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Criatividade na medida

Os 39 degraus leva aos palcos o filme homônimo de Alfred Hitchcock

O espetáculo Os 39 degraus, com direção de Alexandre Reinecke, em cartaz no Rio de Janeiro, ocupa um local perigoso. Está num campo fronteiriço entre a montagem que diverte o público de maneira competente e aquela que carrega tanto nos elementos e truques, que começa empolgando, mas depois pode cansar o espectador. É como se fosse uma fórmula química mesmo e talvez cada apresentação tenha um resultado específico.

Em Curitiba, na primeira apresentação da peça no festival de teatro, por pouco a apresentação não descambou para o exagero. Nas tentativas de fuga para não ser preso injustamente pelo assassinato de Annabela Schmidt, uma agente secreta alemã, Richard Hannay pega um trem, mas é descoberto e perseguido (numa cena criativa e muito bem executada); passa por uma ponte; foge da casa de um casal pela janela; passa por um discurso político e até faz chover e trovoar com a ajuda da plateia.

Elenco interpreta mais de 30 personagens

O interessante é como uma só montagem consegue levar ao público o melodrama, a mímica, o teatro de sombras, os clowns e até o pastelão. O elenco – formado por Dan Stulbach, Danton Melo, Henrique Stroeter e Fabiana Gugli – tem uma sincronia perfeita, inclusive com a técnica, já que eles interpretam mais de 30 personagens. O único que faz um só personagem é Dan Stulbach (Richard Hannay); ele está em cena praticamente a peça inteira.

Os 39 degraus leva aos palcos o filme homônimo de Alfred Hitchcock, de 1935, que inspirou ainda duas refilmagens e uma montagem na Broadway. Na realidade, a versão brasileira é uma homenagem muito bem-humorada ao diretor, com menções a vários de seus filmes (tem até a brincadeira de tê-lo em cena). Um quebra-cabeças solucionado com criatividade, perspicácia e entrosamento, que diverte e empolga o público.

Peça está em cartaz no Rio de Janeiro. Fotos: Pollyanna Diniz

Os 39 degraus
Onde: Teatro do Leblon – Sala Marília Pêra (Rua Conde Bernardote, 26, Leblon, Rio de Janeiro)
Quando: quintas, sextas e sábados, às 21h; domingos às 20h; até 10 de julho
Quanto: R$ 78 e R$ 39 (meia)
Informações: (21) 2274-3536

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Dê lugar à memória

Homem piano - Uma instalação para a memória

O dia estava chuvoso, frio. Daqueles em que o cobertor é o melhor amigo. Mas o Festival de Curitiba já estava acabando e eu não tinha visto Homem piano – Uma instalação para a memória, que tinha sido indicada por alguns amigos jornalistas e produtores numa miscelânea de peças de qualidades bem variantes. Quem me deu o telefone da produtora foi até o Valmir Santos, já que a montagem era para poucas pessoas por sessão.

Saí de uma entrevista (que vcs ainda vão ler por aqui!) direto para a sede da CiaSenhas de Teatro, uma casa numa rua estreitinha, no Centro de Curitiba. As pessoas aguardavam na calçada. Márcia, a produtora, simpática, perguntou se era eu a Pollyanna. A garota ao lado, abraçada ao namorado, me contou que este ano não tinha aproveitado o festival. Que tinha ido ver poucas peças. “E porque escolheu essa?”, quis saber. “É de um amigo meu. Este ano tenho visto só as produções dos amigos”, explicou. Ela deve ter ficado orgulhosa do amigo.

A peça começa ali na rua mesmo. Quem não sabe o que está acontecendo, como a família que estacionou o carro para ir a algum lugar ali perto, estranha a movimentação. Somos convidados a entrar na casa e a resgatar nossas memórias, como faço ao escrever este post. Mas nem sempre memórias tão superficiais. O ator Luiz Bertazzo aguarda todos entrarem. E, noutras palavras, diz que tem muitas coisas que queremos esquecer. Tirar da memória. Na parede da escada, lápis e papeis pendurados. Pediu para que cada um escrevesse. Depois recolheu e picou todos com o movimento da hélice do liquidificador.

