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Boa sorte ao Cordel do amor sem fim

Thomas Aquino, o José, de O cordel do amor sem fim

O amor fica longe dos floreios românticos nos embates de quatro personagens apaixonados. Carminha ama José, José ama Tereza, que ama Antônio, que nem chega a aparecer em cena.

Entre batuques, sincopadas marcações de tamancos, sonoplastia ao vivo, Cordel do amor sem fim cresceu nesse tempo de temporadas esparsas.

O grupo que se apresenta hoje no festival Internacional de Londrina – FILO, tem no corpo e na voz uma energia concentrada para aquecer a audiência e contar uma história de amor. Amor desencontrado. Amor possessivo. Amor desesperado. De medos, de segredos e de esperanças.

Quando assisti novamente ao espetáculo no projeto do Palco Giratório percebi o engrandecimento da encenação (depois que o diretor Samuel Santos fez alguns cortes na montagem) e o crescimento interpretativo do elenco.

Nana Sodré como a velha e misteriosa Madalena, que parece que carrega o peso do mundo; Agrinez Melo como a dissimulada Carminha; e Eliz Galvão, como a ingênua e romântica Tereza. Thomás Aquino defende com muita dignidade seu José.

Vale destacar as máscaras que o elenco se apropria para tratar dessa ancestralidade tão cara na obra, que tem texto de Cláudia Barral, cenografia de Samuel Santos, criação de Iluminação de O Poste Soluções Luminosas, figurinos de Agrinez Melo e maquiagem de Rosinha Galvão.

Na apresentação de maio (Palco Giratório), no Teatro Hermilo Borba Filho, vi a peça de cima. E foi muito bom acompanhar o desenho coreográfico bem definido e atores plenos de seus personagens e de suas funções. E a poesia que ocupou os espaços nos gestos, nas falas, no silêncio.

Boa sorte ao grupo comandado por Samuel Santos nas sessões de hoje e amanhã no Festival de Londrina. Os ingressos, pelo menos desde o início da semana, já apareciam como esgotados no site da mostra

A poesia pode estar nos detalhes

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Prefeito de Camaragibe “ganha” título de Inimigo da Cultura

Ator exibe "título" do prefeito

O prefeito de Camaragibe não está bem mesmo com os artistas das artes cênicas. Sábado último (12), o Movimento dos Sem Palco promoveu uma panfletada para mostrar o descaso do dirigente com a cultura. A tradução mais emblemática da desconsideração é a situação do Teatro Camará. Tanto que foi feita a entrega simbólica do certificado de Prefeito Inimigo da Cultura ao prefeito João Ribeiro Lemos.

Eliz Galvão, uma das líderes do movimento, conta que o ato conseguiu mais de 1.000 assinaturas para o abaixo-assinado, um documento a mais para exigir a conclusão das obras do teatro. E chamou a atenção do povo da cidade.

Não é uma boa situação Sr. João Ribeiro Lemos. Um prefeito ser considerado inimigo da cultura é algo vergonhoso.

Dia 27 de março, Dia Mundial do Teatro, tem mais. O Movimento dos Sem Palco organiza outro ato em frente ao Camará, intitulado Luto pelo Teatro. A perspectiva é que tenha ainda mais gente, mais artistas e mais enquetes sobre a realidade das artes cênicas em Camaragibe.

Senhor prefeito, não é melhor o senhor começar a fazer alguma coisa?

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Cordel teatraliza amor desmedido

Foto: Aryella Lira

Carminha amava José, que amava Tereza que amava Antônio, que sumiu antes de entrar para a história. Alterando o nome das personagens, essa Quadrilha de Drummond continua a fazer suas tramas reais e ficcionais. Em Cordel do Amor sem Fim essa paixão explode, implode ou é sufocada às margens do Rio São Francisco, em Carinhanha, no Sertão baiano. Na cidade moram três irmãs – a velha Madalena, a enigmática Carminha e a jovem e idealista Tereza –, por quem José é apaixonado. No dia em que selaria o noivado, Tereza encontra o forasteiro Antônio no porto da cidade e tudo muda na sua cabeça, no seu coração, no seu corpo. A montagem assinada pelo diretor Samuel Santos recusa o naturalismo e explora outras teatralidades para reforçar o jogo. O texto é da escritora baiana Cláudia Barral.

Em cena estão os atores Agrinez Melo (Carminha), Eliz Galvão (Tereza), Naná Sodré (Madalena ) e Thomás Aquino (José ), além do músico Diogo Lopes. O gestual das personagens é forte, decidido. Os passos e gestuais do coco se fundem com Tai Chi Chuan, candomblé, capoeira, recorrendo até ao Expressionismo, no corpo e nas máscaras faciais. Essas máscaras também trazem a influência do mamulengo. Esse arcabouço dá sustentação a um espetáculo vigoroso, onde os passos do coco-de-roda nordestino se aproximam da arte oriental do Butoh. Essa partitura corporal, que perpassa também pelo cavalo-marinho, deixa bem longe o realismo-naturalismo, mas remete para algo mágico, para mitos.

A montagem está carregada de simbolismos. Da sensualidade feminina descoberta, manifestada no corpo de Tereza, que clama por um sujeito estrangeiro que não irá tocá-la. E esse corpo que anseia, com o passar do tempo vai ficando duro, seco. Na realidade isso ocorre quando ela perde as esperanças desse amor imaginado e não se contenta com as possiblidades que lhe são apresentadas, ou seja, o contato erótico com José.

Foto: Ivana Moura

As outras duas irmãs guardam aproximação com as mulheres reprimidas de Garcia Lorca. Madalena fechou-se em casa, em luto. Não sai para nada, ninguém sabe por que, mas há de se presumir que foi por desilusão amorosa – perda, medo, danação. Carminha guarda o segredo de amar o homem prometido da irmã, e quando pensa que tem uma chance o fogo contido reacende.

O amor desmedido de Tereza desafia o amor desmedido de José. José suporta o tempo pedido pela amada até que cansa e a cultura do macho aflora, o que tenta resolver a questão à força.

Foto: Ivana Moura

A cenografia (de Samuel Santos, executada por Nagilson) e a direção de arte de Fernando Kehler embalam essa trama de beleza e elementos reveladores. Como a concha do mar, as redes e mosquiteiro (cortinado para proteger dos mosquitos), bancos que viram cama ou tribuna nos momentos de narração. São também muito criativas as soluções para portas e janelas. A iluminação (plano de Iluminação é d’O Poste: Soluções Luminosas) entra em cumplicidade com os outros elementos da cena. Os figurinos de Agrinez Melo, executados por Sara Paixão, funcionam em harmonia com o conjunto da obra.

A atuação dos intérpretes segue a linha proposta pelo diretor e Agrinez Melo, Naná Sodré e Thomás Aquino reforçam na caricatura, em atuações convincentes. Eliz Galvão destoa dessa galeria, revelando-se um pouco mais imatura em relação ao grupo, mas também tem sua graça.

Foto: Ivana Moura

O verbo do espetáculo é esperar. O tempo é de espera. E a montagem atropela essa exigência. Explico: Cordel do amor sem fim fala muito. Fala com os diálogos e os monólogos das personagens. Fala com o pensamento dessas figuras atormentadas. Fala com a música tocada ao vivo (Letras das músicas: Carlos Barral e músicas Josias Albuquerque). Fala através da percussao executada pelos atores.
O tempo da espera reclama por silêncios.

Se há o que precisa ajustar nesse Cordel são alguns excessos. A maquiagem dos atores e os figurinos da peça já trazem sua carga. As interpretações também reforçam essa linha não ilusionista, com os corpos extracotidianos dos intérpretes. Para ressaltar a poesia do espetáculo é preciso contrapor o que já está bem marcado com um pouco de sutileza. Para equalizar a séria pesquisa com a recepção. Para que o espetáculo caiba em sua própria medida. E arrebate ainda mais o público.

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