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Irandhir Santos, Newton Moreno e MITsp entre os vencedores do APCA

Saiu na noite de ontem (1) a lista dos vencedores do 59º Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). São diversas categorias, que incluem, por exemplo, arquitetura, literatura, cinema, teatro, dança e televisão.

No teatro, o prêmio de melhor espetáculo foi dividido entre duas montagens: O homem de La Mancha e Pessoas perfeitas; o pernambucano Newton Moreno levou o prêmio de dramaturgia ao lado de Alessandro Toller por O grande circo místico; Laila Garin (que esteve no Recife com o elenco de Gonzação, A lenda) ganhou melhor atriz por seu papel em Elis, A musical; e o prêmio especial foi para a Mostra Internacional de Teatro de São Paulo (MITsp), realizada em março. Na categoria televisão, Irandhir Santos, que estuda a possibilidade de voltar aos palcos na próxima montagem do Coletivo Angu de Teatro, levou melhor ator por Amores roubados e Meu pedacinho de chão.

A festa de premiação será realizada ano que vem.

Confira a lista completa dos premiados no APCA 2014:

TEATRO

Grande Prêmio da Crítica: Laura Cardoso

Espetáculo: O Homem de La Mancha e Pessoas Perfeitas

Eduardo Chagas e Marta Baião em Pessoas Perfeitas, do Satyros. Foto: André Stéfano

Eduardo Chagas e Marta Baião em Pessoas Perfeitas, do Satyros. Foto: André Stéfano

O Homem de La Mancha

O Homem de La Mancha

Diretor: Marco Antonio Pâmio (Assim É (Se Lhe Parece))

Dramaturgia: Newton Moreno e Alessandro Toller (O Grande Circo Místico)

O Grande Circo Místico. Foto: Leo Aversa

O Grande Circo Místico. Foto: Leo Aversa

Ator: Cleto Baccic (O Homem de La Mancha)

Atriz: Laila Garin (Elis, a Musical)

Laila Garin em Elis, A musical. Foto: Caio Galluci/divulgação

Laila Garin em Elis, A musical. Foto: Caio Galluci/divulgação

Prêmio Especial: Prêmio MitSP (Mostra Internacional de Teatro de São Paulo)

Companhia lituana OKT encenou Hamlet na MITsp. Foto: Lígia Jardim

Companhia lituana OKT encenou Hamlet na MITsp. Foto: Lígia Jardim

Votaram: Afonso Gentil, Aguinaldo Cristofani Ribeiro da Cunha, Carmelinda Guimarães, Edgar Olímpio de Souza, Evaristo Martins de Azevedo, José Cetra Filho, Kyra Piscitelli, Marcio Aquiles, Maria Eugênia de Menezes, Michel Fernandes, Miguel Arcanjo Prado, Tellé Cardim e Vinício Angelici

TEATRO INFANTIL

Grande Prêmio da Crítica: Banda Mirim, pela trajetória de 10 anos (direção de Marcelo Romagnoli)

Melhor Espetáculo com Música para Crianças: Mania de Explicação, de Luana Piovani Produções Artísticas (direção de Gabriel Villela)

Melhor Espetáculo com Texto Adaptado para Crianças: As Bruxas da Escócia, do Grupo Vagalum Tum Tum (direção de Ângelo Brandini)

Melhor Espetáculo com Contação de Histórias: As Três Penas do Rabo do Grifo, da cia. Faz e Conta (Ana Luísa Lacombe)

Melhor Elenco de Peça: Cia Delas, por A Famosa Invasão dos Ursos na Sicília (atrizes Cecília Magalhães, Fernanda Castello Branco, Lilian Damasceno, Paula Weinfeld e Thaís Medeiros, com direção de Carla Candiotto)

Melhor Espetáculo com Interação de Mídias: O Sonho de Jerônimo, do grupo Fabulosa Companhia (direção de Eric Nowinski)

Personalidade do Ano no Teatro Para Crianças e Jovens: Luíza Jorge, pela criação, coordenação e produção do novo Prêmio São Paulo de Incentivo ao Teatro Infantil e Jovem

Votaram: Dib Carneiro Neto, Gabriela Romeu e Mônica Rodrigues da Costa

TELEVISÃO

Dramaturgia: Amores Roubados/TV Globo

Atriz: Cássia Kis Magro (Amores Roubados e O Rebu/TV Globo)

Ator: Irandhir Santos (Amores Roubados e Meu Pedacinho de Chão/TV Globo)