Subimos um ou dois andares, não lembro ao certo. Sei que não havia lugares para sentar, como normalmente. Estavam todos de pé, em silêncio e ebulição. O texto, de Sueli Araújo (que assina também a direção) nos fala basicamente de memória. De sentimentos. Do que queremos lembrar ou esquecer. De um homem que não tem memórias. Precisa da nossa ajuda. Noutra sala, pra terminar, podemos participar. Contar memórias em microfones. Sem que ninguém ouça. Só você mesmo. Pra ajudar, alguns papeis pediam lembranças relacionadas ao pai, a mãe, a um momento. Puxei de um deles uma memória antiga, mas que ainda dói. Fui ao microfone. Sai dali com vontade de chorar.

Criação é da curitibana CiaSenhas de Teatro

Um dos méritos do espetáculo é conseguir envolver o público. Seja pela ambientação do espaço cênico (como diz o programa), prioritariamente branca, pensada por Paulo Vinícius, ou pela interpretação de Bertazzo. Claro que isso é muito pessoal e depende de uma série de fatores. Mas o ambiente é sim propício à entrega. Há uma proximidade mesmo com a performance ou com a instalação das artes visuais. Mais do que uma peça, é um experimento. Não só para a companhia, que estreou o espetáculo em julho do ano passado, mas também para o público. Bom, pra conhecer mais um pouquinho da CiaSenhas de Teatro, em atuação desde 1999, vale dar uma olhadinha no site deles. Tem fotos lindas!

Fotos: Pollyanna Diniz

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Um cara de teatro

Algumas trocas de mensagens por celular e estava marcada a entrevista com o ator principal da montagem Os 39 degraus, sucesso de público em São Paulo, que fez quatro apresentações no Festival de Curitiba. Dan Stulbach chegou ao hotel, depois do almoço, por volta das 14h30, com um aspecto cansado. Já tinha apresentado por duas noites a montagem e, naquele dia, tinha ido fazer uma palestra para alunos às 9h30. Fomos ao bar do hotel, ele pediu um café, e confessou que precisava dormir.

Mas esse era só o início da conversa. Quando fala em teatro, os olhos azuis brilham ainda mais. Só vi o mesmo acontecer quando ele virou empolgado para o ver o gol que o Real Madri tinha feito num time qualquer. Estrategicamente, antes do início da entrevista, já sabendo do seu amor pelo futebol, tinha colocado-o numa cadeira de costas para a televisão. Besteira. Independentemente da partida, Dan Stulbach é um ator compromissado, apaixonado pela técnica teatral, pelo desafio. Gosta de falar de arte e também de televisão, cultura, política. Depois de uma hora e meia de conversa, parecia que o cansaço não existia mais. “Poderia ficar aqui a tarde inteira conversando. Mas tenho espetáculo à noite”.

Dan Stulbach

A peça Os 39 degraus possui mais de 30 personagens, interpretados por quatro artistas. E você é o único que faz um só personagem e está em cena quase o tempo todo. Como foi essa preparação?
Comecei a malhar, a correr. Sempre fui um cara saudável, sempre fiz esporte, nunca tive problemas com isso. Mas a peça quis treinar mais. Mas não era só a questão física. Demorei a pegar o ritmo da encenação, correr, falar, isso muda o ritmo da respiração.

Porque você aceitou o convite para fazer Os 39 degraus? Já tinha feito comédia?
Fiz uma comédia no teatro há muito tempo. Foi Guerreiras do amor, em 1995, do Domingos de Oliveira. Quis fazer Os 39 degraus porque é uma homenagem ao teatro, à imaginação. Celebra o lugar do faz de conta, da brincadeira. É isso o que me interessa. Além disso, a peça trabalhava com várias linguagens. Drama, romance, comédia. Isso me encanta. E o jogo de você enganar a plateia, de todo mundo se arrumar, sair de casa, para isso.

