Arquivo mensais:setembro 2012

Em Júlia, o teatro se faz cinema ao vivo

Espetáculo de Christiane Jatahy tem cenas filmadas ao vivo. Foto: Francielle Caetano/PMPA

Sempre achei Senhorita Julia, escrita em 1888 por August Strindberg (1849-1912), uma peça meio datada e não me entusiasmei por nenhuma montagem recente. A diretora Christiane Jathahy pegou o original e transpôs para 2012, com a senhorita do título transformada numa menina mimada, filha de um milionário, que mora numa mansão e resolve seduzir o motorista do pai por brincadeira. Mas a força da encenação de Jathahy vai além dessa atualização. Há alguns anos a encenadora pesquisa o rompimento e a fricção de fronteiras entre o teatro e as outras artes, a partir do uso de mídias tecnológicas na cena teatral. Em Corte seco, por exemplo, que esteve no Recife, a diretora carioca usou a narrativa cinematográfica e a edição para fazer de cada sessão um espetáculo diferente.

Essa fronteira borrada também está presente no espetáculo Júlia, quando o cinema é levado de forma mais radical para o teatro. E essas duas linguagens se confrontam de modo crítico, misturando etapas de criação e recepção, com a imensidão da tela no palco e o uso dos recursos de filmagem e da convenção da teatralidade. Tudo é ressignificado. Não nos esqueçamos de que vivemos num tempo de redes sociais, reality shows e esquemas de segurança.

As presenças física e virtual criam novas possibilidades de tempos e espaços. Os personagens passeiam por esses dois campos. As estruturas cinematográficas são expostas. Com cenas pré-filmadas e cenas filmadas ao vivo, o evento é construído a cada dia nas vistas do público. E é exigido do espectador que funcione com montador do que está sendo exibido. A encenadora comanda essa orquestração que exige sintonia do todo nos mínimos detalhes.

Por Júlia, a encenadora Christiane Jatahy levou o Prêmio Shell de melhor direção de 2011. Ela assina além da direção, adaptação, o roteiro cinematográfico, em parceria com David Pacheco que é responsável pela direção de fotografia.

Julia Bernat e Rodrigo dos Santos etão no elenco. Foto: Ivana Moura

Os protagonistas Julia e Jelson (Jean no original) são trazidos para o Brasil de hoje. Julia Bernat interpreta sua personagem com entrega, coragem, explorando as sutilezas, e expondo frescor e beleza. Rodrigo dos Santos faz o empregado, entende e aplica a complexidade da figura do empregado, recalcado, ambicioso e submisso. Uma das cenas mais marcantes é quando os dois transam e há um jogo da câmera para selecionar o que deve ser revelado.

Além dos dois atores no palco, também participam do espetáculo as atrizes Tatiana Tiburcio no papel da empregada e a atriz mirim Alice Gastal fazendo a menina.

Em Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, que foi aos palcos em 1943, sob a direção de Ziembinski, renovando o teatro brasileiro, três planos são apresentados (Plano da realidade, Plano da alucinação,  Plano da memória) e entrecruzamento memória / alucinação / realidade.

Em Julia, os atores Julia Bernat e Rodrigo dos Santos representam para o público, são filmados no palco pelo câmera David Pacheco (que funciona também como diretor, com os seus corta e ação) e aparecem também nas imagens gravadas. Os três planos interagem em vários momentos. Jatahy apresenta mais um jeito de fazer teatro contemporâneo.

Por também ser cinema, Júlia envolveu 128 pessoas, com os dois atores e o cameraman que estão na cena, muita gente nos bastidores e outros que participaram das filmagens.

A diretora está negociando com o Festival Recife do Teatro Nacional para participar da programação. Torçamos para que dê certo.

Ficha técnica:

Direção: Christiane Jatahy
Adaptação do texto “Senhorita Julia” de August Strindberg
Elenco: Julia Bernat e Rodrigo dos Santos
Direção de arte e cenário: Marcelo Lipiani
Concepção de cenário: Marcelo Lipiani e Christiane Jatahy
Direção de fografia: David Pacheco
Iluminação: Renato Machado
Direção musical: Rodrigo Marçal
Figurino: Angele Fróes
Orientação corporal: Dani Lima
Programação visual: Radiográficos
Assessoria de imprensa : Palavra
Conteúdo e webmarketing : Janeiro
Projeto de som: Paulo Ricardo Nunes
Mixagem de som: Denílson Campos
Projeto de projeção : Alexandre Bastos – Nova Mídia
Fotos: Gui Maia
Câmera ao vivo : David Pacheco – Paulo Camacho (stand in)
Assistente de direção: Fernanda Bond
Assistente de Figurino: Fernanda Theóphilo
Arranjos e instrumentos : Luciano Correa
Participação especial “ funk da piscina”: Felipe Abib e Cintia Reis
Aderecistas: Luiz e Massaira
Marceneiro: Lucio da Palma
Equipe de cenotécnicos:S.F Serpa Fernandes
Participação especial : Gilda (a nossa amada canarinha)
Operador de vídeo: Léo França
Operador de som: Ribamar Mathias de Oliveira
Operadora de Luz: Elisa Tandeta
Diretor de Palco: Marcelo Gomes
Diretor Técnico: Branco Katona
Produção executiva: Lara Schueler e Cristiano Gonçalves
Estagiária de produção: Jéssica Santiago
Apoio de Produção: Marcio Gomes
Direção de Produção Filme/Peça – Cláudia Marques
Um projeto da Cia. Vértice

Ficha técnica Filme
Direção de fotografia: David Pacheco
Atriz: Tatiana Tiburcio
Atriz mirim: Alice Gastal
Ator mirim: Lucas Banhos
Pai do ator mirim: Gerson de Sousa
Produção: Manuela Duque
Edição: Sergio Mekler e Christiane Jatahy
Assistente de Direção: Lara Carmo
Assistente de Câmera: Bacco Andrade
Assistente de Edição : Mari Becker
Logger: Érica Rocha
Fotógrafo Still: Gui Maia
Assistente de produção: Miriam Balen
Produtor de Locação: Rodrigo Magalhães
Produção de Arte : Marina Lage
Técnico Som Direto : Paulo Ricardo Nunes
Técnico Som Direto: Vanilton Vampiro
Mixagem: Denílson Campos
Microfonista: Fabio
Eletricista: Marcelinho Pecis
Maquinista: Edison Mugica
Assistente de Maquinária: Rodrigo Tavares
Assistente de Elétrica: Cesinha
Assistente de Maquinária: Beto
Assistente de Maquinária: Rodrigo
Geradorista: Walk
Assistente de Figurino: Fernanda
Storyboard: Raphael Jesus
Locação: Anna Santos e João Santos
Equipamento de Elétrica e Maquinária: Maico Luz e Quanta
Equipamento de Elétrica: Air Star
Caixa Estanque: Fernando Young
Monitores: Breno Cunha
Dolly: Edison Mugica
Equipamento de Mergulho: X Divers – Rodrigo Figueiredo
Efeito de sangue: Maurício Bevilacqua
Gerador: Rondinelli Pinto
Rádios: Kleber Souza
Seguranças: Body Guard – Anderson
Catering: Set food – Nicolau Barbosa
Caminhão de Eletrica e Maquinária: Finizola – Claudia
Van de Camera e Som: Duda Lima
Van de Equipe: Jair Junior
Colorista: Fabrício Batista
Advogados: Renato Guimarães
Elenco de Apoio: Gerônimo de Sousa, Davi Santos, Jupiara Gomes, Sidnei de Oliveira, Talisson Anacleto, Michele Anacleto, Diego da Silva, Lucio Lopes, Nilda Anacleto, Lenilson de Sousa, Margarida Marques, Jucelina Gonçalves, Jairo Fernandes, Edilson Martins e Geraldo do Nascimento
Realização: Sesc
Co-Produção: Fábrica de Eventos e AXIS Produções

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Experiência e graça de Caetana

Fabiana Pirro (em pé) e Lívia Falcão na peça Caetana. Foto: Ivana Moura

Madura, mas sem perder o viço. A peça Caetana, do Grupo Duas Companhias, de Pernambuco, mostrou no Porto Alegre em Cena – Festival Internacional de Artes Cênicas, que tem as qualidades da experiência e também uma vivacidade, uma ludicidade que a montagem exige. O espetáculo que se apresentou ontem no Teatro Túlio Piva lotado, faz mais duas sessões, uma hoje e outra amanhã. O público encarou a chuva e o frio para conferir as artimanhas dessas personagens de sotaque nordestino.

O termo Caetana é a poética forma de denominar a morte, utilizada pelo dramaturgo Ariano Suassuna em suas obras e poemas. A montagem de Moncho Rodriguez agregou o título e algo da estética armorial. A peça expõe a saga da encomendadora de almas Benta (Lívia Falcão), para driblar a morte/ Caetana (Fabiana Pirro).

Espetáculo participa do Porto Alegre em Cena com três apresentações

A rezadeira já facilitou a passagem e indicou o caminho do além para várias almas perdidas, em troca de dinheiro, é claro. Mas dessa vez é ela mesma quem se vê diante da morte, e vai parar no Reino do Invisível. Lá, Benta reencontra as almas anteriormente encomendadas por ela que aparecem em forma de bonecos.

A encenação faz referências ao circo, ao teatro mambembe, à literatura de cordel, ao mamulengo e a outras manifestações populares. Parte da ação se passa dentro da estrutura em formato circense. A trilha sonora, composta pelo português Narciso Fernandes, modula os climas do espetáculo com uma partitura que junta sonoridades da música ibérica e nordestina.

Caetana estreou no dia 17 de julho de 2004, no Festival de Garanhuns/PE. Tem, portanto, oito anos, mais de 150 apresentações e já foi vista por aproximadamente 55 mil pessoas, segundo a produção. Nesse percurso, o texto, de Moncho Rodriguez e Weydson Barros, ficou mais orgânico e ajustado às necessidades da cena.

A temática do inevitável encontro com a morte e a tentativa de fuga desse destino existe desde que o mundo é mundo. Esses arquétipos narrativos remetem para a tradição ibérica, suas lendas e contos maravilhosos. Nesse universo mágico, Benta traça círculos pelo espaço com Caetana no seu encalço. Outros personagens constróem outros desenhos num enredo de situações engraçadas, inclusive a aflição de Benta.

As atrizes foram aplaudidas com entusiasmo pela plateia gaúcha

As atrizes estão cada vez mais afinadas. Lívia Falcão explora de sua Benta a graça das figuras espertinhas e o carisma do palhaço. Ela imprime leveza, ousadia e ironia à sua personagem encantadora. Fabiana Pirro interpreta Caetana com sobriedade e peso e traça com seu corpo coreografias para a personagem. Pirro também faz as outras almas que foram recomendas para o além pela benzedeira, por trás de bonecos que ganham vida nas várias vozes da atriz. As duas nos divertem com nossas próprias assombrações.

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Excelência artística do Berliner Ensemble

Apresentação de Mãe Coragem, do Berliner Ensemble, no Theatro São Pedro, de Porto Alegre. Fotos: Ivana Moura

Devo confessar que a principal motivação para vir ao Porto Alegre em Cena – Festival Internacional de Artes Cênicas este ano foi conferir com meus olhos, (e os outros sentidos, racionalidade e emoção) a montagem de Mãe Coragem e seus filhos, que o Berliner Ensemble apresenta até hoje na capital gaúcha.

Assisti ontem, no 7 de setembro tão cheio de significados para o Brasil.

Foi uma sessão antológica, de um grupo que embala o nosso aprendizado, de longe, há anos.

Fiquei na segunda fila do Theatro São Pedro – cadeira 13, da fila B – quase dentro da cena, no palco com circunferência central inclinada para a plateia. Os músicos ficavam nas laterais, praticamente embaixo do palco. Holofotes parecidos com os de um estádio de futebol iluminam a ribalta, voltados para o público. Uma carroça estacionada no canto do palco reaviva a memória do texto e das falas dos personagens.

Anna Fierling adentra o palco com sua carroça e seus três filhos, cada um com sobrenome diferente. De pais diferentes. À frente do elenco, Carmen-Maja Antoni, uma atriz baixinha e ágil, de vigor e carisma que tendem a aumentar com o desenrolar da peça e que está há 36 anos na companhia. Ela explora com maestria a força a ironia e o sarcasmo da protagonista. Anna Coragem tenta proteger a prole como uma leoa. Ela pensa que isso será possível. Mas a guerra cobra sua parte. E subtrai um a um seus filhos nas batalhas.

A protagonista tenta negociar com os exércitos a permanência de seus meninos junto à mãe. E apesar de toda sua habilidade, não há negociação possível.

Atriz Carmen-Maja Antoni no papel de Anna Fierling

Há alguns momentos sublimes no espetáculo. Destaco dois: quando Anna Fierling desconhece o corpo de seu filho morto e a atriz mostra na face e na tensão do corpo toda a dualidade dos sentimentos internos de uma mãe e o instinto de sobrevivência, para defender a si própria e a filha Kattrin. A outra é uma sequência longa, que começa quando a mudinha Kattrin, defendida pela atriz Anna Graenzer, resolve tocar o tambor para avisar aos moradores do perigo, o apoio dado pelo garoto, até ela ser resgatada aos braços da mãe.

Em todo o espetáculo Carmen-Maja Antoni se mostra estupenda no seu papel, enquanto os outros integrantes também exibem harmonia e qualidade técnica de interpretação. Os herdeiros do Berliner Ensemble vêm com um elenco afinado, uma encenação austera. Mas Claus Paymann, diretor artístico da companhia, não descarta o humor, um humor ferino que faz acordar para o absurdo da situação bélica.

A peça escrita por Brecht em 1939 faz alusão às duas Guerras Mundiais que o teórico alemão atravessou. A do subtítulo – Crônica da guerra dos trinta anos, mas possui uma atualidade tão grande que remete para qualquer guerra, em que as pessoas deixem prevalecer seus piores instintos. E onde ronde a barbárie.

Dramaturgo alemão escreveu Mãe Coragem em 1939

O espetáculo falado e cantado em língua alemã contou com legendas. O pensamento artístico-político de Brecht, Helene Weigel e seus parceiros de utopia está impregnado em todos os elementos da encenação. Os traços épicos e dialéticos da montagem apostam na excelência artística.

As três atrizes da peça

As canções traduzem bem a poderosa revolução de Brecht. A técnica de esticar e quebrar a emoção chega a um patamar próximo da perfeição.

Montagem foi ovacionada no final

Para demarcar a diferença da família de Mãe Coragem, os outros personagens utilizam máscaras, como rostos pintados para a guerra. O núcleo de Coragem está de cara limpa.

Foram três horas de duração, num ritmo que nem era ágil e nem lento. As trocas de cenas deixavam o teatro no escuro por alguns segundos, o que provocava uma vontade de acompanhar essas mudanças, talvez na penumbra.

O profissionalismo é tamanho que uma figura do grupo, sentada na primeira fileira do teatro, acompanha fala por fala durante todo o espetáculo.

Ao final, a companhia foi ovacionada por um Theatro São Pedro lotado até a torrinha.

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Duas mulheres no POA em Cena

Duas mulheres em preto e branco estreou em Porto Alegre. Foto: Ivana Moura

Um beijo de um minuto e vinte segundos pode tirar muita gente do sério no espetáculo Duas mulheres em preto e branco. O incômodo pode chegar de alguma forma ao ver aquelas bocas que se comem, que se comem, que se comem. O que poderia ser excitante vira uma escavadeira a buscar as camadas mais profundas. A essa altura o público já sabe que Letícia e Sandra eram grandes amigas, que estudaram juntas, passaram incólume pelo regime militar, que faziam parte da esquerda festiva e que no fundo não acreditavam muito na política.

A peça estreou ontem, no 19º Porto Alegre em Cena – Festival Internacional de Artes Cênicas e tem mais duas apresentações, hoje e amanhã, na capital gaúcha. No Recife, a montagem deve ficar em cartaz de 29 de setembro a 21 de outubro.

A atriz Sandra Possani interpreta Sandra, que é casada com Paulo. E Paula de Renor faz Letícia, que é casada com Miguel. Formavam um quarteto. Que se desfez com a separação de Sandra e Paulo e desabou de vez quando Letícia descobre que sua grande amiga Sandra é amante de Miguel. Mas no palco só estão as duas mulheres, com suas memórias. E as acusações e ameaças. São personagens despedaçadas.

Paula de Renor e Sandra Possani são dirigidas por Moacir Chaves

Como médicas, elas já ouviram muitos relatos de dor, mas desta vez elas vomitam frustações e medos. Fazem referências aos filmes de Visconti, Fellini e Pasolini. E tentam chegar a algum lugar. E se Letícia assassinasse Sandra, seria uma solução? A intimidação aparece em muitos momentos. E as matanças simbólicas ocupam o palco no embate entre essas duas atrizes.