Irandhir Santos como Zelão em Meu Pedacinho de Chão. Foto: TV Globo

Irandhir Santos como Zelão em Meu Pedacinho de Chão. Foto: TV Globo

Direção: José Luiz Villamarim (Amores Roubados e O Rebu)

Programa de Variedades: O Infiltrado/History Channel

Programa de Humor: Tá no Ar/TV Globo

Programa Infantil: Quintal da Cultura/TV Cultura

Menção Honrosa: A Grande Família/TV Globo (pela trajetória e episódio final)

Votaram: Cristina Padiglione, Edianez Parente, Flávio Ricco, João Fernando, José Armando Vanucci, Leão Lobo e Neuber Fischer

DANÇA

Grande Prêmio da Crítica: Lia Rodrigues, por Pindorama e Exercício M

Pesquisa em Dança: Biomashup, de Cristian Duarte e Lote # 3

Projetos em Dança: Marcos Villas Bôas

Criação em Dança: Cena 11, por Monotonia de Aproximação e Fuga para 7 Corpos

Espetáculo: Tira Meu Fôlego, de Elisa Ohtake e elenco

Percurso em Dança: Vera Sala / Hideki Matsuda

Iniciativa em Dança: 7×7, projeto de Sheila Ribeiro

Votaram: Ana Teixeira, Ana Francisca Ponzio, Helena Katz e Renata Xavier

CINEMA

Filme: Praia do Futuro, de Karim Aïnouz

Diretor: Paulo Sacramento, por Riocorrente

Roteiro: Fernando Coimbra, por O Lobo Atrás da Porta

Ator: Ghilherme Lobo, por Hoje Eu Não Quero Voltar Sozinho

Atriz: Deborah Secco, por Boa Sorte

Documentário: São Silvestre, de Lina Chamie

Fotografia: Jacob Solitrenick, por De Menor

Votaram: Orlando Margarido, Rubens Ewald Filho e Walter Cezar Addeo

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ARTES VISUAIS

Grande Prêmio da Crítica: Abraham Palatnik – A Reinvenção da Pintura – MAM

Exposição Internacional: Hans Hartung – Oficina do Gesto – CCBB

Exposição: Paulo Bruscky – MAM

Retrospectiva: Iberê Camargo – Um Trágico nos trópicos – CCBB

Fotografia:Luiz Braga – Retumbante Natureza Humanizada – SESC Pinheiros

Obra Gáfica: José Roberto Aguillar – 50 Anos de Arte

Iniciativa Cultural: Cidade Matarazzo Made by…. Feito por brasileiros

Votaram: Antonio Santoro Jr., Antonio Zago, Dalva Abrantes, João J. Spinelli, José Henrique Fabre Rolim, Luiz Ernesto Machado Kawall, Marcos Rizolli, Ricardo Nicola, Silvia Balady, Emilia Okubo e Rubens Fernandes Junior.

LITERATURA

Grande Prêmio da Crítica: João Adolfo Hansen e Marcello Moreira pelos cinco volumes “Gregório de Matos”; editora Autêntica

Romance: “O Irmão Alemão”, de Chico Buarque; editora Companhia das Letras

Ensaio/Crítica/Reportagem: “Música com Z”, de Zuza Homem de Mello; editora 34

Infanto-Juvenil: “A Incrível História do Dr. Augusto Ruschi”, de Paulo Tatit; editora Melhoramentos

Poesia: “Mesmo sem dinheiro comprei um esqueite novo”, de Paulo Scott; editora Companhia das Letras

Contos/Crônicas: “O Homem-mulher”, de Sérgio Sant’Anna; editora Companhia das Letras

Tradução: Caetano Galindo, por “Graça infinita”, de David Foster Wallace; editora Companhia das Letras

Biografia/Memória: “Getúlio (1945 – 1954) – Da volta pela consagração popular ao suicídio”, de Lira Neto; editora Companhia das Letras

Votaram: Amilton Pinheiro, Felipe Franco Munhoz, Gabriel Kwak, Luiz Costa Pereira Jr. e Ubiratan Brasil

MÚSICA POPULAR

Grande Prêmio da Crítica: Nelson Motta

Grupo: Banda do Mar

Intérprete: Anelis Assumpção

Compositor: Marcelo Jeneci

Revelação: Ian Ramil (pelo álbum “Ian”)

