Arquivo da tag: Teatro Arraial

Em nome do condor

Tragédia no mar: o Navio Negreiro de Castro Alves. Foto: Ivana Moura

Senhor Deus dos desgraçados
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura… se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co’a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?…
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!

O cantor e ator pernambucano Carlos Ferrera se aventura pelos versos mais emblemáticos do poeta baiano Castro Alves (1847-1871) para falar de liberdade no espetáculo Tragédia no mar: o Navio Negreiro de Castro Alves. Como se instaura a escravidão na contemporaneidade é o que martela essa performance cênico-musical.

A montagem celebra os 125 anos da abolição da escravidão no Brasil, com uma reflexão contundente sobre ter voz e vez, num momento em que outras vozes se fazem ouvir nas ruas por novos pleitos.

Alternando texto e canto, o artista destaca a fúria dos versos que conduz a plateia por variadas emoções. Com elegância, Ferrera constrói imagens poderosas e nos provoca ou acalanta com sua bela voz.

Tragédia no mar: o navio negreiro de Castro Alves faz temporada durante todas as quartas de outubro, no Teatro Arraial (Boa Vista), sempre às 19h30.

A direção é de Sebastião Simão Filho. A trilha sonora, executada ao vivo, foi composta por Ferrera, também diretor musical, em parceria com o compositor e violonista Leonnardo Melo, que atua ao lado dos músicos convidados Thiago Fournier (contrabaixo acústico) e Tomás Melo (percussão).

A subjugação de um ser humano por outro marca toda a história da humanidade. Normalmente esse domínio é através da violência física, mas atualmente os mecanismos são mais sofisticados.

Quando Castro Alves concluiu O Navio Negreiro, em São Paulo, em 1868, já valia no Brasil a Lei Eusébio de Queirós, aquela que proibia o tráfico de escravos e foi promulgada em 4 de setembro de 1850. Mas esse direito não funcionava completamente. E o poeta resolveu denunciar a desventura por que passavam os africanos que ainda eram trazidos como escravos. Nessa terrível travessia oceânica, muitos morriam pelo caminho.

Composto em seis partes, o poema alterna métricas variadas para obter um efeito rítmico que traduzam as situações apresentadas. Ferrera ocupa o palco nu e explora as sonoridades da obra mais conhecida de Castro Alves por meio da fala e do canto.

No espetáculo de 40 minutos, o ator conta com alguns objetos de cena, como um terço, um livro. Como um guardião de uma memória, ele narra essa história triste, mas que clama para um luta constante.

Serviço

Tragédia no mar – O Navio Negreiro de Castro Alves
Quando: Todas as quartas de outubro, às 19h30
Onde: Teatro Arraial (Rua da Aurora, s/n, Boa Vista)
Quanto: R$ 20 e R$ 10 (meia entrada)
Informações: 3184-3057

carlosferrera10

Postado com as tags: , , , , , ,

Nelson Rodrigues no Arraial

Viúva, porém honesta será encenada na Rua da Aurora. Foto: Pollyanna Diniz

Nelson Rodrigues ainda está rendendo nos palcos pernambucanos, ainda bem! Desta vez, no Teatro Arraial, na Rua da Aurora, 457, Boa Vista. Hoje, às 19h, o grupo Magiluth e os diretores Cláudio Lira e Carlos Bartolomeu participam de uma mesa redonda. Vão discutir o tema “Nelson Rodrigues nos palcos recifenses”. Já amanhã e sexta-feira, também às 19h, o Magiluth volta a apresentar a sua versão de Viúva, porém honesta. E no sábado, no mesmo horário, a Cia. Macambira de Teatro faz uma leitura dramatizada seguida de roda de diálogo do texto Perdoa-me por me traíres. Toda essa programação é gratuita, mas está sujeita à lotação da sala (94 lugares).

Escrevemos sobre Viúva, porém honesta.

E queria publicar um teaser do espetáculo O beijo no asfalto, direção de Cláudio Lira, que estreou no centenário de Nelson Rodrigues no Teatro Dulcina, no Rio de Janeiro, e será apresentado em outubro, no Teatro de Santa Isabel.

Postado com as tags: , , , , , , , , , , , ,

Os Embromation no Barreto Júnior

Evilásio Andrade, Mauro Monezi e Tiago Gondim são Os embromation. Foto: Maira Arrais

Há muito tempo devo uma visita ao espetáculo Os embromation – Jogos de improviso. Sempre adorei o trio de atores – Tiago Gondim, Mauro Monezi e Evilásio Andrade. Lembro de entrevistas divertidíssimas que fiz com os meninos. Acho que eles são empolgados, atirados; não ficam esperando acontecer. Vão lá e lotam o teatro. E não é necessariamente um “público de teatro” que vai ver o espetáculo deles. Principalmente depois que fizeram sucesso na Tv participando do programa da Ana Hickmann.

