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Vivência contra preconceitos

Espetáculo autobiográfico toca nas feridas do racismo, da homofobia e dos fundamentalismos religiosos

“Quando você descobriu que era negro?”, questiona o ator Marconi Bispo no espetáculo Luzir é Negro, do coletivo Teatro de Fronteira, com direção de Rodrigo Dourado. Pergunta carregada de história de discriminação e preconceito racial de um Brasil hipócrita e desigual. Luzir é Negro faz uma sessão especial de despedida da temporada deste ano no Espaço O Poste, neste domingo (04/12), às 17h.

De acordo com Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo IBGE em 2014, 53% dos brasileiros se afirmaram como negros e pardos, num acréscimo de 5 pontos porcentuais em analogia com pesquisa idêntica feita há dez anos.

O geógrafo brasileiro Milton Santos (1926 –2001), em uma palestra lembrou que os professores Florestan Fernandes e Otavio Ianni, escreveram “que os brasileiros, de um modo geral, não têm vergonha de ser racista, mas têm vergonha de se dizer que são racistas”. Essa tese provoca uma reflexão pertinente sobre discursos e aparências, sentimentos que mobilizam e processos de exclusão.

Marconi Bispo sentiu na pele a segregação no ambiente de trabalho, a desconfiança sobre suas guias ritualísticas do candomblé e a rejeição na vida afetiva.  O ator partiu para investigar essas cicatrizes do corpo e da alma a partir de sua própria vivência. E foi justamente o insucesso (?) na vida amorosa o gatilho para transformar suas experiências em  material dramatúrgico da montagem.

Marconi Bispo em Luzir é Negro

Marconi Bispo em Luzir é Negro. Fotos: Ricardo Maciel / Divulgação

A mentalidade misógina, homofóbica e racista e o fundamentalismo religioso e político são interrogados na montagem Luzir é Negro, a partir das experiências do intérprete, das violências simbólicas (e físicas) a que está exposto como homem negro, homossexual e do candomblé. Para traduzir a dimensão das ofensas e mágoas, a peça utiliza os procedimentos do biodrama e do teatro documental.

A dramaturgia é complementada por referências a textos como Os Negros, de Jean Genet, de Arena Conta Zumbi, musical escrito por Gianfrancesco Guarnieri e Augusto Boal, Gota D’água, de Chico Buarque e Paulo Pontes. Além de referências a acontecimentos como o que envolveu o diretor Cláudio Botelho, gravado em um rompante racista e em outras matrizes documentais: redes sociais, matérias e artigos de jornal, documentos históricos, etc.

Marconi, também cantor, é acompanhado em cena pelos músicos Kiko Santana e Basílio Queiroz.

O racismo mata. Das mortes físicas, o relatório final da CPI do Senado sobre o Assassinato de Jovens, deste ano, aponta que 23.100 jovens negros de 15 a 29 anos são assassinados: 63 por dia, um a cada 23 minutos.

Mas há muitas outras formas de apagamento. Também cruéis. Luzir é Negro trata um pouco disso tudo a partir das histórias e memórias de um homem negro de 39 anos – destes, 21 dedicados ao teatro – situado no Pernambuco do Recife, no Nordeste do Brasil, um país que vem dando macha a ré nas conquistas pelos direitos e cidadania.

FICHA TÉCNICA
Atuação: Marconi Bispo.
Direção: Rodrigo Dourado.
Dramaturgia: Marconi Bispo e Rodrigo Dourado.
Preparação Corporal: Pollyanna Monteiro.
Direção de Arte: Marcondes Lima (figurinos) e Plínio Maciel (elementos cenográficos e adereços).
Coreografias: Edson Vogue.
Iluminação: João Guilherme de Paula.
Edição de trilha: Rodrigo Porto.
Assessoria de Imprensa: Cleyton Cabral.
Músicos: Kiko Santana (guitarra e direção musical) e Basílio Queiroz (contrabaixo).
Fotos e vídeos: Ricardo Maciel.
Identidade Visual: Arthur Canavarro.
Assistência de Produção: Rodrigo Cavalcanti.
Realização: Teatro de Fronteira.

SERVIÇO
Luzir é Negro, do Teatro de Fronteira
Quando: Sessão especial neste domingo (04/12), às 17h.
Onde: Espaço O Poste (rua da Aurora, 529, Boa Vista)
Ingressos: R$ 30 e R$ 15 (meia)

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