a cena se passa num corredor e as arquibancadas são colocadas uma de frente para a outra. Dez retroprojetores são capazes de criar lindas imagens em cortinas fininhas que se deslocam e a vitrolinha pode de repente, quando os anos passarem muito, tocar forró em alto mar.

É uma peça de amor (cansativo repetir? paciência!), de esperança, de se deixar encantar. Se em tantas montagens há como que “armadilhas” dramatúrgicas para que em algum momento você “caia”, seja obrigado a se reconhecer e aí as emoções soam por demais forçadas, aqui é outra coisa. Isso passa tão longe, graças a Deus, a García Márquez, ao bom teatro. O texto não precisa de quaisquer recursos “levianos” para entrar devagarzinho e fazer morada. E permanecer no peito, nas mentes, no abraço apertado.

Quem puder, não perca. É tudo que precisamos. Mais amor, por favor. E teatro bom.

Gardênia, El Otro Núcleo de Teatro (SP)
Texto: Ana Roxo, livremente inspirado em O amor nos tempos do cólera, de Gabriel García Márquez
Direção: Marat Descartes.
Concepção e elenco: Cybele Jácome e Luís Marmora
Cenário e iluminação: Cristina Souto
Figurinos: Simone Mina
Direção de produção: Maurício Inafre

Montagem faz duas últimas sessões no Hermilo nesta quinta

Montagem faz duas últimas sessões no Hermilo nesta quinta

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