Os 39 Degraus. Fotos: Pollyanna Diniz

Na peça, em determinado momento, há uma brincadeira com o personagem que te deixou conhecido para o grande público, o Marcos, de Mulheres Apaixonadas. Ter ficado “marcado” por esse personagem te incomoda de alguma forma?
De forma nenhuma. Eu acho ótimo. Discutimos isso antes de levar para a peça. Mas foi um personagem que mudou mesmo a minha trajetória, pelo menos para o grande público. E mudou uma realidade. Conseguimos transformar as coisas. Hoje, o homem que bate em mulher vai para a cadeia. E você faz televisão porque quer ficar mesmo mais conhecido. Não dá pra ficar irritado porque as pessoas vem falar com você, querem um autógrafo, tirar foto. Então você foi pra televisão por quê?

Você já trabalha com teatro desde a década de 1980. Mas realmente se tornou conhecido depois da televisão. O trabalho em televisão trouxe alguma mudança para o seu trabalho no teatro?
Na televisão, busquei trabalhos que fossem um desafio artístico para mim. Trago a televisão para o meu trabalho. Ao contrário do que as pessoas pensam, a televisão exige muita disciplina. É um trabalho exaustivo. Mas o que estamos fazendo é mais ou menos a mesma coisa. Tive a oportunidade de criar na televisão, propor coisas, amadureci. Até porque eu comecei a ter que falar mais sobre o meu trabalho, dar entrevistas. Entender melhor o que eu faço. Mas eu queria dizer que temos que tomar cuidado. Para que o ator que faça televisão não seja execrado por fazer TV, que ele não seja considerado menor; ou o contrário também. Acho que o teatro fica maior com as diferenças, juntando as pessoas. Não vejo esse preconceito comigo, mas ele existe. Até dos meios de comunicação. Sou o “global” Dan Stulbach. E esse título é um mérito ou demérito? Lembro que tinha começado há duas semanas a fazer a novela Mulheres apaixonadas e fui apresentar Novas Diretrizes. Aí me chamaram de global no jornal…O que é um demérito é ser reduzido, taxado.

E qual o papel do teatro?
O lugar do teatro no mundo é o lugar da imaginação, da provocação. Quanto mais o mundo fica digital, violento, e tudo isso, o teatro ganha mais espaço. Porque é o lugar de lembrar o que é ser humano. O teatro te surpreende, te emociona. Essa é a função da arte e do teatro. É um lugar de artistas que não se conformam, que querem o risco. Gosto do teatro como linguagem. Porque quando você lê, você usa a imaginação, como seria aquele personagem, como se portaria, como seria a voz. E o teatro é o próximo passo.

Mas você faz teatro em São Paulo, que tem a lei de fomento ao teatro há dez anos, onde estão os artistas mais conhecidos. E os outros lugares?
É um espaço de resistência. Essa realidade paulista passa por São Paulo também por que, é verdade, lá estão atores conhecidos. Então no momento da empresa escolher um espetáculo para apoiar, ela quer visibilidade. Essa decisão fica nas mãos dos gerentes de marketing. Mas tem outras possibilidades, empresas que apóiam trabalhos continuados. O que eu acho é que há espaço para todo mundo e para o teatro de qualidade.

Podemos dizer que estão surgindo algumas tendências no teatro brasileiro, como os musicais. Como você vê isso?
Os musicais estão se consolidando, assim como o movimento dos stand ups. As pessoas querem ver. Mas o meu teatro, como já disse, é o da imaginação. Não aquele em que a pessoa é o que é. E o público tem se desacostumado com imaginação. Ele quer mais realidade, mesmo que seja a brincadeira com a realidade, a ironia. Muita gente tem raiva dos stand ups. Eu não tenho. Tem espaço pra todos. Mas pode ser só uma fase. O teatro já passou por muitas..pela fase da imagem, da fumaça, quando toda cena tinha que ter fumaça! Eu gosto da palavra, do diálogo, da discussão. Gosto do cinema argentino, por exemplo, que é muito calcado nisso. Gosto de tentar formular coisas. Foi o teatro que me deu isso.

