Arquivo mensais:abril 2013

Magiluth no Fringe

Montagem de Viúva porém honesta, do Magiluth

Montagem de Viúva porém honesta, do Magiluth

O Grupo Magiluth está no Festival de Curitiba para três apresentações do espetáculo Viúva, porém honesta, de Nelson Rodrigues, com direção de Pedro Vilela, na mostra Fringe. Desde a semana passada na cidade, os integrantes vêm batalhando para atrair a atenção de jornalistas, críticos e curadores de todo o país para verem o trabalho. Ano passado, eles participaram da Mostra Oficial com Aquilo que meu olhar guardou para você, que foi apresentado no Teatro Paiol, e ainda com Um torto e O canto de Gregório, numa mostra paralela organizada pela Cia Brasileira.

Viúva foi um texto escrito com raiva ou como vingança aos que destrataram Perdoa-me por Me Traíres, que foi um fracasso na estreia. O Magiluth reforçou o achincalhe ao país, à família brasileira, e não teve dó da crítica teatral.

Os cinco atores se multiplicam em 13 personagens de forma bastante iconoclasta. E eu vou ver a reação do público curitibano a essa montagem, que fica em cartaz de hoje ao dia 6 no TEUNI – Teatro Experimental da UFPR, às 13h.

* A jornalista Ivana Moura viajou a convite da produção do Festival de Teatro de Curitiba

Postado com as tags: ,

Delicadas, e explosivas, relações familiares

Difíceis relações entre pais e filhos são abordadas na peça Esta criança. Fotos: Annelize Tozetto

Difíceis relações entre pais e filhos são abordadas na peça Esta criança. Fotos: Annelize Tozetto

É muito bom ver uma atriz consagrada se associar a uma companhia jovem e em plena ascensão para realizar um trabalho de fôlego, de pesquisa e de entrega. No caso, Renata Sorrah em parceria com Cia Brasileira de Teatro, grupo que já esteve no Recife com Vida, Oxigênio e Isso te interessa?. A parceria entre intérprete e trupe rendeu energia, troca e revitalização para as partes envolvidas.

Esta criança, um texto forte do dramaturgo francês Joel Pommerat, – que catalisa aspectos estranho e familiar – mete o dedo nas feridas das difíceis relações entre pais e filhos. E tem um pouco de tudo, o espectador pode até se identificar.

Marcio Abreu é responsável pela direção do espetáculo, com assistência de direção de Nadja Naira. No elenco, além de Ranata Sorrah estão Giovana Soar, Ranieri Gonzalez e Edson Rocha.

Esta Criança foi o grande vencedor da 25ª edição do Prêmio Shell de Teatro do Rio

Esta Criança foi o grande vencedor da 25ª edição do Prêmio Shell de Teatro do Rio

A peça é composta por 10 situações familiares que não têm ligações entre si. Mas todas convergem para o mesmo tema. As relações de parentesco que podem conter nitroglicerina pura. As variadas abordagens privilegiam aspectos constrangedores, engraçados, tristes e estranhos. Uma mulher quer doar seu pequeno bebê a um casal de seu prédio e o discurso levanta questões da alegria e surpresa da adoção e a tensão e as mil explicações para o abandono.

Uma jovem mulher grávida expõe suas projeções de felicidade, para mostrar aos seus próprios pais que ela pode ir além. Há um diálogo entre uma menininha que porta uma mochila vermelha e seu pai, ele sentado numa pequena cadeira e ela na grande. A garota rejeita o pai que tenta chantageá-la. Um homem explode numa refeição em família e diz que seu pai não é o seu espelho e que por trás de uma aparência tranquila existe um vulcão.

Ansiedade, medo, desejo de provar alguma coisa, desejo de ser alguma coisa. Esse mundo de projeções e lembranças é feito de humor e magia. Mãe, pai, filho, esses papéis que são trocados.

O espetáculo Esta criança foi o grande vencedor da 25ª edição do Prêmio Shell de Teatro do Rio. Teve cinco indicações e levou quatro troféus para casa: Renata Sorrah (melhor atriz), Marcio Abreu (melhor diretor), Nadja Naira (melhor iluminação) e Fernando Marés (melhor cenário).

A encenação percorre relações miúdas e cheias de significado para um homem comum. São fragmentos de alta-tensão. A intensidade que vai além das palavras. Os subterrâneos emocionais são invadidos. Há a virulência da palavra plena, com uma faca afiada.

O encenador conduz tudo com mão firme para extrair a delicadeza, esses pontos fracos marcados na pele e na memória. A cenografia de Fernando Marés e a iluminação de Nadja Naira afinam a proposta, a primeira distorcendo um pouco essa noção do real – que tem tudo a ver com as lembranças do que ocorreu para cada um, que podem estar mais próximas ou distantes do fato em si. A iluminação de Nadja Naira trabalha com os claros/escuros e salienta as sombras em belas imagens.

Renata Sorrah está plena como nesta cena do reconhecimento do corpo do fiho;

Renata Sorrah está plena na encenação, como nesta cena do reconhecimento do corpo do fiho

Um dos momentos mais fortes da peça é quando duas amigas vão ao IML para identificar um corpo, que suspeita-se ser filho de uma delas. Renata Sorrah e Giovana Soar trabalham o desequilíbrio entre felicidade, alívio, egoísmo e dor. A cena é emblemática do espetáculo. Talvez se o diretor Marcio Abreu diminuir um pouco a duração, ganhe em intensidade, força e impacto.