A montagem é uma transposição para o palco do conto homônimo de Ronaldo Correia de Brito, que faz parte do livro Retratos imorais. Não houve adaptação para o “cárcere” da dramática.

Texto da peça é de Ronaldo Correia de Brito

O diretor Moacir Chaves trabalha com teatro narrativo há algum tempo. Na montagem Duas mulheres em preto e branco ele reforça a quebra na estrutura ao organizar cenas e intercalar falas da dramatização com o discurso narrativo. Com isso, o tempo presente move-se em relação ao passado, num movimento de idas e vindas. Ao passado mais longínquo da década de 1970 até o questionamento do futuro, do que Letícia irá fazer se matar Sandra. As personagens presentificam as ações, narram e comentam e isso cria muitas unidades de descobertas e recomeços. E com isso se constrói uma pluralização de vozes e pontos de vista. Do espectador é exigida uma participação mais plena, pela imaginação dos fatos narrados.

Das atrizes foi exigido muito. Um mergulho em outras águas com muitas preciosidades. Isso é um trabalho que demanda do ator entrega e domínio técnico para que funcione como um jogo em que cada se multiplica. No início do espetáculo de estreia, as atrizes me pareceram um pouco nervosas. Absolutamente natural. Com o andamento da peça, elas foram se soltando e criando a cumplicidade com a plateia. Ficaram mais senhoras dos espaços, das intenções, das ações, com muitas nuances desse texto de Ronaldo Correia de Brito. A luz emana das duas intérpretes.

A parceria entre Moacir Chaves e o iluminador Aurélio de Simoni rende mais uma vez uma cena visualmente bonita e cativante. A cenografia de Fernando Mello da Costa tem principal artefato uma larga cama desequilibrada, como um fetiche do próprio quarto, da própria casa.
Duas mulheres em preto e branco é uma peça verborrágica, com suas duas histéricas a tentar encontrar uma saída digna depois de serem atingidas pelas fraquezas humanas.

Montagem estreia no Recife no dia 29 de setembro

A estreia de Duas mulheres em preto e branco ocorreu na mesma noite da primeira das três aguardadas apresentações do Berliner Ensemble, companhia fundada em 1949 por Bertolt Brecht e Helen Weigel, com Mãe Coragem e seus filhos. O charmoso Teatro de Câmara Túlio Piva não estava lotado. Mas tinha muita gente. Os amigos da gaúcha Sandra Possani, o diretor e toda equipe técnica e uma espectadora bem especial, Cristiane Rodrigues, neta de Nelson Rodrigues.

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Paguem Mary Vaz!

Chico César foi só uma das 400 atrações da Virada Multicultural 2011. Foto: Lú Streithorst/Prefeitura do Recife

Alguns questionam se o blog deveria se envolver nas questões de política cultural da cidade. E principalmente quando o caso é de falta de pagamento aos artistas. Ouvimos críticas por exemplo quando publicamos a carta do diretor amazonense Francisco Carlos, que apresentou seus espetáculos no Festival Recife do Teatro Nacional e não conseguia receber o pagamento de jeito nenhum. O que acho é que o blog é um espaço para isso sim. É um espaço de construção de reflexão, de cobrança, de divulgação de espetáculos, de encontros.

E aí esse post segue com mais uma história de descaso…de falta de compromisso com o artista. Quem não lembra que, ano passado, no mês de outubro, a Prefeitura do Recife inventou uma Virada Multicultural? Foram 48 horas de programação cultural – música, artes cênicas e visuais, cinema, moda, gastronomia. Mesmo que a cidade já tivesse (e tenha) milhões de festivais. E todos eles tenham problemas de divulgação, de formato, de atingir o público. Mas, afinal, naquela época João da Costa precisava melhorar a sua imagem pública.

Na coletiva de imprensa, números grandiosos – 400 atrações gratuitas, sendo, por exemplo, 62 de música e 83 de artes cênicas. Depois a gente foi olhar direitinho e percebia que a Virada tinha sim muita programação exclusiva – teve show da orquestra Buena Vista Social Club, de Alceu Valença, Fagner, Chico César, Nação Zumbi, Naná Vasconcelos – mas que também tinha incorporado todos os eventos que já iam acontecer na cidade – o Festival de Circo, o Coquetel Molotov, todas as peças que já estavam em cartaz.

