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O tempo é de luta, lembra Frei Caneca

Buarque de Aquino faz o religioso revolucionário. Foto: Roberto Soarez/ Divulgação

Buarque de Aquino faz o religioso revolucionário. Foto: Roberto Soarez/ Divulgação

Pernambuco tem seus heróis. Frei Caneca é um dos grandes. Símbolo de resistência e luta; mártir e herói da história brasileira, ele foi um dos articuladores da Revolução Pernambucana de 1817, de caráter republicano, e da Confederação do Equador de 1824. No Largo das Cinco Pontas, região central do Recife, foi espingardeado junto à forca (“por não haver réu que se prestasse a garroteá-lo”), em 13 de janeiro de 1825. O percurso político de Frei Joaquim do Amor Divino Caneca é exposto no espetáculo Suplício de Frei Caneca, encenado por José Francisco Filho e com texto de Cláudio Aguiar. A peça tem sessão nesta sexta-feira (18/08), às 20h, na Igreja de Santa Tereza D’Ávila, que fica ao lado da Basílica do Carmo do Recife (avenida Dantas Barreto), com entrada gratuita e distribuição de senhas uma hora antes.

A dramaturgia do escritor Cláudio Aguiar faz um recorte na biografia do carmelita revolucionário e foca no período que vai da ordenação até a sentença de morte. A montagem ressalta a complexidade nas escolhas do religioso. Na análise da peça, o poeta e crítico literário Ângelo Monteiro diz que o autor elegeu uma figura paradoxal e aparentemente dividida como Joana D’Arc que foi santa, guerreira, e queimada como feiticeira ao tentar salvar a França.

“Cláudio Aguiar neste oratório dramático, tem como protagonista uma figura da mesma têmpera e grandeza: Frei Caneca que, sendo frade e sacerdote, foi levado à atividade revolucionária e condenado pela Coroa brasileira à pena capital como traidor da Pátria. As grandes personagens do drama não só da arte, porém da vida, são todas marcadas pelo sentido do paradoxo e mesmo da contradição,”, atesta Monteiro.

Na encenação, o ator Buarque de Aquino assume o a papel do protagonista e a equipe conta com 20 pessoas, entre artistas e técnicos. A trilha é executada ao vivo por Júlio César Brito e Matheus Marques. Cláudio Aguiar musicou os poemas escritos pelo próprio Frei Caneca.

Não posso cantar meus males
Nem a mim mesmo em segredo;
É tão cruel o meu fado,
Que até de mim tenho medo

José Francisco Filho já montou Frei Caneca em dois outros momentos. No Teatro do Parque, em 1977 e na década de 1980, na mesma Igreja de Santa Tereza D’Ávila. Para o encenador o local da apresentação tem algo de místico porque fica próximo do Convento do Carmo, onde o religioso fez seus votos, foi ordenado e teve seus restos mortais sepultados.

Encenar a peça fora dos edifícios tradicionais também é uma postura política ressaltada pelo diretor, que atenta para os teatros sucateados e para a luta da classe artística pela reabertura do Teatro do Parque.

Sobre os motivos de de erguer o Suplício de Frei Caneca nesses tempos marcados por um golpe jurídico-político-midiático, o diretor aposta que nada mais oportuno que mostrar/montar a vida de Frei do Amor Divino Caneca. “Neste país devassado pela corrupção, pelo ódio e pela violência, Caneca nos mostra e lembra que é preciso lutar sempre: ‘Abaixo a escravidão’! ‘Viva a revolução’!!! A contemporaneidade do texto e dos fatos não nos deixa escolha: Lutar!!”

Quem passa a vida que eu passo,
Não deve a morte temer;
Com a morte não se assusta
Quem está sempre a morrer

Apresentações ocorrem na

Apresentações ocorrem na Igreja de Santa Tereza D’Ávila

Joaquim do Amor Divino Rabelo nasceu numa família pobre do Recife, em agosto de 1779. Entrou para o convento carmelita da capital e foi ordenado em 1801, quando trocou o nome de família pelo apelido do pai, que era tanoeiro. Por sua participação no movimento de 1817 ficou preso na Bahia por quatro anos. Voltou ao Recife, fundou o jornal Typhis Pernambucano, de ideias liberais, e participou da Confederação do Equador (1824), movimento separatista de caráter republicano, derrotado pelas tropas imperiais.