Ainda não vai ser desta vez que pago minha promessa, porque estou fora da cidade, mas continuo indicando! 😉 Então vamos lá: sexta-feira (31) será o último dia para conferir a 5ª temporada do espetáculo. No palco do Teatro Barreto Júnior (Rua Estudante Jeremias Bastos, s/n, Pina), os três atores do grupo fazem improvisos a partir de jogos teatrais e da participação da plateia. Todo espetáculo é tudo novo, de novo. Nesta sexta, os garotos convidaram ainda o ator e comediante Múcio Eduardo, do grupo Os Magros em Cena, para participar do espetáculo. Também estão em cena os músicos Tibério Valença, da banda Fiddy, e Diego Perez, da Mr. Peter. O espetáculo começa às 20h e os ingressos custam R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada). Vão e depois contem por aqui como foi!

Postado com as tags: , , , , , , ,

Audiência pública para discutir o Procultura

O Procultura será discutido em audiência pública, segunda-feira, 5 de dezembro, no Teatro Arraial, a partir das 18h. O encontro está sendo convocado pelo deputado federal Pedro Eugênio (PT-PE), em parceria com a Fundarpe.

Além do parlamentar, devem participar da discussão os secretários de cultura de Pernambuco, Fernando Duarte e do Recife, Renato L.

O objetivo é ouvir os segmentos culturais de Pernambuco para enriquecer a construção do relatório que estabelecerá novas regras para o financiamento da cultura, nas diversas regiões brasileiras.

O discurso de Eugênio é de defesa de uma melhor distribuição dos recursos para o segmento. “É importante que tanto os recursos do programa de renúncia fiscal, quanto daquele que é o principal instrumento de fomento do setor, que é o Fundo Nacional de Cultura sejam distribuídos de forma mais democrática”, afirma o deputado.

Serviço:
Audiência Pública para discutir o Procultura
Quando: 5/12/2011 (Segunda-feira), às18h
Onde: Teatro Arraial (Rua da Aurora, 457 – Boa Vista)

Postado com as tags: , , , , ,

Madleia, de Celibi

Foto Ivana Moura

Amor e ódio eletrificam Medeia, protagonista da tragédia grega de Eurípides, escrita em 431 a.C., que tem como fonte o mito dos Argonautas e a busca do Velocino de Ouro. Em Eurípides, o retrato dessa mulher desesperada frente a consumação da perda de seu homem para outra mais jovem, mais rica e temporariamente mais poderosa é de uma fúria de tsunami, que irá destruir parte da realidade que a rodeia.

Na tragédia grega, Jasão larga Medeia e seus dois filhos para se casar com a filha do rei de Corinto, Creonte. Esposa repudiada e estrangeira perseguida, a protagonista vai resolver as mágoas (ou parte delas) com as próprias mãos. Medeia já havia “traído” sua pátria e sua família, para promover e proteger Jasão, por quem se apaixonou e com ele se exilou em Corinto, depois de provocarem a morte do rei de Iolco.

Para vingar-se do homem que ama, Medeia assassina os próprios filhos, frutos do casamento com Jasão. Mas antes envia um presente de grego à nova noiva, um manto que mata a princesa e o rei. E sai de cena vitoriosa e sobre-humana, após abandonar sua condição humana, no carro de seu avô, o Sol.

Em Gota D’Água, de Chico Buarque de Hollanda e Paulo Pontes, o território é transferido para a periferia do Rio de Janeiro, um conjunto habitacional popular chamado Vila do Meio-Dia, onde os subalternos se viram de todo jeito para sobreviver.

Creonte de Vasconcelos é o proprietário dos imóveis populares, e impõe aos seus moradores salgadas taxas juros, o que provoca alto índice de inadimplência.

O sambista Jasão de Oliveira é o futuro genro do dono do império imobiliário, que ganhou visibilidade graças ao seu samba Gota d’água.

E mestre Egeu é uma espécie de liderança comunitária, fruto da combinação do rei de Atenas que promete exílio para Medeia, e o preceptor dos filhos dela. Indignado, ele estimula os vizinhos a combaterem os juros abusivos cobrados por Creonte. Mestre Egeu lidera o “coro dos descontentes”.

A feiticeira grega Medeia transforma-se na macumbeira brasileira Joana.