Você se interessa por política? O que acha do nosso Ministério da Cultura?
É o Ministério mais discutido atualmente…Há ministérios, como o dos Esportes, que deveriam ser tão julgados quanto, que são muito incompetentes. O dinheiro para a Cultura é ínfimo. E isso acaba limitando as ações. Mas acho que a ministra ainda não teve tempo. Ela está sendo muito julgada antes do tempo. Falo do ministério dos Esportes porque acho que ele é mais próximo da saúde, um dos nossos grandes problemas. Não é para ter atletas campeões, ganhadores de medalha. Não só para isso. Para o país, era melhor ter 200 pessoas correndo do que um atleta profissional, campeão. Fora isso, me preocupa a intervenção na Vale, a infra-estrutura para o nosso país crescer na medida em que a economia está crescendo, mais portos, mais estradas.

O que você acha, por exemplo, do Vale-Cultura?
Não conheço bem o projeto. Mas acho a ideia muito boa. Só é preciso ter cuidado para não virar uma meia-entrada, que quem paga é o artista e o próprio público. No mínimo, acho que poderia ser opcional, facultativa.

Você continua no programa de rádio (Fim do Expediente, na CBN)?
Sim. O Paulo Autran disse que eu não deveria fazer. Que o artista não pode ser conhecido. Que ele não pode se dissolver nas suas opiniões. E eu concordo com ele. Mas lá eu falo da vida. Não falo de mim. Elas vão continuar não me conhecendo. E essa é a melhor resposta para aqueles veículos ou pessoas que querem que você seja uma celebridade. Coordeno também a programação do Teatro Eva Herz, da Livraria Cultura, há três anos e meio. Eles até vão abrir salas em outros lugares.

No Recife?
No Recife ainda não estou sabendo. Mas Recife é uma cidade que me interessa muito. Estive lá com a peça Novas Diretrizes, com o Tony Ramos, num teatro lindo (o Santa Isabel). É uma cidade que se interessa por cultura, que recebe as coisas de fora, mas que produz. É muito bacana.

Você sempre cita o Paulo Autran. É uma referência?
Gosto de celebrar a existência do Paulo. Meus pais sempre me levavam ao teatro e uma vez, quando decidi que queria ser ator, fui falar com ele, no camarim. Saber como era ser ator, ver o que ele me diria. Anos depois, ele entrou no meu camarim e me perguntou se eu era aquele rapaz que tinha ido falar com ele. Tenho um carinho muito grande por ele. Ele sempre estava ligando, dando dicas. Depois tive a oportunidade de fazer um espetáculo com ele, o Senhor Green. Aprendi com ele o respeito ao teatro. Ele vivia só para isso, abriu mão da televisão, até falava mal da TV. Tinha uma técnica…

E o que você diria para um ator que viesse te procurar hoje, como você fez com o Paulo Autran?
Que não perca a sua diferença. Que não tente fazer do jeito que o outro faz. Que aprenda a respiração, a técnica. Mas que não entre na “pastelaria’.

Peça tem mais de 30 personagens e só quatro atores

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As sensações da Armazém

Armazém apresenta Antes da coisa toda começar. Fotos: Pollyanna Diniz

As canções do Cazuza não fazem parte da trilha sonora de Antes da coisa toda começar, nova peça da Armazém Companhia de Teatro, grupo do Rio de Janeiro. Mas depois da apresentação da montagem no Festival de Curitiba, foi a música Vida louca vida (de Lobão/Bernardo Vilhena, mas mais conhecida na voz de Cazuza) que pareceu ecoar nas paredes daquele galpão onde foi montada a estrutura para o espetáculo, e bem depois – quando todos já tinham ido embora. Sim, porque essa montagem definitivamente não é algo do qual nos “libertamos” facilmente. “Vida louca vida / Vida breve / Já que eu não posso te levar / Quero que você me leve”.