O movimento emancipatório que instaurou uma república no Estado durante 74 dias chega a 200 anos e o governo de Pernambuco criou uma comissão de notáveis para organizar as celebrações do bicentenário. Em março foram anunciadas as comemorações que seguem até o final do ano, com exposições, publicação de livros pela CEPE, concurso de redação para alunos e a construção de um monumento para conectar a Praça da República, aos outros espaços de referência da revolução, além de outras ações festivas.

O Suplicio de Frei Caneca não faz parte dessa programação, segundo o diretor José Francisco Filho e não recebeu nenhum tostão para sua produção do governo do Estado de Pernambuco. A montagem tem projeto aprovado pela Lei Rouanet, e busca captar recursos com as empresas. Até agora, a temporada com apresentações hoje e nos dias 27 de agosto e 1º de setembro só conta com patrocínio da Copergás.

José Francisco Filho, Cláudio Aguiar, Célia guiar, Buarque de Aquino

José Francisco Filho, Cláudio Aguiar, Célia Salsa e Buarque de Aquino

Serviço
Espetáculo Suplício de Frei Caneca
Quando: Nesta sexta-feira (18), às 20h. E nos dias 27/08 e 1º/09
Onde: Igreja de Santa Tereza D’Ávila (av. Dantas Barreto, bairro de Santo Antônio. Ao lado da Basílica do Carmo do Recife)
Entrada gratuita

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Os horrores da opressão

Stella Maris Saldanha e Germano Haiut. Foto: Renato Filho

Stella Maris Saldanha e Germano Haiut na peça O Delator. Foto: Renato Filho

Ei-los: os Senhores Professores estão
aprendendo a marchar. O nazistinha
puxa-lhes as orelhas e lhes ensina a
posição de sentido. Cada aluno um
espião. Não precisam saber nada
do mundo ou do universo. Mas é interessante
informar: o que, de quem e
quando. Aí vêm as criancinhas. Elas
buscam o carrasco e o trazem para
casa. Delatam o próprio pai, chamam-no
de traidor. E ficam olhando, quando levam
o velho de mãos e pés algemados.
(Bertolt Brecht)

Os delatores estão à espreita nas ruas e até dentro das casas. Não dá para confiar em ninguém. Esse clima domina Terror e Miséria do Terceiro Reich, do alemão Bertolt Brecht (1898-1956), que traça um panorama da vida na Alemanha nazista. O texto foi escrito entre 1935 e 1938, a partir de informações que o dramaturgo recebia daqueles tempos sombrios, pois Brecht vivia à época na Dinamarca.

Composta de vinte e quatro cenas que expõem a rotina de soldados, juízes, professores em que as questões do totalitarismo e das liberdades individuais são salientadas. O pesquisador Martin Esslin diz que são esquetes “… escritas num estilo bem pouco brechtiano, de convenção naturalista”

A montagem de José Francisco Filho focaliza principalmente o episódio 10, O Espião na tradução de Gilda Osvaldo Cruz. “Mudamos de Espião para Delator. Foi um consenso. A palavra delator torna mais atemporal a montagem”, conta o diretor, que completou recentemente 50 anos de teatro.

O espetáculo marca a volta aos palcos do ator Germano Haiut (da peça Galileu e do filme O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, de Cao Hamburger), depois de 30 anos. Judeu, Germano carrega na memória afetiva o horror do Holocausto, que atingiu sua família. Ele divide o palco com Stella Maris Saldanha, que já encenou outro Brecht, Os Fuzis da Senhora Carrar.

Na cena, um casal discute sobre política na presença do filho. O marido critica o regime. O menino desaparece e os pais temem que o garoto possa ter saído denunciá-los.

O clima vai ficando mais tenso. Os direitos usurpados pelo regime não democrático atingem as pessoas na liberdade de pensamento e expressão. A peça provoca a sensação de que o povo é condenado sem justiça. “Não precisa muito esforço para trazer o texto para nossa realidade”, resume José Francisco Filho.

FICHA TÉCNICA

Duração: 50 min.
Classificação etária: a partir dos 16 anos
Texto: Bertolt Brecht
Encenação, adaptação e produção executiva: José Francisco Filho
Assistente de direção e sonoplastia: Ricardo Vendramine
Iluminação: Eron Villar
Direção de arte: Eduardo Ferreira
Elenco: Germano Haiut e Stella Maris Saldanha

SERVIÇO
O Delator – Terror e Miséria no Terceiro Reich
Quando: sábados e domingos de janeiro, às 18h
Onde: Teatro Arraial (Rua da Aurora, 457, Boa Vista)
Classificação: 16 anos

Ingressos: R$ 30 e R$ 15 (meia)
Informações: 3184-3057

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