Pela preservação da memória do Inácia Rapôso

Socorro Rapôso interpretou a Compadecida por mais de 20 anos. Foto vertical: Anderson Guedes/ Fotos horizontais, de cima para baixo: Marcelo Lyra, Jorge Clésio e Fernandes Filmes

Socorro Rapôso interpretou a Compadecida por mais de 20 anos. Foto vertical: Anderson Guedes/ Fotos horizontais, de cima para baixo: Marcelo Lyra, Jorge Clésio e Fernandes Filmes

Um dos momentos mais significativos do último Janeiro de Grandes Espetáculos aconteceu quase por acaso. Assim que viu Socorro Raposo num dos camarotes do Teatro de Santa Isabel, na noite de abertura do festival, Paula de Renor, uma das produtoras do evento, fez questão de mencionar o nome de Socorro e agradecer a presença dela. A atriz e produtora de 82 anos, que ainda se recupera de um AVC sofrido ano passado, foi aplaudida efusivamente pela plateia, composta em grande parte pela própria classe teatral.

Agora novamente a classe demonstra carinho e reconhecimento pelo trabalho de Socorro Raposo. Neste domingo (8), a Trupe Cara & Coragem, do Cabo de Santo Agostinho, fará uma sessão especial do espetáculo Quando o sol vem à janela, texto e direção de Luiz de Lima Navarro. A renda obtida com a venda dos ingressos será revertida para a reforma do galpão que irá receber o acervo do Espaço Cultural Inácia Rapôso Meira, como refletores, cenários, figurinos e documentos. O Inácia Rapôso, que funcionava na Rua da Glória desde 1993 será fechado. O imóvel que abrigava o espaço era alugado e com as dificuldades de saúde, Socorro não tem mais como mantê-lo.

O espaço cultural surgiu em 1990, no Edifício AIP, na Dantas Barreto, como um teatro de bolso para 50 pessoas; depois passou para uma casa na Rua Fernandes Vieira; e, desde 1993, o espaço funcionava no casarão da Rua da Glória. O local recebeu temporadas de espetáculos e abrigou ensaios de vários grupos. Socorro Rapôso e a irmã Margarida Meira, que também é atriz, lançaram a Dramart Produções em 1985. A produtora realizou diversas peças, como Auto da Compadecida (Socorro interpretou a Compadecida por 20 anos), Cantarim de Cantará, A comédia do amor, O menino do dedo verde e O mágico de Oz.

A montagem Quando o sol vem à janela traz Nice Albano e Evânia Copino no elenco. O enredo trata da história de duas mulheres – uma delas, Guida, sofre com a perda gradativa da memória; e a outra, Amélia, busca através da música criar uma ponte que seja capaz de trazer de volta suas lembranças.

Serviço:
Quando o sol vem à janela, sessão especial em homenagem à Socorro Rapôso
Quando: domingo (8), às 20h, no Santa Isabel
Quanto: R$ 20 (antecipado) / R$ 30 e R$ 15 (meia-entrada)
Os amigos também podem contribuir através da conta bancária em nome de Maria do Socorro Rapôso Meira, Ag. 0325-5, C/C 708.077-8, Banco do Brasil.

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José ManoelSocorro Rapôso por José Manoel, diretor e gestor cultural

“Acompanho a trajetória de Socorro Rapôso desde os anos 1980, quando a vi em cena em Cantarim de Cantará. Depois ela produziu e atuou em O Mágico de Oz e O menino do dedo verde, que eu tive o prazer de dirigir para a sua Dramart Produções. Com ela, além de cumprir longas temporadas no Teatro Valdemar de Oliveira fomos a São Paulo e ao Piauí, sempre uma ousadia. Depois acompanhei as outras montagens da Dramart, principalmente o Auto da Compadecida. Socorro Raposo teve atuação importante junto à Federação de Teatro de Pernambuco (Feteape) e participou de seus principais projetos. Dedicada e forte, lidera a Dramart com douçura e segurança. Lembro que ela fundou o Centro Cultural Inácia Raposo primeiramente no Edf. AIP, uma pequena e agradável casa que eu inaugurei com o meu espetáculo Anjos de guarda, tendo Marco Camarotti na plateia. Depois o Centro foi transferido para a Fernandes Vieira e, finalmente, para a Rua da Glória”.

Samuel SantosSocorro Rapôso por Samuel Santos, diretor

“Em 1990, eu fazia o curso de Teatro do Sesc. Muito jovem, me encantava pelo teatro, mas não sabia ainda se era isso. Precisa sobreviver. Talvez não continuasse, possivelmente. Foi quando recebemos no Sesc Socorro Raposo e o diretor Picchetto Saianni para ver algumas cenas montadas. A cena que eu fiz foi do espetáculo Como a lua. Eu era o índio Payá. Minha cena foi terrível, não tinha me saído bem como ator. Depois daquele dia pensava em não mais continuar. Teatro não era pra mim. Oriundo de uma família humilde, precisava do sustento. Só que, nesse mesmo dia, o diretor e Socorro, me convidaram para participar de uma reunião no novo espaço da Dramart, no edifício AIP. Fui sem saber nem do que se tratava. Chegando ao espaço, fui recebido gentilmente (sempre) por aquela senhora e pelo diretor. Eles me entrevistaram e depois me convidaram para participar da montagem do texto infantil Passageiros das estrelas, de Sérgio Fonta, direção de Picchetto Saianni e produção da Dramart. Sai irradiado, sorrindo e gritando no meio da rua. Dançando! Aceitei! Não tinha como recusar! Esse convite foi importante para mim. E o mais importante foi conhecer e ter trabalhado com Socorro. Ela me ensinou a olhar o teatro profissionalmente, apaixonadamente. Lembro que eu era bem imaturo nos exercícios e no trato com o texto. Quando comecei a vê-la com tanta seriedade nos exercícios, no estudar do texto, no carinho com as palavras, um horizonte se abriu. Fui aprendendo sem que ela me dissesse nada no início. Depois, compreendendo minhas deficiências, meus anseios e medos, começou a me ensinar como uma Griot. Uma maestrina. Ensinou-me a ler um texto teatral, como decorar, como buscar a concentração e a ver o teatro com uma coisa maior, importante. Isso tudo com muita maternidade, simplicidade e generosidade. Aprendi com ela que nas coxias não se conversa. As coxias eram o útero, a passagem para o nascimento. É preciso o silêncio. Assistia a isso e vivia tudo aquilo com o olhar de um aluno que respeita seu mestre e com ele aprende. Se não tivesse iniciado com Socorro Rapôso, possivelmente não continuaria no teatro. Ela é tudo. Ela é o próprio teatro”.

Célio PontesSocorro Rapôso, por Célio Pontes, ator e diretor

Amizade de ouro! Ainda menino querendo ser grande, tive a sorte de meu caminho ser iluminado pelo carinho e amizade maternal de uma querida mulher. Num inverno de 1986, um sonho profético alertava-me sobre um convite profissional para compor o elenco de um espetáculo mágico; lembro-me de uma pessoa com expressiva candura que me acolheu. No dia seguinte, estava no ensaio de O Mágico de Oz conhecendo, entre outros, Socorro Rapôso. O exemplo de vida e humanidade, atributos tão vivos da atriz e produtora, figuram como lastros marcantes em minha trajetória artística até hoje. Do Homem de Lata ao Severino do Aracaju (Auto da Compadecida), que tive o privilégio de interpretar na companhia de Socorro, o sentimento é um só: gratidão e amor pelo teatro.

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