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Fósseis do amor e da luxúria

Ossos, com o Coletivo Angu de Teatro, está em cartaz no Teatro Apolo

Ossos, com o Coletivo Angu de Teatro, está em cartaz no Teatro Apolo

Ossos, o espetáculo do Coletivo Angu de Teatro, já nasceu grande. É corajoso. E não vai gerar consenso. A prosa vigorosa do escritor Marcelino Freire chega ao palco potente, com as sujeiras do escândalo. A montagem está impregnada pelas marcas de trepadas pagas, cinismo como moeda de sobrevivência, pequenas ações traiçoeiras para se dar bem. Estão expostas alma, coração, pele, carne até o osso. Heleno de Gusmão é o protagonista que precisa resgatar e devolver o corpo morto de um michê aos pais do garoto, que moram no interior de Pernambuco. Heleno se mudou na juventude do Recife para São Paulo por causa de Carlos, seu primeiro amor, e para escrever peças. Alcançou notoriedade. E perdeu muitas coisas pelo caminho, da ingenuidade à fé na vida.

Enquanto encara a missão “o meu boy morreu” navega por sua própria história, do teatro feito no Recife à conturbada peregrinação de imigrante nordestino que vence em São Paulo.

A tensa, densa e intensa trajetória dramática de Heleno se manifesta enredada entre aventuras intelectual e sexual, com simpatizantes e michês. Ao expor sucessos e fracassos do protagonista como faces da mesma moeda da ilusão, Ossos faz uma ode ao teatro, um metateatro indireto celebrando suas funções.

Um desafio e tanto para o grupo. Materializar na cena os fósseis com a melancolia da infância, a paixão pelo boy, as figuras da noite, os nove irmãos, os outros michês, o IML, o carro fúnebre de Lourenço, os seios de Estrela, o assassinato no ir-e-vir de uma narrativa transbordando de malandragem paulistana.

O espetáculo flui. Os elementos bolem de forma verossímil. O ritmo da prosa de Marcelino – direta, seca, afiada – é amplificado. E ganha reforço na música de Juliano Holanda, que às vezes amacia as situações para provocar um corte ainda mais profundo. O elenco canta bonito. É uma comunhão. Juliano Holanda é aquele artista pernambucano que o Brasil inteiro precisa conhecer. Show de talento.

O discurso indireto livre – técnica que aproxima a voz do narrador com a voz dos personagens – do romance original assume alternadamente planos da memória, alucinação e do desencanto real, que se embaralham em ordem não cronológica. A linguagem do cinema é harmonizada nessa convivência de planos. O teor noir na cartela de cores escolhida para o protagonista e o coro de urubus sem vivacidade, enquanto as lembranças de Heleno são bem coloridas.

Os personagens secundários do romance formam o coro de urubus na peça, que expõe os episódios de forma alegórica. As cenas fortes no envolvimento sexual são ousadas e convincentes. Os corpos desnudos ou cobertos trafegam com desenvoltura pela cena.

Enquanto o público se acomoda, o ator André Brasileiro espia a movimentação dos espectadores da plateia. No palco os homens-urubus traçam suas coreografias. A sombra, o escuro iluminado em partes e um clima de noite gay decadente tomam conta do teatro.

Com temática LGBT, peça mostra o lado humano e sentimental de personagens ainda estigmatizados

Marcondes Lima interpreta Estrela, uma trans

Há o tratamento de uma humanidade sem maquiagem, no fundo machucada por alguma injustiça. A luz de Jathyles Miranda reforça a escuridão da alma, os abismos dos personagens. E dramatiza com vermelhos, monta luzes na beirada do palco num misto de boate e circo, distorce ambientes. O espetáculo tem um tom escuro, numa iluminação que traduz suas figuras atormentadas e febris.

As curvas sinuosas da narração são bem dirigidas por Marcondes Lima e sua assistente de direção Ceronha Pontes. O Coletivo Angu de Teatro mostra plena maturidade com a montagem.

Marcondes Lima mais uma vez assina direção de arte e o elegante figurino da peça, que compartilha com as opções da montagem. A peça apela para o pop, na iluminação, música, direção de arte e até atuação do elenco. A dramaturgia do texto e da cena traz essa combinação Marcelino Freire puro sangue com Marcondes Lima em voo inspirado.

O elenco está afinado. André Brasileiro se dedica a interpretação sóbria, que carrega o peso do tempo e das desilusões do protagonista. O versátil Arilson Lopes faz várias participações e a do Seu Lourenço, o motorista, é preciosa. Marcondes Lima é tão bom ator quanto diretor. Ele defende Estrela, a trans com pulso e graça e arrancou aplausos da plateia na estreia. Ivo Barreto é um ator que consegue fazer um cafuçu e um gay com a mesma propriedade, convicção e alegria de atuar. Tanto Daniel Barros quanto Robério Lucado interpretam os michês com dignidade, demonstrando a mistura de esperteza e graça dos personagens. Barros se sobressai no papel de Cícero e Lucado eleva o tom na dança de “moreno tropicano”.

