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Cada um carrega sua dor

Marcelo Oliveira faz um personagem que briga com formigas. Fotos: Ivana Moura

Marcelo Oliveira faz um personagem que briga com formigas. Fotos: Ivana Moura

imageDeixa ser eu. O título é muito sugestivo e convoca tantas subjetividades. Obra imagética. Vem com uma torrente de desejos e revela camadas de dores, amor, apego, violência, abandono. O espetáculo ocupa a casa 300 da Rua da Glória, no bairro dos Coelhos, a residência do ator e diretor Jorge Clésio. O lugar aceita as inquietações dos artistas Marcelo Oliveira, Wagner Montenegro e Greyce Braga. São três histórias principais, três respiros e um epílogo. E faz parte da Mostra Teatro em Casa.

A primeira cena se passa em off, enquanto as três vozes discutem sobre proibições e usam respostas da linguagem de rua (ou chulas, a depender dos ouvido de quem tem) para contrapor os interditos sociais. É uma dinâmica interessante. O público ajeitado na primeira sala, com as portes e janelas abertas, mas com grades como proteções, escuta, às vezes ri. Paira uma tensão cênica no ar.

Um homem solitário vive a matar formigas enquanto fala da sua experiência insana de prosseguir vivo diante da ausência de um irmão / amigo / amado que que foi assassinado. Marcelo Oliveira interpreta na segunda cena (a primeira história) essa criatura fragilizada, que enfrenta um exército de formigas, enquanto expõe sua aflição. Ele está sentado na cama e a plateia espalhada pela sala nas cadeiras e pelo chão. A dramaturgia clama por trabalhar melhor a poética desse ser em pedaços que fala de doces para os insetos enquanto sua vida é muito amarga. Há momentos de força, de construções tocantes (frases, imagens e tempos), mas que se desmancha muito rapidamente pela questão da dramaturgia.

Greyce Braga como a crítica de teatro.

Greyce Braga como a crítica de teatro.


O segundo respiro é mais engraçado. Greyce Braga caricatura uma repórter / crítica de um jornal / blog. E como é fácil satirizar esses seres em extinção que se dediquem ao ofício da crítica de teatro!!! É divertido o seu diálogo com o público, a inteiração com a cena local e sua desenvoltura salientando a pressa, a falta de paciência e um olhar obtuso sobre seu objeto de análise. Engraçado.

Violência doméstica

Violência doméstica


“Estava trabalhando” repete a mulher para o marido várias vezes ao voltar para casa. A assistência já havia sido deslocada para outra sala. E acompanha ávida o que em princípio é uma cena quente de dois amantes. Eles se deslocam para o quarto enquanto ouvimos os sons de violência doméstica. Um respiro tenso, terrível se pensarmos que essas coisas estão mais próximas da realidade do que da ficção.

Wagner Montenegro como o travesti Jacinta

Wagner Montenegro como o travesti Jacinta


Jacinta (Wagner Montenegro), a protagonista da segunda história é um travesti que trabalha na Boa Vista, tem um romance com um padre e conta detalhes sórdidos de seus encontros com homens casados. Narra que faz tudo por dinheiro e finge gozar, mas se contradiz revelando o desejo por uma relação afetiva em outros termos. Sonha em ser atriz de Hollywood. O ator narra as desventuras de suas personagem, mas delimita seu espaço de atuação em um pequeno espaço entre o espelho e o vão da porta. Precisa destacar mais as nuances dessa figura, para tirar o peso do clichê que ronda esse papel social. É uma personagem facilmente reconhecível.

É ótima a atuação de Greyce Braga

É ótima a atuação de Greyce Braga


Iracema tomou como missão ensinar aos noivos da Igreja da Soledade como cuidar de flores. A crueza dessa personagem é despetalada com a narração de sua história, do marido, dos aprisionamentos, do lado dos espinhos das flores. A atuação de Greyce Braga é comovente. Extrai a delicadeza de uma tarefa preservada no trato dessa mulher que foi oprimida, castigada e inventa outros parâmetros para sobreviver.