Álbum: Encarnado, de Juçara Marçal

Show: Titãs – Nheengatu

Projeto Especial – Jazz na Fábrica – Sesc Pompeia

Votaram: Inês Fernandes Correia, José Norberto Flesch e Marcelo Costa

RÁDIO

Prêmio Especial do Juri: Milton Jung – Jornal da CBN 1ª edição

Internet: Plug Rádio USCS – Universidade Municipal de São Caetano do Sul (plugradiouscs.com.br)

Musical: Espaço Rap 2 – 105 FM

Humor: Plantão de Notícias – Rádio Globo AM

Variedades: No Mundo da Bola, 25 anos – Rádio Jovem Pan

Cultura Geral: Estadão Noite – Rádio Estadão

Destaque do Ano: Um Pouquinho de Brasil – Cultura FM

Votaram: Fausto Silva Neto, Marco Antonio Ribeiro e Sílvio Di Nardo

ARQUITETURA

Homenagem pelo conjunto da obra: Giancarlo Gasperini

Fronteiras da arquitetura: “Maneiras de expor: a arquitetura expositiva de Lina Bo Bardi”, curadoria de Giancarlo Latorraca/Museu da Casa Brasileira

Projeto urbano: Ponte Bayer – passarela móvel sobre o canal Guarapiranga, São Paulo – Loeb Capote Arquitetura e Urbanismo/ arquitetos Roberto Loeb e Luis Capote

Urbanidade: reurbanização de favela do Sapé – Base 3 Arquitetos/ arquitetos Catherine Otondo, Jorge Pessoa de Carvalho e Marina Grinover

Narrativas urbanas: Cristiano Mascaro

Difusão: documentário “Bernardes”, direção Gustavo Gama Rodrigues e Paulo de Barros

Revelação: Alojamentos estudantil na Ciudad del Saber, Panamá – SIC Arquitetura / arquitetos Eduardo Crafig, Juliana Garcias, Marcio Guarnieri, Fabio Kassai e Gabriela Gurgel

Votaram: Abílio Guerra, Maria Isabel Villac, Fernando Serapião, Guilherme Wisnik, Mônica Junqueira Camargo e Nadia Somekh

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Escracho e purpurina contra a caretice

Grupo Vivencial surgiu nas barbas da Igreja Católica. Foto: Ana Farache/Divulgação

Quatro décadas depois do surgimento dos grupos teatrais Dzi Croquettes e Vivencial, suas histórias peculiares ganham homenagens, livros e filmes

Eles queriam fazer diferente. E conseguiram. As afinidades entre dois grupos que apontaram novos caminhos para o fazer teatral começam com o direito que deram a si mesmos de questionar o estabelecido, no momento em que a repressão vinda com o AI-5 (1968) ainda reverberava.

Purpurina, cílios postiços, salto alto e escracho. O Dzi Croquettes surgiu no Rio de Janeiro, em 1972, por iniciativa de pessoas que já estavam próximas da arte, como Wagner Ribeiro, que queria reunir os amigos da escola de teatro para fazer um espetáculo.

Cláudio Gaya e Cláudio Tovar, atores do Dzi Croquettes

O Vivencial foi criado dois anos depois, em Olinda, nas barbas da Igreja Católica. O líder e mentor Guilherme Coelho era um paraibano que queria ser monge no Tibet, mas foi parar no Mosteiro de São Bento. Encontrou outros “desindexados”, como costuma dizer, e, para celebrar os 10 anos da Associação de Moças e Rapazes do Amparo (Arma), montou um espetáculo. A tensão libertária que havia em cada um dos grupos manifestou-se no palco. “Em Vivencial I, nossa primeira montagem, a proposta era ‘seja você mesmo, busque seu eixo, saia de casa, construa, mude o mundo’”, conta.

Mesmo tendo surgido depois, com proposta estética e conceitual semelhante, o Vivencial não tomou o grupo carioca como modelo. “Era a voz da contracultura. O teatro de revista, por exemplo, era muito forte aqui, com Barreto Júnior. Era pornochanchada, eles faziam coisas muito engraçadas e esse escracho a gente achava interessante. Mas não copiava. Tinha o teatro de revista, Nelson Rodrigues, Maria Bethânia, Secos & Molhados, o próprio Dzi Croquettes, a androginia. O mundo estava respirando isso”, avalia Guilherme Coelho. “Acho que fomos muito mais influenciados pelo Dzi Croquettes na época do Diversiones, que era um café-concerto que abrimos. Os números de plateia, por exemplo, eram uma influência descarada do Dzi, embora não copiássemos, era inspiração”, reconhece o ator Henrique Celibi.