Marcelino Freire, que tem um livro de contos chamado Amar é Crime erigiu seu Heleno, nesta peça dura e triste, dos fósseis do amor não cultivado, não compartilhado. O personagem não exercita relações amorosas, mas o contato sexual com michês, perfeitos em seus ofícios. Destituído de amor, o sexo de curiosidade, as metidas de rua e o foder gostoso são opções com gosto de morte.

Angu de Teatro - 3

Coro de urubus

A estreia do espetáculo no Teatro Apolo fez a festa na rua do mesmo nome. Uma fila imensa já dobrava a esquina uma hora antes do início marcado. Muitos artistas da cidade compareceram, inclusive o autor do romance e da peça Marcelino Freire.

O calor no Recife e a espera podem ter contribuído para que, psicologicamente, o espetáculo parecesse estendido no final.

E depois teve uma festa na área de convivência entre Apolo e Hermilo Borba Filho, animada pelo DJ Pepe Jordão. Foi de arrasar.

SERVIÇO
Ossos, do Coletivo Angu de Teatro
Quando: Sextas, às 20h, sábados, às 18h e às 21h e aos domingos, às 19h
Onde: Teatro Apolo (Rua do Apolo, 121, Bairro do Recife)
Ingresso: R$ 20 e R$ 10 (meia)
Classificação indicativa: 16 anos
Informações: 3355-3321

FICHA TÉCNICA
Texto: Marcelino Freire
Direção: Marcondes Lima
Direção de arte, cenários e figurinos: Marcondes Lima
Assistência de direção: Ceronha Pontes
Elenco: André Brasileiro, Arilson Lopes, Daniel Barros, Ivo Barreto, Marcondes Lima, Robério Lucado
Trilha sonora original – composição, arranjos e produção: Juliano Holanda
Criação de plano de luz: Jathyles Miranda
Preparação corporal: Arilson Lopes
Preparação de elenco: Ceronha Pontes, Arilson Lopes
Coreografia: Lilli Rocha e Paulo Henrique Ferreira
Coordenação de produção: Tadeu Gondim
Produção executiva: André Brasileiro, Fausto Paiva, Arquimedes Amaro, Gheuza Sena e Nínive Caldas
Designer gráfico: Dani Borel
Fotos divulgação: Joanna Sultanum
Visagismo: Jades Sales
Assessoria de imprensa: Rabixco Assessoria
Técnico de som Muzak – André Oliveira
Confecção de figurinos: Maria Lima
Confecção de cenário e elementos de cena: Flávio Santos, Jorge Batista de Oliveira.
Operador de som e luz: Fausto Paiva / Tadeu Gondim
Camareira: Irani Galdino

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Pelo resgate da dignidade esgarçada

Depois de cinco anos sem estrear espetáculo, retorna aos palcos com Ossos, de Marcelino Freire. Joanna Sultanum

Depois de cinco anos sem estrear espetáculo, Angu de Teatro retorna aos palcos com Ossos. Foto: Joanna Sultanum

A peça Ossos, do Coletivo Angu de Teatro, é a estreia mais aguardada do Recife deste ano; ou pelo menos deste primeiro semestre de 2016. Com texto de Marcelino Freire, adaptado pelo autor do romance Nossos Ossos (Record, 2013) para o dramático, a montagem reafirma a parceria entre o escriba e o grupo teatral, que começou em 2003 com a encenação de Angu de Sangue, passou por Rasif – Mar que arrebenta, e chega a Ossos. O espetáculo dirigido por Marcondes Lima inicia temporada neste sábado, dia 11 de junho, no Teatro Apolo e segue até 26 de junho, com sessões nas sextas, às 20h, nos sábados, às 18h e 21h, e nos domingos, às 19h.

Cada um carrega o que o constitui. Lembranças, fantasmas, decepções, alegrias e muitas pessoas – vivas ou mortas – que atravessaram o caminho. O cadáver do amante do dramaturgo Heleno de Gusmão está no centro da narrativa de Ossos. O protagonista precisa entregar os restos mortais do garoto aos familiares em Sertânia, no interior de Pernambuco. Em nome de uma dívida de sobrevivência e da dignidade esgarçada.

Os acontecimentos são expostos de modo não linear, embaralhados no tempo/espaço. Parte se desenvolve no submundo paulistano e outra se move na estrada que leva o escritor até o Sertão pernambucano de sua infância.