Tocantes são esses gritos, apelos, pedidos de socorro desses personagens, que situados no Bairro da Boa Vista/ Coelhos se mostram nossos vizinhos, que ignoramos. Mas a intimidade deles está exposta ali, para esse pequeno grupo – que é a plateia – acompanhar e refletir sobre a crueza desses dias que correm tão solitários. A fluidez com que as cenas são organizadas no casarão também leva para ressignificações do nosso convívio social e a falta de humanidade que deixamos escapar nas pequenas coisas.

Eles, os personagens, podem ser qualquer um. E o elenco trabalha nesse campo sensorial, na proximidade. E o espectador pode sentir a respiração do intérprete e suas pulsações. E isso é algo especial.

Ficha técnica
Texto e Direção: Marcelo Oliveira
Elenco: Greyce Braga, Marcelo Oliveira e Wagner Montenegro
Direção de arte: Greyce Braga, Marcelo Oliveira e Wagner Montenegro
Realização: Hazzô

SERVIÇO
Deixa ser eu, de Hazzô
Quando: Segunda (26) e terça (27), às 20h
Onde: Casa Outrora – Rua da Glória, 300, Boa Vista
Ingresso: R$ 20 e R$ 10

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Melhor tradução do espírito natalino

11º Baile do Menino Deus – Uma Brincadeira de Natal. Foto: Gianny Melo

11º Baile do Menino Deus – Uma Brincadeira de Natal. Foto: Gianny Melo

Dezembro vem acompanhado de promessas de amor fraterno e desejos sinceros de felicidade. Seguindo o melhor espírito natalino, um palco é erguido na Praça do Marco Zero, no Recife, para uma celebração cênica. Ali, à beira do Rio Capibaribe, há 11 edições é realizado o Baile do Menino Deus – Uma Brincadeira de Natal. Acompanho esse baile há anos, em saletas, teatros e no Marco Zero. O Baile foi criado há 31 anos e desde 2004 é encenado ao ar livre no Marco Zero.

No início dessa sua bem-sucedida temporada ao ar livre, fiquei com receio da história se perder na amplidão. Que nada! A saga de Mateus em busca da criança ganhou força, fôlego e reforço de novos elementos. Sob a direção do dramaturgo Ronaldo Correia de Brito – que assina o texto junto com Assis Lima e tem trilha sonora de Antônio Madureira – a peça assumiu a função de ópera popular de Natal.

A partitura física do espetáculo elege os folguedos populares da região para engrandecer a história do Natal e trazê-la para bem pertinho do público local. As coreografias sonoras e visuais espalham-se por toda a praça em lampejos de bons sentimentos.

Uma linda ópera de rua, que desloca a ânsia de encontrar o pequeno Cristo em alegria que afaga o coração de cada um dos espectadores. Personagens da cultura popular nordestina ganham papel de destaque na jornada de Mateus. Como sabemos, essas criaturas fantásticas colaboram a seu modo na empreitada. Entre eles a Burrinha Zabilin, Anjo Bom, o Sol, a Lua, a Estrela, a Ciganinha e o Monstro Jaraguá, que ganham músicas e coreografias para suas ações.

A figura de Mateus é dobrada e interpretada por dois atores: Arilson Lopes e Sóstenes Vidal. O elenco é grande e inclui Zé Barbosa (José), Isadora Melo (cantora-atriz com uma linda voz, no papel de Maria). além dos cantores solistas Silvério Pessoa, Surama Ramos, Jadiel Gomes e Virgínia Cavalcanti.

José Barbosa e Isadora Melo

José Barbosa e Isadora Melo

Este ano, a atriz Greyce Braga, integrante da ONG Doutores da Alegria, debuta como uma palhaça nos entreatos da montagem. Ela vai contracenar com o artista circense italiano Damiano Massaccesi, que está no espetáculo desde o ano passado.

A trilha sonora é executada ao vivo por 13 músicos, regidos pelo maestro José Renato Accioly. Doze crianças integram o coro infantil; o coro adulto é formado por 13 cantores.