Quase 40 anos depois da explosão em cena do grupo carioca e do pernambucano, suas experiências são lembradas em livros, filmes, menções. Em novembro de 2011, o Vivencial foi o homenageado do Festival Recife do Teatro Nacional, promovido pela Prefeitura do Recife, quando houve também o lançamento da obra Transgressão em 3 atos – nos abismos do Vivencial, assinada pelos jornalistas Alexandre Figueirôa, Cláudio Bezerra e Stella Maris Saldanha. Nos próximos meses, deverá ser relembrado no cinema, já que é “referência afetiva” para o filme Tatuagem, primeiro longa dirigido por Hilton Lacerda, que tem como protagonista Irandhir Santos.

O Dzi, por sua vez, teve sua história recontada em detalhes e muitos depoimentos no documentário que leva o nome do grupo, assinado por Tatiana Issa e Raphael Alvarez. Dzi Croquettes estreou no Brasil no Festival do Rio, em outubro de 2009, e saiu de lá como o melhor documentário, segundo o júri popular e também o oficial. Levou, ainda, o prêmio do público na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, no Cine Fest Goiânia, no Torino GLBT Film Festival, e no Los Angeles Brazilian Film Festival.

Para sempre

“A gente não deixa de ser Dzi Croquettes. A gente não é ex-Dzi Croquettes, a gente é pra sempre. A maneira de pensar, agir, fazer, continua comigo”, diz o ator Cláudio Tovar. “Não existe ex-Viveca”, confirma Suzana Costa, uma das musas do Vivencial, ao lado da bailarina clássica que, quando percebeu, estava nos palcos “com os peitos de fora”, Ivonete Melo.

Vivencial não queria saber de rótulos - nem na vida, nem no palco. Foto: Gilberto Marcelino/Divulgação

Enquanto o Dzi Croquettes era formado só por homens – 13, no total (embora as mulheres, fossem namoradas, tietes, estivessem sempre rondando) –, o Vivencial tinha garotas na sua formação. Agregou, aliás, não só as mulheres. Quando, em 1978, no meio do mangue, no bairro de Salgadinho, construíram o Vivencial Diversiones, havia show de variedades e muitos travestis também se apresentavam. “Além de dar visibilidade positiva ao universo homossexual e se impor contra o autoritarismo político e moral da época, o Vivencial realizou um trabalho de inclusão social, oferecendo aos travestis uma oportunidade de seguir carreira artística. Ao instalar um café-concerto numa comunidade pobre de Olinda, o grupo não só incorporou aquela realidade à dramaturgia vivencial como também incluiu jovens do local nos seus espetáculos”, aponta Cláudio Bezerra.

Havia no Vivencial certo empirismo que se refletia na cena. “O teatro não era aquela coisa acadêmica. Quando você perguntava pelo método e ninguém respondia, é porque não tinha método nenhum. Mas, como salvação pela palavra, foi a melhor coisa que aconteceu”, avalia Suzana Costa. Já os Dzi tiveram a sorte de contar com o americano Lennie Dale, “pai do grupo”, embora eles também estivessem longe de qualquer fórmula acadêmica. “Quando fui assistir ao ensaio, notei que os meninos tinham, assim, uma garra, uma força de vontade tão grande. O que faltava neles era uma técnica de dança”, contou Dale, numa antiga entrevista. “Então, Lennie pegou os brasileiros ‘mocoronga’ e mandou pau em cima, oito horas de trabalho”, confirmou Wagner Ribeiro, também em antigo depoimento – tanto Lennie quanto Wagner já são falecidos.

O Dzi e o Vivencial tinham em comum, no entanto, o improviso, o humor, o sentido crítico no que levavam ao palco. Além, claro, da revolução comportamental vivida nos palcos e fora deles. Eram contra o maniqueísmo. “A cultura dizia que homem era assim, mulher era assim e quem fosse diferente não tinha vez. E a gente disse não: ‘Ser humano é para brilhar e não para morrer de fome’. As pessoas que eram diferentes eram obrigadas a entrar em papéis sociais restritos”, pontua Guilherme Coelho. “O espetáculo deles não era um espetáculo gay. Havia uma sexualidade boa, masculina, feminina, homossexual. Havia uma possibilidade absoluta do exercício da sexualidade”, depõe Pedro Cardoso, no documentário Dzi Croquettes.