Com temática LGBT, peça mostra o lado humano e sentimental de personagens ainda estigmatizados

Com temática LGBT, peça mostra o lado humano e sentimental de personagens ainda estigmatizados

A peça dramatiza a subjetividade de Heleno de Gusmão, com estilhaços de memória, cenas de sonho e materialização de uma vida suprarreal. A atmosfera carregada de sombras, formas bizarras e distorções visuais, remete para o universo fronteiriço de sonho e pesadelo.

Nessa narrativa fragmentada, a peça dá saltos para a frente e para trás, explorando cortes secos, sobreposições e fusões de cenas, nas pegadas de um processo cinematográfico.

O clima sombrio é reforçado pela presença de um coro de urubus, permeado pela presença da morte; e subvertido pelo humor e o colorido da ação de alguns personagens.

No elenco estão os atores André Brasileiro, Marcondes Lima, Arilson Lopes, Ivo Barreto, Daniel Barros e Robério Lucado. A trilha sonora, assinada por Juliano Holanda, conta com mais de 20 canções. O autor Marcelino Freire é aguardado na estreia.

A montagem de Ossos é patrocinada pelo prêmio Myriam Muniz da FUNARTE – Ministério da Cultura – Governo Federal.

SERVIÇO
OSSOS
Estreia: 11 de junho, às 21h
Temporada: de 11 a 26 de junho – Sextas, às 20h; Sábados, às 18h e 21h; Domingos, às 19h
Onde: Teatro Apolo (Rua do Apolo, 121, Bairro do Recife)
Ingressos: R$20,00 inteira / R$10,00 meia-entrada
Informações: 81 3355-3321
Classificação indicativa: 16 anos

FICHA TÉCNICA
Texto: Marcelino Freire
Direção: Marcondes Lima
Direção de arte, cenários e figurinos: Marcondes Lima
Assistência de direção: Ceronha Pontes
Elenco: André Brasileiro, Arilson Lopes, Daniel Barros, Ivo Barreto, Marcondes Lima, Robério Lucado
Trilha sonora original – composição, arranjos e produção: Juliano Holanda
Criação de plano de luz: Jathyles Miranda
Preparação corporal: Arilson Lopes
Preparação de elenco: Ceronha Pontes, Arilson Lopes
Coreografia: Lilli Rocha e Paulo Henrique Ferreira
Coordenação de produção: Tadeu Gondim
Produção executiva: André Brasileiro, Fausto Paiva, Arquimedes Amaro, Gheuza Sena e Nínive Caldas
Designer gráfico: Dani Borel
Fotos divulgação: Joanna Sultanum
Visagismo: Jades Sales
Assessoria de imprensa: Rabixco Assessoria
Técnico de som Muzak – André Oliveira
Confecção de figurinos: Maria Lima
Confecção de cenário e elementos de cena: Flávio Santos, Jorge Batista de Oliveira.
Operador de som e luz: Fausto Paiva / Tadeu Gondim
Camareira: Irani Galdino

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Se jogue no brega com o Grupo Experimental!

Breguetu faz nova temporada no Espaço Experimental Foto: Rogério Alves

Breguetu faz nova temporada no Espaço Experimental,no Bairro do Recife. Fotos: Rogério Alves

O que é ser brega? Na música, na dança, na moda, no visual, o gênero se espalhou e o estilo ostentação vai do subúrbio ao centro e eclode em um território rizomático. Artistas da periferia disseram estou aqui e não estou nem aí para as regras do bom gosto burguês ou de técnicas tradicionais.  A liberdade de cantar e dançar suas realidades é defendida como a democratização que permite a qualquer um virar um astro. Vale a comunicação do  sentimento e da situação.  O espetáculo de dança Breguetu, do Grupo Experimental, ressalta o lado festivo do fenômeno como identidade. E com essa alegria contagiante, a trupe inicia nova temporada neste sábado (16) e fica em cartaz todos os sábados, às 20h e domingos, às 19h. Depois vai circular pelo Norte e Sudeste, com incentivo do Prêmio Klauss Vianna e do Funcultura.

A peça surgiu a partir da pesquisa A dança no corpo desse lugar, realizada pelo Experimental em 2014, que investigou os movimentos e manifestações culturais do Recife. O espetáculo concebido pela diretora da companhia, Mônica Lira, percebe a contaminação do brega no ritmo do Recife. Bregaetu ganhou o prêmio de Melhor Espetáculo pelo júri técnico do 21º Janeiro de Grandes Espetáculos.

O brega provoca movimentos de repulsão quando é taxado de feio ou cafona. Mas carrega seus distintivos para seus protagonistas. A relação amorosa pode ser rotulada de brega, pelos olhos recriminatórios de quem está de fora. Quem participa está tomado. E é com esse anseio de pertencimento, de algo inebriante que a equipe dança num clima de felicidade. Na sensualidade do corpo e no sorriso no rosto.