A primeira montagem dessa tragédia urbana estreou em 26 de dezembro de 1975 e teve Bibi Ferreira no papel de Joana, com direção de Gianni Ratto e direção musical de Dory Caymmi. Bibi Ferreira gravou o áudio de sua atuação que influenciou gerações futuras.

Foto: Ivana Moura

O avassalador ressentimento amoroso da heroína ganha contornos melodramáticos em Madleia + ou – Doida, da Companhia do Chiste, que tem roteiro de Henrique Celibi, direção de Carlos Bartolomeu e Henrique Celibi e Daniel Silva no elenco. A montagem busca na Música Popular Brasileira (MPB) as expressões de desvario dessa mulher traída e revoltada, que conclama os orixás para trazer “seu” homem de volta.

Madleia retira a força das relações estáveis para inserir a personagem numa contemporaneidade líquida. Ao convocar um repertório da música popular brasileira de teor romântico, a montagem parece dividir a protagonista em várias outras. A que reage de várias formas ao abandono; a que não suporta o desamor do homem que ela ajudou a construir. Da maquiavélica que elabora uma vingança cruel contra a mulher que fisgou seu amado. E a que atenta contra seus filhos pequenos, como forma de punir o pai.

No centro do palco encontramos Henrique Celibi, que comemora 30 anos de carreira. Nessa bricolagem dos textos de Medeia de Eurípedes e Gota d´Água de Chico Buarque de Hollanda e Paulo Pontes, com enxetos popularíssimos de dor-de-cotovelo, Celibi projeta seu talento e ganha a plateia, às vezes com mínimos gestos, uma virada de cabeça, uma sutileza com as mãos. Mas tudo com um timing preciso e pessoal.

Em alguns momentos, para representar os fantasmas de Madleia, aparece o bailarino Daniel Silva, proporcionando imagens de alguma beleza.

Ao optar pelo brega, pela melodramático, os artistas fazem uma manobra difícil. Enquanto absorvem o que predomina na indústria cultural, criticam esse modelo da sociedade de consumo. Mas não é uma crítica quadrada, chata, mas munida da irreverência, a partir das suas próprias heranças culturais.

Vale lembrar que tanto Celibi, quanto o diretor Carlos Bartolomeu participaram do Vivencial Diversiones. O grupo teatral que se desenvolveu em Olinda, foi influenciado pelo tropicalismo e pela contracultura. Entre os anos 1970 e 1980 foi um campo de irreverência e transgressão da cena cultural pernambucana. E ninguém passou pelo Vivencial impunemente. Ele deixou marcas.

Foto: Paulinho Mafe

Tanto no cenário quanto nos adereços predomina um vermelho que se aproxima mais do kitsch das manifestações da indústria cultural, como os programas televisivos populares, do que do pathos da tragédia grega. Com direito até a coraçãozinho de pelúcia.

A partir das músicas que formam uma nova dramaturgia e dos pedaços de Medeia e Joana, Madleia cria seu pastiche com músicas inteiras ou trecho de canções escritas e conhecidas na voz de Chico Buarque, Paulo Pontes, Vanderléia, Roberto Carlos, Fernando Mendes, Maria Bethânia e outras figuras.

Bartolomeu e Celibi dessacralizam a tragédia grega e sob uma determinada perspectiva zombam desse conceito de amor como sentimento natural e universal, que deve estraçalhar a figura que “perde” o objeto amado. Em outra camadas de leitura, o amor passa a ser encarado com uma uma construção social, que em algumas situações passa a ser ridículo. Com Álvaro de Campos e a lembraça dos sentimentos esdrúxulos.

O pastiche carrega também uma carga de ressignificação do mundo, o esvaziamento de sentidos e a banalização do amor. E com isso Madleia faz evaporar a função social presente nas obras de referência anteriores.

Mas o que é realmente maior nessa montagem é a performance de Henrique Celibi. Além de seguro de seu trabalho, ele é carismático e tem personalidade ao atuar. E passa dos excessos melodramáticos, arranca risos e por alguns instantes convence da grande dor de sua personagem.

SERVIÇO
Espetáculo: Madleia + ou – doida
Onde: Teatro Arraial (Rua da Aurora)
Quando: Sábados e domingos, às 19h, até 27 de março
Quanto: R$ 20 e R$ 10 (meia)

Roteiro, Figurino e Cenografia: Henrique Celibi
Sonoplastia e Direção: Carlos Bartolomeu
Intérpretes: Henrique Celibi e Daniel Silva

Postado com as tags: , , ,