Afetividades

Dzi Croquettes, as internacionais

Essa liberdade, os dois grupos levaram para a vida que, nem de longe, foi pacífica, sem conflitos. Até porque tanto os integrantes do Dzi Croquettes como do Vivencial moraram juntos. As relações eram intensas, as emoções viviam à flor da pele. Algumas Vivecas moraram juntas, antes mesmo da criação do café-concerto.
Até por conta do Dzi Croquettes ter surgido no Rio de Janeiro, o alcance que os dois grupos tiveram foi diferente. Os Dzi foram à Europa, tinham em Liza Minelli uma madrinha, fizeram temporada com teatro lotado em Paris. Com Repúblicas independentes, darling, que estreou em 1978, o Vivencial fez apresentações em São Paulo, no Teatro de Arena Eugênio Kusnet, e no Rio de Janeiro, no Teatro Cacilda Becker. Era uma colagem de textos de jornais, crônicas, contos e poesias de Carlos Drummond de Andrade, Carlos Eduardo Novaes, Luís Fernando Veríssimo e ainda depoimentos dos próprios atores.

“O nome do espetáculo era uma coisa extremamente engajada e depois vinha uma ‘pinta’. A gente relativizava tudo. Em São Paulo, lembro o Plínio Marcos, o Antunes Filho na plateia. E, depois, eles queriam saber como aquilo acontecia, porque para a gente era muito natural fazer teatro daquele jeito, usando todos os subsídios para fazer cenário, figurino. Transformando lixo em arte”, conta Fábio Coelho, bailarino do Vivencial.

Tanto o Dzi Croquettes quanto o Vivencial foram sucesso de público, nem sempre de crítica, embora os talentos fossem inegáveis. Talvez por isso mesmo, por reunir tantas possibilidades artísticas, os dois grupos acabaram se desagregando. O Dzi começou a ruir por conta de uma briga que tomou proporções muito maiores do que a sua causa: um cenário que Cláudio Tovar fez para uma apresentação e Lennie Dale não gostou. O Vivencial também se desfez por conta de conflitos. “Não podia faltar céu para tanta estrela brilhar. Todos eram muito brilhantes, com muito ego. Cada um era uma entidade, todos tinham projetos, e nós demos corda para esses projetos. Sempre poli o ego de todo mundo: ‘Você é linda, vai arrasar’, enchia de purpurina. O Vivencial nasceu para brilhar’, afirma Guilherme Coelho. Há um ditado, entre o cômico e o malicioso, que afirma, bem ao estilo de deboche dos dois grupos: “Bicha não morre, vira purpurina”. O Dzi Croquettes e o Vivencial, nesse caso, só nesse, não fugiram à regra.

(Matéria publicada na edição de Janeiro da Revista Continente)

Henrique Celibi, Fábio Costa e Guilherme Coelho. Foto: Henrique Celibi/acervo pessoal

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Vivencial é referência afetiva no cinema

“Caros caras:
Não sou anormal. Somos. Logo, não somos. É diferente. Um anormal é anormal. Dois anormais são normais. Tanto mais se unidos. Muito poucos fazem muito. De minoria em minoria, a maioria enfia a viola no saco, e a violação no cu.”

“Não adianta fazer ou assistir teatro sem considerarmos as características do tempo em que vivemos. O teatro é o reflexo das realidades de uma época e não um fenômeno isolado cujas dificuldades sejam exclusivamente suas, mas de todo um processo criativo em crise.”

O Grupo Vivencial Diversiones foi um furacão, uma perversão, o salto-alto no mangue, o teatro em movimento. E ele mesmo se “explicou” em alguns textos. Esses foram reunidos e publicados por Lúcia Machado no livro A modernidade no teatro, Ali e aqui, Reflexos estilhaçados. Foi lá no Vivencial que o cineasta Hilton Lacerda bebeu. E Tatuagem está surgindo…

Primeiro longa de Hilton Lacerda é inspirado no Vivencial Diversiones. Fotos: Pollyanna Diniz

Visitei o set e escrevi uma matéria para o Diario de Pernambuco, publicada no último sábado e reproduzida aqui:

“O nosso show vai estrear / Mas não se engane / Nós somos perigosas / Bem gostosinhas e amorosas”. A irreverência dos versos cantados por marinheira, bailarina, um diabo provocante se propagava no jardim daquele casarão antigo nas ladeiras históricas de Olinda na quinta-feira passada. O lugar serve como locação do primeiro longa de Hilton Lacerda – Tatuagem, que será filmado até o dia 28 deste mês.

