Lampejos do Vivencial

Cabaré diversiones está em cartaz no Teatro Hermilo Borba Filho. Foto: Ivana Moura

O projeto Cabaré Diversiones foi contemplado com o Prêmio Fomento às Artes Cênicas do Recife 2014/2015. A Prefeitura do Recife deveria ter liquidado a conta com os nove projetos inéditos (três de circo, três de teatro e três de dança), no valor de R$ 33 mil (fora os descontos) para cada um há algum tempo. Não foi pago. Todo o processo de produção foi realizado com os parcos recursos de Henrique Celibi. Isso é importante destacar porque condições materiais influenciam e até determinam o resultado final de uma montagem. E, além do dinheiro, as preocupações, o estresse, o tempo desprendido para conseguir soluções. O edital também definiu o período de estreia, em conjugação com a disponibilidade de pauta.

Na visita técnica ao Teatro do Parque, hoje pela manhã, o presidente da Fundação de Cultura Cidade do Recife, Diego Rocha, assegurou que esses valores de editais começam a ser pagos na próxima semana. Dito isso, vamos ao espetáculo.

Espetáculo tira onda até de como se faz teatro no Recife

Henrique Celibi recrutou novos atores para compor o elenco da peça. Ele e Sharlene Esse são remanescentes do Vivencial. Além deles, compõe a trupe Carlos Mallcom, Cássio Bomfim, Carol Paz, Cindy Fragoso, Filipe Enndrio, Flávio Andrade, Ítalo Lima, Robério Lucado e Ágatha Simões. Ironia, deboche, questionamento social estão lá, ora com um, ora com outro. Mas há problemas de tom, de extensão do espetáculo, de atuação. Foi uma estreia longa, digamos assim.

O diretor resgata quadros do Grupo de Teatro Vivencial. Uns funcionam, outros precisam de atualização. E alguns poderiam ser suprimidos sem prejuízo do todo. Celibi, que entrou para a trupe com apenas 14 anos e foi um dos protagonistas do desbunde nos idos dos 1970 e 1980, aparece em vários quadros. Como a faxineira, como o fauno, na dublagem de Maria Bethânia, como a Democracia. O rapaz tem muito fôlego.

Henrique Celibi, um guerrilheiro dos palcos pernambucanos

Henrique Celibi, um guerrilheiro dos palcos pernambucanos

Além disso, ele atua, faz a direção geral, a trilha sonora, o figurino, a cenografia, a direção de arte e assina também a preparação do elenco para o Cabaré.

A dramaturgia faz uma colagem inspirada em trechos já encenados no Vivencial. Entram em cena personagens novos como Dilma Rousseff, Fuleco, e Congresso Nacional, Cleópatra. Além de figuras locais. Até as Yolandas foram inspiração para a cena.

Clima de deboche. Foto: Paulinho Mafe

A encenação carrega a semente, o sentimento, o espírito irreverente do Vivencial. Se posiciona contra a caretice generalizada., mas os temperos precisam ser harmonizados. Sobram quadros de dublagem. Aquela cena da piada é, na minha opinião, absolutamente dispensável. A das crianças correndo pelo palco também.

Ao fazer alguns ajustes a peça deverá ganhar um ritmo mais frenético, ficando mais debochada e, quem sabe até, a característica revolucionária do Vivencial inspirador será acentuada.

Mas hoje é difícil pensar em subversão, sem entender que tudo já foi feito. É bem verdade que os grupos que pregam a intolerância, o enquadramento das pessoas (principalmente sexual), às vezes fazem com que um gesto inocente possa parecer uma rebeldia.

Sharlene Esse em primeiro plano. Foto: Ivana Moura

O espírito guerrilheiro do grupo pode ser traduzido na construção da cena, feita com embalagens, plásticos, panos e material reciclado. Henrique Celibi gastou mais de R$ 10 mil do próprio bolso para adiantar o serviço.

O espetáculo abre e fecha com a música Puro teatro que, por sinal, também foi utilizada recentemente na montagem de Viúva porém honesta, do Grupo Magiluth. A montagem tem aquele toque de precário, de gambiarra, que funcionava muito bem no Vivencial.

O elenco feminino precisa ser mais ousado. As atrizes do Vivencial original (Ivonete Melo e Suzana Costa) contam que, no grupo de Olinda, sob o regime masculinista, elas tinham que “dar o truque” a para aparecer um pouco. Mas a estrela delas, de Auricéia Fraga, e de outras brilhava na disputa de palco.

As cenas das atrizes do Cabaré Diversiones são periféricas, como pano de fundo. Elas precisam reagir com graça, leveza, garra e muito mais humor. Cássio Bomfim, que estreia no teatro, tem boa presença de cena, mas precisa tomar conta do espaço e não ficar bamboleando. Sua entonação precisa ser mais cuidadosa. Algumas fragilidades do espetáculo ficaram mais evidentes na estreia, mas a criança nasceu. E precisa de cuidados para crescer saudável. Precisa equalizar e diminuir algumas cenas. Para que toda irreverência seja aplaudida.

Postado com as tags:

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *