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Memórias de uma estreia

Olivier e Lili – Uma história de amor em 900 frases será encenada na Mostra Capiba. Foto: Rogério Alves

A long time ago, num reino desencantado, um encenador que merece essa nomeação transformou uma criatura numa atriz. O espetáculo era Woyzeck, do alemão Georg Büchner. O encenador, Moncho Rodriguez. E aqui não estou avaliando método, processo, e relação do líder (que além de diretor de cena é diretor de ator) com o elenco, mas o resultado. O episódio da transformação. Isso sempre me volta como memória agradável e promissora. Então, é possível transformar alguém em um ator?! Bem, não sei se tanto, mas pelo menos naquela montagem a pessoa estava convincente, bela, límpida e transparente.

Assisti à montagem Olivier e Lili: Uma história de amor em 900 frases na estreia, no Teatro Hermilo Borba Filho, que foi um desastre. O som falhou, o vídeo pifou, os efeitos inventados pela equipe não funcionaram. Quer dizer, ficou um espetáculo meia boca, meia sola. Quem é de teatro sabe que essas coisas acontecem. Embora, por problemas técnicos, espetáculos já tenham sido detonados na cidade.

Sabemos também que, muitas vezes, a legitimação ou não de uma obra de arte depende de interesses extrínsecos ou obscuros; ou tão límpidos e transparentes que alguns insistem em não enxergar. É. A vida é cheia de mistérios. E os humanos, quando botam o lado podre para fora, é como um cegueira de ódio.

O texto original, Les Drôles, foi montado por Olivier Py e pela da dramaturga Elizabeth Mazev, em 1993, com direção dele. E passa pela história da amizade dos dois, o que eles enfrentaram quando mais jovens. O amor dos dois artistas franceses pelo teatro. Quem viu a encenação assinada por Py, garante que era leve, bonita e repleta de emoção.

Um parêntese. Em 2009, Ano da França no Brasil, foi apresentada em São Paulo a peça Epître aux jeunes acteurs (Epístola aos jovens atores), de Olivier Py, que além da dramaturgia assinava a direção e iluminação. Como o título sugere, trata da arte teatral e é apresentado como grande poema.

A dramaturgia de Olivier e Lili é problemática, lógico que na minha opinião, por vários aspectos. Entre eles não é possível enxergar os artistas Olivier Py, que foi diretor artístico do Odéon-Théâtre de l’Europe, em Paris, por cinco anos. E que, no ano que vem, assume o cargo de diretor do Festival de Avignon. Tampouco Elizabeth Mazev. Os personagens que dão título à peça ficam só na superfície.

Se esse teatro de fronteiras busca trabalhar com a memória dos atores, tendo por base o texto de Elizabeth, penso que eles não obtiveram êxito.

Dramaturgia evidencia muito mais as histórias de Leidson e Fátima

Talvez fosse melhor chamar a peça simplesmente de Leidson e Fatinha, pelo menos, o público saberia o que o esperava lá dentro: a história de vida dessas duas pessoas. Mas vamos lá. Trabalhando nessa zona de transição, a montagem, como um todo, precisaria avançar mais do que misturar as memórias dos franceses e dos pernambucanos. O que se vê no palco é muito pouco, enquanto pesquisa e experimentação contemporânea. Falta pulsação.

Eu adoro teatro. Os meus amigos, para me provocar, dizem que eu falei que até teatro ruim é bom. Eu nunca falei isso, não exatamente assim. Mas há espetáculos que são precários. Mas uma luz, um brilho no olho do ator, a troca que ele faz com o público, uma entonação, um gesto, revela uma faísca que pode virar labaredas.

Seguindo e voltando à questão do desempenho. As atuações são fracas, dos dois atores. A dele mais do que a dela. Ele é estridente e falta-lhe a graça sugerida pelo texto original. Leidson Ferraz é alto e magro, e Fátima Pontes é baixinha. A direção poderia tirar proveito dessa determinação da natureza. Claro que os dois atores têm potencialidades e podem ser melhor aproveitados. O que enxerguei foi um gestual pouco criativo, com clichês, modulação de voz acomodada e lembranças que não foram bem exploradas cenicamente. Essas são minhas impressões da estreia.

Gente que estava nesse mesmo dia que eu e voltou depois garante que o espetáculo ganhou outro rumo. Mas também escutei a mesma opinião que a minha de outros que viram a peça com tudo de cima. Bem, a minha memória, por enquanto é da estreia. E foi assim que recebi a peça.

A participação do diretor parece forçar uma barra. É lógico que tem muitos diretores que gostam de aparecer na cena. Gerald Thomas é um deles. Mas ele acrescentava, pelo menos, nas suas encenações mais emblemáticas. Não achei que era o caso.

De qualquer forma, pretendo assistir novamente ao espetáculo. Não sei se vai dar para ser hoje, quando Olivier e Lili é apresentado dentro da Mostra Capiba, às 20h, no Sesc Casa Amarela. Se não, no Janeiro de Grandes Espetáculos, que a peça está escalada. Quem sabe não mudo de opinião? Lembrando a música de Raul Seixas, Metamorfose: “Prefiro ser / Essa metamorfose ambulante / Eu prefiro ser / Essa metamorfose ambulante / Do que ter aquela velha opinião /Formada sobre tudo…”

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Ao som da música preferida

Aquilo que meu olhar guardou para você, do Grupo Magiluth, na Mostra Capiba 2012. Foto: Pollyanna Diniz

Noite de domingo. A Avenida Norte tranquila de fazer gosto. Enquanto dirijo em direção ao Teatro Capiba escuto uma música e vou rememorando. Já tinha visto Aquilo que meu olhar guardou para você, do Grupo Magiluth, três vezes: na estreia, no Teatro Hermilo Borba Filho, na temporada no Joaquim Cardozo, e no Apolo, durante o Trema! – Festival de Teatro de Grupo do Recife. Ah…com um detalhe importante: tudo já devidamente registrado em palavras.

Fui me perguntando se ainda encontraria algo novo; se de alguma forma me surpreenderia. E olhe que nessas elucubrações Candeias-Casa Amarela preciso confessar que veio uma vontade enorme de dar um Ctrl C + Ctrl V em algum texto meu mais antigo. Será que poderia ser considerado plágio? Irônicos e sarcásticos que são, os integrantes do Magiluth até me apoiariam. Seria certamente uma crítica sucesso de compartilhamentos no Face, carentes que estamos de pertinências, amantes de polêmicas vazias.

Mas ‘plagiando’ Pedro Wagner, numa entrevista que fiz com o grupo por conta da estreia do terceiro trabalho do ano – Luiz Lua Gonzaga -, “teatro é foda”. Principalmente para quem passa oito horas do dia numa sala já não tão calorenta no Bairro do Recife; para quem enxerga nisso meio e fim; para quem ama tanto que é capaz de dar a cara a tapa. Minha dedicação como jornalista e ‘crítica’ nem é tanta assim. Mas para mim, assim como observo que para o Magiluth, “é um negócio sério pra caralho”, não é Pedro?

Por isso que a dúvida, logo que começa a sessão da Mostra Capiba, se esvai. Sempre tem algo novo. Sempre algo é revelador. Um olhar, um gesto, uma palavra que você nem tinha percebido da última vez. Uma delicadeza, uma poesia ou até mesmo uma grosseria. Aquilo que meu olhar guardou para você, que surgiu a partir de um encontro com o Teatro do Concreto, de Brasília, várias fotos do Recife e a experiência com o diretor Luiz Fernando Marques, do grupo paulista XIX, é uma montagem extremamente viva. Pulsante. E como cresceu desde a estreia, considerada caótica pelo grupo, em janeiro.

Peça estreou em janeiro, participou de festivais e teve temporadas

São questões importantes discutidas sem pretensões formais ou acadêmicas. Sem a pompa e circunstância que muitas vezes alguns levam ao palco. Que lugar é esse do ator que parece não se vestir de um personagem? Que é chamado pelo próprio nome na peça? Que lugar tem essas memórias e as experiências pessoais levadas ao palco? Que importa a mim saber que Erivaldo Oliveira queria ser padre ou que o avô de Giordano trabalhava no Mercado de São José? Mas peraí – será que tudo isso é mesmo verdade? Quais são os limites entre ficção e realidade? De que forma o público pode se posicionar diante de um espetáculo desses? Será que o público deseja ser coautor?

Muitas perguntas que não precisam ser respondidas no sopro. Ou enquanto dura a montagem. Mas que fazem parte de uma linguagem que não pode ser ignorada. Que certamente tem admiradores, mas também críticos. Principalmente com relação a uma questão por demais inquietante: o que é ser ator de verdade? Será que esses atores – e aí isso é muito mais amplo do que o Magiluth – que estão embarcando por esses caminhos também se ‘sustentam’ em montagens tradicionais?

No palco do Teatro Capiba

É importante dizer que não vi as primeiras montagens do Magiluth – Corra e Ato. Mas desde Um torto percebo um amadurecimento de linguagem, de experimentação, de dramaturgia e também nos próprios atores; além, é claro, da experiência de gerir um grupo e conseguir manter um trabalho continuado. Um torto, por exemplo, traz muitas questões que só vão ser discutidas de forma mais clara em Aquilo que meu olhar guardou para você; e talvez se aproximem do público de maneira mais efetiva com Luiz Lua Gonzaga, que eu ainda não vi, mas que é a primeira montagem do grupo pensada para a rua. O canto de Gregório e Um torto Viúva, porém honesta são experiências com dramaturgias mais formais, mas nem por isso menos instigantes. Pelo contrário – são peças fortes, de muita ironia, sarcasmo, de construção de um discurso.

Público é levado ao palco e tem surpresas

Talvez na Mostra Capiba, em muito por conta da proximidade que o teatro proporciona com o público, tenha sido a minha melhor experiência com Aquilo que meu olhar guardou para você. Um momento para perceber mais de perto a dor da partida, os amores desfeitos, a busca por uma tal verdade. E para acompanhar a surpresa do público, a reação ao ter que subir ao palco, a surpresa de receber uma carta, de ouvir a música preferida tocar na peça.

Fotografias do Recife foram utilizadas na construção da montagem

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Mostra Capiba para fechar bem o ano

Hay Amor!, do grupo Os Geraldos, de Campinas, está na programação da Mostra Capiba. Foto: Claudia Echenique

Saiu a programação da VI Mostra Capiba, realizada no Teatro Capiba, no Sesc Casa Amarela, e também este ano, com ações no C.A.S.A (Centro de Articulação de Saberes Artísticos), que é na Rua Visconde de Abaeté, 166, na Tamarineira.

Mais uma vez o Satisfeita, Yolanda? é parceiro do festival, que vai de 7 a 15 de dezembro. Vou escrever sobre os espetáculos e os textos serão postados aqui no blog e no site do Sesc. Também foram convidados pra escrever sobre as peças os professores Wellington Júnior e Elton Bruno.

Os ingressos custam R$ 10 e R$ 5 (meia-entrada).

Vamos à programação:

TEATRO CAPIBA

Dia 7/12, às 20h:
Sereia no Escuro – Marcondes Lima (PE)
Sinopse: Exercício teatral calcado na improvisação como meio de expressão e não como meio de preparação para o trabalho do ator. Uma experiência cênica no limite entre linguagens, onde a representação, o canto e a dança são utilizados pelo ator como experimentos, sem a preocupação com certas convenções. O ator, em tom confessional, faz de si personagem. Fala sobre o seu fazer artístico, entremeando fragmentos de memória e ilustrando-as com demonstrações práticas. A figura mítica da sereia serve como metáfora do ser ator e dos estados de inadequação, de dubiedade e de inconformismo diante da existência. Também diz respeito às criaturas híbridas que rodeiam e habitam os abismos de todos nós.

Dia 8/12, às 20h:
Propriedade Condenada – Cia de Teatro da UFBA (BA)
Sinopse:
Com o texto curto Essa propriedade está condenada, Tennessee Williams trata de inocência de duas crianças (Tom e Willie) que se encontram nos trilhos do trem e os fatos cruéis que constituem a vida de Willie, como abuso sexual, abandono e exploração de menor. Através da narrativa de Willie, descobrimos toda a tragédia de sua família: após o abandono de sua mãe que fugiu com o homem que freava os trens e do sumiço de seu pai, alcóolatra, Willie e sua irmã mais velha, Alva, ficam sós em uma grande casa abandonada. Logo, os homens da região abusam de Alva até sua morte por tuberculose. Aos treze anos, Willie assume o lugar de sua irmã, transformando-se na cortesã dos homens da ferrovia.

Dia 9/12, às 20h:
Aquilo Que Meu Olhar Guardou Pra Você – Grupo Magiluth (PE)
Sinopse:
Com dramaturgia que adota a postura de “testemunho imparcial”, contando relatos que poderiam ser objeto de vários contos, Aquilo que Meu Olhar Guardou Pra Você mostra uma visão mais aprofundada das cidades com foco nas figuras, histórias e fluxos de todo o tecido social. É um espetáculo vivo e a cada apresentação, amplia o estado de jogo dos atores envolvidos e que pretende estabelecer uma ligação com o público a partir de uma humanidade comum, compartilhada e assumida. Neste sentido, a montagem radicaliza a experiência teatral, dando a platéia não mais um papel passivo e protegido em sua penumbra e sim um papel ativo e propositivo mediante aquilo que ela encontra.

Dia 10/12, às 20h:
Avesso – Educandário Cicuta Sem Estricnina (PE)
Sinopse: O espetáculo é o encontro de dois seres em busca de suas verdades através de histórias fabulosas e divagações filosóficas, apoiados em suas relações com o sistema sócio-econômico capitalista e suas atividades cotidianas. É uma redescoberta do ser humano começando do lado contrário. A trilha sonora é feita ao vivo a partir de recombinações de sons capturados por microfones espalhados pelo palco e na platéia, trazendo caráter orgânico ao universo surreal proposto.

Dia 11/12, às 20h:
Gaiola de Moscas – Grupo Peleja (PE)
Adaptado do conto homônimo do escritor moçambicano Mia Couto, Gaiola de Moscas é um espetáculo inspirado na brincadeira de Cavalo Marinho. Zuzé Bisgate é um curioso comerciante. Ele vende cuspes para engraxar sapatos e moscas para acompanhar os mortos nos funerais. Sua mulher, cansada das ideias do marido, se encanta por um forasteiro vendedor de “pintadas” de batom. A história nos remete a um vilarejo imaginário que poderia estar em Moçambique, no Brasil, ou em qualquer lugar onde se combine desigualdade social e criatividade. A encenação envolve o espectador num universo de precariedade e alegria, onde os personagens sobrevivem entre destroços e sonhos. Como “brincantes do conto”, músicos e atores-dançarinos apresentam sua própria brincadeira contemporânea e instauram o clima vivenciado nos brinquedos populares.

Na solidão dos campos de algodão, com Edjalma Freitas e Tay Lopez. Foto: Pollyanna Diniz

Dia 12/12, às 20h:
Na solidão dos campos de algodão – Cia do Ator Nu (PE)
Onde: O espetáculo não será no teatro, mas na quadra poliesportiva do Sesc Casa Amarela
Sinopse: Dois homens se encontram num lugar neutro, indefinido. Um deles pretende fornecer o que o outro desejaria, mas nem o desejo, nem a mercadoria são revelados. O jogo enigmático avança até chegar a um final surpreendente. E essa relação mostra-se, ao longo do tempo, como um combate sem vencedores tendo a solidão como horizonte. Um combate que só se realiza através da palavra. É a palavra que vai, no percurso do espetáculo, revelar que toda relação é um jogo comercial no qual um deseja e o outro sacia.

Dia 13/12, às 20h:
Olivier e Lili – Uma História de Amor em 900 Frases – Teatro de Fronteira (PE)
Sinopse: Concebido a partir de Les drôles: un mille-phrase, texto em que a dramaturga e atriz Elizabeth Mazev revive passagens de sua infância, adolescência e juventude ao lado do encenador e ator Olivier Py, o espetáculo cruza essa história de amor e amizade com fragmentos da biografia dos atores Fátima Pontes e Leidson Ferraz. Como se lesse as páginas de um diário, como se abrisse um álbum de fotos, como se revirasse um baú empoeirado, o público é convidado a compartilhar as memórias íntimas de Lili/Fátima e Olivier/Leidson: escola, família, sabores, músicas, perdas, paixões, sexo, identidades. Numa narrativa telegráfica e vertiginosa, a montagem (con)funde as camadas do ficcional e do real, do público e do privado, para celebrar os encontros de arte e vida propiciados pelo teatro.

Divinas, da Duas Companhias. Foto: Ivana Moura

Dia 14/12, às 20h:
Divinas – Duas Companhias (PE)
Sinopse: O espetáculo apresenta em clima de brincadeira e poesia três figuras contadoras de histórias, na pele das palhaças Uruba, Bandeira e Zanoia, atravessando tempos e geografias diversas numa caminhada sobre a delicadeza e a força na busca dos sonhos. O trabalho em conjunto transforma o grupo num grande amálgama de criatividade, dando continuidade ao movimento em busca de um corpo de mulher no universo do clown, criando uma linguagem própria da palhaça.

Dia 15/12, às 20h:
Hay Amor – Os Geraldos (SP)
Ao evocar que haja amor, a comédia musical pretende tratar a necessidade humana de não estar só. Através de uma criação dramatúrgica coletiva, o espetáculo busca retratar as relações amorosa do homem contemporâneo que, por conviver com a instantaneidade do mundo virtual, vê-se imerso em um universo de laços “a curto prazo” e relacionamentos a distância. Hay amor! se passa em um banco de praça de uma cidade do interior, onde jovens descobrem sua sexualidade e as relações amorosas.

C.A.S.A – Centro de Articulação de Saberes Artísticos

Dia 13/12, às 22h:
Faca de dois gumes – Grupo Cênico Calabouço – (PE)
Sinopse: Este trabalho foca sua busca nas relações entre sexualidades e cena contemporânea. O ator Nelson Lafayette apresenta seu solo dialogando com as tensões presentes em diversos materiais criativos – de sua vida até trechos de filmes e novelas.

Dia 14/12, às 22h:
Drama em Pessoa – Teatro Dubando (PE)
Drama em Pessoa é o novo projeto do Teatro Dubando. Consiste na leitura dramática do texto teatral O marinheiro, de Fernando Pessoa, e da encenação do texto Salomé do mesmo autor. Dividem a direção da leitura Edjalma Freitas e Alexsandro Souto Maior. A encenação de Salomé é dirigida também por Alexsandro. Com este projeto, o grupo pretende partilhar com o público o teatro pouco conhecido de Fernando Pessoa. Um teatro marcado pela valorização da palavra. Um teatro para ser lido, não encenado, como o próprio Pessoa admitia. O Teatro Dubando acabou por enveredar no universo lírico e onírico, presente nos dois textos, a fim de contar dramas estáticos na perspectiva de um espetáculo intimista e envolvente.

Dia 15/12, às 22h:
Cartas Autorais – A Cântaros (PE)
Sinopse: Através do jogo e performance, diferentes leituras de cartas, postais, bilhetes e outras correspondências, permeadas por memórias musicais. O roteiro e a direção são de Ana Laura Nascimento e Sonia Guimarães, que também estão no palco.

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Perdendo a cabeça

Ser, o não-ser, espetáculo de teatro negro. Foto: Rodrigo Moreira

A coragem e a ousadia de experimentar uma linguagem que quase não é vista nos palcos pernambucanos. Só isso já seria suficiente para atiçar a curiosidade do público, mas não para necessariamente capturá-lo. O Grupo Capibaribe Negro sabe disso e vai além. Consegue conquistar com a graciosidade de um espetáculo pouco pretensioso, mas que se mostra bem construído em seus propósitos.

Atores jovens, a maioria deles saídos da universidade ou da escola de teatro, decidiram enveredar pelo teatro negro e pelas formas animadas. A ausência de luz, ou melhor, a medida perfeita no seu uso, aliada à manipulação coordenada de objetos, são os pré-requisitos para que Ser, o não-ser se erga.

Como bem disseram os atores ao final da montagem, nem é preciso entender exatamente a história que eles contam para se divertir e surpreender. A sinopse explica “Ser, o não-ser conta com sutileza a eterna busca do homem racional e sua inquietude perante sua existência no mundo. O homem que agora perdeu sua fé e renasceu completamente fragmentado, parte numa odisséia penumbrosa em busca da paz de se sentir completo outra vez”. Se eles estão dizendo que é isso, tudo bem. Na realidade, nem importa tanto assim…

Grupo fez três temporadas este ano no Joaquim Cardozo e se apresentou na Mostra Capiba

A narrativa começa com um homem que perde a cabeça e depois o corpo todo. Sobram só as mãos, que vão atrás de outro corpo, feito com um lençol. Mas ainda faltam os olhos, o rosto, a boca, que pode ser um livro, o nariz roubado de um boneco de neve resfriado. A música ajuda a dar ritmo e compor o ambiente da montagem. Quem faz a sonoplastia é Júlia ShaKurr. A direção é de Pedro Cardoso e o elenco é formado por Juliana Nardin, Ailton Brito, Kedma Macedo e Kelina Macedo.

Talvez fosse interessante, como um próximo passo, conseguir se apropriar da dramaturgia de maneira mais efetiva. Comunicar não só através das cores reluzantes e movimentos dos bonecos. Contar um enredo mais claro ao público. Vimos algumas dessas experiências por aqui – com o teatro de objetos (não o teatro negro) no Festival Internacional de Teatro de Objetos (Fito), realizado no Marco Zero. Fiquei lembrando, por exemplo, dos espetáculos do espanhol Jaime Santos, da La Chana Teatro: Entre dilúvios e O pequeno vulgar, que têm um enredo totalmente assimilado pelo público, e nem por isso, os espetáculos deixam de ser inventivos.

A direção é de Pedro Cardoso

Só este ano, o Capibaribe Negro já fez três temporadas no Teatro Joaquim Cardozo, no Centro Cultural Benfica, que foi onde este elenco deslanchou e tomou intimidade de verdade com o espetáculo. Quantas pessoas teriam prestigiado o grupo nesse longo período em cartaz? E aí as considerações vão muito mais no sentido da divulgação propriamente dita do que na construção da montagem. É preciso articular meios – seja por fotografias adequadas, pelo contato mais efetivo com a imprensa, pela atuação nas redes sociais – para que a montagem realmente seja bem-sucedida. Não basta só ter um bom espetáculo. Claro que a propaganda “boca a boca” é importante, mas pode ser incrementada se as pessoas tiverem uma noção e forem despertadas para o que podem desfrutar no espetáculo. Só digo uma coisa… já estou curiosa para a próxima montagem.

Manipulação é feita por quatro atores

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