Você já se pensou imortal como o Cazuza? Já achou que poderia tudo o que quisesse? Já passou pela dor? Pela inveja? Pela frustração de não ter o que você mais quer? A peça é sobre tudo isso. E embora o teatro seja mesmo uma arte de sensações, é difícil que um grupo consiga fazer com que a plateia chegue ao menos perto de sentir o que aquele outro, lá no palco, está vivenciando, seja com um bom texto, com o trabalho de interpretação, com uma música. E esse é o mérito dessa companhia que já tem 22 anos de trajetória. A última vez em que o grupo esteve no Recife foi para apresentar a peça A inveja dos anjos, no Teatro de Santa Isabel, ano passado.

Dramaturgia é de Paulo de Moraes e Maurício Arruda Mendonça

 

Thales Coutinho interpreta ator"mentado"

Neste novo projeto, que vinha sendo idealizado desde o início do ano passado e já fez temporada no Rio de Janeiro e em São Paulo, o grupo vem com um diferencial percebido logo no início da apresentação. A música do espetáculo, dirigida por Ricco Vianna, que também está em cena, parece ser parte muito mais visceral da montagem. Alguns dos atores (o elenco é composto por Patrícia Selonk, Thales Coutinho, Rosana Stavis, Ricardo Martins, Marcelo Guerra, Simone Vianna, Camila Nhary e Ricco Vianna) cantam e também compõem uma banda, que faz a música do espetáculo ao vivo.

Rico Vianna, também em cena, é o diretor musical

O diretor Paulo de Moraes já havia contado em entrevista coletiva que essa mudança vinha a partir da influência do grupo Galpão, de Minas Gerais, que tem uma musicalidade muito forte. “Os atores fizeram intercâmbio com o Galpão e voltaram dizendo que queriam tomar conta da música, mas eu tinha que achar algo que se encaixasse ao meu trabalho”. A banda fica nas laterais do palco, mas no alto, como que em plataformas. Alguns atores, em alguns momentos, também sobem em estruturas montadas na parede, como que para delimitar o risco que corremos ao viver. A montagem também usa de projeções, que dão a impressão de videoclipes e ajudam no ar onírico da peça.

Na peça, o fantasma de um ator que interpretou Hamlet (ele traz consigo sempre um crânio) encontra três personagens – Zoé, uma garota apaixonada pelo irmão; Téo, um ator; e Léa, uma cantora doente. E a partir deles, das situações vivenciadas por eles pouco antes da suas mortes, esse fantasma revive as suas próprias emoções. O texto escrito em parceria por Paulo de Moraes e Maurício Arruda Mendonça tem poesia, força, ironia, humor, drama. E o trabalho dos atores, inclusive alguns bem jovens, consegue segurar essa dramaturgia. Patrícia Selonk interpretando a jovem louca pelo irmão, e Rosana Stavis, que está substituindo Simone Mazzer, e faz a cantora, têm atuações vibrantes e, ao mesmo tempo, tocantes.

Rosana Stavis canta muito no espetáculo!

É na figura do ator Téo (Thales Coutinho) que a companhia discute mais o próprio ato de fazer teatro. Afinal, como disse Paulo de Moraes, “foi no palco que a maioria de nós se sentiu imortal”, assim como o ator “mentado” da história. E há sempre a necessidade que o colega de profissão de Téo insistia: a de contar uma história. A Armazém Companhia de Teatro sabe bem disso.

Zoé é apaixonada pelo irmão

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A labuta do Galpão

Grupo Galpão estreia Tio Vânia. Fotos: Pollyanna Diniz

“Tudo tem o seu tempo determinado. E há tempo para todo propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou. Tempo de matar e tempo de curar; tempo de derribar e tempo de edificar”. Os integrantes da família russa tema do espetáculo Tio Vânia (aos que vierem depois de nós), nova montagem do grupo Galpão que estreou na última sexta-feira, no Festival de Curitiba, parecem ter absorvido essas palavras “emprestadas” do livro bíblico de Eclesiastes. Embora o tempo que se sobressaia nesse caso seja o da labuta e, mais ainda, o da resignação advinda das possibilidades e escolhas feitas ao longo da vida.