A cenógrafa Séphora Silva fez uma releitura dos cenários de Marcondes Lima e acrescentou referências às pontes do Recife e ladeiras de Olinda; e as portas se multiplicaram. O VJ Mozart Santos também leva novidades com as suas projeções.

Essa festa cênica começa nesta terça-feira (23) e segue até quinta-feira (25), sempre às 20h, no Marco Zero, Bairro do Recife.

Serviço
11º Baile do Menino Deus – Uma Brincadeira de Natal
Quando: Terça (23), quarta (24) e quinta-feira (25), às 20h
Onde: Praça do Marco Zero, no Bairro do Recife
Quanto: Entrada gratuita

Temporada 2014 do espetáculo começa nesta terça-feira (23) e vai até o dia 25

Temporada 2014 do espetáculo começa nesta terça-feira (23) e vai até o dia 25

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É melhor ser alegre…

Palhaços em ConSerto é um espetáculo sem contra-indicação

A arte da palhaçaria é algo bem delicado, que trafega em uma fronteira tênue entre o tom perfeito e exagero. Quando falo tom perfeito não me refiro a nenhuma fórmula consagrada, forma ou coisa do gênero. A piada pode ser batida, mas o artista, quando tem uma graça só dele, subverte sentidos fazendo com que pareça algo inusitado.

Não fui uma criança de muitas gargalhadas. Achava tudo sério. Todo mundo ria de uma topada do outro, ou quando alguém escorregava numa casca de banana. Era automático para eles. Pra mim não. Ficava com pena da criatura, ali esborrachada, humilhada. Mas mesmo com toda seriedade, desde sempre adorei teatro, circo e palhaços. Ficava vidrada na performance daqueles caras que conseguiam arrancar ondas de risos da plateia. Nunca deixei de gostar deles.

Ontem fui assistir novamente ao espetáculo Palhaços em ConSerto, com os Doutores da Alegria. Posso garantir que minha tarde ficou muito mais feliz.

O teatro Marco Camarotti (do Sesc de Santo Amaro – que fica ali perto do cemitério) estava lotado. E muitas crianças estranharam aquelas figuras de nariz vermelho e cara pintada. Alguns choraram. Mas a maioria se divertiu muito. Os adultos também.

Rocco Wicks na plateia dos Doutores da Alegria

Fui com Rocco Wicks e sua querida avó, Suzana Costa. O menino de dois anos se comportou como um príncipe. Bateu palmas, riu muito e tirou fotos depois. Eu adoro o espetáculo e não me contive; soltei sonoras gargalhadas. Suzana disse que gostou, mas ela é a mais crítica de nós três… talvez de todo o teatro.

Mas vamos voltar o foco para o palco. Uma trupe de palhaços que também tem sua lista de remédios contra a dor, a tristeza, a falta de ânimo, essas coisinhas que deixam um ser humano meio jururu.

Alegria das crianças

É uma gente muito talentosa. Nesse elenco tem médico para praticamente todos os males. Anderson Douglas é o dr. Cavaco; Arilson Lopes é o Dr. Ado, Eduardo Filho, o Dr. Dud Grud; Enne Marx, a dra. Mary En; Fábio Caio, o dr. Eu Zébio; Greyce Braga a dra. Monalisa; Juliana Alemeida, a dra. Baju; Luciano Pontes, o dr. Lui; Marcelino Dias, o dr. Micolino; Tâmara Lima, a dra. Tan Tan.

As paródias musicais são hilárias e as personalidades que eles criaram transbordam de humor. Cada um explora um detalhe. Há melancólicos, bobinhos, espertos, graciosos, abusados. Eu tenho os meus preferidos. É sempre um prazer assistir a algo com Arilson Lopes ou Fábio Caio, por exemplo. Eduardo Filho está bem como o mais bobo e o jeitinho e os cabelos da dra. Tan Tan me conquistam. Mas o espetáculo fica grande pelo conjunto de talentos. Um ou outro se destaca em algum momento, mas a proposta parece que é mesmo o investimento no trabalho coletivo para vencer os desafios de plantar humor na vida das pessoas.