Renata Sorrah está plena, em toda sua capacidade de intérprete, linda no palco, como mãe ou como filha. Giovana Soar, Ranieri Gonzalez e Edson Rocha têm ótimas participações, garantindo a alta qualidade da encenação.

E nos papéis de pai ou mãe, “desejo e sina”, filho ou filha, alguns conseguem arrancar do outro “coração a fecha farpada” e “e sem medo do grito”, com o perdão pedido, dado, não dado, sonhado para tornar a vida mais bela.

* A jornalista Ivana Moura viajou a convite da produção do Festival de Teatro de Curitiba

Postado com as tags: , , , , ,

Os bem intencionados do grupo Lume

Os bem intencionados se passa num  salão de baile. Fotos:  Annelize Tozetto

Espetáculo Os bem intencionados se passa num salão de baile. Fotos: Annelize Tozetto

A ambientação do espetáculo Os bem intencionados, montagem da trupe paulista Lume é realista e convincente. No galpão do Centro de Eventos Sistema Fiep, com engradados de um lado, um lugarzinho para o bar com uma luz néon e uma pequena banda que toca boleros e outros sons, e mesas espalhadas por todo o espaço, entramos num ambiente com ar decadente e apelo brega. A atmosfera kitsch da montagem é completada pelo figurino dos atores, com roupas brilhantes, coloridas, curtíssima e até um terno branco com camisa colorida por dentro.

Ao entrar, o público já faz parte da cena. Os espectadores são distribuídos em mesas com amendoins e salgadinhos (a cerveja chegará depois) e acompanha a movimentação dos personagens do grupo Lume a indicar lugares, dançar e se exibirem pelo grande salão. As duas apresentações no Festival de Teatro de Curitiba foram lotadas.

A primeira senha: “será que você vai ver o que você quer ver?”. Parece jogo de palavras, como gosta tanto a dramaturga e diretora Grace Passô, do grupo mineiro Espanca!, convidada a dirigir esse trabalho. O que se segue é algo bem diferente das encenações do Lume.

A técnica de pesquisa com acabamento limpo, uma marca do grupo de quase 30 anos de existência, é deixada um pouco de lado nesse espetáculo que segue por outras palpitações. A companhia de Barão Geraldo, distrito de Campinas (SP), arrisca em outro terreno e sai de sua zona de conforto.

Suas figuras usam perucas e outras marcas de travestimento para destacar elementos histriônicos. Isso fala das inquietações dos artistas. Deles, também. É um mergulho em outras águas.

Os sete aspirantes a artistas expõem suas dificuldades. Eles não vivem de sua arte. Assumem outras profissões tão diferentes, mas à noite se encontram “cheios de boas intenções” para traçar planos para o sucesso.

Bebem, conversam, incentivam uns aos outros, brigam. Uma sempre quis ser Nina Simone. Outro canta Fábio Jr. Entrecortada, como focos que se alternam no salão, a peça intercala os tempos. Eles falam da vida cotidiana e deliram em suas fantasias de grandeza.

Atriz Naomi Silman interpreta uma viciada

Atriz Naomi Silman interpreta uma viciada

Uma conta que ficou feliz quando o pai morreu, porque ela era violentada todo o dia. Outra tenta mostrar uma técnica infalível de sedução, que ela prova na pele que não funciona. Outra ainda, interpretada pela atriz Naomi Silman, tem crises de dependência química e chega a lembrar a cantora Amy Winehouse.

Num momento de destemperança, o Márcio de Ricardo Puccetti grita que “eles”, o resto da companhia, pode enganar os outros (os espectadores), mas a ele não. O alvo de sua fúria é Gonçalvez, de Jesser de Souza (aquele baixinho, de 1,50m de altura). É um momento forte em que eles arrancam suas máscaras. E a reflexão que chega com o desmascaramento é de que o artista é vulnerável em seu trabalho, solitário e sempre a mercê do aplauso e da legitimação de outros que, muitas vezes, nem entendem o que eles fazem.

Carlos Simioni  no papel de Dagoberto

Carlos Simioni no papel de Dagoberto

Em uma auto ironia, eles sempre reforçam que o grupo possui CNPJ e que o cachê é dividido por igual para os sete integrantes. Lógico que é um dinheiro insuficiente. Dagoberto, de Carlos Simioni, ouve o diagnóstico ferino de uma tia, quando ele sofre um AVC: “Se você não tivesse perdido tanto tempo tentando ser artista, as coisas seriam melhores. Podia até ter plano de saúde”. Enquanto pode Dagoberto canta My way ao estilo Frank Sinatra para acalentar as ilusões.

Na trilha dessa trupe cômico marginal, com todos os excessos, seus integrantes buscam incentivar uns aos outros repetindo como mantra: “Ele acordou com esperança porque nada melhor que um fim de semana para decorar um peito solitário. Essa mansão”.

* A jornalista viajou a convite da produção do Festival de Teatro de Curitiba

Postado com as tags: , , , , ,