O grupo Galpão, de Minas Gerais, completa 30 anos em 2012, mas nunca havia levado aos palcos um texto de Anton Tchékhov. Antes de Tio Vânia…, só tinham tido a experiência de mergulhar na obra do dramaturgo russo quando foram dirigidos por Enrique Diaz no processo de criação de As três irmãs, em 2008, que foi registrado pelo cineasta Eduardo Coutinho, e virou o documentário Moscou. Para uma companhia tão afeita às montagens de teatro de rua, às comédias, a fazer música nos próprios espetáculos, o soturno Tio Vânia… é um desafio.

Galpão se desafia ao montar texto psicológico

O enredo traz uma família que vive numa propriedade rural. Todos ali passaram anos trabalhando sem descanso, principalmente Vânia (Antonio Edson) e a sua sobrinha Sônia (Mariana Lima Muniz, atriz convidada pelo grupo para participar da montagem). Com a chegada do seu cunhado, o professor Serebriákov (Arildo de Barros), metido a intelectual, e da sua jovem esposa Helena (Fernanda Vianna), Vânia percebe que levou uma vida medíocre. Que os anos passaram. Sente-se frustrado e impotente. Helena desperta paixão tanto em Vânia quanto no médico Ástrov (Eduardo Moreira), esse último desejo do amor de Sônia. Ainda estão no elenco Teuda Bara e Paulo André.

Mariana Lima Muniz interpreta Sônia

Os próprios atores já tinham dito, durante entrevista, que montar a peça foi uma forma de revisitar as suas próprias vidas e carreiras. O papel do ator, a trajetória do grupo. A direção da montagem ficou sob a responsabilidade da também mineira Yara de Novaes, que tem mesmo um perfil de realizar um teatro mais psicológico (fez, por exemplo, Noites brancas, de Dostoiévski; e, durante um período em que morou no Recife e deu aulas na UFPE, montou A história do zoológico, de Edward Albee, em 2001). “Esses atores são todos operários do teatro, trabalhadores dedicados. E a peça é sobre trabalho”, dizia a diretora.

O tom de antiguidade e conflito foi alavancado pela cenografia da peça, um dos seus méritos. A concepção foi de Márcio Medina (que também é responsável pelo figurino), que trabalha com o grupo pela quarta vez. São imagens muito bonitas. Como que fotografias amareladas, em tom sépia. Logo no início, a família está reunida numa mesa de madeira, tendo ao fundo uma árvore seca e cinco grandes colunas. Elas são movimentadas pelos próprios atores nas transições de cena e podem tanto reprimir quanto aconchegar. A luz, pensada por Pedro Pederneiras, do grupo Corpo, e o figurino que não é datado, mas entende-se que é antigo, complementam a concepção do que é montar Tchékhov para o Galpão.

Protagonista ficou sob a responsabilidade de Antonio Edson

As atuações são, como pede o texto, mais contidas do que as habituais montagens do grupo, mas não perdem o vigor, a força. Sustentam um texto que fala de sonhos, ilusão, frustração, trabalho, desejo. Em cena, os atores mostram um ritmo que leva o espectador a digerir aos pouquinhos aquela dramaturgia. Claro que pode melhorar ainda mais no decorrer das apresentações, com o trato cotidiano no palco com a história e a encenação. Desafio pequeno para tantos talentos, lapidados em 29 anos de companhia. Menor ao menos do que foi fazer essa viagem ao passado, ao inconsciente do grupo, às “colunas” de sustentação (como aquelas que seguram a casa da família) desses atores, para enfrentar Tchékhov pela primeira vez.

Grupo disse que gostaria de participar do Festival Recife do Teatro Nacional

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