Nessa dança da alegria, o Experimental aponta que “todos somos bregas em alguma coisa na vida”.  Muito além dos estereótipos, carrega na ginga a legitimação da periferia. Tudo junto e misturado: sinais de violência e erotismo, denúncia de disparidades sociais e do “eu lírico”. Manifestações populares com doses generosas de humor.

Espetáculo tem direção de Mônica Lira

Espetáculo tem direção de Mônica Lira

Ficha Técnica
Concepção e Direção: Mônica Lira (Grupo Experimental)
Intérpretes Criadores: Lilli Rocha, Jorge Kildery, Rafaella Trindade, Gardênia Coleto, Márcio Filho e Rebeca Gondim
Projeto de Iluminação: Beto Trindade
Trilha sonora: Marcelo Ferreira e João Paulo Oliveira
Sonoplastia: Adelmo do Vale
Figurino: Carol Monteiro
Design: Carlos Moura
Cabelo e maquiagem: Jennyfer Caldas
Produção: Emeline Soledade
Cenotécnico: Eduardo Autran
Textos e assessoria de comunicação: Paula Caal
Duração: 60’
Indicação: 16 anos

Serviço
Espetáculo Breguetu, do Grupo Experimental
Quando:
Sábados, às 20h, domingos. às 19h, a partir do dia 16 de abril
Onde: Espaço Experimental – Rua Tomazina, nº 199, 1º andar, Recife Antigo
Ingresso: R$ 30 e R$15 (meia), à venda no local, duas horas antes do espetáculo
Informações: (81) 3224-1482 / 98812-1036

 

 

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Nova temporada de Breguetu

Grupo Experimental. Fotos: Camila Sergio

Encenação do Grupo Experimental, com direção de Mônica Lira. Fotos: Camila Sergio

Brega é um estado de espírito. De festa e de vida. Alguém duvida? O Grupo Experimental dança essa celebração no espetáculo Breguetu. A montagem estica a temporada por mais três fins de semana, no Espaço Experimental, no bairro do Recife, às sextas e sábados, às 20h, de 1º a 16 de maio.

Sabemos que a palavra brega carrega significados, história, classe social e rótulos de exclusão. Pode ser apontada como algo cafona, feio. Na moda pode ser o exagerado. Na música, a melodia simples, de fácil apelo popular, que traga um conteúdo de “sofrencia” em suas letras. Pode ser um pensamento menos elaborado. Dizem que até o amor é brega.

A bailarina e coreógrafa Mônica Lira captou que todos somos bregas em alguma coisa na vida. E teceu sua narrativa de dança-teatro de forma intimista, com a leveza de quem se entrega à felicidade de rostinho colado, dos românticos populares que enchem os salões de baile. Mas inclui o pensamento crítico para encarar o gênero e sua relação com as classes sociais.

Breguetu começou com a pesquisa A dança no corpo desse lugar, quando o Experimental investigou os movimentos e as manifestações culturais do Recife. Desse trabalho, a equipe identificou o brega como um fenômeno que cresce atualmente, em festas de todas as facções. O espetáculo é resultado desse diagnóstico e das experiências individuais de cada bailarino.

A montagem estreou no 21º Janeiro de Grandes Espetáculos, e ganhou o prêmio de Melhor Espetáculo pelo júri técnico do festival.

Serviço
Espetáculo Breguetu
Quando: Sextas e sábados, sempre às 20h, de 1º a 16 de maio, ,
Onde: Espaço Experimental – Rua Tomazina, nº 199, 1º andar, Recife Antigo
Ingresso: R$ 20 e R$10 (meia), à venda no local, uma hora antes do espetáculo
Informações: (81) 3224-1482

Breguetu é resultado de pesquisa e experiência dos bailarinos

Breguetu é resultado de pesquisa e experiência dos bailarinos

Ficha Técnica
Concepção e Direção: Mônica Lira (Grupo Experimental)
Intérpretes Criadores: Lilli Rocha, Jorge Kildery, Jennyfer Caldas, Rafaella Trindade, Gardênia Coleto e Márcio Filho
Projeto de Iluminação: Beto Trindade
Produção musical: Marcelo Ferreira e João Paulo Oliveira
Design Gráfico: Carlos Moura
Produção: Emeline Soledade
Assessoria de Comunicação: Paula Caal
Figurino: Carol Monteiro
Concepção e produção de cabelo e maquiagem: Jennyfer Caldas
Cenotécnico: Eduardo Autran
Ator convidado: Vavá Schön-Paulino
Colaboração: Adelmo do Vale
Duração: 60’
Indicação: 16 anos

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