Bom, fato é que na época o prefeito João da Costa chamou toda a imprensa para anunciar o evento. Disse que a Virada custaria R$ 3 milhões, que não sairíam dos cofres públicos. “A meta é que 50% ou 60% desse valor venha de patrocínios”, afirmava. E, para os artistas, João da Costa deu a sua palavra – que, pelo jeito, não vale de nada: “todos serão pagos até dezembro, inclusive aqueles que, por exemplo, participaram de outros ciclos e festivais e ainda não foram pagos”.

E aí abrimos o Facebook e ficamos sabendo de mais um caso de calote. O diretor Rodrigo Dourado iniciou uma campanha virtual: “Paguem Mary Vaz”. Ele disse que vai postar todo dia uma mesma mensagem de cobrança e repúdio. Dourado foi o curador da Virada da Performance, dentro da tal Virada Multicultural. E uma das artistas escolhidas por ele foi a performer alagoana Mary Vaz – que, até agora, quase um ano depois, ainda não recebeu o seu cachê. Sabe de quanto? R$ 1 mil. O evento custou R$ 3 milhões.

Será que as bandas grandes que se apresentaram no palco principal ainda estão sem receber? Quantos artistas ainda têm dinheiro para receber da Prefeitura? Será que são só os artistas que estão levando calote? Será que técnicos, produtores, assessores de imprensa estão sendo pagos? Quantas campanhas como esta ainda vamos fazer?

Rodrigo Dourado foi curador da Virada da Performace. Quase um ano lança a campanha: Paguem Mary Vaz! Foto: Reprodução Facebook

Seguem as publicações de Rodrigo Dourado e Mary Vaz:

Rodrigo Dourado:
“Convidada por mim (como curador) para compor a Virada da Performance, dentro da Virada Cultural de 2011, promovida pela Prefeitura do Recife, na gestão João da Costa (Secretário de Cultura: Renato L), a performer alagoana Mary Vaz continua sem receber seu mísero cachê de R$ 1.000.

Depois de várias tentativas de recebimento junto à prefeitura, a artista decidiu recorrer a mim para que a ajudasse. Após várias mensagens e conversas com membros da prefeitura, sem uma resposta definitiva, decidimos tornar público o (des)caso.

A Prefeitura do Recife não trata os artistas como profissionais. Profissional é quem trabalha e recebe por isso, para pagar suas contas. Quando deixa um artista sem cachê por um ano, a prefeitura prova que considera a atividade artística um hobby, uma brincadeira de criança, pois pressupõe que os artistas desempenham outras atividades para sobreviver.

Por essas e outras, eu começo campanha: PAGUEM MARY VAZ! (Dia 01)

Todos os dias, esta mesma mensagem será postada para que casos como este não caiam no esquecimento, contabilizando quanto tempo mais será necessário à Prefeitura do Recife para que honre seu compromisso, tenha responsabilidade, hombridade e ética.”

Mary Vaz:

“É com grande pesar que inicio minhas palavras a essa postagem!
Caros amigos da vida e consequentemente, do Facebook. Ano passado no mês de outubro, no mais exato dia 14 fui convidada para participar do Festival Multicultural de Recife com a performance Anônimo (A). Trabalho este que hoje fazem 11 meses que a Prefeitura de Recife NÃO me pagou! Através de e-mails tenho tentado me comunicar e obter …alguma resposta mas NADA me é informado sobre isso. Por isso, venho através da rede social Facebook, fazer esse apelo por esse pagamento justo do meu trabalho.
Porque sou artista, não preciso de dinheiro? Quanta falta de respeito e consideração pela a arte e artista!!?? Espero que agora com esse manifesto, alguém apareça pra me dar alguma resposta e finalmente me pagar. Por enquanto está nas palavras…Muito triste com tamanho descaso com a obra e com o material HUMANO!
NÃO ESTOU MENDIGANDO! SÓ IMPLORANDO QUE MEU TRABALHO SEJA PAGO JUSTAMENTE! PUTA QUE O PARIU! SERÁ POSSÍVEL QUE EM PLENO ANO 2012 TENHAMOS QUE PASSAR POR TAMANHA HUMILHAÇÃO ? MUITO TRISTE COM TUDO ISSO!”

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