A montagem é dividida em três partes: momento besteirológico (com as canções trabalhadas nos hospitais), Momento ‘bolsa Nova’, com músicas da bossa nova, e momento ‘no quintal de casa’, que remete ao cancioneiro popular.

Nas músicas criadas pelo grupo e outras de domínio público há muitas referências que os pequenos talvez não entendam, como alusões à Amy Winehouse, Michael Jackson, as popozudas, os sertanejos, à cultura que capitulou… E a musicista Rosemary Oliveira que tentar colocar um pouco de ordem à zona que se estabelece com tantas sonoridades.

Os atores tocam e cantam. Fotos: Ivana Moura

O musical tocado e cantado ao vivo está alicerçado na simplicidade, numa ingenuidade que constrói semelhanças. Parece dizer que todos têm direito à felicidade, mas que isso é uma construção constante. Esses palhaços fazem a parte deles. E divulgam a ideia de “que é melhor ser alegre que ser triste”.

Faz falta um DVD, um CD com o repertório do espetáculo, que é bom. Já tem muita coisa gravada no mercado, mas com certeza os Palhaços em ConSerto tem um lugar certo no nosso tocador de música (Ai pode, tu podes, ele pode, CD, DVD).

ÚLTIMA SESSÃO DA TEMPORADA – Neste domingo, às 16h30, no Teatro Marco Camarotti, do Sesc de Santa Amaro, o grupo faz a última apresentação desta temporada. Posso garantir que eles têm a capacidade de fazer o dia de qualquer um mais feliz.

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Mestres da alegria

Eles são inacreditáveis. Encantam não só as crianças, mas os adultos – que ficam surpresos e se sentem prestigiados por um espetáculo inteligente, interessante, que traz referências diversas (sejam musicais, estéticas, textuais). Palhaços em ConSerto, montagem dos Doutores da Alegria Recife, está em cartaz no Teatro Marco Camarotti, no Sesc Santo Amaro, aos sábados e domingos, às 16h30. E é bom chegar cedo, porque é uma briga por ingresso!

O espetáculo é um musical. São médicos “besteirologistas” que se encontram para ensaiar um concerto; mas ali somente a musicista Rosemary Oliveira “leva o propósito à sério”. Os palhaços se revezam ao microfone e mostram os seus “dotes” musicais. Geralmente, eles são inversamente proporcionais à capacidade de nos fazerem rir. Através de um olhar, uma careta, uma piada, uma situação inusitada. E é um espetáculo em que todos têm a oportunidade de brilhar. É um elenco muito bom de atores/palhaços e uma seleção musical de fazer gosto – vai de Michael Jackson ao cancioneiro popular.

Se for para destacar alguém, só por força do hábito, não há como esquecer Arilson Lopes (dr. Ado); e Tâmara Lima, a palhaça Tan tan, que tem um apelo mágico com as crianças. Mas todos têm o seu charme (porque talento já é indiscutível nesta trupe!): Anderson Machado (dr.Cavaco), Eduardo Filho (dr. Dud Grud), Enne Marx (dra Mary En), Greyce Braga (dra Monalisa), Juliana Almeida (dra Baju), Luciano Pontes (dr. Lui), Marcelino Dias (Dr. Nicolino) e Fábio Caio (dr. Eu). A direção é de Fernando Escrich e a coordenação artística é de Enne Marx. A ficha técnica tem ainda Luciana Raposo (técnica de Luz), Carlos dos Prazeres (técnico de som), Enne Marx (também na coordenação de produção), Tâmara Lima (produção executiva) e Nice Vasconcelos (assistente de produção).

Além das apresentações no teatro, os Doutores estão visitando os hospitais com Palhaços em ConSerto. No dia 17, às 10h30, eles estarão no Hospital da Restauração e, no dia 24, no Imip, no mesmo horário.

Palhaços em ConSerto
Quando: sábados e domingos de agosto, às 16h30
Onde: Teatro Marco Camarotti (Sesc Santo Amaro)
Quando: R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada)
Informações: (81) 3216-1708

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