A cena que estava sendo gravada era, na realidade, “um filme dentro do filme, já que um dos personagens grava um Super-8. Era o baile da trupe Chão de Estrelas, uma “referência afetiva” ao grupo de teatro Vivencial Diversiones, que existiu no Recife nas décadas de 1970 e 1980 sob influência da contracultura. “Não queria fazer um documentário, me desagrada o fato de adaptar o real para a ficção. Mas tem essa inspiração”, explica o diretor.

Irandhir Santos interpreta líder da trupe Chão de estrelas

Casarão em Olinda onde foram rodadas algumas cenas

O filme se passa em 1978, mas não está preso ao passado. “Não me interessa fazer um filme fora do que a gente vive. Nesse Super-8 que está sendo gravado no filme, os atores dizem que o futuro será incrível e todos os preconceitos seriam abolidos. Seria uma revolução filosófica e não tecnológica. Mas 1978 era o ano em que o Brasil ia dar certo e acho que estamos passando por isso novamente”, avalia Lacerda.

O protagonista do filme é Irandhir Santos, que começou no teatro aqui em Pernambuco, mas despontou mesmo no cinema em longas como Tropa de Elite 2 e Besouro. Santos faz o líder da trupe tão questionadora quanto polêmica e inventiva; mas que está envolvido numa relação com o lado oposto, um soldado, interpretado pelo também pernambucano Jesuíta Barbosa. O diretor explica que o projeto tem pelo menos cinco anos e que sempre pensou em Irandhir para o papel principal. Os dois já trabalharam juntos – Lacerda como roteirista – em Febre do rato (que teve pré-estreia dentro do Janela de Cinema) e Baixio das bestas. “Adoro fazer roteiros e isso fez com que eu demorasse a dirigir”, complementa.

O longa tem um orçamento de R$ 2,5 milhões, recursos da Petrobras, Eletrobras e Funcultura. 70 pessoas estão na equipe. “Desde setembro temos o elenco, tanto atores quanto não-atores, mas pessoas envolvidas com arte, que, às vezes, são até mais naturais”, conta Rutílio de Oliveira, produtor de elenco. É assim, por exemplo, que Júnior Black faz o DJ Tonho do Som. Ou alguém que trabalhava na arte acabou em cena vestida de bailarina. “Meu personagem fuma um monte para poder criar. Como muitos, saiu de casa por algum motivo. Acho que hoje haveria espaço para um grupo como o Vivencial, mas não sei se com o mesmo nível de provocação”, diz o ator Erivaldo Oliveira, vestido de Marquinhos Odara.

Trupe Chão de Estrelas

Cláudio Assis relembrou o tempo em que foi dirigido por Vital Santos e se apresentou no Vivencial

Que diabos é essa liberdade?
A sede “político-anárquica” do Vivencial Diversiones ficava no Complexo de Salgadinho, numa área de mangue. “Quando eu era ator do Grupo de Cultura de Caruaru, com Vital Santos, nós nos apresentamos no Vivencial. Era meio mangue, me lembro bem, fim da década de 1970”, recorda o diretor Cláudio Assis, que estava acompanhando as gravações de Tatuagem – e iria até entrar em cena. Se a casa do Vivencial ficava no mangue, a da trupe Chão de Estrelas é construída no Nascedouro de Peixinhos, com referências ao tropicalismo e, claro, à liberdade.

O filme ainda terá a participação de alguns atores que integraram o Vivencial, como Auricéia Fraga, que entra na última etapa de gravação, em Bonito. Para a pesquisa, Hilton conversou com nomes como Guilherme Coelho, criador do Vivencial que hoje mora em Brasília, e com o diretor de teatro Antônio Edson Cadengue. “Na realidade, eu queria fazer um filme sobre o personagem Túlio Carella, do livro Orgia. Tinha até um nome…O homem da ponte. Estava conversando com João Silvério Trevisan, que era meu vizinho, e foi ele quem levantou essa ideia do Vivencial, que eu não cheguei a frequentar”, conta.

O filme tem até uma referência ao próprio Hilton. No filme, o personagem de Irandhir Santos tem um filho de 13 anos, mesma idade que Lacerda tinha em 1978. “Convivi com Cadengue, Jomard Muniz. Teatros mais marginais existiam em vários lugares do Brasil. E o filme discute que diabos é essa liberdade que temos hoje”, diz.

Hilton Lacerda disse que tem vontade de escrever para teatro

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